Giulia
Dias atuaisMeu plano só ia até a parte em que eu o encontrava, e ponto final. Eu sabia que os meus sentimentos pelo babaca iriam aflorar. Gostaria muito de ser aquela pessoa que sabe bem como esconder o que sente ou que o olharia como um simples idiota que me abandonou do nada.Entretanto, estar no mesmo lugar que Dante era difícil. Todas as vezes que estivemos juntos vinham, a todo tempo, à minha cabeça, torturando-me e fazendo com que minha guarda, a casca dura que tentei formar em torno de mim, desse uma quebrada bem na hora que eu deveria ser a durona.Dante estava nervoso, era bem visível. O que era estranho e surpreendente para mim, pois eram poucas as vezes que o víamos tendo algum tipo de sentimento que não fosse arrogância ou raiva.Foque, Giulia. Não pode fraquejar. Não se envolva emocionalmente, fale o que veio falar, peça o mínimo de coisas e saia.— Por que está aqui vestindo isso? — ele finalmente disse algo, usando um tom enojado e raivoso. Bem, não era difícil odiar esse homem, bastava ele ser o Dante de sempre. — O quê...? Por quê...?— Não me deu muitas opções. — Tentei não o olhar, sentindo raiva, algo que eu estava tentando alimentar por todas as merdas que tinham acontecido comigo nos últimos meses. — Sabe quantas vezes tentei falar com você? — Ele franziu o cenho. — Os idiotas que o cercam sempre me expulsavam, sempre me mandavam embora com o rabo entre as pernas. E se eu não precisasse muito, se fosse só a minha cabeça em risco aqui, nunca que me sujeitaria a isso, nunca que voltaria a ver esse seu rosto.— Do que está falando? — Pareceu incrédulo. — Quando? Quem está com você e por que...?— Vou ser direta — eu o interrompi. — Preciso sair desta cidade; deste país, se possível. É só isso que vim pedir. Você me deve isso, pois é culpa sua.— Giulia...— Não quero ouvir nada que não seja sobre o que vim pedir — alertei-o.Por mais incrível que parecesse, ele demonstrava estar triste, nervoso e irritado. Tudo ao mesmo tempo. Ele tirou o seu blazer e o estendeu em minha direção.— Vista isso. — Dante não me olhou. Era como se não quisesse me ver praticamente nua com aquelas roupas vulgares que as garçonetes da boate vestiam.Hipocrisia, eu diria, pois aquele lugar fazia parte da rede de casas noturnas da sua família. E pensando em como ele me usou, não parecia que ele me respeitava o bastante.— Você vai me dizer exatamente o que está acontecendo, então vou resolver.Peguei a peça de roupa com tanta raiva, que poderia rasgá-la, mas até eu estava odiando a forma vulgar como estava vestida.— Olha, não quero mais do que pedi — novamente expliquei. — Se não tivesse entrado na minha vida e feito uma bagunça, meu pai não estaria tentando me botar no inferno. Não que eu esteja no céu agora.— Marcos? — Finalmente me olhou nos olhos. — Eu o procurei. Procurei por você...— Me poupe! — Revirei os olhos.Então Dante, surpreendendo-me da pior forma, avançou em mim, pondo-me contra a parede e me olhando nos olhos com raiva.Eu já o tinha visto furioso, só que nunca havia sentido tanto medo quanto naquele instante.— Olhe aqui, menina, eu não sou de brincar. — Eu diria algo bem irônico se minha língua não estivesse presa dentro da boca. Temia piorar a situação. — Cometi muitos erros, e uns sem volta. — Aos poucos a força que ele colocava para me pôr contra a parede foi se dissipando. — Muitos motivos me levaram a deixá-la naquele dia. Sofri para caralho. A única coisa que eu gostava, que eu queria, depois de anos nessa merda, tive que abrir mão.— Você me deixou para morrer — finalmente falei. — Achou que meu pai não descobriria? Ainda mais...— Eu não sabia que duraria tanto tempo. Não queria levá-la para o meio daquela merda. Eles queriam a minha cabeça e minha família precisava de mim.— Eu precisei de você — falei, furiosa. Estava quase perdendo as paredes que me protegiam dele.Senti uma angústia terrível, uma vontade de deixar as lágrimas, que achei terem acabado depois de tudo que já chorei, caírem.— Ele soube no dia que você se foi, que me deixou para trás.— Eu não queria isso. — Ele tentou me beijar, porém virei o rosto. — Precisei resolver esse problema. Eu voltaria para você, iria tirá-la daquela casa e você seria minha. Mas quando voltei, já não estava mais lá.Eu o olhei, incrédula, reunindo a raiva que tanto tinha dele por tudo que sofri naquela época. Empurrei-o para longe, achando ridículo ele me dizer tudo isso.— Quer saber por que fui embora? — Encarei seus olhos escuros com tanta raiva, que poderia bater nesse filho da mãe. — Você me deixou, mas ainda estava lá. Eu estava grávida. Uma hora ele descobriria, e eu sabia que me mataria por isso, por tê-lo traído.