Nos olhos de Ravenna havia uma dor que eu conhecia bem: a dor de ter que partir e deixar a pessoa que ama para trás, abandonando os sonhos e os desejos. Eu conhecia aquela dor como ninguém, pois era dessa forma que me sentia quando vi seus olhos, dizendo que estava decepcionada comigo por tudo que eu tramara contra seu pai e pelo que ela disse contra metade da aldeia. Por minha ganância de viver uma vida melhor, coloquei a vida de muitos em perigo. Não sei como nunca me questionei sobre tal ato de Dante, já que, por onde ele passava, deixava um rastro de destruição. Acho que nunca conseguiria esquecer os olhos da minha filha; ela me odiava e eu era a culpada por aquele ódio. Eu o plantei em seu coração, eu o cultivei e não era justo com ela reclamar do quanto seu ódio por mim era grande, pois eu era a culpada.— Alfa Jonathan, cuide bem de todos. E, por favor, diga a ele que eu sinto muito que tudo tenha terminado assim. — E diga a ele que, mesmo que nossa história tenha acontecido da
A cena à minha frente era a mais triste que eu já tinha vivido. Não posso comparar com o dia em que Verbena aplicou uma dose de aconito em Tamara, fazendo-a cair no chão desacordada, mas a diferença em relação à cena à minha frente é que, em relação a Tamara, eu sentia medo; meu corpo inteiro tremia com a possível morte da minha companheira. Entretanto, ver Ian se debruçar sobre o corpo imóvel de Ravenna, chorando e pedindo para ela voltar para ele, estava partindo meu coração. Antes de Verbena morrer, ela nos garantiu que Ravenna viveria; ela praticamente gastou suas últimas energias para devolver a vida à sua filha.— Jonathan, procure algum curativo; preciso estancar esses sangramentos dela. — Ian se levantou com Ravenna em seus braços e a levou até a cama. Caminhei até a porta e vi meus pais, meu sogro e Tulio parado em uma pose como se estivesse preparado para lutar a qualquer momento.— Tulio, traga urgentemente tudo que servir para limpar e fechar ferimentos. — Eu estava tão ne
Ian e Ravenna fizeram um ótimo trabalho no quarto daquele esconderijo; ele estava digno de receber minha mulher e filha. Para um quarto que passou muito tempo fechado, não havia nem cheiro de poeira. Tudo estava bem limpinho. Ao lado da cama onde minha mulher estava, havia um bercinho de ferro pintado de rosa, e dentro dele estava a minha bonequinha. Maitê estava com os olhos abertos; ela não chorava, apenas observava o ambiente ao seu redor. Peguei minha menina nos braços, fui até minha companheira e beijei seus lábios.— Está na hora de acordar, meu amor. Precisamos de você aqui conosco — falei para Tamara ouvir. Levei minha pequena até seu tio. — Oi, titio! Olha como eu já estou espertinha! Estava procurando alguém para me tirar daquela prisão que vocês chamam de berço.— Oi! Princesa, titio veio aqui socorrer vocês. Posso pegá-la? — ele perguntou, com os olhos brilhando. Entreguei minha filha nos braços do tio.— Leve minha princesa lá para cima. Vou pegar minha mulher e seguir vo
Sabe a sensação de ser sufocado, mesmo estando respirando? Foi assim que me senti quando recebi a ligação de Jonathan pedindo para eu voltar ao quarto. Algo dentro de mim dizia que tudo iria dar errado no momento em que Ravenna pediu para Jonathan ficar no quarto, enquanto eu deveria descer para o esconderijo com Tamara e a filha deles. Ravenna havia demonstrado que não estava confiante com a parte do plano em que eu ficaria no quarto. Embora ela não estivesse errada, pois, se eu tivesse ficado no quarto, jamais deixaria que ela se colocasse em perigo, e era justamente isso que ela temia. Com o pouco tempo que passamos juntos, minha bruxinha já me conhecia muito melhor do que eu; ela sabia que eu me colocaria entre ela e qualquer coisa que colocasse sua vida em perigo.No momento em que desci a escada, meu coração já estava apertado. Eu queria ter tido, pelo menos, a chance de me despedir dela, mas desci a escada sem nem vê-la. Coloquei Tamara na cama, verifiquei os sinais dela e, dep
