Capítulo 3


- Já pegou a espingarda? - Ellen pegava as últimas coisas necessárias para ir atrás da filha. Seu desespero era totalmente visível.

- Já. Podemos ir. - Deise falou de forma rápida.

As duas saíram naquela noite e foram para onde achavam que a Amanda tinha ido. Para a Lomba Alta. Seguiram um caminho de terra, até chegarem na rodovia e seguiram para o sul, justamente para a direção da cidade. Amanda teria que passar por lá e obviamente encontraria centenas de infectados pela praga. 

- Droga! Essa pirralha não deve ter ido tão longe. 

- Calma Ellen!

- Calma uma pinóia! Quando encontrar ela, deixarei um vergão na bunda. É última vez que foge assim. Quer que eu seja uma mãe durona, serei uma maldita mãe durona. Vou meter tanta porrada, que vai virar do avesso.

- Calma Ellen! Ela tá bem. - Deise seguia os passos decididos da amiga. Sabia que a Ellen nunca foi durona e jamais seria. Ela mataria ou iria torturar quem fizesse mal para o seu bebê, mas em relação ao bebê, ela jamais bateria. Jamais iria levantar a mão.

Ellen carregava um arco e flechas nas costas. Era certo que o mundo se modernizou e havia vários tipos de armas no mercado. Mas com o mundo entregue ao caos, nada melhor que o velho arco e flecha.

Depois de ter fugido do Rio de Janeiro, aprendeu tiro com arco, algo que não podia ser tão útil dada aos motivos da fuga e de quem fugiu. Mas pelo menos deixou ela em forma. Agora ela agradece por ser uma arqueira.

- Vergão não é suficiente! Vou quebrar ela. Vou partir ela em duas, unir novamente e partir novamente. Ah mas essa menina me paga.

Eram seis km até a cidade, uma distância vencida em meia hora. E mesmo assim, nada de encontrarem a bendita garota.

- Será que ela chegou na cidade? - Deise perguntou

- Deve ter chegado. 

As duas olhavam em direção às casas de uma cidade fantasma. Viram que o sol surgia e um novo dia chegava. A partir dali, estavam numa situação extremamente perigosa. Não porque os zumbis ou infectados poderiam atacar. Nunca atacavam outros seres humanos, embora ouvissem certos rumores. E nenhuma das duas estavam afim de confirmar os boatos. As duas cobriram o rosto com um capuz e máscara. As roupas eram de um material simples, mas que protegia bem. Foi dado pelo governo para que o pessoal que estava protegido, pudessem continuar protegidos e fugirem caso necessário. O arco e as flechas, além da espingarda, revólveres e de várias munições, mostrava que ambas não pensavam na ideia de correr. Seus corpos estavam todos cobertos, inclusive os olhos. Enxergavam graças ao material na altura dos olhos. Elas estavam indo pra guerra.

Alguns minutos antes, perto dali, a Amanda era levantada pelo o homem asiático.

- Você não parece um infectado.

- Porque eu não sou um. 

- Não? Então por que não se comporta como tal? Matou as mão-peladas com a própria mão. Isso é perigoso.

- É mesmo?

- Cê é retardado pelo jeito.

- Já me chamaram disso aí. Mas o que uma criança faz sozinha nesse lugar?

- Não importa! Você é apenas um estranho. E não deveria estar perto de mim. Estou infectada pela praga.

- E quem é que não está?

- É sério! Você deveria procurar uma psiquiatra. Indicaria a minha. Mas talvez ela esteja brava de mais comigo.

- Vamos pra casa e pare de reclamar.

- Casa?

- A sua. Vou te levar de volta. 

- Eu não posso voltar. Tô indo até a minha amiga.

- Tu vai ver a Zoé em breve. Pare de frescura..

- Quê? Donde conhece a Zoé? - Pela primeira vez, a menina parecia realmente brava.

