Capítulo 3
Mariana Sentei na beirada da cama e demorei para conseguir levantar. Havia um banheiro, vi que dava para trancar, então entrei, fechei e fiquei ali por bastante tempo, olhando para tantas marcas roxas no meu corpo que eu tanto gostaria de apagar. Não havia janela ali, nada útil nas gavetas que eu pudesse usar para soltar a janela do quarto. Liguei o chuveiro, tomei um banho. Quando saí segurei a roupa que estava separada. Era um vestido bonito, diferente do que meu pai me fazia usar. Discreto, elegante e sem vulgaridade. Ele lembra um que ganhei do único homem que já confiei, junto com uma agenda. Tudo porque era o papai Noel de uma noite de natal há quase dois anos. Mas estava naquela sacolinha que perdi no caminho até aqui. — Com licença... — Alguém abriu a porta do quarto pelo lado de fora — Sou Luciana. Vim avisar que o senhor Ezequiel está esperando. — Me encolhi na toalha. — Ele só quer conversar e explicar o que está acontecendo. Depois te manda embora, despacha pra algum lugar no mundo que queira viver e pronto. Não vai te manter aqui. — Isso não me parece ser verdade. — Pode pensar como quiser, mas vista a merda da roupa e venha. Eu sabia que aquele era o único caminho para sair desse lugar, então respirei fundo, vesti o vestido e encontrei uma escova, então arrumei os cabelos. Eu precisava enfrentar esse homem e conseguir uma faca, talvez uma arma. Saí pela porta e Luciana me acompanhou por corredores. Fiquei olhando para todas as janelas. Quando vi uma possibilidade, eu a empurrei para dentro de um dos quartos e corri. Pensei que todos aqueles caras correriam atrás de mim, mas pra minha surpresa, não foi assim. Olhei para trás marcando o caminho que fiz. Se algo desse errado eu saberia que teria que seguir por outro lado depois. Mas me assustei quando bati com tudo naquele homem de novo. — Por que a pressa, Mariana? — Me afastei imediatamente. Foi como se me desse choque. — Não encoste em mim! — segurei o primeiro jarro de barro que vi numa mesa para me defender, mas escorregou e caiu no chão. Meu coração errou uma batida. — Quem me encostou foi você. Eu estava bem parado aqui, olhando a comida esfriar e levei um belo empurrão. — moveu as mãos com semblante irritado — Não chegou nem a mover meu cabelo, mas gostei das suas mãos pequenas encostando no meu peito. — Olhei apavorada e vi que ainda estava com as mãos no homem, tirei imediatamente, sentindo meu coração acelerado. — Você é louco. — Ele veio mais perto, dei um passo pra trás. Seus olhos não desviavam dos meus. — Tanto faz. Caso queira ficar apoiada no meu peito ou em algum outro lugar e dizer que é outra coisa, não vou me importar. Agora me explica, por que corria tanto? — Eu só quero sumir daqui. Não se faça de bobo, porque foi você quem me comprou e me prendeu. Aliás, ainda não me disse de onde me conhece. Como sabia sobre meu pai e que estava me vendendo? O que realmente quer comigo? — me afastei o suficiente, olhando ao redor. O homem veio bem perto, meu corpo inteiro tremeu. — Eu faço isso todas as semanas. Sei quem está a venda, compro pelo nome. — Mas por que eu? Por que me comprou? — Eu já conhecia você, sua história, mas não vamos falar disso agora. — Veio mais perto. Pensei que me agarraria, mas com seu tom grosso, ordenou: — Sente-se. — Cadê o velho que queria me ver? — dei a volta na mesa, tomando distância dele, mas não sentei. — Eu já expliquei que não sou um velho. — Você é o Ezequiel, então? Me comprou e mentiu ser um agente? Cada vez tenho mais certeza de que homens só enganam, mentem, se aproveitam — minhas palavras saíram picadas, minha voz falhou ao sentir a dor absurda no meu peito voltando com tudo. — Me chamo Ezequiel, mas não aquele que você esperava encontrar. Não gosto de ser questionado e julgado, então modere suas palavras — sua voz ficou mais firme. — Os boatos são muitos... todas as moças daqui tem medo de serem vendidas ao velho Ezequiel, e tantas já morreram... Como espera que eu me sinta? — ele veio andando perto de mim. — A minha mãe foi comprada por Ezequiel, assim como muitas outras. Aquele velho comprava todas as mulheres, em busca de ter um herdeiro. Maltratava até a morte se a mulher não lhe desse um filho, mas quem era estéril era ele. A minha mãe conta que tentou inúmeras vezes, e o problema era o velho. Até que um dia, ela ficou grávida de outro, fazendo Ezequiel acreditar que eu fosse filho dele, até tenho seu nome... “Ezequiel Costa Junior!