Afinal, a vida só se vivia uma vez.— Dr. Daulo, eu tenho um pedido. — Disse Sílvio.Dr. Daulo não respondeu de imediato. A luz cirúrgica acima de Sílvio era tão intensa que ele precisou apertar os olhos. Mesmo assim, sua voz permaneceu firme:— Priorize a cirurgia da Lúcia. Não se preocupe com a minha segurança. Se algo der errado comigo na mesa de cirurgia, não será sua responsabilidade. O transplante de fígado dela precisa ser um sucesso. — Continuou Sílvio.Daulo, segurando a seringa, parou por um instante, lançando um olhar curioso a Sílvio, mas não respondeu diretamente:— Não posso prometer que ela vai sair dessa. Se, por acaso, vocês dois não sobreviverem... bom, pode acontecer. Tudo depende do destino.A agulha penetrou o couro cabeludo de Sílvio. Primeiro, ele sentiu dor, depois uma dormência que se espalhou por todo o corpo. Assim que a anestesia geral fez efeito, ele mergulhou em um sono profundo, alheio a tudo ao seu redor.Do lado de fora da sala de cirurgia, Basílio perm
Basílio segurava o celular, os olhos frios como gelo. Soltou uma risada sarcástica e, em seguida, desligou o telefone sem hesitar, voltando para fora da sala de cirurgia.A luz da sala de operações permanecia acesa, e a porta, fechada. Ele não saiu de lá por um segundo sequer. Mesmo após seu pai lhe dar um ultimato pelo telefone, Basílio não se importou. Lúcia já o havia ajudado uma vez, e ele nunca encontrou a oportunidade certa para retribuir.Ou talvez, até então, ele não tivesse como cuidar dela abertamente. Lúcia era uma mulher casada, e os dois sempre se desencontravam. Agora, porém, ele tinha uma desculpa legítima para estar ao lado dela, para se preocupar com ela.A cirurgia de Lúcia durou exatos seis longos e intermináveis horas. Para Basílio, parecia que aqueles seis horas haviam se arrastado por seis séculos.Quando a cirurgia finalmente terminou, as luzes da sala de operações se apagaram abruptamente, e a porta se abriu de repente. Lúcia foi empurrada para fora da sala em u
Basílio olhava para a mulher deitada na cama, seu rosto pálido como cera. O longo cabelo de Lúcia estava espalhado pelo travesseiro. Ele não pôde evitar sentir uma pontada de tristeza. Eles haviam sido colegas na escola primária. Sua mãe o forçou a estudar em uma escola de elite, mas seu passado foi rapidamente descoberto.Ele era um filho ilegítimo, um segredo vergonhoso. Sua mãe havia destruído um lar, e por isso ele foi ridicularizado e isolado.Lúcia foi a única a ajudá-lo. Declarou que ele era seu amigo e que qualquer um que o maltratasse estaria se metendo com ela. Naquele momento, olhando para Lúcia, com seu vestido de princesa e seu jeito adorável, Basílio a viu como uma verdadeira heroína, uma Mulher Maravilha encantadora.— Qual é o seu nome? — Lúcia perguntou um dia.— Basílio. — Respondeu ele.Mas ela não se lembrou do nome dele por muito tempo. Logo o esqueceu, e mesmo quando se cruzavam pelos corredores, ela não o reconhecia. Ele imaginava que Lúcia devia ter ajudado tant
O nariz de Lúcia começou a arder, e ela não conseguiu conter as lágrimas ao pensar em todas as dificuldades que atravessou até ali. Ela havia acordado, finalmente acordado. Não tinha morrido! Afinal, ela não tinha voltado a ser a noiva do Sílvio, não tinha ido ao café com o Sílvio para ler os postais um do outro e envelhecido com ele para a eternidade.Desta vez, eles não se perderiam!Lúcia sentia no fundo do coração que seus pais, lá do céu, haviam abençoado sua recuperação, o que tornara a cirurgia um sucesso. Talvez pela emoção ou pela alegria, sua mão estendida tremia sem controle. Ela quase tocou as pontas dos cabelos do homem adormecido à sua frente. Teria ele voltado correndo do exterior para vê-la? Como havia sido a negociação?Os olhos de Lúcia estavam vermelhos, o nariz também, e sua garganta estava seca e dolorida. Quando finalmente tocou o cabelo dele, o homem despertou, levantando a cabeça e olhando para ela.A mão de Lúcia congelou no ar, e a alegria que tinha nos olhos
