O ar era pesado, quase irreal, e cada respiração parecia trazer consigo um fluxo de energia desconhecida. Daniel e Clara estavam em pé, tentando processar o que viam ao redor. Tudo era ao mesmo tempo familiar e alienígena. As florestas ao longe tinham cores que não existiam no espectro da Terra, e o horizonte se curvava de uma maneira impossível, como se o próprio espaço fosse maleável.
— Isso… isso não pode ser real — disse Clara, a voz trêmula. Ela olhava para o céu púrpura com uma mistura de assombro e medo. — É real — respondeu Daniel, ainda fascinado pelo que seus olhos captavam. — Estamos em outro universo. Além do horizonte de eventos. Não é uma simulação, não é uma visão. Estamos aqui. Clara se levantou com a ajuda de Daniel e olhou ao redor. O ambiente parecia deserto, mas havia algo perturbador em sua quietude, uma sensação de que o mundo à sua volta estava apenas adormecido, esperando algo para despertar. — Precisamos entender como isso aconteceu — ela disse, sua mente já voltando ao modo científico. — A energia que nos puxou, a forma como fomos transportados… Isso não era parte do experimento original. Daniel concordou, mas no fundo de sua mente algo o incomodava. Ele se lembrava claramente do sinal que haviam captado antes da viagem. Aquele padrão rítmico, quase como uma pulsação, parecia vir de uma inteligência. E agora que estavam aqui, a sensação de serem observados era mais forte do que nunca. — Você sente isso? — perguntou ele, franzindo o cenho. — O quê? — Clara olhou para ele, confusa. — Como se… algo estivesse nos observando. Como se houvesse uma presença aqui, esperando por nós. Clara o encarou por um longo momento, e então seus olhos se arregalaram levemente, como se ela também estivesse começando a perceber. Antes que pudessem discutir mais, um som grave e reverberante cortou o ar ao longe. Parecia um chamado, como o eco de algo vasto e profundo. — O que foi isso? — sussurrou Clara. Daniel virou-se para a direção do som. Havia uma estrutura no horizonte que, de onde estavam, parecia uma torre imensa, construída com materiais que brilhavam em tons de azul e prata. A torre se erguia contra o céu púrpura, sua forma oscilando como um miragem. Mas o som claramente vinha dali. — Temos que ir até lá — disse Daniel, já decidido. — O quê? Você não sabe o que está lá! Pode ser perigoso! — Clara o agarrou pelo braço, sua voz desesperada. — Não sabemos nada sobre esse lugar! — Exatamente por isso precisamos descobrir. — Ele olhou nos olhos dela com uma determinação inabalável. — Esse som, Clara, não é natural. Algo aqui está nos chamando. Clara hesitou, mas finalmente cedeu. Eles sabiam que ficar no mesmo lugar não era uma opção. Em pouco tempo, começaram a caminhar em direção à torre, seguindo o som grave que parecia ficar mais intenso a cada passo. A paisagem ao redor deles era surreal, com montanhas flutuando ao longe e rios de luz líquida correndo sob seus pés. Daniel sentia que o próprio conceito de gravidade era diferente ali; às vezes, seus passos pareciam mais leves, quase como se pudesse flutuar. A caminhada foi silenciosa, exceto pelo som persistente da torre, que ressoava nas profundezas de suas mentes. Quando se aproximaram, viram que a estrutura era ainda mais imponente de perto. Suas paredes eram feitas de um material que parecia vivo, pulsando em sincronia com o som. Havia uma porta aberta na base, convidativa e ao mesmo tempo sinistra. — Você tem certeza disso? — Clara perguntou, seu corpo tenso. Daniel não respondeu. Em seu âmago, ele sabia que não tinha escolha. Algo naquela torre tinha as respostas que procuravam. Eles entraram. O interior da torre era vasto, muito maior do que o exterior sugeria. A geometria do espaço parecia desafiada ali, com corredores que se estendiam infinitamente, luzes que flutuavam no ar e sombras que pareciam ter vida própria. À medida que caminhavam mais fundo, o som que antes era um eco distante tornou-se uma batida regular, como um coração pulsante. No centro da sala principal, uma esfera gigantesca flutuava, feita de um material translúcido que emitia luzes em padrões complexos. Daniel sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Ele reconhecia aquilo. — Esse