“ — Então... não houve mais compras de mulheres? O velho parou, graças a sua mãe? Bom, e a você. — Não, o maldito não parou, se acostumou a fazer isso com elas. Só que cresci presenciando isso, e antes que machucasse mais mulheres, eu o matei. — Matou quando? Até onde sei, mulheres ainda são compradas, mulheres morrem. Isso nunca vai parar. — Continuei comprando as moças, porque se eu não tivesse comprado, onde você acha que estariam? Ainda estariam vivas? Porque as famílias vão vender pra outros velhos, homens ruins, então eu compro e liberto, levo para uma vida nova, e aviso as famílias que morreram, para que tenham paz e não façam exatamente como o asqueroso do seu progenitor, e tente vender novamente. — Faz jantar romântico pra todas? — Olhei na mesa, ele gargalhou. — Isso nunca foi e nunca será um jantar romântico. Só pedi pra prepararem bem a mesa pra que comesse a vontade. Quando eu convidar uma mulher, ela saberá diferenciar. — Isso significa que estou livre? — ele veio mais perto, meu coração bateu rápido. Tenho aversão a homem. Precisaria me controlar. — Eu quero que fique. Posso te dar uma vida diferente, dinheiro, posso te oferecer muitas coisas. — Levantou a mão tentando tocar meu rosto, mas não deixei. — Nada é de graça, Ezequiel... o que quer de mim? Se é verdade tudo o que disse, você gastou uma nota preta com meu pai, e não foi para lavar sua casa ou algo do tipo, seu que estou em dívida, mas... — o olhei dos pés a cabeça — Não estou a venda. Nem que eu precise trabalhar o resto da vida pra pagar isso. Jamais te deixaria me tocar. — Quero que fique aqui comigo. Como faremos? — Como assim? A Luciana disse que se eu viesse, você me "despacharia". Você mesmo disse que não passaria de um jantar. — Ainda não comeu nada. Não tive porra de jantar nenhum. — Não estou com fome. Estou presa na sua casa, ou sei lá o quê é isso. — Olhe para os lados. Tem alguém te segurando? Quando correu, alguém te impediu? — olhei ao meu redor e me lembrei que tinha razão. — Não, mas eu prefiro ir embora. — Pra quê? Quer que aquele nojento te encontre novamente e te venda? Posso matá-lo se quiser, mas aquele cassino é imenso. Todos sabem de você, por isso te encontrei. Acha que exitariam em fazer o mesmo que aquele asqueroso? — a dúvida percorreu minha mente. — Como sabe de mim? Por que me procurava? — estreitei os olhos. O homem falou com domínio. — Eu sei de muita coisa que acontece aqui. Você deveria ficar e trabalhar pra mim. Os meus motivos não importam pra você, e o seu trabalho eu ainda vou decidir como será — Ele colocou o dedo no meu queixo e o empurrei. Ele me segurou forte e colocou o dedo novamente. — Não me subestime, Mariana. Estou querendo ajudar, mas você quase acertou o meu rosto, e isso nunca irei permitir. Ninguém, escuta bem o que estou falando... Ninguém b**e na minha cara, porque antes eu mato. — Eu não encostei em você — tentei me soltar. — É só um aviso. — O que quer para me ajudar a encontrar as minhas irmãs? Descobrir mais sobre minha mãe — minha voz embargou — Visitar seu túmulo... — Posso conceder um dos pedidos. Mas terá um preço... — senti meu coração gelar.Capítulo 4 Mariana Bazzi — Por um momento pensei que pudesse estar dizendo a verdade, que fosse diferente. Que realmente pudesse ter algo bom, libertar mulheres — me afastei — Mas é igual todos os homens. Odeio você e toda a sua raça! Odeio todos! Me deixe em paz, e me deixe ir embora! — Me soltou imediatamente, como se nada tivesse acontecido. — Você não jantou. Sente-se e faça o que veio fazer. Está pedindo coisas, mas não cede em nada? — apontou para a mesa e puxou uma cadeira. — Se não está mentindo e sou realmente livre, me deixe sair pela porta da frente sem que ninguém venha atrás de mim. — O encarei e disse com uma coragem que não pensei que eu tinha. — Está ciente dos riscos? Porque vão te encontrar e não vou te salvar novamente se for vendida. — Eu... quero sair daqui. — Não, você não vai — entrou na minha frente com o semblante enfurecido. Seu porte grande se sobrepôs perante mim. Seu olhar estava severo. A raiva e o medo ferveram no meu peito. El