- Tá bravinha? Eu sei muitas coisas, Amanda. 

Amanda não pensou duas vezes. Pegou a besta, colocou uma flecha e apontou para o homem. Estava visivelmente furiosa.

- Você trabalha para o tal Natanaél?

- Natanaél? Só conheço um cara com esse nome. E não. Não sou funcionário dele.

- E pra quem trabalha?

O homem se aproxima e coloca o seu corpo encostado na besta. Ele olha no olho da Amanda, que treme com a ação. Ele mexe as sombrancelhas e dá um sorriso de vitória.

- Criança, vai matar o teu salvador? Se quer fazer isso, faça logo.

A Amanda abaixa a besta e se joga no chão. Claro que ela não quer fazer isso. Nunca matou ninguém e nem se quer um animal. Sim, ela atirou no Rocket minutos atrás, mas errou porque assim torceu. Matar? Não era para ela.

- Vamos Amanda! Tua mãe deve estar preocupada.

- O sol está nascendo.

- Sim. Não vai querer estar aqui em alguns minutos.

- Mas como vamos chegar em casa tão rápido? Estou cansada e não temos nem dez minutos.

Quando terminou de falar se viu num cenário diferente de antes. Aliás, se viu na porta de casa.

- Mas que...!

- Olha a língua! Minha mãe colocaria pimenta na minha boca se eu dissesse palavrão.

- Quem diabos é você?

- Já disse! Teu anjo da guarda.

- Rá! Está fazendo um péssimo trabalho. Quero falar com o teu chefe para te demitir.

- Não fode!

- Rá de novo! Falou palavrão.

- Tu é impossível, garota! Vamos entrar.

Óbvio que a porta estava trancada e obviamente que o senhor anjo da guarda abriu sem nenhuma chave. Apenas movendo a mão. Amanda estava pensando numa oração para Deus. Se aquilo fosse um anjo, estava quebrando todas as regras de um anjo.

- Parece que não tem ninguém em casa.

- Obviamente que não vai ter ninguém em casa. A mãe deve estar atrás de mim. E a Deise também. Mas o que isso importa? Se tu é o meu anjo da guarda, deve ter outros por aí. 

- Não tem outros por aí. - A anjo pegava e olhava um foto de uma mulher de longos cabelos negros e uma garotinha no braço. - Sua mãe?

- Tu não é o cara que sabe tudo?

- Eu só sei o que devo saber. É ou não é a tua mãe?

- É. Mas espera! Tu disse que não tem outros anjos da guarda? Sempre tem outros anjos. Cada um de nós temos um anjo da guarda nos protegendo. 

- Em situação normal sim. Mas esse mundo aqui está entregue ao caos. Anjos da guarda não tem poder de atuação aqui.

- Mas você disse...

- Eu estou te protegendo. Sou teu anjo da guarda. - O anjo deu de ombros ao dizer isso. - Mas não sou um simples anjo da guarda. Afinal, anjos da guarda não fazem isso.

O cenário mudou novamente e ela estava na rodovia ou mais precisamente na entrada da cidade.

- Não faz mais isso, cacete! Meu cérebro entra em pane!

- Eu sei! O cérebro fica bastante confuso com a mudança de cenário.

- Quantos anos tu tem? 10?

- Mais ou menos. 

Não falou muito mais, pois um zumbido de flecha se ouviu. Mas o anjo foi tão rápido que conseguiu pegar a flecha no ar. 

A pessoa mascarada que atirou, ficou visivelmente surpreendida pelo ato do outro. Os olhos do anjo ficaram vermelhos por alguns segundos e voltaram para a cor normal que era antes, um castanho claro.

- Ah, olha a tua mãe aí! Pelo jeito era não se recusa em atirar.

- Se afasta da Amanda! - Uma outra mascarada disse com uma espingarda apontada para o anjo.

- Quem é a loira?

- É a Deise. Mas como consegue identificar elas?

