Dois dias depois.Lúcia não entendia por que Basílio insistia tanto para que ela ficasse longe da internet e do celular. No fundo, ela sentia que algo estava errado, mas não conseguia descobrir o quê.Foi só quando uma empregada, enquanto lhe servia café, deixou escapar sem querer que Sílvio havia ido a Viana para se noivar com Giovana.Enzo, que presenciou a cena, repreendeu a empregada de imediato e tentou consolar Lúcia. Ela, no entanto, forçou um sorriso e disse que estava tudo bem, apesar de ser evidente que não estava. Após tomar um gole apressado de café, subiu para o quarto.Enzo percebeu a inquietação dela e temeu que algo mais sério acontecesse. Sem pensar duas vezes, ligou para Basílio.No quarto, Lúcia estava sentada no chão, encostada no tapete, com o celular nas mãos. Seus olhos estavam fixos nos trending topics do Twitter, onde o principal assunto era o noivado de Sílvio e Giovana. Os tópicos estavam todos em negrito, chamando atenção de qualquer um que passasse por ali.
Lúcia não ouvia a voz de Sílvio há muito, muito tempo. E agora, ao escutá-lo falar tão educadamente, sem o tom agressivo de antes, seus olhos imediatamente se encheram de lágrimas.Meio minuto se passou.— Você está bem? — Perguntou Sílvio, como se realmente estivesse preocupado.As lágrimas de Lúcia vieram com força, transbordando pelo rosto, sem que ela conseguisse controlar. Mesmo assim, ela tentou disfarçar, não queria que ele percebesse:— Sílvio, você está preocupado comigo? — Perguntou Lúcia, com a voz trêmula.Ele não respondeu.Sentindo o peito apertar, ela insistiu, sua voz carregada de mágoa:— Você está preocupado comigo, não está? Você ainda se importa comigo, não é? Então como, Sílvio? Como você pode estar noivo de outra mulher? O que está passando pela sua cabeça? Me diz, por favor, o que você está pensando? Eu não consigo entender. O que foi que eu fiz de errado para você me tratar assim? Por que você não pode simplesmente falar comigo, ser honesto? Você tem seus motivo
A voz zombeteira de Sílvio ecoou do outro lado da linha:— Só um trote.A ligação foi abruptamente encerrada. Giovana, completamente imersa na felicidade do noivado iminente, não suspeitou de nada. Sílvio a envolveu pela cintura, e ela se aconchegou contra o peito dele.O rosto de Giovana se avermelhou num instante.— Sílvio! Em plena luz do dia? Não tem medo que alguém veja? — Giovana o repreendeu, com um tom manhoso.— Já estamos quase noivos, ainda tem medo que alguém veja? Hum? — Sílvio arqueou os lábios, soltou sua cintura e tirou um cigarro do bolso da calça, levando-o aos lábios. — Entra comigo?Ela hesitou:— Pode ir na frente. Vou dar uma volta.— Algum problema?— Não, só quero dar uma volta. Pode ir, eu volto logo.— Se cuida. — Sílvio acariciou seu rosto com ternura.Giovana assentiu e se virou, entrando em uma viela pavimentada com pedras. Sílvio acendeu o cigarro e a seguiu à distância.Giovana estava bastante alerta. A cada poucos passos, ela se virava para olhar ao redo
Como uma chuva torrencial castigando flores prestes a murchar, Giovana sentia-se esmagada. Era vergonha, era raiva, era desespero. Com os olhos vermelhos, ela mordia os lábios com tanta força que o gosto salgado das lágrimas escorria para dentro da boca tão salgado que parecia arder.— Vou te dar mais uma chance, Giovana. Hoje à noite, traga o Sílvio para a fábrica abandonada. Hoje, ou ele morre, ou você morre. — A voz de Arthur era fria, cortante como uma lâmina.— Depois que eu me casar, você faz o que quiser. — Giovana estava de joelhos, tentando resistir à humilhação.Arthur, com um chute violento, a arremessou ao chão. A dor foi tão intensa que ela levou vários segundos até conseguir se mover. Ele se aproximou lentamente, agachou-se diante dela e segurou seu queixo com força, obrigando-a a encará-lo:— Se eu não tivesse medo de que você voltasse para casa cheia de marcas, já teria te dado um tapa na cara. Você não passa de uma vadia, Giovana. Quem você pensa que é para tentar nego