é o sinal — murmurou ele, seus olhos fixos na esfera. — É a fonte do sinal que captamos. Clara se aproximou cautelosamente, suas mãos trêmulas. De repente, a esfera começou a brilhar mais intensamente, e o som ficou ensurdecedor. O chão sob seus pés tremeu, e a realidade ao redor deles pareceu distorcer. — Daniel! — gritou Clara, mas já era tarde. A esfera se expandiu em um flash de luz, e de dentro dela, uma figura começou a emergir. Não era humana, mas sua forma era familiar, uma silhueta que lembrava algo de suas memórias mais antigas. O que quer que fosse, havia inteligência ali, algo que os observava desde o momento em que cruzaram para aquele universo. — Vocês... vieram. — A voz da figura não era audível de forma convencional. Ela reverberava diretamente em suas mentes, profunda e antiga. — Estávamos esperando por vocês. Daniel e Clara ficaram paralisados, incapazes de mover um músculo. Eles tinham atravessado o limiar do conhecimento, e agora estavam face a face com algo muito além do que jamais imaginaram. E, por um instante, Daniel percebeu a verdade aterradora: eles não tinham sido puxados por acidente. Tudo isso, cada passo, cada decisão, havia sido planejado. Eles haviam sido convocados.O silêncio que seguiu a declaração da figura era esmagador. Daniel e Clara permaneciam imóveis, seus corações batendo com força no peito. A figura à sua frente era indistinta, envolta em um brilho que desafiava qualquer definição, como se fosse composta de pura energia. Seus contornos flutuavam entre formas humanas e alienígenas, mudando constantemente, mas os olhos, ou o que pareciam ser olhos, permaneciam fixos neles, brilhando com uma inteligência ancestral.— Vocês... nos esperavam? — Clara conseguiu balbuciar, sua voz tremendo. — Como isso é possível?A figura inclinou-se levemente em sua direção, e a sensação de ser observada aumentou, como se milhares de mentes estivessem focadas neles ao mesmo tempo.— Vocês dois carregam a marca do buscador — disse a figura, suas palavras ecoando não só no ar, mas nas profundezas da mente de Daniel e Clara. — Desde o momento em que olharam para o horizonte de eventos, desde que decifraram os sinais... estavam destinados a chegar aqui. Não foi
O laboratório estava silencioso, exceto pelo som incessante das teclas enquanto Daniel e Clara digitavam freneticamente, analisando os dados que haviam recebido após seu retorno. As flutuações de energia que eles captaram antes e depois da jornada para o universo paralelo agora faziam sentido de uma maneira que nunca imaginaram. Era como se cada pulso, cada variação, fosse parte de uma linguagem codificada, uma mensagem enviada através de dimensões.— Está ficando mais forte — disse Clara, seus olhos fixos na tela. — As flutuações estão aumentando, como se algo estivesse pressionando essa barreira entre os universos.Daniel assentiu, concentrado. Ele podia sentir a tensão no ar, o tempo correndo contra eles. Embora estivessem de volta à Terra, ele não conseguia afastar a sensação de que ainda estavam sendo observados, como se a presença que sentiram na torre tivesse atravessado junto com eles.— Temos que localizar a fonte dessas flutuações — ele disse, com a voz firme. — Não podemos
O vento gelado da Sibéria assobiava em torno de Daniel e Clara enquanto eles trabalhavam freneticamente. Cada segundo parecia uma eternidade, enquanto o colapso iminente entre os universos se aproximava. Os detectores estavam em alerta máximo, e o campo de energia ao redor deles oscilava violentamente, quase como se a própria realidade estivesse sendo rasgada.— A instabilidade está piorando! — gritou Clara, ajustando os parâmetros do estabilizador que haviam trazido. — Se não conseguirmos desacelerar essas flutuações agora, não vamos ter chance de controlar o colapso!Daniel, suando sob o frio intenso, estava tentando ajustar o fluxo de energia para estabilizar a barreira. Mas algo parecia errado. A sombra que os confrontara antes havia falado como se o caos fosse inevitável, como se houvesse algo além do controle deles. Ele olhou para Clara, seus olhos carregando a dúvida que pairava sobre sua mente.— E se não for suficiente? — Daniel murmurou, mais para si mesmo do que para Clara.
