ThaylaSaí da casa onde estava hospedada sem olhar para trás, sentindo o peso da minha decisão nos ombros. Caminhei até um ponto de ônibus próximo dali, com o coração acelerado e a mente inquieta. A linha era intermunicipal, e quando finalmente desci na rodoviária, um alívio momentâneo percorreu meu corpo. Mas eu sabia que não poderia ficar ali por muito tempo. Se Gabriel descobrisse onde eu estava, poderia aparecer a qualquer momento. Não queria colocar Milena e Thierry em risco. Ou, até mesmo, arrumar problema para a mãe da Milena, que gentilmente me ajudou também. Eu sabia que Gabriel era capaz de tudo.Fiquei em uma pequena pousada próxima à rodoviária, um lugar simples e discreto, onde passei alguns dias tentando organizar meus pensamentos. A cada noite mal dormida, minha certeza aumentava: eu precisava desaparecer de verdade. Não bastava mudar de endereço, era necessário sair da cidade.Depois de um tempo, decidi ir para Rio das Flores. Esperei o suficiente para que parassem de
G4— Tá livre agora, Carioca? — Gonça voltou perguntando.— Agora tô. Bora lá conversar! — Meu pai responde, gesticulando com a cabeça em direção à sala da boca. — Você também, Gabriel!Ao entrar, tudo igual como sempre. Sentamos na cadeira, Gonça e eu acendemos um baseado, e meu pai serve um copo de uísque para cada um. É como um ritual nos segundos que antecedem as conversas que acontecem nessa sala.— Tu é de responsa mesmo, Gonça! Gosto de atitudes como as suas. É de gente assim que eu preciso no meu bonde, e é por isso que tu tem cargo de confiança!— Eu sou pelo certo, Carioca! Se a pessoa tá no erro, não é porque é minha mulher que eu vou fechar os olhos. Fez merda, vai ser cobrada!— É justo! — Falo, colocando meu copo em cima da mesa. — Mas quem garante que ela não vai fazer outra vez?— Eu garanto, G4! Se a Josiane sair da linha outra vez, não vai ser só esculacho e corte de cabelo, não. Eu mesmo passo ela sem dó, e ela sabe disso! — Gonça responde firme. Ele sempre foi o ti
Thayla— Quando você voltou, Thayla? Eu não fazia ideia de que você estava aqui! — Adriano se aproxima com um sorriso surpreso, mas antes que eu possa reagir, ele me puxa para um abraço apertado. Meu corpo enrijece, e ele percebe, mas não se afasta.— Eu só vim tirar uns dias, Adriano! Não vim para ficar! — Respondo, me desvencilhando devagar.— Por quê? Você tem que voltar pra cá, aquele lugar não é para você! Eu tava morrendo de saudade.— Realmente ficarei aqui só por poucos dias... — falo, baixinho.— Hum, entendi. E como anda a sua vida? — Ele segura meu rosto entre as mãos e deposita um beijo na minha bochecha. O gesto, tão íntimo e inesperado, me deixa desconfortável.— Vai indo... E a sua? — Tento disfarçar, afagando suas costas durante o abraço. Depois, sentamos no chão, um ao lado do outro, como tantas vezes antes.— O de sempre, né, Thayla? Trabalhando, estudando pra fazer um concurso público, uma diversão de vez em quando... Essa vidinha aqui de Rio das Flores, que você sa
MilenaA gravidez da Antonela, embora tenha pegado todos de surpresa, também foi uma notícia que trouxe alegria para todos. Para mim, então, mais ainda. Meu afilhado ou afilhada será uma pessoinha muito amada, principalmente por mim.Eu serei a madrinha, é claro. Antonela e eu falamos sobre isso desde que éramos muito novinhas. Fizemos um pacto: quando fôssemos mães, uma seria a madrinha do filho da outra. Agora, esse momento tinha chegado.Thierry conseguiu um novo emprego, e o cargo era melhor do que o que ele tinha no mercado. Além disso, ganharia mais. Mas o exame de DNA que ele e tio Carioca fariam em poucos dias estava o deixando aflito. A angústia que ele carregou a vida toda estava prestes a ter um ponto final.A caminho da rodoviária, o silêncio no carro era preenchido apenas pelo barulho do motor. Eu e ele estávamos indo nos despedir da Thayla, que havia tomado a decisão de se mudar para o Espírito Santo. Ela realmente não voltou atrás e, para evitar qualquer possibilidade d
