A enfermeira-chefe lançou um olhar severo para as duas jovens enfermeiras. Ao perceber que a situação estava se complicando, temeu que Lúcia acabasse descontrolada. Sem perder tempo, pegou o celular e ligou para Basílio:— Sr. Basílio, a Sra. Lúcia está em um estado muito delicado. O senhor poderia vir imediatamente?Naquele momento, a enfermeira-chefe nem ousava aconselhar ou dizer qualquer coisa a Lúcia. Limitava-se a ficar por perto, observando-a com cautela.Através do vidro da UTI, Lúcia fitava Sílvio, que mal respirava, e soltou um grito desesperado, como se seu coração tivesse sido esmagado por um martelo, despedaçando-se em mil pedaços que jamais poderiam ser reunidos.Ela havia perdido os pais. Agora, só restava Sílvio, que estava do outro lado da parede, naquela mesma sala fria de terapia intensiva. Apenas uma parede os separava. E mesmo assim, ela não percebeu nada. Não sabia de nada.Quando a dor era profunda demais, as lágrimas simplesmente se recusavam a cair. Ou talvez,
— Ele quer que Basílio cuide do Grupo Baptista por mim? — Lúcia perguntou, confusa.— Exatamente. O Sr. Sílvio sabia que esse acidente foi grave, temia... Enfim, ele queria que o Sr. Basílio tomasse conta da senhora. — Leopold explicou, com um ar sério.Ele continuou, quase sem pausa para respirar:— Além disso, a senhora tem resistido ao tratamento, sempre brigando com o Sr. Sílvio por causa da sua doença. Ele se desdobrou para convencer o Dr. Daulo a tratá-la, viajando de um lado para o outro. Antes, o Sr. Sílvio era um workaholic, mas depois que a senhora adoeceu, ele deixou tudo de lado para se dedicar exclusivamente a você.— Por que ele queria me juntar com o Basílio? — Lúcia não conseguia entender o motivo.Leopoldo mordeu os lábios, hesitando em continuar.— Pode falar, eu aguento. — Lúcia insistiu, determinada a descobrir a verdade.— Porque, antes de perder a memória, a senhora estava muito próxima do Sr. Basílio. Você até queria se divorciar do Sr. Sílvio por causa dele.Lúc
Lúcia pegou um táxi até o sopé da Serra Encantada. No topo da montanha havia uma capela, justamente aquela que ela tinha visto na publicação online.Ela decidiu ir até lá após ler os comentários dos internautas, que diziam que, embora o local não fosse muito visitado, bastava uma confissão sincera para que seus pedidos fossem atendidos. Era tudo o que ela podia fazer agora. Sem mais opções, ela agarrou-se à última esperança, pedindo que alguma força divina protegesse Sílvio, mesmo sendo uma ateia convicta que nunca acreditara em nada disso. Mas, naquele momento, ela implorava por um milagre.Pagou a corrida, abriu a porta e saiu do carro. O táxi arrancou em alta velocidade, deixando-a sozinha.Uma rajada gelada atingiu seu rosto, bagunçando seu cabelo, que grudou em suas bochechas pálidas. Ela respirava com dificuldade. Na pressa de sair, esqueceu de vestir um casaco mais quente. Vestia apenas um fino pijama listrado de hospital, frouxo, que pouco a protegia do frio cortante que atrave
Lúcia chamou Sílvio e Leopoldo, que já estavam prestes a desaparecer no fim do corredor.— Sílvio, vou esperar você voltar. Vamos nos esforçar, ok? Eu vou dar o meu melhor na cirurgia, e você, na sua negociação. Quando tudo isso acabar, eu quero ser sua noiva mais uma vez.Essas foram as últimas palavras que ela lhe disse.Lúcia estava tão absorta em seus pensamentos que a neve acumulava cada vez mais em seu corpo, em seu rosto, em seus cabelos, trazendo um frio penetrante. De repente, ela despertou, cerrando os dentes e, com dificuldade, usou as mãos para se erguer do chão coberto de neve.Ela tentava se motivar a cada instante. "Lúcia, por Sílvio, você precisa ser forte. Levanta! Este caminho é difícil, é muito difícil."Mas, agarrando-se às memórias recentes com Sílvio, parecia que o trajeto se tornava um pouco menos árduo. Era sua única fonte de força.Uma vez após a outra, ela se ajoelhava, prestando reverência, até seu corpo cambalear de exaustão. O vento cortante açoitava impied
