Embora a energia tivesse sido cortada, o quarto não estava tão escuro quanto Giovana imaginava. A luz da lua, clara como a água, entrava inclinada pelas frestas da janela, iluminando o ambiente com sua suavidade. As cortinas balançavam levemente com o sopro da brisa, criando sombras irregulares pelo chão.Giovana, com o rosto escondido sob uma máscara que só deixava seus olhos à mostra, entrou no quarto. Abelardo estava de olhos fechados, claramente adormecido. Ela vestia luvas e caminhava lentamente em direção a ele. Já havia decidido que ele morreria pelas suas mãos, sem deixar vestígios.Para ela, Lúcia só conseguiu se casar com Sílvio por pura sorte, por ter nascido em uma família privilegiada. E a maior ligação entre Sílvio e Lúcia era Abelardo. Se ele morresse, Lúcia certamente romperia com Sílvio. O simples pensamento de Lúcia assistindo à morte de seu próprio pai, antes de encontrar seu próprio fim, fez Giovana sorrir por dentro.Com passos suaves para evitar qualquer ruído, Gi
O tom do Dr. Arthur não era de reprovação, mas sim de consolo:— Você perdeu essa oportunidade, Giovana. Tenho medo que encontrar outra chance seja cada vez mais difícil.— Cala essa boca, seu agourento! — Giovana respondeu irritada e desligou o telefone bruscamente.No quarto, Sandra havia chamado uma enfermeira para ajudar a colocar Abelardo de volta na cama. Ele soltava gemidos abafados, e Sandra, preocupada, perguntou:— Está com sede?Abelardo balançou a cabeça negativamente.— Está com fome, então?Outro aceno de negação. Frustrado, Abelardo jogou no chão tudo o que havia no prato de frutas. A enfermeira, assustada com a reação dele, deixou o quarto rapidamente.Sandra começou a recolher o que estava espalhado pelo chão:— Calma, por favor. Eu só saí por um momento para pegar água. Sei que você não quer que eu me afaste de você.— Ugh! Ugh! — Abelardo protestava, mas Sandra não conseguia entender nada do que ele dizia. Desesperada, ela foi até a enfermaria e voltou com papel e ca
Abelardo olhava para Lúcia com uma mistura de emoções nos olhos – ansiedade, confusão e desespero. Ele tentava falar, mas só conseguia emitir gemidos, gesticulando de forma agitada.Lúcia sabia que seu pai estava preocupado com ela. Mas será que ela conseguiria convencer Sílvio a deixá-lo voltar para casa para passar o Natal? Nem ela tinha certeza. Seu coração estava cheio de apreensão.Mesmo assim, Lúcia tentou acalmar sua própria inquietação. Segurou a mão de Abelardo com delicadeza e disse em um tom suave:— Pai, não se preocupe mais. O senhor já passou a vida inteira cuidando de tudo. Agora, deixa comigo. Hoje, de qualquer forma, vou levar o senhor de volta para a Mansão Baptista.Abelardo sorriu aliviado ao ouvir essas palavras.— Pode esperar pelas boas notícias, papai! — Lúcia sorriu, tentando transmitir confiança.Ele assentiu com gratidão, seus olhos brilhando com um misto de alívio e esperança.Depois de tranquilizar Abelardo, Lúcia saiu do quarto. Ela não ligou para Sílvio.
