Ele estava recostado no travesseiro, com os olhos turvos, olhando para o lustre no estilo europeu.Sandra falava enquanto as lágrimas escorriam pelo rosto. Abelardo, em silêncio, deu um leve tapinha em seu ombro e a abraçou. Ele se sentia profundamente culpado, inútil por não conseguir proteger sua esposa e filha. Ser humilhado por Sílvio e não poder fazer nada a respeito só aumentava essa sensação.Depois que sua esposa adormeceu, Abelardo fechou os olhos, mas os pensamentos sobre as palavras de Sandra não o deixavam em paz. Ele cuidadosamente retirou o braço dela, que estava sobre ele, e, com grande esforço, desceu da cama, indo até sua cadeira de rodas. Lentamente, deslizou a cadeira até sair do quarto.Notou que o quarto de Lúcia ainda estava iluminado e, curioso, foi até lá.Ao entrar, viu Lúcia de costas para ele, caída sobre a mesa, como se tivesse adormecido enquanto trabalhava.Abelardo estava prestes a acordá-la para que fosse descansar na cama e não pegasse um resfriado, ma
Lúcia ouviu o nome de Sílvio e, imediatamente, sentiu o coração apertar.É claro, como ela não pensou nisso antes? Devia ter sido ele!— Lúcia, você brigou com ele de novo, não foi? — Sandra perguntou, chorando, com o tom de quem já sabia a resposta.Lúcia não queria preocupar a mãe e negou, contrariando seus próprios sentimentos:— Não, não brigamos.— Como não? E por que seu pai desapareceu de repente? Só pode ter sido Sílvio. Quem mais teria motivo para fazer isso? Você já esqueceu quando ele empurrou seu pai da cadeira de rodas? — Sandra enxugou as lágrimas com a manga da blusa. — O Natal está quase aí, e esse ingrato ainda quer causar mais confusão!De repente, Lúcia lembrou do dia anterior, quando Sílvio a forçou a tomar o remédio, e ela, num impulso de raiva, arranhou o rosto dele e ainda lhe deu alguns tapas.Não imaginava que a vingança viria tão rápido. Agora, ela sabia que suas ações impulsivas sempre tinham um preço.— Mãe, eu vou encontrá-lo. Não se preocupe, está bem? Síl
Lúcia sempre teve coragem de fazer o que os outros jamais ousariam.Sílvio, por sua vez, percebeu que sua paciência com ela estava ficando cada vez maior, e os limites que impunha a si mesmo, cada vez menores.Ele andava muito ocupado nos últimos dias, afinal, o Natal estava chegando e ele queria resolver os negócios para poder passar um tempo tranquilo com ela e sua família.O que ele não esperava era que Lúcia viesse procurá-lo tão rápido.Sílvio sentiu os cantos da boca se levantarem involuntariamente, mas foi só por um instante. Logo seu rosto voltou àquela expressão fria e séria.Ao entrar na sala de reuniões, ele a notou imediatamente.Lúcia estava sentada em uma das cadeiras ao lado da mesa comprida. Seus longos cabelos negros caíam suavemente sobre os ombros, presos atrás das orelhas delicadas.Ela vestia um grosso casaco preto que a envolvia, parecendo ainda mais pequena e frágil.Com uma xícara de café nas mãos, Lúcia estava prestes a dar um gole quando ouviu o som de passos
Lúcia levantou os olhos, nervosa, apertando o cabo da colher com mais força.Sílvio, de braços cruzados, estava sentado do outro lado da mesa, vestindo um terno impecável que destacava sua presença imponente. Ele exalava a aura de um verdadeiro líder, alguém acostumado ao poder.No rosto dele, não havia traços de qualquer emoção, o que fazia o coração de Lúcia bater acelerado. Ainda assim, ela decidiu falar:— Eu e o Basílio não temos nada, somos apenas amigos. — E quanto ao rapaz mudo, ele já está morto. Eu o vi apenas uma vez e nem lembro mais de sua aparência. Nunca tive nenhum envolvimento inadequado com ele. Sílvio, estou dizendo a verdade. Se não acredita, pode investigar. — Disse Lúcia, mordendo o lábio, tentando manter a calma.Sílvio estreitou os olhos, observando-a de forma penetrante:— Por que veio me procurar? O que realmente quer?Ele sabia que ela não estava ali apenas para se explicar. Mas, de certa forma, o fato de Lúcia estar se esforçando por ele lhe agradava, ainda
