A voz era familiar. O tom, inconfundível.Era Felipe.Juliana encerrou a ligação sem esboçar reação. Em seguida, abriu a caixa de entrada do e-mail no celular.Na pasta de mensagens recentes, encontrou um e-mail dele.Abriu.No topo, uma foto 3x4, sem nenhum retoque. Ela passou os olhos rapidamente pelo texto e logo entendeu do que se tratava.— Ju, o que é isso? — Perguntou Maia, curiosa.Juliana não fez cerimônia. Estendeu o celular para ela com naturalidade.— Provavelmente são os dados das pessoas envolvidas na confusão.Mas... Como o Felipe ficou sabendo?Essa dúvida pairava no ar, silenciosa, entre as três. Até que a chegada repentina de Joaquim cortou a tensão no ambiente.— Lari! Você tá bem? Se machucou? E a Carol?Joaquim entrou com a camisa amarrotada, o rosto sério, marcado por uma preocupação visível.Segurou Larissa pelos ombros com as duas mãos e olhou ao redor, apressado, até que seus olhos encontraram Juliana. Na mesma hora, sua expressão ficou ainda mais dura.— O que
As crianças de hoje têm uma memória surpreendente.Com apenas três ou quatro anos, já conseguem guardar lembranças marcantes.Carolina tinha cinco. Por fora, era só uma menininha doce e animada… Mas por dentro, carregava muito mais do que deixava transparecer.Assim que chegaram ao elevador, ela se remexeu nos braços de Juliana e pediu baixinho:— Titia, me coloca no chão... Estou pesada.Juliana respondeu, sorrindo, que ela não pesava nada, mas respeitou o pedido e a colocou no chão com delicadeza.As duas seguiram de mãos dadas, Carolina no meio, com Juliana de um lado e Maia do outro.A menina caminhava de cabeça baixa. A tristeza estampada no rostinho era impossível de esconder.Ao saírem do elevador, Carolina levantou os olhos, hesitante e perguntou:— Titia… O papai e a mamãe brigaram por minha causa?Uma pergunta como essa só podia significar uma coisa: Larissa e Joaquim deviam brigar com frequência quando moravam fora.Juliana e Maia trocaram um olhar rápido. Em seguida, as dua
Carolina tomou dois goles seguidos de suco de laranja, nos cantinhos da boca, ainda tinha resquícios de ketchup vermelho.Ao ouvir a pergunta de Juliana, ela parou um instante, pensativa, antes de responder:— O papai é muito bom comigo.Juliana e Maia trocaram um olhar. Por um momento, acharam que talvez tivessem exagerado nas suspeitas.Mas então Carolina continuou:— Tudo o que eu quero, o papai compra. Mas ele nunca me abraça nem me dá beijo. A mamãe disse que é porque ele tá sempre muito cansado.Não demonstrar carinho de forma espontânea...Isso, sim, era preocupante.Havia algo errado ali.O que exatamente, Juliana ainda não sabia dizer. Mas sentia que não era apenas cansaço.Ela olhou o horário no celular, já estava na hora de voltar. Pegou a mãozinha de Carolina e as três seguiram de volta para o hotel.Quando chegaram, Larissa e Joaquim já haviam encerrado a briga.Ele estava de pé, próximo à janela, fumando em silêncio.Larissa, sentada no sofá, tentava conter o choro, os ol
Joaquim era um covarde. Um frouxo completo.E, para Maia, não existia tipo de homem mais desprezível que esse.Se um sujeito não consegue nem proteger a própria esposa e filha... Vai proteger quem, então?O desprezo por ele era geral e absoluto.Justo quando Larissa se preparava pra discar o 190, o celular dela começou a tocar.— Alô? A Srta. Larissa? Aqui é da Polícia da Cidade A. O Sr. Rodrigues foi preso por suspeita de causar distúrbios públicos...“Sr. Rodrigues?”Larissa ficou sem reação. Que Sr. Rodrigues era esse? Joaquim estava ali, na frente dela. Existia outro?Só Juliana entendeu na hora.Assim que a ligação terminou, ela disse, com calma:— Foi o Felipe.Aquele nome... Joaquim conhecia bem. Talvez até bem demais.Nas últimas semanas, a casa estava virada do avesso. Raul e Sarah brigavam dia sim, dia também, sempre aos gritos.E o nome “Felipe” aparecia com uma frequência assustadora.Sarah insistia que Felipe era filho bastardo de Raul, fruto de um caso antigo fora do casa
