ANA MARIA O momento dos dois foi tão lindo. A Íris chorou, e eu compreendo. Depois de todo o desespero que foi o desaparecimento do irmão e agora esse bálsamo, quando até túmulo já havia sido construído. São tantas coisas na vida de Miguel que precisam ser colocadas no lugar, que eu espero que sobre um espaço para mim. Eles ficaram conversando enquanto eu arrumava as coisas da Malú, para o tio levá-la. Não preciso nem dizer que minha princesa fica super animada quando vai para a casa do Rodrigo e da Kátia. Quando foi à tardezinha, Rodrigo foi anunciado na portaria. Miguel, claro, liberou sua passagem e ele chegou no apartamento com o queixo no chão, exatamente como eu fiquei. — E aí, cara? Que fita braba é essa? — Nem me fale, está sendo uma verdadeira confusão. Veio ver minhas meninas? — Ele veio busca a Malú. — Miguel me olhou junto com a irmã. — Para eu poder cuidar de você melhor, sem me preocupar se ela vai estar bem. — Não quero que ela vá. Ela precisa das história
ANA MARIA — Eu quero ir para casa. Sua voz saía carregada de dor, após o silêncio esmagador que se fez, depois de eu colocar aquela mulher no seu lugar. — Vamos, eu te levo, você não está bem para dirigir. — Pedro se ofereceu. — Quem ela pensa que é, para falar assim comigo? — Agnes, vamos. Ele saiu arrastando-a pelo braço, até sumirem de nossas vistas. — Pedro, leve-o para casa, ele não está bem para passar por essas situações — solicitou Luiz. — E Ana, perdoa a Agnes, ela tem um bom coração, só protege demais o filho. — Às vezes, desnecessariamente — completou Mariana. — Preciosa! — Agnes é um amor de pessoa, não tem porque você levantar a voz para ela. O mínimo de educação, já que está na sua casa. — Foi a vez da tal Gabriela. — Gabriela. — Pedro a repreendeu. — Vamos, por favor, não quero mais ficar nesta casa. Eu saí me tremendo, parece que todos conseguiam ver uma boa pessoa naquela mulher, mas só eu tinha que suportar a antipatia. Se ela demonstrar acidez comigo, n
FELIPE Porra, estou nervoso perto de um cara. Foda isso! Entramos no elevador em silêncio. Percebia as olhadas que ele me lançava, mas permanecia no meu canto. Eu sempre fui cheio de atitude, uma gracinha aqui e outra ali e agora, nem sei o que dizer. Percebi a cara de surpresa que ele fez, quando me viu no quarto do Miguel. Depois da noite que tivemos, eu esperei um novo contato, só que não veio. Já estava acostumado a ter lances de uma noite ou algumas horas, afinal, a minha aceitação foi tão difícil de engolir e depois mais difícil ainda de assumir, que não sei o que é relacionamento. Nunca estive em um. Talvez pela minha falta de segurança, e também se a minha própria família ficou com vergonha de mim, quem é que vai querer, né? Não sou indeciso na minha opção, só que esses traumas são fodas, bagunça a cabeça de uma forma que quando você vai ver, já está todo fodido. — Quer comer o quê? — Pedro me perguntou. — Qualquer coisa. Só vim para distrair a mente e deixar a Ana respi
ANA MARIA Hoje faz três dias que Miguel passou pela cirurgia. Ele ainda não acordou, os médicos dizem ser normal, pois seu cérebro sofreu uma pressão por longo tempo, então precisa se reestabelecer no seu devido lugar. Eu acabei retornando para casa, afinal, precisava trabalhar e mais, tenho uma filha para cuidar. Parece que se passaram anos, foram as duas semanas mais longas da minha vida, estive em lugares que nem imaginei estar, passei por situações que nem cogitava e conheci pessoas que levarei para toda minha vida. Algumas eu não faço questão. Mas, o bom é que foi tudo para o bem do homem que eu amo. Ele vai ficar bem. Foi nesse pensamento positivo que eu trabalhei durante a quinta-feira. — Vocês tão fazendo panelinha. — Tales nos perguntou. — Acertou, miserável, não te suportamos. — Felipe? Mentira, Tales, nós te amamos. — Fale por você. Felipe, todo debochado, arrumava as latas pequenas de tinta na prateleira. — Vamo ver se no próximo churrasco tu vai ser convidado,
