ANA MARIA A dor em meu coração era dilacerante. Destruída como se um rolo compressor passasse por cima de meu corpo, deixando cada parte esmigalhada. Era assim que eu me sentia. Ele não se lembrava de mim, não lembra de nada que viveu comigo, o amor que dizia sentir não estava mais lá. O seu olhar frio para mim, sem nenhum sentimento. Caminhei por um longo tempo. Eu estava tão desolada que não podia ir para casa. A minha dor era tão intragável que foi pior do que quando Anderson me deixou, grávida. Eu me sentia uma incapaz. Não sei se tinha coragem para fazer qualquer coisa nesse momento. Eu não poderia ir para casa dessa maneira. Como eu falaria com Malú que o tio Miguel não voltaria mais? Como vamos viver sem a alegria que ele nos acostumou? Chorei o caminho todo até a casa do meu amigo. Já era noite quando bati na porta e Kátia me atendeu com um sorriso que logo se desfez quando notou a minha cara. — O que houve? A Butterfly me mandou mensagem falando que o Miguel aco
ANA MARIA Cheguei em casa de manhã, aproveitei para passar na padaria para comprar algumas coisas para o café da manhã. Rodrigo só me permitiu sair, depois que viu que eu estava mais calma. Seu apoio junto ao de Kátia é tão fundamental para mim. Sempre serei eternamente grata pelas amizades que cultivo. Assim que cheguei no meu portão, liguei para Felipe abri-lo para mim. Demorou um tempo até que veio, mas veio com uma cara de cansado e toda amassada. No meio da calçada mesmo, ele me abraçou. — Tá bem? — Vou ficar. — Estamos do seu lado. — Obrigada, obrigada por ficar com a Malú. — Sempre. Comemos pizza ontem. Fomos entrando até a sala onde vi o sofá bagunçado. — Tudo bem, quem dormiu no sofá? — Eu, a última vez que eu deitei na sua cama, Miguel teve ataque de pelanca. — Não sei se ele volta, está muito feliz ao lado da sua noiva. — Ele não se lembrou de você, gatinha? — Seu rosto assumiu preocupação. — Não, não se lembrou de mim, nem da Malú. Não sei como vai ser para e
PEDRO Alguns dias antes... — Aída, por favor, as reuniões de hoje à tarde. Acabei de chegar de um almoço com um cliente um tanto chato. Algo que tenho que suportar, já que são eles que pagam meus honorários salgados. — Doutor, no período da tarde há apenas uma reunião com o doutor Tesaksi no final da tarde. E um rapaz ligou para o senhor. — Quem? — perguntei desabotoando o paletó e pendurando no aparador que fica atrás da minha mesa. Olhei para a minha bela vista e, diga-se de passagem, não deixa nada a desejar na localidade. Mamãe e papai fizeram um grande investimento na minha educação, sempre na melhor escola, os melhores tutores, faculdades internacionais, pós, doutorado. Infelizmente eles não estão mais aqui para contemplar a colheita de sua semeadura, mas eu prossigo, tentando deixar a minha marca. Estou quase nos meus quarenta e posso dizer com propriedade que meu escritório é um dos mais bem-sucedidos em todos os casos que se envolve. — Informou apenas o primeiro nome
ANA MARIA Atualmente... — O que você faz aqui a essa hora? — Posso entrar? A indecisão pairou sobre mim, mas o coração estava feliz por vê-lo, que decidi ceder. Assim que ele entrou, eu fechei o portão. Por causa do início da madrugada, fazia um vento frio. — O que o senhor quer? — Proferir essas palavras me doeu. — Eu fiquei sabendo que a sua filha está doente por sentir minha falta. Olhei espantada para ele. Quem contou? — Ela vai ficar bem, não precisava vir. Seu olhar me sondava frio, nenhum pouco do amor que ele dizia sentir por mim estava lá. — Posso vê-la? — Ela está dormindo agora, está melhorando. Não precisava se preocupar, vindo aqui a esse horário. Por algum tempo ele ficou me sondando em silêncio. Não queria me martirizar mais, tendo sua presença tão perto e não poder trocá-lo, beijá-lo, abraçá-lo. Vendo que ele não ia tomar nenhuma atitude eu abri novamente o portão. — Se o senhor me der licença, eu preciso dormir, para amanhã cuidar da minha filha. Ele pa
