Capítulo 2: O Limiar

As luzes do laboratório piscavam intermitentemente, refletindo o estado caótico da mente de Daniel. Ele mal havia dormido nas últimas quarenta e oito horas, obcecado pela ideia de que o buraco negro SG- cento e três estava escondendo algo que os cálculos e modelos não conseguiam prever. Era como se todo o seu treinamento científico fosse insuficiente para lidar com o que estava diante dele.

O buraco negro, que antes era uma ameaça distante e misteriosa, agora parecia um convite tentador. As flutuações eletromagnéticas, os sinais enigmáticos que ele captara, ainda ressoavam em sua cabeça. Mas, estranhamente, não havia pânico em seu coração. Havia uma curiosidade insaciável, quase como se aquilo estivesse destinado a acontecer.

Naquela manhã, ele se sentou com Clara, sua parceira de pesquisa e a única pessoa que parecia compartilhar, ao menos em parte, de seu entusiasmo. Clara, uma jovem cosmóloga com uma mente afiada, estava mais cautelosa. Enquanto Daniel via as evidências como um caminho para algo grandioso, Clara estava preocupada com o que poderia dar errado.

— Você está realmente disposto a seguir adiante com isso? — perguntou ela, sua voz suave, mas carregada de preocupação. — Estamos falando de uma jornada que, honestamente, não temos como prever onde vai parar.

Daniel sabia que ela tinha razão. Ele sabia que o que planejavam era arriscado, talvez até suicida. Mas algo dentro dele queimava com uma intensidade inegável.

— Clara, estamos diante de uma descoberta sem precedentes. Tudo o que estudamos, todas as nossas teorias sobre o universo, sobre buracos negros e multiversos, podem estar prestes a ser comprovadas. Não podemos ignorar isso.

Clara o encarou por um longo momento. Os olhos castanhos dela eram profundos, como se estivessem tentando enxergar a lógica por trás daquela loucura. Finalmente, ela suspirou.

— Certo. Mas faremos isso do jeito certo. Precauções máximas. E se houver o menor sinal de que isso está saindo de controle, você me promete que voltaremos.

Daniel assentiu, mas no fundo sabia que não haveria volta.

Naquela mesma noite, os dois se prepararam. Eles estavam a poucos metros da maior façanha científica de suas vidas. O telescópio, programado para capturar e ampliar as flutuações, estava ajustado. Porém, ao invés de apenas observar, Daniel propôs algo radical: usar uma tecnologia experimental que simulava uma interação direta com o buraco negro. Se ele estivesse certo, essa interação poderia abrir um canal para além do horizonte de eventos.

Quando Clara ativou os controles, uma vibração percorreu o ar. Não era apenas uma sensação física; havia algo tangível, como se o próprio espaço ao redor começasse a se distorcer. As luzes no laboratório escureceram por um breve segundo, e então... silêncio.

A tela do monitor mostrou algo que eles nunca esperavam ver. Não era apenas uma imagem de um buraco negro; era um vislumbre de outro lugar. A imagem tremulava, oscilava, mas o que estava do outro lado era inconfundível: uma paisagem alienígena, semelhante à Terra, mas distorcida, onde o céu era púrpura e os continentes flutuavam como ilhas no espaço vazio.

Clara respirou fundo, seus olhos arregalados.

— Isso é... outro universo?

Antes que Daniel pudesse responder, algo aconteceu. O campo de energia que eles haviam gerado ao redor do experimento começou a puxá-los. A sensação era incontrolável, como se o próprio tecido da realidade estivesse se dobrando. Eles tentaram desligar os controles, mas já era tarde. O buraco negro os puxava para dentro.

Em um piscar de olhos, o laboratório desapareceu.

Daniel e Clara sentiram seus corpos flutuando, girando no vácuo. A realidade ao redor se desfazia, fragmentando-se em pedaços distorcidos de luz e sombras. Não havia som, exceto o pulsar rítmico que Daniel reconheceu dos sinais captados. Era como se o próprio buraco negro estivesse respirando, os conduzindo para além de tudo o que conheciam.

Então, em um clarão de luz, tudo se acalmou.

Eles estavam de pé, em um lugar desconhecido. O céu púrpura que haviam visto antes agora se estendia acima deles, repleto de estrelas que Daniel não conseguia reconhecer. O ar era denso, quase vibrante, como se estivesse carregado de uma energia que atravessava seus corpos. Ao longe, estranhas estruturas flutuavam, cidades inteiras suspensas no vazio.

Clara caiu de joelhos, tentando respirar. Daniel a ajudou a se levantar, mas sua mente estava fixada em uma única questão:

Onde exatamente estavam?

Este não era apenas um universo paralelo. Era algo muito além. E, mais perturbador, sentia que estavam sendo observados.

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