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Antônia
Antônia era uma beata católica apostólica romana fervorosa – como sempre gostava de se autodenominar –, estava sempre à frente de todos os eventos que sua comunidade realizava, e a missa de Corpo–Presente de seu finado marido foi celebrada pelo padre e amigo da família, Marcelino, o qual cuidava da vida espiritual de toda a família de Antônia desde que eles se casaram.
Antônia e Marcelino sempre tiveram uma amizade muito forte, estudaram nas mesmas escolas durante a adolescência tiveram até um pequeno romance relâmpago, mas na época, Marcelino já estava começando a sentir seu chamado sacerdotal e eles decidiram não investir mais naquele romance, o que para suas famílias foi um golpe baixo, principalmente a família dele, que esperava que tirasse aquela ideia estapafúrdia de se isolar em algum monastério e viver uma vida reclusa para um deus que eles não acreditavam.
Marcelino ser cristão já era um milagre por si só, o que dava ainda mais crédito às suas pregações, por viver em um ambiente completamente hostil à fé, ele ser um leal servidor de Cristo na Terra realmente era algo admirável.
Nessa mesma época Antônia conheceu Cícero com quem viveu um grande romance – para não dizer um grande amor, mas as atitudes de Cícero simplesmente afastaram suas vidas para sempre, principalmente quando os pais dela conheceram Paulo Bitencourt, um jovem estudante de medicina, nascido no seio da aristocracia paulistana, ele não era simplesmente um bom partido, era o melhor partido que existia, e por alguma coisa inexplicável, amava Antônia que não conseguia enxergar um palmo à frente do rosto que aquele partidão estava completamente apaixonado por ela.
Mas como ela era filha de um militar, tudo sucedeu da forma como comumente era para ser resolvida, seu pai a convenceu
Mesmo depois de estar noiva de Paulo, Antônia ainda saiu algumas vezes com Cícero, mas a segurança financeira falou mais alto em seu coração, pois Cícero adorava viajar, estava sempre metido com passeatas políticas entre grupos socialistas em pleno período de Ditadura Militar, e isso era o fim da picada para ela e sua família tradicional e militar, Antônia queria se casar com um homem de verdade e não com um futuro mito.
Antônia cansou de ficar esperando por ele com sua janela aberta, e ele nunca aparecia por ter problemas com o de regime militar – pois o pai de Antônia era um Coronel do Exército e conhecia muito bem o rosto de Cícero, que vivia à frente das passeatas e grupos estudantis com histórico de terroristas.
Quando Antônia marcou o casamento com Paulo, ela decidiu nunca mais ver Cícero novamente, e desde então nunca mais o viu e nem teve notícias dele, o que em sua cabeça, seu pai, ou alguém do alto comando pudesse ter dado um fim nele, algo muito comum quando as pessoas não eram exiladas.
Paulo foi casado com Antônia por vinte e oito anos. Diante de toda a sociedade, eles tinham o casamento perfeito. Tinham duas filhas inteligentes e muito bonitas – além de talentosas –, viajaram por quase todo o mundo, jamais brigaram ou discutiram ao ponto de ficarem sem conversarem um com o outro.
Eles sempre ficaram muito conhecidos por suas festas exorbitantes, repletas de pessoas famosas e muito ricas.
Antônia era uma socialite nacionalmente conhecida, e fazia questão que as pessoas soubessem disso na primeira oportunidade que tinha.
4DanielaA morte de Paulo Bittencourt foi uma verdadeira tragédia para toda a família Bittencourt e amigos, ele era o exemplo perfeito de marido, pai, amigo e profissional. Todos que conheceram Paulo jamais fora o mesmo...Paulo morreu após ter um ataque cardíaco fulminante durante o expediente, foi durante o almoço, quando todos perceberam que ele estava passando mal, mas já era tarde demais, todos tentaram fazer o possível por ele... Sua filha mais nova – Michelle – foi a primeira a ter conhecimento do incidente, ela fazia estágio no hospital em um bairro vizinho e ficou extremamente triste e abalada ao saber da morte do pai, afinal, ela era a filha mais próxima dele, enquanto Daniela – a primogênita – era mais apegada à mãe. 