Lúcia viu que ele estava prestes a sair e correu para interceptá-lo, bloqueando seu caminho.Como poderia deixá-lo ir embora, depois de todo esse tempo que ele demorou para aparecer?— Diga-me o que você precisa para trazer meu pai de volta! Você sabe que minha mãe está desesperada! Sílvio, você pode brigar comigo e se irritar à vontade, mas por que usar meu pai como arma? — Lúcia falava com pressa, as palavras saindo desenfreadas.O semblante de Sílvio tornava-se cada vez mais sombrio, seus traços faciais rígidos:— Dizem que fui eu. E as provas?— Como você sequestra alguém e ainda deixa provas?— Lúcia, se existissem provas contra mim, seria melhor você ir à delegacia fazer uma denúncia e chamar a polícia para me prender. Sem provas, não venha sujar meu nome. — Sílvio puxou a gravata, visivelmente irritado.Lúcia cerrava os punhos, sentindo a frustração subir.— Você realmente não sabe quem levou seu pai? Ele fez tantas maldades, tem tantos inimigos, não faz ideia de quem possa esta
As botas de neve afundavam na espessa camada branca, que chegava a quase um metro de altura, deixando suas pegadas desiguais, como se estivesse andando em pernas de pau.“Onde será que Sílvio escondeu papai? Será que ele está bem?” Pensava Lúcia, preocupada.Dias atrás, seu pai havia feito birra como uma criança por causa de um pesadelo, recusando-se a jantar. Agora, sem poder vê-lo, como ela poderia saber se ele estava comendo direito? Será que estava descansando bem?A neve caía em grandes flocos, pesados e rápidos, atingindo o rosto magro de Lúcia. O vento uivava ao redor, jogando seus longos cabelos negros no ar, como se fossem uma rede flutuante, uma mecha de cada vez.Lúcia sentia como se estivesse sufocando. Por que Sílvio a odiava tanto?Tudo isso começou porque ela se recusou a tomar os remédios para segurar a gravidez, e depois lhe deu alguns tapas. E agora, ele havia levado seu pai.O celular no bolso do casaco piscava silenciosamente, com a tela mostrando uma chamada da mãe
Por ter visto acidentalmente o testamento que Lúcia havia feito, Abelardo não conseguiu dormir e pediu que um dos empregados o levasse para a varanda. O funcionário, apressado para terminar o expediente, provavelmente esqueceu de avisar os outros que ele estava lá fora.Abelardo ficou na varanda por várias horas, com a neve pesada caindo em seu rosto e ombros, enquanto o vento gelado o mantinha ainda mais alerta. Quando finalmente foi encontrado pelo empregado que o empurrou até lá, já estava quase completamente congelado, com o corpo adormecido e a pele ficando roxa.Lúcia, ao ver o pai de cabeça baixa, pensou que ele estivesse chateado e, com carinho, apertou a mão dele: — Pai, não estamos bravos com o senhor. Só estamos preocupados. O Natal está chegando e combinamos de passar juntos, lembra?Abelardo levantou a cabeça e, ao ver o olhar suplicante da filha, assentiu levemente. Enquanto isso, Sandra foi para a cozinha verificar como estava o jantar.Abelardo murmurou algumas palavr
Sílvio pegou o isqueiro e, com um clique seco, a chama amarela engoliu o cigarro entre seus lábios finos. Ele deu uma tragada profunda, e a fumaça fez uma viagem lenta por seus pulmões antes de ser exalada pela boca e pelo nariz. Sua expressão, fria e indiferente, ficou parcialmente envolta na fumaça que pairava ao redor de seu rosto esculpido.Com a mão larga e áspera, ele segurava o celular, olhando para a mensagem de Lúcia por um longo tempo. Era a primeira vez que ela admitia tê-lo acusado injustamente.A irritação que o consumia por ter sido acusado desapareceu em um instante, trazendo uma certa tranquilidade. No entanto, ele não respondeu à mensagem de Lúcia. Sabia que ela era do tipo que, quando se via em vantagem, tentava tirar mais proveito. Se ele fosse bom demais com ela, Lúcia não saberia parar.Sílvio apagou a tela do celular, terminou o cigarro e mergulhou de volta no trabalho. Ele era um viciado em trabalho, e sabia que investir tempo e esforço nele sempre traria resulta