ANA MARIA — Que porra, mulher! Ela amou essa foto, perguntou se tinha mais. — Felipe tirou agora. Pedro me ligou assim que viu a publicação no I*******m. — Ele é foda! Fala para ele que ele é foda. — Eu sei, amor. Estou ouvindo. — Você não cansa de me surpreender, sabia? Os dois. — Ainda tem mais coisas para você descobrir. — Então... segunda-feira ela quer você na agência, vou te passar o endereço por mensagem. Amor, você acompanha ela? — Claro! Eu vou com ela. — Obrigada, Pedro. Por tudo — agradeci. — Você é família, e eu não estou fazendo nada, sou apenas a ponte. Depois de toda a euforia, eu me permiti acreditar, me permiti sonhar. Não segurei a alegria e liguei para minha mãe. Contei para ela tudo que estava acontecendo, sobre como Malú passou a semana e sobre eu ser mandada embora do trabalho. Minha mãe é uma mulher maravilhosa e eu sou grata pela criação que ela me deu. Infelizmente, pela minha inocência, eu acreditei em certas pessoas e cometi vacilos, dos quai
ANA MARIA O prédio era opulento e exalava bom gosto. Não era muito alto, mas pelo visto era todo da agência de Mariana. Um “N” enorme, na frente de um flash que parecia ser de câmera, em vidro, adornava acima da porta, também de vidro fumê, logo na entrada. — Uau, tô chocado. — Muito bonito, né? — Vem, vamos entrar com o pé direito, por favor. Porque daqui, você vai sair uma nova mulher. Felipe e eu seguimos para o balcão, onde uma loira muito bem vestida nos sorriu. — Em que posso ajudá-los? — Mariana Noronha, por favor? — Ela espera vocês? — A cara de incredulidade que ela fez foi desprezível. — Sim, ela nos aguarda, eu sou Ana Maria Garcia. — Um momento. Ela ligou para alguém e citou meu nome. Enquanto isso, eu reparei o lugar, tudo muito claro e pelo fato das paredes serem de vidro, o sol da manhã resplandecia por todo canto. — Aqui está o crachá de acesso, é só pegar o elevador até o oitavo andar, Rebeca espera vocês lá. Agradeci e seguimos pelo elevador, cada vez ma
MIGUEL Estava no meu escritório, na sede da Polícia Federal em São Paulo, analisando alguns casos administrativos, já que os meus superiores me pediram para ir com calma. Eles também são muitos dos que não sabem, e é bom, quanto menos pessoas souberem, melhor. Eu estava próximo de desmascarar o maior esquema de drogas e prostituição do Brasil, envolvendo alguns políticos de grande nome, quando fui atacado. E o pior é que lembro absolutamente de tudo, de cada um deles. Sempre fui um cara obstinado, o que eu quero, eu consigo. Não enxergo os obstáculos, eu simplesmente vou lá e pego o que é meu. Nesse momento eu quero desmascarar essa grande quadrilha. Quando entrei para a polícia federal, entrei com um objetivo: ser leal ao meu país. Obedecer e fazer as leis serem obedecidas, custe o que custar. E foi assim que eu passei um longo período longe da minha família. Não que eu sentisse falta. Com certeza eu preferia estar em qualquer operação, do que na companhia da minha mãe. Sem co
ANA MARIA Coloquei algumas trocas de roupa minha e da Malú numa mochila, algumas coisas que minha filha ia precisar e fui. Ainda era oito horas da noite, se desse muita sorte, chegaria antes das onze na cidade e como o hospital que meu pai está é próximo, Doni poderia me pegar. Liguei para Mariana e perguntei se ela precisaria de mim por esses dias, graças a Deus, só a partir de segunda-feira. ............................................................. Cheguei na cidade quase uma da manhã. O ônibus quebrou no caminho e tivemos que esperar um outro chegar, o que demorou demais. As mulheres com criança eles dispensaram na frente. Agradeci imensamente por isso. Enfim, chegamos na rodoviária com um imenso deserto, apenas o nosso ônibus lá parado. — Ana. Ouvi Doni me gritar e apenas virei o corpo para ver de onde vinha, estava do lado da caminhonete cinza, como Malú estava dormindo no meu colo e ainda tinha o peso da mochila, não consegui dar um passo além. Ele correu até onde eu