Logo Rodrigo percebeu que a resposta era um sonoro “não”.— A sua expressão é a mesma de quando te conheci no hospital. — Sara apontou para a foto que segurava. — Já éramos namorados?Olhou para foto com atenção. Era do tempo do colégio, ele vestia o uniforme do time de basquete, na face uma expressão irritada voltada para ela, que tinha os braços ao redor do pescoço dele, estava vestida como agora e sorria para ele.— Não. Começamos o namoro muito tempo depois do colegial.— Mesmo? — Sara olhou intrigada para o verso da foto. — A senhora Montenegro já estava apaixonada por você. Pelo menos é o que parece. — Estendeu a foto.— Senhora Montenegro? — Rodrigo pegou a foto, mas não tirou os olhos de Sara.— É que todos me chamam de senhora Montenegro, mas não me sinto senhora e tão pouco Montenegro. — Deu de ombros. — Percebi que somos diferentes, então prefiro pensar na pessoa que esqueci como senhora Montenegro, enquanto eu sou somente Sara.A teoria de Karen que Sara estava fingindo co
Andava temerosa por uma estrada de terra, os pés descalços afundavam a cada passo tornando o caminhar mais difícil. A camisola de seda branca era fina demais e o frio naquele lugar era cortante, se abraçava com força na esperança de manter o corpo aquecido.O local não tinha qualquer tipo de iluminação e o manto da noite, sem lua ou estrelas, deixava o aspecto ainda mais sombrio. Nas calçadas as casas pareciam abandonadas, as árvores e a grama estavam secas como se naquele lugar não chovesse a um bom tempo. Estranhamente sentia que conhecia o lugar e, por isso, continuava a caminhar sem rumo.— Por aqui, Sara.Do nada, teve o braço puxado por uma versão juvenil de si mesma, vestindo uniforme escolar, até uma construção que reconheceu se tratar da escola estadual de Cezário. Pega de surpresa, só se soltou de sua cópia quando já se encontrava dentro do colégio vazio, encontrando somente várias portas fechadas em um longo corredor. Observou a sua cópia tentar, em vão, abrir uma das porta
Passada algumas horas, o pesadelo aterrorizante permanecia na mente de Sara. Sentia que a mulher de vermelho continuava por perto, observando-a, esperando para pegá-la, perturbando-a como uma assombração.O ataque, a angústia sentida no sonho, rodava em sua mente como um filme, repetindo-se a cada instante de silêncio. E, sozinha no quarto - e até mesmo no restante do apartamento -, silêncio era sua amiga íntima. A única, lamentou ao desistir de trocar os canais e desligar o televisor antes de largar o controle remoto na cama.Respirou fundo e se levantou. Precisava conversar com alguém, colocar em palavras sua aflição e acabar com a impressão maluca e desagradável deixada pelo pesadelo.Teve vontade de contar para Rodrigo, e só não o fez por ele estar de saída para o trabalho. Já era incomodo imaginar que ele se atrasou ao se preocupar com ela.Entrou na cozinha e aproximou-se de Marta. A jovem estava concentrada em seu serviço, preparando algo com um cheiro maravilhoso.— Marta...S
Rodrigo chegou ao apartamento furioso, com Sara por sair sem avisar, com a empregada por não perceber a saída da patroa e consigo por não seguir o instinto de ficar em casa, ou, pelo menos, perguntar o que Sara sonhou a ponto de deixa-la assustada.No trajeto até sua casa telefonou para Tatiana. Teve esperança de que a madrinha de sua esposa soubesse de seu paradeiro, mas só conseguiu dor no ouvido com os berros ofensivos da médica.Assim que abriu a porta Marta o encarou com evidente espanto e medo. Rodrigo, além de não reparar no estado da empregada, antes que ela pudesse dizer uma só palavra a agarrou pelos braços perguntando aflito:— O que Sara disse ou fez antes de sair? Porque não percebeu nada?Marta o fitou aterrorizada com a inesperada reação do patrão. Nunca o vira tão irado. Em realidade, pouco o via desde sua contratação, agora o homem entrou no apartamento e descarregou perguntas como se fosse um policial e ela uma criminosa. Para piorar sua situação, ele apertava seus b