5AntôniaAntônia acordou em seu quarto ao lado de toda sua família, dava para ver em seus rostos que o alívio tomava conta de seus corações preocupados. Antônia deu um sorriso tranquilo e disse: –– Está tudo bem, não tem nada para se preocuparem comigo. Apesar da terrível dor de cabeça... Antônia se levantou e foi tomar um banho muito quente, ela adorava ficar pelo menos quarenta e cinco minutos em sua banheira, e naquele dia em especial não foi diferente do convencional. Todos ficaram na sala conversando, lembrando–se dos bons e inesquecíveis momentos que passaram ao lado de Paulo. Ele era realmente inesquecível, tinha uma habilidade incr&iac
6MichelleRodrigo convidou Michelle para dar uma volta pela casa. Antônia insistiu para que ela fosse, e ela foi. Michelle estava andando completamente quieta – era como se fosse uma sonâmbula. Ela queria acordar de qualquer maneira daquele terrível pesadelo em que estava. Rodrigo segurou uma de suas mãos, colocou o outro braço na cintura dela e lhe deu um beijo na face esquerda de seu rosto pálido como a neve, bem devagar, foi arrastando seus lábios perto dos dela. Michelle também o beijou, sem se importar com aquilo, sua cabeça estava longe demais para se preocupar com um simples beijo, afinal, ela já tinha um longo histórico – para não dizer quase infinito – de rapazes que beijou, sem sequer saber seus nomes.
7MichelleAssim que Michelle acordou, sentiu seu corpo muito leve, apesar de que, dentro de sua cabeça, parecia que existia uma manada de elefantes correndo desesperadamente em busca da comida mais saborosa do mundo, que no caso, seria ela mesma, mas a sensação era muito boa, até a dor naquele momento parecia ser prazerosa. Michelle percebeu que estava nua, e quando olhou para o lado viu que Rodrigo estava deitado – também nu e com um sorriso de felicidade extrema. Parece que a noite foi boa para alguém... – pensou ela. Michelle pensou que Rodrigo estava tendo um sonho muito bom, afinal, ele tinha um leve sorriso sem–vergonha em seu rosto – mas Rodrigo estava fingindo o sono. Pela primeira vez em toda su
8AntôniaA relação entre Michelle e Antônia deu uma boa – talvez leve – melhorada depois da morte de Paulo, elas sabiam que iriam precisar uma da outra para se levantar na vida novamente. Mas é claro, ninguém consegue apagar uma vida de descaso do dia para a noite, aquilo seria um processo de cura para ambas. Antônia não sabia – não tinha a menor ideia – sobre o novo vício de sua filha – sobre nenhum vício dela, afinal, sexo era outro vício ainda mais constante e necessário para Michelle –, e muito menos sobre a vida secreta de Rodrigo – afinal, Antônia não sabia completamente nada sobre a filha. Para ela, Rodrigo era exatamente como os pais – que eram empresários de grande sucesso segundo ele dissera –, mas Antônia nã
9MichelleMichelle guardava os papelotes de cocaína em sua gaveta de roupas íntimas – onde ninguém, nem mesmo a empregada iria mexer –, depois de três meses usando quase que diariamente cocaína, Michelle percebeu o quanto já estava viciada e o quanto se afundara naquele vício sedutoramente maldito. Michelle sentia que ninguém poderia ajudá–la – apesar da aproximação da mãe –, aquilo ainda era muito pouco perto de uma vida inteira de descaso e falsidade, afinal, Michelle sempre culpou a mãe pelo distanciamento delas... As festas sempre eram mais importantes que ela, sua vida social perante a sociedade sempre foi mais importante do que instantes de carinho, e agora que o mundo desabou sobre as costas dela, ela queria compensar? Michel
10AriAri colocou a cabeça no encosto do banco de seu carro e estava sonhando sozinho, ele sempre sonhou com aquele dia em que encontraria a mulher dos seus sonhos... Tudo tinha acontecido de forma tão natural... De repente sentiu algo frio como a morte encostando em sua orelha esquerda, era um convite da própria morte lhe fazendo suas devidas formalidades excêntricas. Quando seus olhos viraram para o lado sem mexer um único centímetro a cabeça – tentando achar o dono daquele revólver, já imaginando o pior –, Ari percebeu que um rapaz muito bem vestido estava apontando uma arma para sua cabeça. Uma voz sussurrou no seu ouvido. –– Chega perto dela mais uma vez que te mato, você
11Michelle e AriEm uma semana, eles se viram todos os dias. Aquela paixão foi crescendo gradativamente, ambos estavam completamente entregues um ao outro. Em todos os lugares em que iam, Ari via o fantasma do Rodrigo o observando, mas depois do primeiro dia, nada o assustava mais – ele sabia o que era realmente importante para ele.Sua mãe – Raquel – acabou se cortando enquanto preparava um frango a passarinho no restaurante onde trabalhava e ligou para Ari levá–la ao hospital, e por uma grande coincidência, era o hospital onde Michelle fazia estágio... Ele a viu, mas ela acabou se preocupando tanto com o corte da mulher à sua frente que nem tinha reparado quem a acompanhava. Ele começou a assoviar a música Patience – do Guns’n Roses.<