Capítulo 5 Ezequiel Costa Júnior Sou o Don da máfia Zion Triad, porém a minha identidade é secreta. Todos sabem do “Don”, poucos sabem que sou eu. Faço tudo por trás dos panos, e quem aparece são meus dois soldados de confiança, que atuam como agentes, para não serem expostos em Israel ou países onde preciso de cobertura. Mas hoje foi diferente. Fui pessoalmente atrás dela, a Maryam, porém não saiu do jeito que programei, apesar de todo esforço, ela me rejeitou, me fez sentir um idiota na frente dos meus subordinados. Outra vez fui rejeitado, me odeio por isso. Da outra vez até deixei passar, porque a mulher que escolhi amava outro, mas dessa vez as coisas serão diferentes. Despejei toda minha ira no móvel da copa. Em seguida, Sara, uma dos meus soldados se ofereceu para limpar o sangue da minha mão.... Encostado em uma cadeira giratória, ela observa o que destruí do móvel sob medida e respiro pesadamente ao vê-la me olhando. — Don... Isso não está cer
Capítulo 6 Mariana Bazzi A madrugada estava escura como breu. Nenhum poste aceso. Nenhum som além do da minha própria respiração e do coração batendo tão forte que eu mal conseguia escutar os pensamentos. Só precisava chegar até o centro. Talvez encontrasse um bar, um ônibus, qualquer coisa. Meus olhos marejaram, mas segurei. Não agora, já chega de sofrimento. Até que ouvi o som de um motor. Pneus no cascalho, precisei apressar o passo. Um carro se aproximava devagar demais. O farol iluminou minha silhueta, e antes que eu pudesse correr, a porta abriu com violência. — Olha só... A fugitiva — reconheci aquela voz na hora, era do cassino. Ele parecia que estava parando... Droga! — Você?! — minha voz saiu trêmula, mas cheia de ódio. Ele sorriu de um jeito que me embrulhou o estômago. Já havia tentado me comprar do meu progenitor uma vez, como se eu fosse uma mercadoria, mas fugi. E agora, ali, no meio do nada... era como se estivesse realizando um plano antigo de
Capítulo 7 Ezequiel Costa Júnior Tranquei a porta atrás de mim, ouvindo o som metálico da chave girando na fechadura. Sem olhar de volta, caminhei pelo corredor da casa com o coração pulsando feito um tambor de guerra. Cada passo transbordava minha raiva contida. Meus olhos encontraram os rostos curiosos dos funcionários, todos parados no meio de suas tarefas, fingindo que não viam, mas desejando saber a fofoca. — Ninguém abre aquela porta — minha voz foi firme. Luciana, a governanta, hesitou por um instante antes de se aproximar. — Nem mesmo para levar comida, senhor? A moça parece fraca… Cerrei os dentes. — Nada de regalias. Apenas uma sopa. Vi a dúvida no olhar dela, mas esperava o quê? “Preparei um jantar inteiro e ela não valorizou, quem sabe a sopa não come.” — pensei, passando direto por Luciana sem dar chance de réplica. Fui até a sala dos fundos e abri a porta com força. — Chame o Yulssef. Agora. O funcionário que estava por ali se apressou. E
Capítulo 8 Mariana Bazzi Acordei assustada. Um barulho suave, quase imperceptível, me tirou do sono. Meus olhos demoraram alguns segundos para se ajustarem à luz suave que entrava pelas frestas da cortina. O quarto ainda estava em silêncio, mas eu sentia que não estava sozinha. Foi então que o vi. De pé, próximo à porta, Ezequiel me observava. Me encolhi instintivamente na cama, puxando a manta até o queixo. O coração disparou. Meu corpo inteiro reagiu com tensão, como se esperasse um golpe, um grito, qualquer coisa. — Bom dia — ele disse, com a voz baixa. — Dormiu bem? — Sim… — respondi, quase num sussurro. Minhas mãos tremiam sob o cobertor. Ele se aproximou devagar. Ainda assim, cada passo dele parecia um trovão nos meus ouvidos. — Chamei o médico novamente. Gostaria que você fizesse alguns exames. Está muito pálida, quase não come. Pode ser algo sério. — Não. — minha resposta foi automática, mais firme do que eu esperava. — Homem nenhum vai encostar em mim.