G4 Quando o Leco me avisou que os soldados viram a Célia saindo da comunidade com muitas sacolas, a primeira coisa que veio à minha mente foi que tinha algo a ver com a Thayla. Não sou burrö, e a ordem que todos os soldados tinham era para cuidar de todos os passos da Célia e, em qualquer atitude suspeita, me avisar. E se ela estivesse indo ver a Thayla mesmo, seria a minha chance de falar com ela. E, sem pensar duas vezes, eu já tava pronto para agir. O Leco deu a ordem para um dos homens seguir a Célia e ir passando a localização, e, quando ele disse que o trajeto se aproximava da rodoviária, eu coloquei meu bonde na pista. Foi uma atitude muito arriscada, loucura total, eu sei, mas era minha única oportunidade de falar com ela. A possibilidade de nunca mais ver a Thayla não ia se tornar real. Não fui com a minha moto, fui com uma dos soldados, e vários deles me acompanhavam, tipo escolta de famoso, só que com motos discretas para não chamar atenção. Foi uma missão praticamente
Antonela Os dias vão passando, e com eles, um pouco da minha tristeza também. Ter meu bebê crescendo dentro de mim me dá uma força que eu jamais imaginei ter, e, mesmo o pai dele não estando comigo fisicamente, sinto que estará eternamente, seja espiritualmente, na minha lembrança, na saudade que sinto ou no fruto do nosso amor, que é o nosso filho. Decidi que ele vai nascer no Brasil. O apoio da minha família foi essencial para que eu tomasse essa decisão, e minha gestação corre com total paz e tranquilidade. Minha mãe e a Milena me acompanharam no primeiro exame pré-natal aqui no Brasil, e foi muito emocionante para nós três. Tia Rebeca, tia Dani e até mesmo a Rafaela já falaram que querem ir nos próximos exames, e eu sei que vai ser uma bagunça na clínica. Uma bagunça boa, é claro. Meu mundo agora é todinho azul. Sim, estou esperando um menino. Minha mãe e minha avó estão enlouquecidas comprando todo tipo de coisa para meu filho. Minha mãe aqui no Brasil e minha avó lá na
Thierry Eu sabia que o G4 não iria simplesmente aceitar numa boa a Thayla sair da vida dele sem ao menos os dois conversarem, principalmente se, dessa vez, ele realmente não fez nada errado. Então, fui pra Penha com a minha tia porque já sabia o que a esperava quando ela chegasse lá, pois, se eram os soldados dele indo mesmo para a rodoviária, G4 devia estar virado num capeta. Assim que estamos chegando em frente à lanchonete, uma moto gigante freia ao nosso lado, levantando poeira do chão. Era o G4, óbvio, nem precisava olhar para saber que era ele. — Onde ela tá? — Ele já desce da moto perguntando, visivelmente alterado. — Se acalma aí, G4! — Falei, colocando a mão no peito dele. — Pra onde ela foi, carälho? FALA, CÉLIA! — Ele se voltou para minha tia. — Já falei pra se acalmar! — Fiquei na frente dele porque ele já tava começando a gritar. Então, ele me olhou. — Vocês fizeram tudo pelas minhas costas, até a senhora, dona Célia! — Voltou a olhar para minha tia. — Mas me
Thierry Diante do postinho de saúde, estou parado há alguns minutos sem ter coragem de entrar. Tudo que eu sempre quis está a poucos metros de mim e, de repente, um medo idiotä tomou conta de mim. Afinal, se eu for filho do Carioca muda tudo, porque ser filho de um dos traficantes mais famosos do Brasil faz a vida de qualquer pessoa mudar em todos os sentidos. Mas não foi isso que eu desejei a vida toda? Não foi isso que eu sempre quis? Que tudo deixasse de ser apenas uma especulação e fosse esclarecido? Foi isso, sempre foi. Eu sempre quis confirmar ou descartar essa possível paternidade. Mas então, por que estou amedrontado assim? — Bora entrar lá? — A voz do Carioca me tira da viagem mental em que eu estava, sem nem ter fumado um baseado pra estar brisado assim. Eu nem percebi a chegada dele. — Vamos lá! — Respondi, e entramos. *** A sala onde eu sentaria para a coleta de material era pequena e com o barulho ar-condicionado se misturando com as vozes vindas do la