Marcos era um homem fino, educado e atencioso. Residia na capital paulista e dificilmente aparecia na região para visitar o tio, irmão de sua mãe, que insistia em continuar morando no Nordeste. Por sorte nos encontramos no momento mais difícil de minha maldita existência, cheia de altos e baixos, dores e sofrimentos. Juiz de Direito e dono de um grande e renomado escritório de advocacia que atendia nada menos que a alta elite social de São Paulo
E demais capitais brasileiras, ele possuía uma estabilidade econômica altamente definida, além de ser solteiro e estar à procura da felicidade, assim como eu. Lhe contei minha história, deixando-o a par de todos os pormenores, desde minha chegada ao casarão de Izabel até a saída às pressas da cidade do Rio de Janeiro para evitar de ser morta pelos traficantes do morro.
Onde fui obrigada a cometer um duplo homicídio, como autoridade pensei ser correto que me prendesse por ter morto aqueles dois homens, mas deixou claro q
— Rosilda, vem cá depressa, me leve ali para o pátio que desejo ver o pôr do sol, não sabe que faço isso todas as tardes, mulher, porque sempre tenho que ficar implorando para que faça seu trabalho? Afinal, não é para isso que pagamos esse seu enorme salário! —Sim, patroa, já estou indo, não se irrite, olhe o coração! —E não me venha com essa ironia toda, sua assanhada,deixe de ficar tagarelando e conduza-me logo nessa droga de cadeira até o pátio! —Tudo bem, tudo bem! Oh mulherzinha estressada essa! —Mas vejam só como os empregados modernos tratam seus patrões nos dias de hoje, parece até que somos duas coleguinhas. Tenha mais respeito comigo sua fulaninha de merda! —A senhora me desculpe, Dona Mercedes, mas eu não sou igual a seus outros serviçais, fui contratada pelo Dr. Gilberto para prestar meus serviços como enfermeira e, portanto, sou livre para me expressar como achar conveniente. E deixe de exagero,
Logo após a destruição de nossas casas pelos invasores e a prisão de nossos pais, pelo menos os que ainda ficaram vivos depois do confronto com a polícia, minha mãe perdeu completamente a noção da realidade e não dizia coisa com coisa. Fomos levados por minha tia que residia noutra parte daquelas propriedades, uma área que não foi incluída nas ações violentas do governo contra famílias indefesas.As outras mulheres e seus filhos ficaram abandonadas sobre os entulhos que sobrou depois do incêndio que consumiu o pouco do que possuíam, nós, por outro lado, acreditávamos ter alcançado mais sorte do que eles, mas estávamos enganados. Tia Izabel era do tipo ambiciosa e capaz de tudo para alcançar seus objetivos na vida, ir morar com ela foi um terrível erro que tivemos de pagar a altos custos.Nossa mãe p
Como todas as manhãs nos reunimos num amplo salão próximo a cozinha, onde geralmente fazíamos nossas refeições, logo que cheguei ali percebi os olhares impiedosos de minhas companheiras e senti um arrepio na espinha, era o sinal de alerta dado por meu subconsciente de que algo não ia bem e que deveria estar em alerta. Cada uma de nós estávamos de pé para receber na cantina nosso café matinal, estrategicamente escolhi o final da fila para evitar surpresas desagradáveis, pois só Deus sabia o que estava prestes a acontecer. Recolhi minha bandeja enquanto todas as demais mulheres foram para as mesas espalhadas pelo local. Sempre me fitando seriamente como se desejassem me esganar. Optei em sentar-me numa cadeira com mesa de frente para elas e com a costa voltada para a parede afim de evitar algum tipo de ataque surpresa, pois percebia nas criminosas o desejo de sentir o sabor de meu sangue quente nas suas mãos. Levava o pão murcho e azedo à boca, ingerindo junto um gole d
— Rosilda, onde você se meteu, criatura? Diabos!— Já estou aqui, patroa, vou levar a senhora para o jardim, está fa-zendo uma manhã linda— Deixe de conversa e faça logo seu serviço, mulher!— Está bem, vamos láDesde minha saída do sertão até o presente momento nada teria si-do mais doloroso do que viver aquele momento de intensa pobreza, me sentia como se estivesse literalmente jogada numa vala de esgoto a céu aberto. Antes não era capaz de entender o sofrimento daquelas pessoas, mesmo vindo de origem humilde, nem do quanto elas paga-vam um alto preço para sobreviverem nas ruas.As vezes reclamamos de barriga cheia enquanto lá fora muitos morrem de fome, frio, contaminados por diversas doenças sem cura e esqueci-dos pela sociedade que, apesar de viverem em derredor, fingem não perceber a existência d