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Antônia
Antônia acordou em seu quarto ao lado de toda sua família, dava para ver em seus rostos que o alívio tomava conta de seus corações preocupados.
Antônia deu um sorriso tranquilo e disse:
–– Está tudo bem, não tem nada para se preocuparem comigo.
Apesar da terrível dor de cabeça...
Antônia se levantou e foi tomar um banho muito quente, ela adorava ficar pelo menos quarenta e cinco minutos em sua banheira, e naquele dia em especial não foi diferente do convencional.
Todos ficaram na sala conversando, lembrando–se dos bons e inesquecíveis momentos que passaram ao lado de Paulo. Ele era realmente inesquecível, tinha uma habilidade incrível em deixar as pessoas à vontade em qualquer ambiente – além de ser um exímio contador de piadas e histórias.
Antônia chegou exatamente no auge da conversa e conseguiu rir, lembrando–se da piada que ela ouvira Paulo contar inúmeras vezes.
Antônia ficou entre as duas filhas, ninguém conseguiu almoçar, estavam todos com o mesmo sentimento de irreparável perda, mas cada um entendeu que agora era um novo tempo para todos eles.
E teriam que se acostumar com a dor.
6MichelleRodrigo convidou Michelle para dar uma volta pela casa. Antônia insistiu para que ela fosse, e ela foi. Michelle estava andando completamente quieta – era como se fosse uma sonâmbula. Ela queria acordar de qualquer maneira daquele terrível pesadelo em que estava. Rodrigo segurou uma de suas mãos, colocou o outro braço na cintura dela e lhe deu um beijo na face esquerda de seu rosto pálido como a neve, bem devagar, foi arrastando seus lábios perto dos dela. Michelle também o beijou, sem se importar com aquilo, sua cabeça estava longe demais para se preocupar com um simples beijo, afinal, ela já tinha um longo histórico – para não dizer quase infinito – de rapazes que beijou, sem sequer saber seus nomes.
7MichelleAssim que Michelle acordou, sentiu seu corpo muito leve, apesar de que, dentro de sua cabeça, parecia que existia uma manada de elefantes correndo desesperadamente em busca da comida mais saborosa do mundo, que no caso, seria ela mesma, mas a sensação era muito boa, até a dor naquele momento parecia ser prazerosa. Michelle percebeu que estava nua, e quando olhou para o lado viu que Rodrigo estava deitado – também nu e com um sorriso de felicidade extrema. Parece que a noite foi boa para alguém... – pensou ela. Michelle pensou que Rodrigo estava tendo um sonho muito bom, afinal, ele tinha um leve sorriso sem–vergonha em seu rosto – mas Rodrigo estava fingindo o sono. Pela primeira vez em toda su
8AntôniaA relação entre Michelle e Antônia deu uma boa – talvez leve – melhorada depois da morte de Paulo, elas sabiam que iriam precisar uma da outra para se levantar na vida novamente. Mas é claro, ninguém consegue apagar uma vida de descaso do dia para a noite, aquilo seria um processo de cura para ambas. Antônia não sabia – não tinha a menor ideia – sobre o novo vício de sua filha – sobre nenhum vício dela, afinal, sexo era outro vício ainda mais constante e necessário para Michelle –, e muito menos sobre a vida secreta de Rodrigo – afinal, Antônia não sabia completamente nada sobre a filha. Para ela, Rodrigo era exatamente como os pais – que eram empresários de grande sucesso segundo ele dissera –, mas Antônia nã
9MichelleMichelle guardava os papelotes de cocaína em sua gaveta de roupas íntimas – onde ninguém, nem mesmo a empregada iria mexer –, depois de três meses usando quase que diariamente cocaína, Michelle percebeu o quanto já estava viciada e o quanto se afundara naquele vício sedutoramente maldito. Michelle sentia que ninguém poderia ajudá–la – apesar da aproximação da mãe –, aquilo ainda era muito pouco perto de uma vida inteira de descaso e falsidade, afinal, Michelle sempre culpou a mãe pelo distanciamento delas... As festas sempre eram mais importantes que ela, sua vida social perante a sociedade sempre foi mais importante do que instantes de carinho, e agora que o mundo desabou sobre as costas dela, ela queria compensar? Michel
10AriAri colocou a cabeça no encosto do banco de seu carro e estava sonhando sozinho, ele sempre sonhou com aquele dia em que encontraria a mulher dos seus sonhos... Tudo tinha acontecido de forma tão natural... De repente sentiu algo frio como a morte encostando em sua orelha esquerda, era um convite da própria morte lhe fazendo suas devidas formalidades excêntricas. Quando seus olhos viraram para o lado sem mexer um único centímetro a cabeça – tentando achar o dono daquele revólver, já imaginando o pior –, Ari percebeu que um rapaz muito bem vestido estava apontando uma arma para sua cabeça. Uma voz sussurrou no seu ouvido. –– Chega perto dela mais uma vez que te mato, você
11Michelle e AriEm uma semana, eles se viram todos os dias. Aquela paixão foi crescendo gradativamente, ambos estavam completamente entregues um ao outro. Em todos os lugares em que iam, Ari via o fantasma do Rodrigo o observando, mas depois do primeiro dia, nada o assustava mais – ele sabia o que era realmente importante para ele.Sua mãe – Raquel – acabou se cortando enquanto preparava um frango a passarinho no restaurante onde trabalhava e ligou para Ari levá–la ao hospital, e por uma grande coincidência, era o hospital onde Michelle fazia estágio... Ele a viu, mas ela acabou se preocupando tanto com o corte da mulher à sua frente que nem tinha reparado quem a acompanhava. Ele começou a assoviar a música Patience – do Guns’n Roses.<
12AntôniaTodo domingo depois da missa, o padre Marcelino ia almoçar na casa de Antônia com sua família, todos já se acostumaram com aquilo, afinal, já era algo que acontecia há pelo menos doze anos, mas Leide sempre se recusava a almoçar lá aos Domingos, pois ela sabia que seu desafeto certamente estaria lá.Antônia era uma devota assídua – para não dizer beata – quando o assunto era religião. Ela fora criada em um duro regime católico. Para sua família, era desonra se um filho não era batizado, crismado e não se casava na Igreja Católica. Antônia ensinou a mesma coisa para suas filhas, mas ela nunca entendeu o porquê que as duas filhas jamais gostaram de ir à igreja. Daniela ainda se crismou sem problema algum, era uma garota q
13Ari e MichelleAri também era um cristão assumido, ia constantemente à igreja – pelo menos três vezes por semana –, foi educado por seus pais que, humildade e caridade eram acessórios fundamentais para que um ser humano tenha caráter, afinal, não basta apenas estender a mão para ajudar alguém, tem que haver algo nessa mão, um sentimento por trás disso, porque, mão vazia não enche barriga, mesmo que essa mão tenha boa vontade em ajudar. Sua mãe sempre o ensinou que: Ajudar alguém sem sentimento é como dar um prato vazio para um faminto, e querer que ele saia com sua fome saciada...Michelle assumiu para Ari que era viciada em drogas. Ele por um momento sentiu seu mundo girar ao contrário, mas ficou feliz por ela