Capítulo 9 Ezequiel Costa Júnior Ela saiu correndo. Fiquei parado por alguns segundos, sem conseguir processar. O coração batendo no peito como uma martelada surda. A raiva veio como um vendaval. Eu tinha servido aquela mesa com calma, com paciência — algo que nunca fiz para ninguém. Só para ela e bom... Valéria, mas não gosto de lembrar. Fiz seu prato, tratei bem. E pra quê, caralho? Ela correu de mim como se eu fosse um monstro. Minha mão tremeu, os olhos fixos no prato vazio dela. A raiva ferveu. Com um grito rouco e abafado, agarrei a travessa mais próxima e arremessei contra a parede. A porcelana se estilhaçou com um estrondo. Em seguida, virei a mesa com um movimento violento, jogando tudo no chão. Louças, taças, talheres... voaram pelo salão. A mesa de mogno ficou virada, a toalha manchada de vinho escorrendo como sangue. — Porra! — gritei, socando a parede até sentir a pele dos nós dos dedos abrir. O sangue escorreu quente, mas nem isso me fez parar.
Capítulo 10 Ezequiel Costa Júnior Entrei, mas não fui até ela. Encostei as costas na porta fechada e fiquei ali. Braços cruzados, olhar atento. O quarto ainda estava com o cheiro do incenso que a doutora usava, uma tentativa inútil de esconder o medo no ar. Ela estava sentada na cama, os joelhos juntos, abraçando os próprios braços. Assustada, sim. Mas me olhava. E isso já era muito. — Quais foram seus pedidos? — perguntei, sem rodeios — Pode me lembrar o que me pediu? Mariana hesitou por alguns segundos. Os olhos correram pelo quarto antes de voltarem pra mim. — Visitar o túmulo da minha mãe… — começou, a voz embargada. — E procurar pelas minhas irmãs. Assenti lentamente. — Bom... posso conceder um desses desejos. Apenas um, terá que escolher. Vi a surpresa surgir no rosto dela. Não falei com arrogância. Falei com verdade. — Um? — O túmulo da sua mãe está lá. Frio, imóvel, sem nada que eu possa mudar. Nada que você possa mudar também. Não quero te levar
Capítulo 11 Mariana Bazzi Nem acreditei que ele me levaria até minhas irmãs, Iris e Soraya. Meu coração batia rápido no peito, eu queria muito vê-las, ficar perto, ver um dos rostos que conheço. Mas paralisei quando vi tantas luzes brilhando. Era um cassino. Muito maior e mais sofisticado que o do meu pai, e comecei a apertar o banco com os dedos de medo do que aconteceria. — Elas estão aqui? — perguntei gaguejando quando chegamos. — Sim. Mas olha pra mim — ergui o rosto e o encarei — Se quer mesmo entrar e ver as duas, terá que confiar em mim. Você confia? — Balancei a cabeça confirmando que sim. Eu não tinha escolha, era tudo ou nada. — Você as viu? — questionei. — Sim. Tentei comprar as duas através de meus agentes, mas Iris não quis. Soraya teve medo e preferiu ficar com a irmã. — Mas porque? — Olha, diferente de você, elas foram vendidas para um homem que apenas compra dançarinas e mulheres bonitas para atrair clientes no cassino. Pare