O silêncio após o tumulto era quase ensurdecedor. O frio cortante da Sibéria, por um breve momento, pareceu perder a intensidade. Daniel e Clara permaneciam imóveis, encarando a fenda contida, enquanto tentavam recuperar o fôlego. O peso da última hora ainda os pressionava.Daniel finalmente quebrou o silêncio.— Precisamos encontrar o Guardião. Ele é a nossa única chance de selar isso de vez.Clara assentiu, mas o cansaço e a incerteza estavam claros no rosto dela. O Guardião, a enigmática figura que lhes dera pistas fragmentadas antes, parecia estar em todos os lugares e lugar nenhum ao mesmo tempo. Ninguém sabia ao certo se ele era um aliado ou apenas uma entidade indiferente, observando o caos se desenrolar.— Mas como? — Clara perguntou, seus olhos fixos em Daniel. — Ele nos encontrou da última vez. Como vamos achá-lo agora?Daniel hesitou. A verdade é que ele não sabia a resposta. Mas o pouco que tinham aprendido sobre o Guardião sugeria que ele poderia estar mais perto do que i
Clara viu Daniel dar o passo final em direção à fenda, e seu coração parecia parar. O caos do outro lado pulsava, como se a própria escuridão o aguardasse, ansiosa para envolvê-lo. Ela gritou seu nome, mas o som foi abafado pela energia vibrante ao redor deles. O Guardião observava em silêncio, como um espectador distante e implacável do destino que se desenrolava.O tempo parecia desacelerar. Clara sentiu as lágrimas escorrerem pelo rosto, enquanto as mãos de Daniel tremiam levemente, a poucos centímetros da ruptura. O brilho pulsante da fenda lançava sombras distorcidas sobre o rosto dele, e, por um momento, ele olhou para trás, seus olhos encontrando os de Clara.— Não... — ela sussurrou, incapaz de aceitar o que estava prestes a acontecer.Mas o destino estava selado.Assim que a ponta dos dedos de Daniel tocou a energia da fenda, o mundo ao redor deles explodiu em uma onda de luz e som. Clara foi lançada ao chão, o impacto da energia a fazendo perder o fôlego. A fenda brilhava co
A noite na Sibéria caía silenciosa e mortal, enquanto Clara permanecia estática no mesmo lugar onde a fenda havia sido selada. O frio era implacável, mas ela mal o sentia. Sua mente estava em um redemoinho de pensamentos, dilacerada pelo sacrifício de Daniel. A ruptura havia desaparecido, mas o vazio que ele deixara era profundo demais para ser ignorado.Com os olhos fixos no horizonte, Clara lutava para entender o que viria a seguir. O Guardião havia partido, e com ele as respostas que ela tanto buscava. O caos parecia contido, mas a presença sombria e inquietante de tudo o que havia acontecido ainda pairava no ar. E agora, ela estava sozinha.Porém, conforme o vento uivava ao redor, algo começou a mudar. Primeiro, foi uma leve sensação de calor, uma presença que parecia contradizer o frio cortante. Depois, veio o sussurro — suave, quase inaudível, mas inconfundível.— Clara...Ela se virou abruptamente, seu coração disparando. A voz... era familiar demais para ser ignorada.— Daniel
O caos ao redor de Clara e Daniel começou a se contrair, como se estivesse sendo pressionado por forças invisíveis. A escuridão líquida pulsava, cada vez mais densa. Clara sentia a opressão crescente, mas, ao mesmo tempo, a determinação dentro dela não vacilava.— Precisamos encontrar o Guardião novamente — Clara disse, sua voz cortando o silêncio. — Ele sabe mais do que está dizendo. Há uma saída, Daniel, eu sei disso.Daniel assentiu lentamente, mas sua expressão ainda estava sombria. Ele não era mais o mesmo. O caos havia começado a corroê-lo, transformando-o de maneiras que Clara não conseguia entender completamente. Mesmo assim, algo dentro dele parecia resistir.— O Guardião não dá respostas fáceis — Daniel murmurou. — Ele joga com o equilíbrio, não com nossas esperanças. Ele nunca quis que nós vencessemos, apenas que retardássemos o inevitável.Clara balançou a cabeça. Ela se recusava a aceitar a ideia de que tudo o que fizeram até ali fosse em vão.— E se o caos não for o inev
Quando a luz se dissipou, Clara e Daniel se encontraram em um lugar que desafiava qualquer lógica. O chão não era chão, o céu não era céu. Tudo ao redor era uma mistura de formas em constante transformação: montanhas que surgiam e desapareciam, rios de luz e sombra que se entrelaçavam como serpentes, e criaturas sem rosto que flutuavam, observando-os silenciosamente.O caos pulsava ao redor deles como um organismo vivo, respirando, esperando, consciente de sua presença. Clara agarrou a mão de Daniel com força, seus olhos vasculhando aquele mundo imprevisível.— Isso é... — ela começou, mas não encontrou as palavras certas para descrever o que via.— O centro do caos — Daniel completou, sua voz baixa e pesada. — É daqui que tudo emana. E é daqui que nós podemos tentar controlá-lo.Os dois sabiam que não havia tempo a perder. Cada segundo ali era um risco, pois o caos tentaria corrompê-los, assim como havia feito com Daniel antes. Eles não poderiam perder o foco.— Temos que encontrar o