Capitulo 2

Celeste Moreau

Eu nunca acreditei em bruxas. Nem em magia, nem em destinos escritos nas estrelas. Para mim, o mundo sempre foi aquilo que se podia ver, tocar, medir. Uma sequência de eventos caóticos, sem propósito, sem explicação além da lógica e da ciência. Mas agora, com um livro de couro envelhecido sobre minha mesa e palavras escritas em um idioma esquecido, sinto que toda a minha realidade está prestes a desmoronar.

Foi Sienna quem encontrou o livro, é claro. Ela sempre teve um dom para encontrar problemas. Seu entusiasmo desenfreado contrastava com minha constante necessidade de manter os pés no chão. Quando entrou em meu apartamento, naquela noite, os olhos brilhando como os de uma criança que acaba de descobrir um tesouro, eu deveria ter sabido que minha vida estava prestes a mudar.

— Celeste, você não vai acreditar no que eu encontrei! — Ela jogou a mochila no sofá e puxou um volume grosso e empoeirado, colocando-o na minha frente como se fosse a chave para um segredo ancestral.

Revirei os olhos, pegando o livro com ceticismo. A capa era de couro desgastado, com símbolos dourados entalhados, alguns familiares, outros completamente desconhecidos. O cheiro de papel antigo e umidade se misturava ao perfume floral de Sienna, criando um aroma peculiar que me envolveu de imediato. Abri a primeira página, e meu estômago revirou ao ver meu próprio sobrenome ali, em letras floreadas.

Moreau.

— O que é isso? — minha voz saiu hesitante, quase inaudível.

Sienna sorriu como quem sabe mais do que deveria. Seus olhos faiscavam, cheios de expectativa.

— Um diário. Ou talvez um grimório. Estava entre as coisas da minha avó. Você sabia que sua família é descendente de uma das bruxas mais poderosas da história?

Ri, tentando ignorar o arrepio na nuca. O apartamento pequeno parecia ainda menor, como se as paredes estivessem se fechando ao meu redor.

— Não seja ridícula.

— Não sou eu quem está dizendo! — Ela puxou o livro de volta e folheou as páginas amareladas. O som do papel seco rasgando o silêncio era quase ensurdecedor. — Olha isso. Está tudo aqui. Sua linhagem, seus ancestrais. Essa mulher, Vivienne Moreau, era uma bruxa lendária. E você... bem, você é sua descendente direta.

Cruzei os braços, tentando manter a compostura, mas meu corpo inteiro estava rígido. Um nó apertava minha garganta.

— E daí? Mesmo que fosse verdade, o que isso significa? Que eu posso lançar feitiços e voar em uma vassoura?

Sienna revirou os olhos, impaciente.

— Não estou dizendo que você precisa sair por aí lançando maldições, mas... e se houver algo nisso? Você nunca sentiu que havia algo diferente em você?

E foi aí que meu coração parou por um segundo.

Porque eu já sonhava com isso. Desde que me entendia por gente, imagens surgiam na minha mente à noite, como se fossem memórias de outra pessoa. Uma mulher com longos cabelos escuros, murmurando palavras antigas sob a luz da lua. Símbolos desenhados na terra, velas queimando em um altar de pedra. E um feitiço. Um encantamento que eu repetia nos meus sonhos desde criança, sem nunca entender o significado.

Engoli em seco, minha mente correndo para todos os momentos em que senti algo diferente, algo inexplicável. Quando objetos caíam sem motivo perto de mim, quando as luzes piscavam estranhamente, quando eu sabia de coisas antes mesmo que acontecessem.

— Celeste? — Sienna me chamou, notando meu silêncio.

— Eu... eu sonhei com isso. Com palavras como essas. Desde pequena.

Ela arregalou os olhos.

— Isso não pode ser coincidência.

Olhei para o livro novamente. De repente, parecia muito mais pesado. As palavras pareciam pulsar na página, como se esperassem para serem lidas, como se exigissem que eu aceitasse o que sempre recusei.

Lembrei-me de todas as vezes que senti um arrepio inexplicável na espinha, das vezes em que algo dentro de mim dizia para correr antes que algo acontecesse. De momentos fugazes em que senti que não estava sozinha, mesmo quando não havia ninguém por perto.

Talvez eu estivesse errada esse tempo todo. Talvez houvesse mais no mundo do que apenas o que podemos ver.

Talvez, apenas talvez... eu fosse parte disso.

O mundo tem uma forma engraçada de testar nossas convicções. E, apesar de todas as evidências que Sienna jogava na minha cara, eu me recusava a acreditar.

Bruxas não existem. Magia não existe. E eu certamente não era descendente de uma delas.

— Você pode tentar negar o quanto quiser, Celeste, mas os fatos estão aí. — Sienna cruzou os braços, me observando como se estivesse lidando com uma criança teimosa. — Esse livro tem seu sobrenome, sua linhagem, sua história.

Bufei, pegando o grimório e folheando as páginas sem realmente absorver nada. Sim, meu sobrenome estava ali. Mas isso não significava que havia algo sobrenatural envolvido. Muitas famílias tinham histórias antigas, lendas passadas de geração em geração. Isso era apenas uma coincidência. Um delírio de pessoas que queriam acreditar em algo maior do que a realidade.

— Ouça bem, Sienna. — Fechei o livro com um baque e a encarei. — O que é mais provável? Que eu seja uma descendente de uma bruxa poderosa, ou que alguém da minha família simplesmente gostava de inventar histórias? A segunda opção me parece muito mais racional.

Ela revirou os olhos. — E os seus sonhos? Você mesmo disse que sempre sonhou com palavras que nem sabia que existiam. E as coisas estranhas que acontecem ao seu redor? Como você explica isso?

Cruzei os braços e respirei fundo, tentando conter minha irritação. — Coincidências. O cérebro humano preenche lacunas o tempo todo. Talvez eu tenha visto essas palavras em algum lugar quando era criança e apenas me esqueci. Ou talvez sejam apenas ecos de algo que minha mente inventou.

— Ah, claro. Tudo tem uma explicação lógica. — Sienna bufou e jogou as mãos para o alto. — Você é impossível.

— E você é obcecada por essas coisas. — Retruquei, pegando minha bolsa. — Mas eu não tenho tempo para fantasias, Sienna. Amanhã começo no meu novo emprego, e é nisso que eu preciso focar. Não em livros velhos e lendas familiares.

— Você acha mesmo que pode simplesmente ignorar isso? Fingir que nada está acontecendo? — Ela perguntou, me olhando com uma mistura de frustração e preocupação.

— Exatamente. — Respondi, decidida. — E é isso que eu vou fazer.

Sienna balançou a cabeça, claramente inconformada. Mas não importava. Eu tinha mais com o que me preocupar. Meu foco agora era o emprego na Vólkov Industries. Oportunidades como essa não apareciam para pessoas como eu. Eu precisava me concentrar, ser profissional e fazer isso dar certo.

Enquanto saía do apartamento, tentei empurrar para longe as palavras de Sienna, os sonhos recorrentes, e todas as estranhas coincidências que pareciam querer me arrastar para algo que eu não queria acreditar.

Porque se eu começasse a acreditar... o que isso significaria para mim?

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