O som de batidas firmes na porta me despertou, interrompendo um sonho que já começava a se esvair da minha memória. A voz de Ethan veio logo em seguida, baixa, mas decidida.— Ei, rapaz, está na hora. Levanta logo, temos um longo dia.Abri os olhos lentamente, piscando contra os primeiros raios de sol que escapavam pela janela entreaberta. O quarto era modesto, mas aconchegante. Pela primeira vez, talvez na minha vida inteira, eu tinha um teto sobre a cabeça e uma cama quente.— Já estou indo. Murmurei, tentando afastar o sono enquanto me sentava na cama.Ao abrir a porta, Ethan estava lá, esperando. Ele segurava uma pequena sacola branca que me entregou sem cerimônias.— Aqui, use isso. Ele apontou para o corredor. — O banheiro é ali. Quero você pronto e com a cara lavada antes do café.Peguei a sacola e olhei o conteúdo: Uma escova de dentes nova, outra de cabelo, pasta, sabonete e uma muda de roupas simples, mas limpas. Eu estava acostumado a ser tratado com desconfiança ou ind
O café da manhã transcorreu em meio a provocações e risos. Laila não parecia se conter, lançando olhares e comentários que, a cada instante, testavam minha compostura. Ela era uma força da natureza: Confiante, sagaz, e absurdamente bela. Era impossível ignorar sua presença.Quando ela terminou de comer, levantou-se com um movimento ágil, pegando a bolsa que estava pendurada na cadeira. Antes de ir, inclinou-se ligeiramente na minha direção, com aquele mesmo sorriso provocativo que me desarmava.— Bem, Gabriel...Ela pronunciou meu nome com uma familiaridade que me incomodava e atraía ao mesmo tempo. — Tenho que ir, mas não se preocupe. Hoje à noite, vamos terminar nossa conversa em um lugar mais... reservado.A sugestão implícita na voz dela fez algo dentro de mim se agitar de forma inesperada. Meu corpo reagiu de um jeito que eu não compreendia. Eu não sabia se já havia estado com uma mulher, mas, se tinha, não me lembrava de nada que me fizesse sentir assim.Recuperando o control
AYLA ..O sol estava alto quando me despedi de Eliza, deixando para trás não apenas sua casa, mas também tudo o que conhecia. A mochila pesada nas costas, cheia de dinheiro que minha mãe me deu, parecia carregar não só meu sustento, mas também o peso das decisões que precisavam ser tomadas. Meu destino era incerto, mas a certeza de que precisava partir me movia.Minha casa ficava em um vilarejo escondido no interior de Belize, cercado por plantações de milho, feijão e mandioca. A vida ali era regida pelo ritmo da terra e das estações. Meus pais, agricultores dedicados, acreditavam que o trabalho duro e a tradição nos protegiam das influências externas. Mas, para mim, aquele paraíso verdejante era também uma prisão. A floresta que nos rodeava parecia um muro intransponível, uma barreira que mantinha o mundo distante.Minha jornada começou com passos hesitantes pela trilha que cortava a floresta densa. O cheiro de terra molhada e a sombra das árvores altas me acompanhavam, mas també
Meus pés pareciam presos ao chão. A lógica gritava para que eu me escondesse, para fingir que nunca vi nada e proteger a mim mesma. Mas, enquanto o som de suas súplicas ficava mais alto, algo dentro de mim explodiu.— Ei! Solte-a agora! Minha voz saiu mais firme do que eu esperava, mas o tremor em minhas mãos denunciava meu medo.O homem parou, virando lentamente o rosto para mim. Ele era enorme, com uma barba espessa e olhos escuros que brilhavam de malícia. A mulher aproveitou a distração e, como um relâmpago, se desvencilhou dele, correndo em disparada pelo corredor até desaparecer da minha vista.Agora, era só eu e ele.— Ora, ora... que cena heroica. Ele deu um passo em minha direção, rindo com desprezo.— E o que você vai fazer agora, princesinha? Agora eu fiquei sem minha comida. Será você a me satisfazer?Minha garganta estava seca, e minhas pernas ameaçavam ceder, nem mesmo Azrael, no início de suas aparições, me causou tanto medo.— Não vou deixar você fazer isso com ningu
AZRAEL ..O cheiro quente de óleo e especiarias enchia o ar, tornando o pequeno espaço da banca de lanches mais abafado do que deveria ser. Ethan estava ao meu lado, movendo-se com a familiaridade de quem sabia exatamente onde cada ferramenta e ingrediente estavam. Eu, por outro lado, ainda me adaptava ao ritmo frenético.— Passa o pão, Gabriel! Ethan gritou acima do som da chapa chiando.Eu obedeci, entregando o pão que ele precisava para o próximo lanche. Ele trabalhava rápido, mãos hábeis transformando ingredientes simples em algo que fazia as pessoas voltarem todas as manhãs. Eu observava os rostos que vinham até a banca. Risos, conversas casuais, algumas histórias trocadas em voz alta enquanto aguardavam seus pedidos.Parte de mim se perguntava o que eu estava fazendo ali, entre pessoas tão comuns e tão complicados ao mesmo tempo. No entanto, outra parte, mais silenciosa, sentia-se estranhamente... satisfeita.Enquanto cortava os ingredientes, lembrei-me da promessa de Laila.