Os olhos de Lúcia brilharam por um instante, mas uma pontada de decepção logo tomou conta. Ela só poderia vê-lo depois que conseguisse andar? O que, afinal, Sílvio estava fazendo para não poder aparecer por tanto tempo?— Se concorda, balance a cabeça. — Basílio insistiu.Lúcia sabia que não tinha outra escolha. Lúcia acreditava que Sílvio jamais faria algo para machucá-la. Se ele estava ausente, devia ter um bom motivo. Ela precisava ser paciente, seguir as orientações médicas e se recuperar logo para vê-lo.Com o coração apertado, Lúcia assentiu, chorando.— Você precisa se alimentar bem e tomar todos os remédios. Sílvio me disse que, se você fizer manha outra vez, ele nunca mais vai querer te ver. — Mentiu Basílio, sem hesitar.Ao ouvir isso, Lúcia ficou agitada e logo balançou a cabeça, prometendo que se comportaria. Ela iria comer direitinho, tomar todos os remédios e se cuidar para se recuperar o mais rápido possível.Nesse momento, a porta do quarto se abriu. Leopoldo entrou car
Basílio ficou paralisado por um momento. Esse tipo de oportunidade, ele não queria de forma alguma. Aproveitar-se da doença de alguém para interferir em um relacionamento não era do seu feitio. Se pudesse escolher, desejaria que aquele arrogante Sílvio acordasse, porque sabia que, mesmo que Lúcia perdesse a memória, ele nunca poderia ocupar o lugar de Sílvio no coração dela.O homem que ocupava a mente e o coração de Lúcia sempre seria Sílvio, não ele.Uma sensação amarga apertou a garganta de Basílio, seu pomo de adão subiu e desceu enquanto tentava falar algo, mas as palavras simplesmente não saíam. O que ele poderia dizer? Afinal, Daulo já havia dado o veredito, e nada do que ele dissesse mudaria a situação.Ao voltar para o quarto, Lúcia, que o viu entrar, imediatamente se levantou da cama.— Por que você se levantou? — Perguntou Basílio, preocupado.Lúcia balançou a cabeça e sorriu radiante:— O médico disse que estou me recuperando muito bem e que já posso andar. Basílio, você me
Leopoldo trabalhava com o Sílvio há muitos anos, e a ligação entre eles era profunda.— O Sílvio se machucou? Está em perigo? — Perguntou Lúcia, enquanto seus olhos se enchiam de lágrimas, que logo caíram, pingando na tigela de comida que ela segurava.Ver Lúcia chorar partia o coração de Leopoldo. Ele ainda nem tinha conseguido responder quando ela continuou:— Leopoldo, se algo aconteceu com o Sílvio, você não pode esconder isso de mim! Somos marido e mulher! Precisamos enfrentar tudo juntos!— Sra. Lúcia, o Sr. Sílvio está bem. Realmente, ele só está ocupado com o trabalho. Está levando mais tempo do que o esperado, mas ele está muito feliz por saber que a sua cirurgia foi um sucesso. — Disse Leopoldo, abaixando os olhos com respeito, tentando esconder a dor que sentia e evitar que as emoções o traíssem. — Por favor, coma. Se a senhora não comer, eu não saberei o que dizer ao Sr. Sílvio.Lúcia confiava em Leopoldo. Ele era o assistente mais próximo de Sílvio. Se Leopoldo dizia que e
A segunda ligação também foi rejeitada. A mágoa de Lúcia foi se acumulando, camada por camada. Ela mordeu o lábio e estava prestes a fazer a terceira chamada quando uma mensagem apareceu na tela.[Lúcia, estou muito ocupado agora. Não posso atender. Leopoldo me contou que sua cirurgia foi um sucesso. Seja boazinha e espere eu voltar.]Ao ler a mensagem, Lúcia sentiu uma pontada de emoção no peito, e as lágrimas começaram a rolar, grandes e pesadas, caindo sobre a tela do celular. Ele pediu para ela esperar por ele, e ela sempre foi tão obediente. Como poderia não fazer o que ele pedisse? Finalmente uma notícia dele! Mesmo que fosse apenas uma mensagem, já era o suficiente. Significava que ele estava bem, que estava a salvo.Com os dedos tremendo, Lúcia começou a digitar, cheia de saudade, e escreveu um monte de coisas.[Sílvio, o Dr. Daulo disse que estou me recuperando muito bem. Já posso andar! Fui muito obediente, como você pediu. E você? Como estão as coisas aí? Ouvi dizer que sua