2. Voando

Valentina Carvalho

Eu acordei com uma dor latejante na cabeça, mal conseguindo abrir os olhos devido à intensa claridade que fazia minhas têmporas pulsarem. Tentei me situar no ambiente ao meu redor e percebi que estava em um quarto luxuoso, com uma cama dossel majestosa, cortinas negras e uma parede de vidro que levava a uma sacada com sofás e arcos. Era como se eu tivesse sido transportada para um palácio sombrio e desconhecido.

A confusão tomou conta de mim e a pergunta ecoou em minha mente: "Onde eu estou?". Lembrei-me vagamente das últimas horas, quando reservei o hotel e um homem misterioso segurava uma placa com o meu nome. Recordo-me de ter entrado no carro com ele e, pensei que ele tinha sido enviado pelo hotel, algum serviço de transfer. O próximo fragmento de memória que surgiu foi o homem borrifando algo em meu rosto, fazendo-me desmaiar.

O desespero tomou conta de mim ao perceber que estava presa naquele quarto. Corri até a porta e tentei abri-la, girando freneticamente o trinco, mas ela estava trancada. Meu coração acelerou e a sensação de pânico se intensificou. Lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto enquanto eu me perguntava como cheguei a esse pesadelo.

Senti-me impotente e vulnerável, sem ter ideia de quem poderia estar por trás disso ou qual era o propósito de me manter aprisionada. A angústia e a incerteza se misturaram, criando uma tempestade de emoções dentro de mim. 

Eu me encostei na porta, as lágrimas continuavam a escorrer pelo meu rosto. Levei as mãos ao rosto molhado, tentando conter o desespero que tomava conta de mim. Como eu havia chegado a esse lugar? Será que eu tinha caído em alguma armadilha cruel? Essas perguntas ecoavam em minha mente, aumentando ainda mais a minha angústia.

Decidi seguir até a sacada, em busca de uma possível saída. Talvez eu pudesse pular dali e procurar ajuda, talvez até mesmo ir direto para a polícia. Minha bolsa, contendo meu passaporte, estava comigo. Era irônico pensar que essa seria minha primeira viagem para fora do Brasil e eu me encontrava em uma situação tão desesperadora.

Ao chegar na sacada, percebi que a porta de vidro que dava acesso ao parapeito estava aberta. Um raio de esperança surgiu dentro de mim, alimentando a ideia de que talvez eu pudesse escapar dali. Mas quando olhei para baixo, meu coração afundou. A altura era assustadora demais.

— Droga, é alto demais - murmurei para mim mesma, sentindo um misto de frustração e medo. Eu sabia que pular dali seria um risco enorme, poderia até mesmo ser fatal. A sensação de impotência me envolveu novamente, fazendo com que eu me sentisse ainda mais aprisionada.

Estou determinada a fugir do quarto pela sacada. Amarro um lençol bem firme em uma das extremidades da sacada e jogo o lençol, que começa a balançar de um lado para o outro com o vento. Me preparo para descer pela corda improvisada, mas quando coloco o pé no parapeito, percebo que estou descalça e meu pé escorrega, deixando-me pendurada e balançando de um lado para o outro.

— Merda, eu vou cair daqui e me esborrachar no chão.

Desesperada, tento me segurar e solto alguns gritos. A situação fica ainda mais complicada quando um pássaro pousa no parapeito da sacada e me observa atentamente. O que eu não esperava era que ele fosse se aliviar e seu cocô caísse bem na minha cabeça!

— Ah, não, seu pássaro, filho da mãe, eu não acredito que você fez isso.

O desespero toma conta de mim enquanto tento pensar rápido para sair dessa situação. Estou a vários metros do chão e a ideia de cair me aterroriza. Segurando firmemente no lençol, tento subir novamente, mas meus braços pequenos e finos mal conseguem aguentar o meu peso. Preciso encontrar uma solução, e rápido.

Decido que não estou em um filme de ação, mas isso não me impede de tentar algo arriscado. Com coragem, decidi me jogar no quarto de baixo, na esperança de que a porta esteja aberta e eu consiga escapar dessa situação.

— Ah, meu Deus, me ajude a fugir desse lugar - sussurro em desespero, rezando para que meu plano idiota dê certo e eu consiga sair dessa situação desconhecida.

Com as pernas enroladas no lençol, tomo uma grande inspiração e me lanço no ar. O tempo parece passar em câmera lenta e meu coração dispara e sinto um misto de medo e empolgação, enquanto tento descer.

Faltava pouco para eu chegar próximo ao quarto de baixo, quando o lençol que eu achava que tinha prendido fortemente começou a se soltar. O tecido escorregadio fez com que minha jornada se tornasse ainda mais rápida, meu corpo descendo centímetros a cada segundo, deixando-me pendurada entre o quarto em que estava e o debaixo. O lençol não iria durar muito tempo e eu sabia que tinha que ser ágil, ou... eu não queria nem pensar no que poderia acontecer.

— Quando eu disse que queria morrer ontem, eu estava brincando, hein, era tudo brincadeira, eu juro.

Enquanto tento me segurar desesperadamente, flashes do dia anterior invadem minha mente quando ela havia dito que sua vida estava acabada e que morrer seria a única solução para os seus problemas.

Logo a imagem do meu noivo com a prima dele, tomando banho juntos no apartamento que seria a nossa casa, me atinge como um soco no estômago. Eu nunca esperava que tudo fosse acontecer tão rápido. A dor da traição e a sensação de ter meu coração partido às vésperas do casamento me fez desejar a morte, mas agora, tudo o que eu queria era sair dessa situação e dar o troco naquele imbecil.

A adrenalina corre em minhas veias enquanto meu corpo balança no ar, lutando para se manter firme. Eu me agarro ao lençol com todas as forças que tenho, sentindo meus braços doerem e minha respiração acelerar. É uma mistura de medo, raiva e determinação que me impulsiona a continuar lutando.

Com o tempo se esgotando, vejo a sacada aberta no quarto de baixo. É a minha única chance de escapar. Reúno toda a coragem que tenho e me impulsiono para frente.

O ar sopra em meu rosto enquanto eu voou, sentindo uma mistura de liberdade e pavor. Por um instante, sinto como se estivesse voando, mas a realidade logo me atinge, o lençol se solta e eu grito como louca e fecho meus olhos, esperando o baque com o chão.

De repente, sinto um aperto ao redor da minha cintura, como se estivesse nos braços de alguém forte. Sinto até mesmo um perfume bom e másculo que me faz pensar que estou sonhando. Abro um olho de cada vez, esperando ver o chão, mas em vez disso, vejo um par de olhos preocupados me encarando.

— Você?

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