Juliana achava que, quando Isaac disse que já a tinha visto antes, ele estivesse se referindo à internet.Afinal, toda aquela confusão entre ela e Viviane tinha viralizado. Foi um verdadeiro furacão nas redes sociais e ficou entre os assuntos mais comentados por quase duas semanas. Não seria nada surpreendente se Isaac tivesse esbarrado em alguma coisa.Isaac, então, disse:— Onde eu te vi... Não posso contar.Se revelasse, conhecendo o jeito do Bruno, sabia que os próximos dias seriam um inferno.Juliana franziu a testa, confusa.— Não pode contar?Era algo tão constrangedor assim?Mas, como Isaac não quis entrar em detalhes, Juliana também não insistiu. O principal motivo de sua visita era saber sobre Felipe. Como já tinha conseguido as informações que precisava, preferiu não atrapalhar mais o reencontro entre pai e filho.Ao sair do escritório, para sua surpresa, viu que Hildo ainda estava do lado de fora, esperando.— Sr. Hildo. — Chamou ela.Ele se virou ao ouvi-la.Tinha um olhar
Ele estava claramente defendendo a Larissa.A relação entre os dois deixava Juliana com uma sensação esquisita, havia algo ali, algo sutil, difícil de explicar.Mas esse tipo de coisa não dava para sair falando por aí.Fazer isso poderia acabar prejudicando a Larissa.— Juliana, isso é um assunto de família. Não diz respeito a uma estranha como você!De qualquer forma, ela não tinha o menor direito de se meter.Juliana, no entanto, não se abalou nem um pouco. Fez um som de desprezo com a boca e retrucou:— Olha só, eu nem falei nada... Para que essa defensiva toda? O que foi, você mesmo se sente um covarde?— Juliana! — Gritou ele.— Sr. Rodrigues, aqui é uma delegacia. Por favor, mantenha a compostura. — Interrompeu um dos policiais.Juliana era praticamente a queridinha de todos ali.E Joaquim? Ele teria coragem de levantar a voz com a protegida da casa?Se fizesse isso, o pessoal estaria pronto para dar o troco.A cara de Joaquim ficou ainda pior, tão fechada que parecia prestes a p
Depois do grito de Joaquim, o saguão inteiro mergulhou num silêncio sepulcral.O que foi que ele acabou de dizer?Que Larissa só queria o divórcio pra correr atrás... De outro homem?Larissa arregalou os olhos, incrédula.— Homem?Joaquim era seu primeiro amor, desde a adolescência.Em mais de vinte anos, ele tinha sido o único homem da sua vida.E agora... Agora ele vinha insinuar que ela teve outro?Era o cúmulo da humilhação.Um tapa seco cortou o ar, a mão de Larissa acertou em cheio o rosto de Joaquim.O golpe não só virou o rosto dele como também o trouxe de volta à realidade.Quando viu as lágrimas escorrendo dos olhos da esposa, a culpa e o desespero bateram de uma vez.Joaquim se desvencilhou dos policiais que ainda o seguravam e esticou os braços, querendo abraçá-la.Mas Larissa deu dois passos pra trás.A recusa dela fez o gesto dele morrer no ar, vazio.— Lari, fui eu que falei besteira! Eu... Eu não quis dizer isso, me deixa explicar...Carolina não entendia exatamente o q
Cidade A, Hospital Aliança.— Saiam da frente! Com licença! Abram caminho!— Corram! Chamem o doutor, agora!Médicos e enfermeiros avançavam às pressas pelo corredor, empurrando uma maca direto para sala de cirurgia.Larissa vinha logo atrás, cambaleando, amparada por Juliana, que a segurava pelos ombros, tentando conter o desespero.— Calma… A Carol vai ficar bem. Ela vai sair dessa, Larissa…Tudo tinha acontecido apenas quinze minutos antes.Carolina, tomada pelo desespero, correu pra fora da delegacia… E foi atropelada.Aquela menininha tão cheia de vida agora estava ali, imóvel, olhos fechados, o corpinho coberto de sangue.Era impossível olhar para ela e lembrar da criança alegre e sorridente de poucas horas atrás.A tragédia veio como um raio. Em um segundo, tudo virou do avesso.— Carol… Meu amor… Por favor, fica bem… — Larissa mal conseguia formar palavras. A voz falhava entre os soluços.Seus olhos estavam tão inchados de tanto chorar que mal conseguiam se manter abertos.Do l