Como eu poderia responder às perguntas de Ravenna, sendo que eu tinha certeza de que nenhuma das minhas respostas a agradaria? Eu tinha medo de dizer a ela que sua mãe me ligou a ela e, graças a isso, ela estava viva. Mas também tinha receio de que ela se sentisse pressionada com tal ação e ficasse comigo por obrigação. Mesmo depois de ouvir tudo o que Jonathan falou e de ela ter dito que me amava, meu medo de ser rejeitado ou amado por obrigação ainda era grande em meu peito. Meu coração desejava um amor de entrega, uma pessoa que me amasse sem ter medo do que o futuro nos reservava. Por um bom tempo, eu achei que esse amor era Tamara; entretanto, os meses que passei ao lado da bruxinha mais encabulada do planeta abriram meus olhos para uma vida que eu não viveria se não a tivesse em minha vida. Nosso relacionamento não começou com um conto de fadas, onde eu passei meses tentando cortejar seu coração. Foi totalmente ao contrário: nós começamos tudo através do ódio, buscando saciar o
Escutei vozes ao meu redor e, com muita força, consegui abrir meus olhos. Eu estava em um quarto com um cheiro muito forte; minha mente estava em branco. Coloquei a mão em minha barriga, tentando sentir minha menina, e, ao perceber que minha barriga estava menor do que eu me lembrava, meu coração acelerou. Então, começou a passar um filme pela minha cabeça. Acordei Jonathan de madrugada; as contrações que eu começara a sentir pela manhã estavam piorando. Chacoalhei o corpo de Jonathan na intenção de fazê-lo acordar. Ele nunca teve sono pesado, mas, para contrariar todas as expectativas, no dia em que a dor estava quase me fazendo gritar e acordar a casa toda, foi na noite em que Jonathan dormiu parecendo não querer acordar.— Eu vou te matar, Jonathan! Como você pode continuar dormindo enquanto eu estou aqui morrendo de dor? — Levantei meu braço o mais alto que pude, fechei a mão em punho e soquei com toda a força o estômago de Jonathan.Ele pulou da cama, e eu tentei me sentar na cam
Após o filme dos meus últimos momentos passar por meus olhos e eu lembrar de tudo que aconteceu, para meu alívio, percebi que minha barriga estava menor, não porque eu tinha perdido minhas meninas, mas sim porque ela tinha vindo ao mundo. Eu queria vê-la novamente, queria poder pegá-la em meus braços, sentir o cheirinho da minha filha. Santa Deusa, era até difícil acreditar que no mundo já existia uma pessoinha que carregava um pouco do meu DNA e o de Jonathan. Maitê era o fruto do nosso amor, um amor que venceu todos os tipos de barreiras, e minha menininha era a prova viva de que o perdão poderia transformar vidas.— Jonathan? — Chamei o nome do homem que realizou o meu desejo de ser mãe. — Oi, meu amor. — Ele veio até a cama em que eu estava e beijou meus lábios. — Você gosta de me assustar, mocinha. — Passei muito tempo desacordada? — Ele sorriu e beijou minha mão. — Graças à deusa Selene que, dessa vez, foi menos do que nas outras. — Onde está nossa menina? — Tentei me se
Sempre achei incrível como o tempo passava rápido quando estávamos ao lado da pessoa amada. Minha bonequinha Maitê já estava fazendo um mês de vida e, como um belo pai babão que eu era, não queria me desgrudar dela por nenhum segundo do dia. Queria ficar ao seu lado, apreciando cada gesto novo que ela aprendia. Ainda que fossem poucos, era como se meu dia começasse apenas quando eu entrava em seu quarto e a via sugando os seios de sua mãe. Nós já estávamos morando em nossa casinha. No dia em que revelamos que iríamos voltar para nossa casa, foi o dia mais triste da alcateia; dava para ouvir de longe o choro da minha mãe, dizendo que queríamos separá-la de sua neta. O incrível de tudo isso é que nossa casa era praticamente colada à casa da alcateia; mesmo assim, para minha mãe, era como se nossa casa fosse no Japão.— Se você levar minha filha e minha neta para longe de mim, eu darei ordens ao seu pai para te deserdar. — Quem iria deserdá-la sou eu.— O que você não lembra, ou talvez f