O peso de Laila em cima de mim, seus dedos na minha pele, era uma provocação que eu sentia em cada fibra do meu corpo. Suas mãos puxavam meus cabelos com uma intensidade que deveria ser desconfortável, mas, ao contrário, parecia uma âncora me prendendo ao momento. Sua língua dançava com a minha, exigente, exploradora, enquanto seu corpo movia-se lentamente sobre o meu, despertando uma necessidade primal, quase impossível de resistir.Ela era fogo, um fogo que queimava e consumia, e por um instante, eu quase quis me entregar. Quase.Minhas mãos começaram a explorar suas curvas, deslizando por sua cintura até suas coxas, onde o tecido fino do vestido tornava a pele dela um convite irresistível. Mas, no instante em que meus dedos tocaram sua pele nua, algo aconteceu.Um flash.Uma imagem tão nítida quanto um soco."Uma garota", mas não era Laila.Seus olhos castanhos e profundos encarando-me, a expressão dela serena, quase inocente. O mundo ao nosso redor desbotado, mas sua boca desenha
Os dias passaram, e o silêncio de Laila se tornou ensurdecedor. Eu sabia que a havia magoado. Não era difícil perceber. A intensidade dela era fogo, mas também era frágil, como vidro prestes a se quebrar. E, naquela noite, eu fui a pedra que causou a fissura. Ela deixou de aparecer, e a ausência dela era como um eco estranho na minha rotina. Não que eu sentisse falta dela, mas o vazio deixado por sua presença barulhenta me fazia pensar.Naquela tarde, enquanto terminava de organizar alguns coisas na cozinha, Ethan apareceu. Ele se encostou na porta com aquele ar descontraído de quem sabia mais do que deveria.— Então, o que aconteceu com Laila? Ele perguntou, cruzando os braços. — Faz dias que ela não aparece por aqui. Alguma briga?Suspirei, jogando o pano na mesa e passando a mão pelo rosto. Ethan sempre tinha um talento peculiar para aparecer nas horas erradas.— Não foi uma briga, exatamente. Respondi, hesitante.Ethan arqueou uma sobrancelha, visivelmente curioso.— Se não foi
Laila estava com os braços cruzados e aquele olhar que misturava julgamento e curiosidade. Ela era uma tempestade, e sua presença ali fazia meu peito se contrair. Não sabia se era alívio ou desconforto, mas era algo que me puxava para ela como uma maré.Ela franziu a testa, seu olhar intenso fixado em mim.— Azrael? Você lembrou quem é?Eu queria responder. Queria contar sobre o sonho, sobre a garota, o navio, os gritos. Sobre como meu coração parecia reconhecer algo que minha mente ainda não conseguia alcançar. Mas como explicar tudo isso sem soar ainda mais insano? Como dizer a ela que talvez o Gabriel que ela conhecia fosse só um pedaço de algo muito maior?Suspirei e desviei o olhar.— Não exatamente. Fiz uma pausa, buscando as palavras. — Eu tive um sonho. Uma mulher estava me chamando por esse nome. Azrael. Eu não consegui ver o rosto dela, mas... algo nela parecia tão real, tão familiar.Ela permaneceu em silêncio, mas seu olhar não vacilou. Era como se ela estivesse tentan