Lúcia apertou os lábios antes de perguntar:— E o Sílvio? Preciso falar com ele.— Ele está no escritório. — Respondeu Leopoldo.— Ótimo, vou falar com ele.Lúcia já se preparava para seguir em direção ao escritório quando Leopoldo a chamou, hesitante, com uma expressão que a fez franzir as sobrancelhas.— Leopoldo, quer dizer algo mais? — Ela perguntou, intrigada.— O presidente está de mau humor por causa de um projeto de investimento. Sra. Lúcia, cuidado com o que vai dizer. Se não for algo urgente, talvez seja melhor esperar ele se acalmar. — Leopoldo parecia genuinamente preocupado, e depois de uma pausa, acrescentou. — Se a senhora confiar em mim, posso passar o recado.Lúcia soltou um suspiro. Então, Sílvio estava mal-humorado. Isso complicava ainda mais a situação. Ela se perguntou se ele lhe daria alguma atenção ou se a trataria com frieza.Vendo a preocupação de Leopoldo, Lúcia sentiu-se grata. Mas o assunto era importante demais para ser deixado para depois, e por mais que c
Sílvio fechou os olhos, deslizando os dedos pelos fios longos e escuros do cabelo de Lúcia. O aroma suave dos cabelos dela invadiu seus sentidos, um perfume sutil e envolvente.Ele permaneceu assim por um bom tempo, inalando o cheiro, antes de abrir os olhos e deixar o olhar pousar na pele clara de Lúcia. O desejo começou a brilhar em seus olhos castanhos, que aos poucos se intensificavam.Marcas de beijos começaram a surgir no pescoço de Lúcia, suaves como uma garoa de primavera, frescas e delicadas, como penas roçando a pele.O corpo de Lúcia se retesava cada vez mais, enquanto as palavras do médico ecoavam em sua mente: “Nada de relações sexuais”.O médico havia sido enfático. Seu corpo estava exausto, e ainda havia uma criança em seu ventre, como uma bomba-relógio prestes a explodir.Será que Sílvio estava tentando matá-la mais rápido?Se fosse antes, ela aceitaria o destino sem questionar, sem sentir grandes emoções. Aceitaria tudo com calma. Mas agora, com seu pai finalmente acor
— Lúcia, você não confia em mim? — Sílvio semicerrava os olhos, soltando uma risada curta, carregada de sarcasmo.— Não tem jeito, a gente aprende com as experiências. Você muda de ideia muito fácil. Eu tenho todo o tempo do mundo, Sílvio. Você faz a ligação e começamos imediatamente."Faz a ligação e começamos imediatamente."Lúcia estava deixando ainda mais claro que estava usando o próprio corpo como moeda de troca, uma barganha descarada.Sílvio lembrou do último filho que ela havia perdido. Aquela criança também foi usada como ficha num jogo de negociações. Na época, ela fez uma lista de exigências, até contrato quis assinar, forçando-o a jurar que cumpriria tudo antes de aceitar engravidar. Mas não era obrigação dela ter o filho?No fim, ela conseguiu o que queria, mas o bebê se foi.Essas lembranças eram algo que Sílvio tentava evitar a todo custo. Ele não queria lembrar. Não queria nem pensar nisso. Mas Lúcia, tola, insistia em esfregar o passado na cara dele.O rosto de Sílvio
Sílvio ouviu aquelas palavras e seu rosto, antes sério, foi tomado por uma sombra escura. Os dedos, outrora relaxados ao lado do corpo, agora se curvavam lentamente, fechando-se em punhos."Não quero dever nada a você?" Eles eram marido e mulher, e mesmo assim ela falava como se não quisesse ser grata a ele. Além disso, ela já não devia o suficiente? Como poderia pagar tudo o que lhe devia?Ele havia feito tantas coisas por Lúcia, sempre em silêncio, sem que ela soubesse. Quando ela foi cercada por jornalistas na frente do Grupo Baptista, foi Sílvio quem pediu a Leopoldo para chamar a polícia e dispersar os repórteres. Quando soube que Lúcia havia ido ao Bairro das Árvores investigar a morte de seus pais, apesar de dizer que desejava que ela morresse, ele secretamente mandou Leopoldo segui-la e protegê-la.Quando ela sofria de insônia e sentia o peso das pressões, ele cancelou compromissos de trabalho para levá-la a Viana, tentando aliviar sua mente, buscando algum respiro para ela.
Sílvio disse que, mesmo se ela ficasse nua, ele nem a olharia. Ele a desprezava a esse ponto.Mas... Eles tinham um acordo, não tinham?— Esse foi o acordo que acabamos de fazer. Se você não quer me tocar, pode propor outro termo para compensar. — A voz de Lúcia estava calma, sem pressa. Ela já não tinha mais forças para se irritar.Ela, que um dia foi cheia de orgulho, cheia de dignidade, agora parecia uma porco-espinho que teve todos os espinhos arrancados. E quem tirou cada um deles foi Sílvio.Lúcia pensava que, no fim das contas, sua vida já estava com os dias contados. Se conseguisse passar por aquilo, logo viria a libertação. Esse pensamento trouxe um alívio momentâneo ao seu coração sufocado.— Lúcia, eu vou dizer mais uma vez: sai daqui! Se você ousar dizer mais uma palavra, eu garanto que aquele velho vai ficar preso no hospital para o resto da vida. Acredita em mim?Ela o encarou fixamente, piscando devagar, seus cílios tremendo levemente.Parece que ele realmente a odiava.