- Visão. Mas não é só isso que estou vendo na sua amiga. Ele moveu os braços e jogou a Ellen longe. A mãe da Amanda se viu de repente em uma barreira invisível. Amanda por mais que odiasse, foi transportada para a mesma barreira. Ellen tomou outro susto com isso. Mas quando a filha abraçou ela, ela caiu no chão e a encheu de beijos e carinhos.

- O Que está acontecendo? - Ellen perguntou assustada.

- Ainda estou procurando saber. - Amanda respondeu.

Fora da barreira, Deise estava assustada com o que via. O homem asiático a sua frente, parecia se divertir com tudo. Sem falar que em menos de dois minutos aconteceram coisas bem estranhas.

- Mas o temos aqui? Serpentes são animais tão... Como posso dizer? Perigosos.

- Se afasta se não eu atiro. 

O homem balançou as mãos como se estivesse com medo.

- Essa é a melhor ameaça que pode fazer? Como gostaria que eu te chamasse? Deise? Nome bonito... Na verdade eu nunca pensei que esse fosse teu nome. Achava que era algo relacionado com serpentes. Afinal, sempre gostou de cobras não é? Veneno de Deus! Hummmm algo mais ou menos nesse sentido.

- Não sei quem é você e o que quer comigo. E nada do que diz, faz sentido.

- Claro que não faz sentido! Sabe por que me enviaram para cá? Visão. Eu vejo tudo... Ou quase tudo. Claro, preciso me concentrar em algo e assim vejo onde ela está e quem ela é. Então tua verdadeira face não pode ser escondida de mim, serpente!

- Contou o apelido que deu pra ela? - Ellen perguntou para a filha.

- Não. Mas isso quer dizer que...

- Temos que sair daqui. A Deise precisa de ajuda. 

Do outro lado, a Deise finalmente deu um tiro no homem. Mas ele se desviou de forma que só o Neo de Matrix faria.

- Ah por favor! - Deise estava assustada com tudo. Pra ela nada fazia sentido.

- Qual o teu nome? - Amanda gritou perguntando.

- Uriel. - O anjo respondeu sem tirar os olhos da Deise.

- Uriel? Mas é um... Esquece! Isso explica tudo. Uriel, por favor! Não machuque ela. Isso tudo está muito confuso pra mim. Quer dizer... Anjos e demônios são meus temas favoritos e nada do que está acontecendo aqui faz sentido. Mas se a Deise é exatamente isso... Eu conheço ela desde pequeninha, por favor! 

- Se eu matar ela agora, muitas coisas podem ser alteradas. Bom, ela é única no universo. Não terá nenhum paradoxo no espaço tempo. Tão fraca e indefesa! É tão fácil acabar com tudo.

- Uriel! Se Deus te enviou aqui, Ele quer te ensinar algo. Acha que matar ela é o que Deus quer.

O anjo pareceu pensar por alguns minutos e finalmente disse:

- Não. Não é.

Uriel moveu as mãos e barreira caiu. Ele pegou a espada e colocou nas costas. Nada mais foi dito.

Amanda correu e se jogou nos braços da Deise e Ellen caminhava com cuidado. Ela ouviu toda a conversa da filha e do homem. Não tinha motivos para dúvidar de nada. Sabia que a partir daquele momento tudo mudava novamente em sua vida. Ao olhar o braço da amiga, notou que a vestimenta estava rasgada e justamente mostrava a tatuagem. Uma serpente se enroscava num tronco de árvore. O símbolo mais tradicional da medicina de repente tomou um significado diferente. A Ellen sabia o que tudo aquilo significava e chorou. Chorou de tristeza e medo. Tristeza pela amiga e medo pelo futuro. Mas independente do que fosse dito nos próximos dias, ela não iria desistir da amiga. Lutaria contra o próprio Deus, mas não iria se opor a Deise.

- Samael! - Ela disse por fim

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