Ao chegar no hospital particular Santana, Sara desceu do táxi e olhou maravilhada para o grande prédio antes de passar pelas portas automáticas. Desde pequena, graças a sua mãe, cirurgiã chefe do Hospital de Cezário, sempre teve fascinação por hospitais. Cresceu sonhando seguir os passos da mãe e, no futuro, trabalharem lado a lado.Segurou a vontade de chorar ao dar-se conta de que a sua mãe já não vivia e, no lugar de ocupar um cargo num hospital, jogou anos de estudo no lixo após se casar. Agora, sem as memórias do que estudou, estava longe de tornar realidade o seu sonho de ser médica.Inesperadamente insegura, foi até o balcão de atendimento do hospital. A atendente, uma mulher loira de olhos castanhos, falava ao telefone e nem mesmo a olhou quando se aproximou e colocou ambas as mãos no balcão.— Boa tarde, meu nome é Sara Almeida. Preciso falar com a diretora do hospital, a doutora Tatiana Santana — informou assim que a mulher desligou o telefone e a mirou de cima a baixo com u
Seguindo as indicações de Suzana, Sara saiu do hospital e foi engolfada pelas ruas movimentadas, observando tudo com fascinação e assombro.Em Cezário suas caminhadas eram tranquilas, com paradas para cumprimentar alguém, fofocar sobre algo, se perder nos próprios pensamentos e apreciar a paisagem natural. Com exceção dos dias de calor, em que iam praticamente na cidade vizinha para nadar no lago, ou as excursões escolares, rotina era a mesma. E era impossível o script sair diferente em uma cidade de pouco mais que mil habitantes e poucas opções de diversão.Foi colocar o pé na calçada fora dos portões do hospital, para Sara perceber o quanto a capital era imensamente diferente. Todos andavam apressados, alguns tinham os olhos fixos em telas de celular, e ninguém parecia interessado no que os cercava. E nem havia muito a apreciar além das construções. Eram bonitas, deformas, tamanhos e utilidades diferentes, porém Sara sentiu falta da sombra das árvores, quase inexistente no caminho q
A noite tomava conta de São Paulo quando Sara chegou ao prédio. Ao pisar na portaria foi surpreendida pelo abraço forte de um homem desconhecido.— Senhora Montenegro, que bom que apareceu.Paralisada pelo susto, levou alguns segundos para afastá-lo e olha-lo de cima a baixo com desconfiança. Pelo crachá preso ao bolso da camisa dele, se deu conta de se tratar do porteiro do prédio.Aumentando o espanto de Sara com seu comportamento estranho, o homem deixou a portaria sozinha e a escoltou até o apartamento, e só retornou ao serviço quando ela entrou no apartamento.Nem bem assimilou a estranheza com o comportamento do homem, foi novamente envolvida por um apertado abraço. Logo notou se tratar de sua madrinha.Seus arregalados olhos verdes visualizaram Rodrigo em pé no meio da sala, as mãos plantadas nos quadris e uma carranca no rosto bonito.— Em que lugar se escondeu, menina? — Tatiana questionou afastando-se e a avaliou com atenção, como a procurar algo de errado nela.— Fui ao hos
Sara levantou cedo, fez sua higiene matinal e vestiu uma camiseta de Rodrigo, que a cobria até os joelhos antes de caminhar sonolenta e faminta para a cozinha.Na geladeira selecionou vários ingredientes para fazer um sanduíche perfeito. Montava seu lanche quando Rodrigo entrou na cozinha, o cabelo úmido e penteado, o corpo coberto por terno escuro e segurando uma valise de couro marrom.Sobre o olhar cauteloso de Sara, ele colocou a valise na mesa e foi até à cafeteira servir-se de café. Para aflição da ruiva, enquanto bebericava o líquido, Rodrigo encostou-se a pia e observou cada movimento dela.Após passar a noite incomodada por ele não a ter beijado, ter aqueles penetrantes olhos escuros sobre sua pessoa lhe causava arrepios pela pele. Tentou ignorar a reação a presença dele e focar no lanche, mas Rodrigo a atraia como um ímã."Também, além de ser lindo, tem um olhar matador capaz de abalar uma mulher".— Cala a boca! — ordenou ao seu pensamento fora de hora.— O que disse? — per