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Paulo
Paulo Bitencourt era médico do hospital particular Santa Helena há trinta e dois anos, era referência de profissional na área da saúde por todo o Brasil e América Latina, dava palestras por todo o mundo, tinha mais de dez livros de medicina publicados e ganhara três vezes o prêmio de Profissional do Ano pela revista Medicinal Art, simplesmente um dos maiores nomes da medicina que o Brasil já teve a honra de produzir.
Paulo era muito querido por todos, desde o porteiro do hospital até o seu chefe – Phillip Berningstein –, um judeu ortodoxo que veio ao Brasil de férias com sua família e nunca mais voltou para sua terra natal – Polônia. Vendo sua grande oportunidade de crescer e realizar seu grande sonho.
Ter um hospital para salvar muitas vidas.
Paulo convidou Phillip a uma visita ao Brasil quando foi para a Europa passar as férias com sua família na Polônia pela primeira vez – para conhecer os campos de concentração nazista em Auchhwitz para usar como referência em um de seus livros sobre as descobertas científicas que o Anjo da morte, Dr. Josef Mengele, havia descoberto, jamais defendendo as atrocidades realizadas por ele, mas algo de produtivo aconteceu naquele inferno, a medicina teve muitas respostas, tais como: resistência humana, fertilidade, medicina em campo de batalha, técnicas cirúrgicas, eugenia, uso de medicamentos entre outros.
Phillip era um jovem rico, recém-formado em medicina pela Universidade de Viena e Paulo disse que o Brasil era um excelente lugar para começar um bom negócio como aquele – além de ser um verdadeiro paraíso para se morar, praias, mulheres lindas e o clima tropical que fazia toda a diferença.
Phillip veio com sua esposa, Sue, que ficou encantada com as praias do Nordeste e com a comida brasileira – em especial, a comida mineira. Decidiram então, com o apoio do novo amigo, Paulo, se instalarem e construíram o hospital que levava o nome da mãe de Paulo – por ter acolhido Phillip e Sue de forma tão calorosa –, eles decidiram homenagear sua mãe, pois ela morreu bem no dia da que deveria ser a inauguração.
A amizade deles perdurou fiel desde o primeiro dia até o último, em que Paulo, nos braços da mulher que amava, teve um ataque cardíaco fulminante.
O dia tinha começado da melhor forma possível para ele, nada no mundo poderia ser melhor do que estar nos braços da mulher dos seus sonhos, aquela que fazia cada segundo valer a pena, porque simplesmente não poderiam ter todo o tempo disponível para eles, o tempo era curto, um inimigo invisível que contava implacavelmente cada segundo, que os espreitava como um ladrão de noite não pode vacilar para não perder sua própria liberdade sabendo que um simples erro, ou um momento oportuno de sua vítima, tudo teria um fim, assim era o romance de Paulo e Renata, cada instante era único, pois em todo o momento simplesmente poderia ser o fim de tudo para eles.
Caso um dia Antônia soubesse de tudo.
Paulo era um homem na casa dos cinquenta anos de idade, extremamente bem-sucedido, já havia viajado o mundo todo ao lado de sua família, palestrado nas maiores e melhores universidades do mundo, incluindo Harvard, Princeton e Columbia.
Renata, ao contrário de seu grande amor, era uma mulher simples, que viajou por muitos dias clandestinamente na caçamba de um caminhão para tentar ganhar a vida na selva de pedra, ato da qual só não se arrependia por ter encontrado Paulo e disso resultar o fruto de seu amor.
A relação entre eles tinha tudo para dar errado, mas contra tudo e todos, até mesmo o destino, faziam todo o possível para compartilhar cada instante que tinham um com o outro, não falavam sobre a vida um do outro, nem faziam planos para o futuro, simplesmente curtiam cada momento como se fosse o último, e naquela quinta–feira de chuva, foi a última.
Após terem feito amor como jamais haviam feito até então, os dois se deitaram um ao lado do outro, totalmente sem fôlego, Paulo olhou para Renata e disse:
–– Não importa quanto anos passem, toda vez que olho para você, é como se fosse a primeira vez e me apaixono novamente.
–– Você é um bobo, sabia? – respondeu ela sorridente.
–– Até os bobos se apaixonam, se você não sabe.
–– Só sei que a vida nem sempre sorri para nós da forma como gostaríamos que sorrisse.
–– Pode até não sorrir, mas quem disse que a nossa felicidade depende do que a vida quer ou deixa de querer?
Paulo se deitou tentando imaginar a vida vinte e quatro horas ao lado dela, e ao fechar os olhos, nunca mais voltou a abri–los.