O padre disse a Lúcia que, se tivesse algo a dizer, poderia contar tudo em silêncio a Deus. Afinal, Ele é o mais compassivo com os aflitos deste mundo.Lúcia ajoelhou-se com devoção, juntando as mãos em oração, fechando os olhos. Lágrimas escorreram pelo seu rosto enquanto seus lábios se moviam, murmurando uma prece silenciosa. Em seu coração, implorava para que Deus a ouvisse, para que Sílvio acordasse em segurança. O sangue em sua testa já havia secado ao vento, e as manchas de sangue e lágrimas em suas bochechas se misturavam.Ela comprou um crucifixo simples, feito de ferro, e o padre fez questão de entregá-lo em suas mãos.Em outras circunstâncias, Lúcia provavelmente teria achado aquilo tudo uma bobagem, mas agora ela se agarrava à fé, buscando qualquer forma de consolo para sua alma desesperada.O crucifixo era pequeno, mas em suas mãos parecia pesado, carregado de simbolismo.Segurando o crucifixo com firmeza, ela caminhou até o quintal da igreja, onde uma antiga árvore imensa
O velho padre perguntou novamente:— Senhora, poderia me informar sua data de nascimento?Lúcia balançou a cabeça com um ar de tristeza:— Eu perdi a memória. As lembranças do passado estão todas embaçadas.O padre a observou por um longo tempo, e só então disse com um tom sério:— Minha filha, eu observei seus traços... Mesmo que seu marido acorde, talvez o destino não lhe reserve o final que você tanto deseja. Todos nós somos peças de um grande jogo chamado vida. Forçar as coisas pode não trazer o resultado esperado.— Mas como posso saber se não tentar? — Respondeu Lúcia com determinação.— E se, mesmo depois de tudo que fizer, ele não acordar, o que você fará? — O padre insistiu.Lúcia sentiu um calafrio percorrer sua espinha ao ouvir aquela pergunta, seu coração acelerou de angústia. Ela apertou com força o pincel que segurava, seus dedos ficando brancos de tanta pressão. Olhou fixamente para o padre e respondeu com uma honestidade desoladora:— Então, vou morrer junto com ele. Se
— Sra. Lúcia, sou eu. A voz grave do homem foi levada pelo vento gelado.Lúcia ouviu a voz, levantou lentamente as pálpebras, e quando sua visão clareou, finalmente conseguiu ver o rosto do homem que a puxara para um abraço. Usava um boné preto, um casaco militar verde e jeans todo o visual esportivo. Era Basílio, não era ele. A luz que acabara de brilhar nos olhos de Lúcia, como uma estrela cintilante no céu noturno, se apagou rapidamente, caindo no esquecimento. Claro, Sílvio estava na UTI, em estado crítico, como poderia estar aqui?Não, ele jamais viria.Enquanto Lúcia estava absorta em seus pensamentos, um casaco grosso caiu sobre seus ombros. Basílio a olhava, um brilho de compaixão passou por seus olhos, mas ele logo lembrou que não tinha o direito de sentir pena dela. Baixou o olhar, escondendo a decepção que lhe apertava o peito. Lúcia relutou em aceitar o casaco dele; tudo que conseguia pensar era que, se Sílvio soubesse, ele ficaria com ciúmes. Leopoldo já havia dito que
— Basílio, eu sei que você acha que eu sou uma mulher boba. — Lúcia murmurou, olhando para o casaco em seu colo. — Antes, quando eu via outras pessoas fazendo essas coisas estúpidas, também pensava que elas eram tolas. Mas agora eu entendo... Isso é amor. Basílio, você não entende.Basílio apertou o volante com mais força. Ele, não entende?— Um dia, você também vai encontrar uma garota de quem goste muito, alguém por quem você vai fazer de tudo, sem esperar nada em troca. Quando esse dia chegar, você vai entender o que estou sentindo. Mas eu não quero que você passe pelo que eu passei. Você é um homem bom, Basílio. Eu só desejo que você e a mulher que você ama possam se entender perfeitamente, sem ter que enfrentar tantos obstáculos. — Lúcia mordeu o lábio, suas palavras eram sinceras. De verdade, ela só queria que seus amigos tivessem uma vida tranquila.Os olhos de Basílio se estreitaram ligeiramente. Era uma clara rejeição aos seus sentimentos. Uma dor aguda atravessou seu peito.—