ANA MARIA A dor em meu coração era dilacerante. Destruída como se um rolo compressor passasse por cima de meu corpo, deixando cada parte esmigalhada. Era assim que eu me sentia. Ele não se lembrava de mim, não lembra de nada que viveu comigo, o amor que dizia sentir não estava mais lá. O seu olhar frio para mim, sem nenhum sentimento. Caminhei por um longo tempo. Eu estava tão desolada que não podia ir para casa. A minha dor era tão intragável que foi pior do que quando Anderson me deixou, grávida. Eu me sentia uma incapaz. Não sei se tinha coragem para fazer qualquer coisa nesse momento. Eu não poderia ir para casa dessa maneira. Como eu falaria com Malú que o tio Miguel não voltaria mais? Como vamos viver sem a alegria que ele nos acostumou? Chorei o caminho todo até a casa do meu amigo. Já era noite quando bati na porta e Kátia me atendeu com um sorriso que logo se desfez quando notou a minha cara. — O que houve? A Butterfly me mandou mensagem falando que o Miguel aco
ANA MARIA Cheguei em casa de manhã, aproveitei para passar na padaria para comprar algumas coisas para o café da manhã. Rodrigo só me permitiu sair, depois que viu que eu estava mais calma. Seu apoio junto ao de Kátia é tão fundamental para mim. Sempre serei eternamente grata pelas amizades que cultivo. Assim que cheguei no meu portão, liguei para Felipe abri-lo para mim. Demorou um tempo até que veio, mas veio com uma cara de cansado e toda amassada. No meio da calçada mesmo, ele me abraçou. — Tá bem? — Vou ficar. — Estamos do seu lado. — Obrigada, obrigada por ficar com a Malú. — Sempre. Comemos pizza ontem. Fomos entrando até a sala onde vi o sofá bagunçado. — Tudo bem, quem dormiu no sofá? — Eu, a última vez que eu deitei na sua cama, Miguel teve ataque de pelanca. — Não sei se ele volta, está muito feliz ao lado da sua noiva. — Ele não se lembrou de você, gatinha? — Seu rosto assumiu preocupação. — Não, não se lembrou de mim, nem da Malú. Não sei como vai ser para e
PEDRO Alguns dias antes... — Aída, por favor, as reuniões de hoje à tarde. Acabei de chegar de um almoço com um cliente um tanto chato. Algo que tenho que suportar, já que são eles que pagam meus honorários salgados. — Doutor, no período da tarde há apenas uma reunião com o doutor Tesaksi no final da tarde. E um rapaz ligou para o senhor. — Quem? — perguntei desabotoando o paletó e pendurando no aparador que fica atrás da minha mesa. Olhei para a minha bela vista e, diga-se de passagem, não deixa nada a desejar na localidade. Mamãe e papai fizeram um grande investimento na minha educação, sempre na melhor escola, os melhores tutores, faculdades internacionais, pós, doutorado. Infelizmente eles não estão mais aqui para contemplar a colheita de sua semeadura, mas eu prossigo, tentando deixar a minha marca. Estou quase nos meus quarenta e posso dizer com propriedade que meu escritório é um dos mais bem-sucedidos em todos os casos que se envolve. — Informou apenas o primeiro nome
ANA MARIA Atualmente... — O que você faz aqui a essa hora? — Posso entrar? A indecisão pairou sobre mim, mas o coração estava feliz por vê-lo, que decidi ceder. Assim que ele entrou, eu fechei o portão. Por causa do início da madrugada, fazia um vento frio. — O que o senhor quer? — Proferir essas palavras me doeu. — Eu fiquei sabendo que a sua filha está doente por sentir minha falta. Olhei espantada para ele. Quem contou? — Ela vai ficar bem, não precisava vir. Seu olhar me sondava frio, nenhum pouco do amor que ele dizia sentir por mim estava lá. — Posso vê-la? — Ela está dormindo agora, está melhorando. Não precisava se preocupar, vindo aqui a esse horário. Por algum tempo ele ficou me sondando em silêncio. Não queria me martirizar mais, tendo sua presença tão perto e não poder trocá-lo, beijá-lo, abraçá-lo. Vendo que ele não ia tomar nenhuma atitude eu abri novamente o portão. — Se o senhor me der licença, eu preciso dormir, para amanhã cuidar da minha filha. Ele pa