Na mansão da família Araújo, em Cidade A.O céu estava pesado, cinzento, e a neve caía furiosamente.Lúcia havia se trancado no terraço. Diante dela, um braseiro emanava chamas que dançavam ao sabor do vento gelado. No chão, ao lado dela, estavam folhas de papel com desenhos. Eram retratos de Sílvio: ele a carregando nas costas, ele concentrado em uma aula na sala de aula, e eles caminhando juntos pelo campus, onde ele, com uma mão, empurrava uma bicicleta enquanto segurava a mão dela com a outra.Sempre que a saudade apertava, Lúcia desenhava Sílvio. Mas agora, ele havia mudado. Sílvio estava de casamento marcado com outra mulher. O telefonema de hoje foi a gota d’água; ela não podia mais se enganar.Uma lágrima solitária caiu sobre o papel, mas o vento frio rapidamente secou o rastro. Em seguida, ela jogou os desenhos no braseiro. Depois, pegou um caderno onde havia escrito incontáveis vezes o nome dele e também o lançou ao fogo.Os papéis e o caderno logo se transformaram em cinzas,
Lúcia pensou por um momento e sorriu de leve:— Vamos ver o que acontece. Perdi a memória, e minha única âncora, o Sílvio, também se afastou de mim. Quando eu conseguir me recompor, acho que vou procurar um emprego. Ficar presa às lembranças de um amor perdido não vai me levar a lugar nenhum.— Já tem algo em mente? Posso ajudar você a encontrar alguma coisa. — Basílio pareceu lembrar de algo e sugeriu. — O escritório da presidência do Grupo Araújo está precisando de uma secretária. Que tal tentar?Lúcia não demonstrou interesse. Pensar em Sílvio, prestes a se casar com outra mulher, fazia seu coração apertar:— Vamos deixar pra depois.Mais tarde naquela noite.Era a última noite de Lúcia na fazenda. O humor dela não estava dos melhores, e durante o jantar, resolveu beber um pouco de vinho. Basílio a acompanhou. Ele ficou observando suas bochechas coradas, como duas nuvens de fogo no céu do entardecer, e acabou se perdendo em seus pensamentos.Lúcia, já um pouco embriagada, começou a
Lúcia estava escorada na beira do sofá, segurando uma garrafa de vinho vazia. Sem um pingo de compostura, soltou um arroto alcoólico. Os olhos se abriam e fechavam pesadamente, a mente enevoada, a cabeça baixa. Na verdade, não prestava atenção em nada do que ouvia, mas mesmo assim fazia questão de responder com entusiasmo fingido:— E depois?Na cabeça de Lúcia, só havia memórias de Sílvio. Boas, ruins, momentos felizes e, claro, outros de tristeza.Sentada ali, a mente já tinha viajado para um passado distante.Basílio, ao ouvir a pergunta dela, não conseguiu evitar a ponta de alegria que brotou em seu peito. Achou que ela estava mesmo interessada na sua história. Seus lábios se curvaram em um leve sorriso, e ele continuou contando, com aquela calma quase hipnotizante. Revelou como, por ser um filho bastardo, jamais teve coragem de se aproximar dela. Mas, para ficar perto de Lúcia, ele foi atrás dela, seguindo seus passos por onde pudesse.Escola. Faculdade.Basílio viu com seus própr
— Depois, nós nos reencontramos. Você estava encurralada por um bando de repórteres na neve, e eu fui o responsável por afastá-los. Mais tarde, você foi ao Bairro das Árvores e acabou sendo atropelada pela Olga. Eu investiguei esse caso. Foi aí que eu descobri que você não estava feliz. Por isso, voltei para a família Araújo. Voltei para assumir a presidência do Grupo Araújo, não porque eu quisesse dinheiro ou poder. Na verdade, eu desprezo essa família e essa vida. Mas eu queria ser o seu apoio. Eu sabia que o Sílvio era poderoso, e, se eu fosse apenas um policial qualquer, não teria como proteger você. Então, sem dizer nada, pedi demissão. De repente, me tornei o novo presidente do Grupo Araújo, o futuro líder da família Araújo.Basílio falou com um misto de emoções em sua voz. Fez uma pausa, respirou fundo e continuou:— Eu não podia me declarar antes porque sabia que o seu coração estava com outra pessoa. Eu temia que isso a colocasse em uma posição difícil. Mas agora o Sílvio já s