2MichelleMichelle era a filha mais nova de Paulo, consequentemente seu xodó, a companheira e confidente de todos os seus segredos mais íntimos, não havia absolutamente nada que um escondesse do outro, tinham uma ligação que transcendia o fato de serem pai e filha, eram amigos, confidentes, companheiros e acima de tudo, parceiros de vida. Michelle estava cursando a faculdade de medicina, principalmente por causa do pai, que estava pensando em passar o bastão e aproveitar a vida um pouco, descansar depois de mais de trinta anos de serviço, e por mais que amasse o que fazia, simplesmente o foco agora era outro, pois já tinha conquistado tudo o que um homem poderia sonhar, agora estava na hora de desfrutar de tudo isso, e ao mesmo tempo, dar lugar para a chegada dos mais novos. Mas ao contrário do p
3AntôniaAntônia era uma beata católica apostólica romana fervorosa – como sempre gostava de se autodenominar –, estava sempre à frente de todos os eventos que sua comunidade realizava, e a missa de Corpo–Presente de seu finado marido foi celebrada pelo padre e amigo da família, Marcelino, o qual cuidava da vida espiritual de toda a família de Antônia desde que eles se casaram. Antônia e Marcelino sempre tiveram uma amizade muito forte, estudaram nas mesmas escolas durante a adolescência tiveram até um pequeno romance relâmpago, mas na época, Marcelino já estava começando a sentir seu chamado sacerdotal e eles decidiram não investir mais naquele romance, o que para suas famílias foi um golpe baixo, principalmente a família dele, que esperava que tirasse
4DanielaA morte de Paulo Bittencourt foi uma verdadeira tragédia para toda a família Bittencourt e amigos, ele era o exemplo perfeito de marido, pai, amigo e profissional. Todos que conheceram Paulo jamais fora o mesmo...Paulo morreu após ter um ataque cardíaco fulminante durante o expediente, foi durante o almoço, quando todos perceberam que ele estava passando mal, mas já era tarde demais, todos tentaram fazer o possível por ele... Sua filha mais nova – Michelle – foi a primeira a ter conhecimento do incidente, ela fazia estágio no hospital em um bairro vizinho e ficou extremamente triste e abalada ao saber da morte do pai, afinal, ela era a filha mais próxima dele, enquanto Daniela – a primogênita – era mais apegada à mãe. 
5AntôniaAntônia acordou em seu quarto ao lado de toda sua família, dava para ver em seus rostos que o alívio tomava conta de seus corações preocupados. Antônia deu um sorriso tranquilo e disse: –– Está tudo bem, não tem nada para se preocuparem comigo. Apesar da terrível dor de cabeça... Antônia se levantou e foi tomar um banho muito quente, ela adorava ficar pelo menos quarenta e cinco minutos em sua banheira, e naquele dia em especial não foi diferente do convencional. Todos ficaram na sala conversando, lembrando–se dos bons e inesquecíveis momentos que passaram ao lado de Paulo. Ele era realmente inesquecível, tinha uma habilidade incr&iac
6MichelleRodrigo convidou Michelle para dar uma volta pela casa. Antônia insistiu para que ela fosse, e ela foi. Michelle estava andando completamente quieta – era como se fosse uma sonâmbula. Ela queria acordar de qualquer maneira daquele terrível pesadelo em que estava. Rodrigo segurou uma de suas mãos, colocou o outro braço na cintura dela e lhe deu um beijo na face esquerda de seu rosto pálido como a neve, bem devagar, foi arrastando seus lábios perto dos dela. Michelle também o beijou, sem se importar com aquilo, sua cabeça estava longe demais para se preocupar com um simples beijo, afinal, ela já tinha um longo histórico – para não dizer quase infinito – de rapazes que beijou, sem sequer saber seus nomes.
7MichelleAssim que Michelle acordou, sentiu seu corpo muito leve, apesar de que, dentro de sua cabeça, parecia que existia uma manada de elefantes correndo desesperadamente em busca da comida mais saborosa do mundo, que no caso, seria ela mesma, mas a sensação era muito boa, até a dor naquele momento parecia ser prazerosa. Michelle percebeu que estava nua, e quando olhou para o lado viu que Rodrigo estava deitado – também nu e com um sorriso de felicidade extrema. Parece que a noite foi boa para alguém... – pensou ela. Michelle pensou que Rodrigo estava tendo um sonho muito bom, afinal, ele tinha um leve sorriso sem–vergonha em seu rosto – mas Rodrigo estava fingindo o sono. Pela primeira vez em toda su
8AntôniaA relação entre Michelle e Antônia deu uma boa – talvez leve – melhorada depois da morte de Paulo, elas sabiam que iriam precisar uma da outra para se levantar na vida novamente. Mas é claro, ninguém consegue apagar uma vida de descaso do dia para a noite, aquilo seria um processo de cura para ambas. Antônia não sabia – não tinha a menor ideia – sobre o novo vício de sua filha – sobre nenhum vício dela, afinal, sexo era outro vício ainda mais constante e necessário para Michelle –, e muito menos sobre a vida secreta de Rodrigo – afinal, Antônia não sabia completamente nada sobre a filha. Para ela, Rodrigo era exatamente como os pais – que eram empresários de grande sucesso segundo ele dissera –, mas Antônia nã
9MichelleMichelle guardava os papelotes de cocaína em sua gaveta de roupas íntimas – onde ninguém, nem mesmo a empregada iria mexer –, depois de três meses usando quase que diariamente cocaína, Michelle percebeu o quanto já estava viciada e o quanto se afundara naquele vício sedutoramente maldito. Michelle sentia que ninguém poderia ajudá–la – apesar da aproximação da mãe –, aquilo ainda era muito pouco perto de uma vida inteira de descaso e falsidade, afinal, Michelle sempre culpou a mãe pelo distanciamento delas... As festas sempre eram mais importantes que ela, sua vida social perante a sociedade sempre foi mais importante do que instantes de carinho, e agora que o mundo desabou sobre as costas dela, ela queria compensar? Michel