— O quê?! — ele disse, surpreso.— Então, não pude mais esconder dele. Ele me bateu o mais forte possível, achando que, assim, poderia matar aquela criança dentro de mim. Ele me levaria para uma clínica e a tiraria da minha barriga, então fugi.— O que você disse? — Enfureceu-se.— Foi o que ouviu. — Nem percebi que estava peitando Dante, que era mais alto e forte.Ele me fitou, quase incrédulo e raivoso. E eu não me importei, só queria jogar tudo para fora.— Ele ainda está atrás de mim. Não paro mais que uma semana em um lugar. Ele quer matar a minha filha porque você é o pai dela, e a mim, por ter me deitado com você. Ficou claro por que quero ir embora desta cidade?— Tenho uma filha?— Não se preocupe — respondi, irônica. — Depois que me tirar daqui, não vai ter que se preocupar com isso.— Por que não me procurou antes? — Sacudiu-me, furioso. — Eu tenho uma filha e não sabia.— Se não se lembra, você me deixou para trás, meu pai está me perseguindo e seus seguranças me queriam longe de você.— Onde está a criança?Ouvi-lo falar assim dela me deixou furiosa.— Faça o que estou pedindo. É só isso que quero.— Quer minha ajuda? — Dessa vez, ele parecia assustador. Seu olhar escureceu e meu braço estava até doendo, sentindo seus dedos apertarem a minha carne. — Você vai ter. Mas quero ver a menina. Vou levá-las para um lugar seguro.— O nome dela é Nina, e você não vai tocar na minha filha. — Soltei-me, puxando o braço.— A menina é minha filha, é meu sangue. Ninguém, muito menos Marcos, nem outro, vai machucar o meu sangue. Você pode me odiar pelo que fiz, mas ela é minha filha e eu tenho o direito de vê-la, de protegê-la.— Não precisa fazer essa performance de bom pai — ironizei. — No fim das contas, você só foi o cara com quem transei e que a concebeu.— Não. No fim das contas, sou o pai dela. E eu não vou ser como o meu, que me desprezou.— Está me dizendo que quer assumir a Nina? Não seja bobo.— Onde está a menina? — questionou de novo. — Vou levá-las para um lugar seguro.— Não existe um lugar seguro perto de você.DanteIsso não pode estar acontecendo, deve ser algum engano ou sonho louco.Giulia foi a única pessoa em toda a minha miserável vida que realmente amei. Amor era uma palavra forte para ser usada por mim. A última mulher que, algum dia, pôde me amar minimamente, morreu em um trágico acidente. A minha mãe não era de sangue. Essa era uma prostituta drogada que fez da minha existência, aos cinco anos de idade, um inferno.Nunca tive sorte para o amor ou uma família normal. Não que eu estivesse reclamando da minha vida com meus irmãos. Se não fosse por Paola, eu nunca teria uma família por quem lutar. Aquela mulher não me odiou por ser um bastardo do seu marido, ela me defendia e me amava. E era punida por isso. Meu pai era um tirano, filho da puta.Sempre disse a mim mesmo que nunca amaria ninguém, que eu não seria o escolhido e que alguém jamais me amaria de verdade. Então, em uma noite estrelada e fria, Giulia apareceu. Seus cabelos loiros estavam soltos e uma mecha caía sobre o seu ro
GiuliaA enorme casa de dois andares, piso escuro e detalhes em madeira era bonita, entretanto não deveríamos estar nela. Eu não queria dormir embaixo de um teto luxuoso, onde um Mitolli poderia entrar a qualquer momento.Dante sabia como mudar o jogo para o seu lado, e eu não seria a idiota de antes, que caiu no seu charme. O meu objetivo era me livrar dos homens que só me machucaram.Nina já estava mais quieta. Ela nem se importava mais com as mudanças de ares às quais era forçada graças à perseguição do meu pai.Nada era só "uma coisa" com esses mafiosos, sempre tiravam uma parte de nós. E, dessa vez, eu estava tentando mudar o rumo da minha vida. O melhor para a minha filha era ficar longe de Drakoy e dos homens que já tinham nos ferido.A noite foi longa. A menina de cabelos claros dormiu como um anjo ao meu lado, na grande cama macia de lençóis brancos.Assim que amanheceu, eu não sabia o que fazer. Não queria ficar mais do que meio segundo longe da minha filha. O medo me cercav
DanteNão consegui mais fechar os olhos e dormir depois da noite em que reencontrei Giulia. Saber que eu tinha uma filha era a coisa que mais me tirava o sono; não por ser um absurdo, mas por tudo que vinha com isso.Como se já não bastasse eu não fazer ideia de como um cara idiota como eu podia ser pai, vinha de brinde a ameaça de Marcos, que estava com seu orgulho ferido por conta disso.Estar perto delas me deixava estranhamente vulnerável, todavia eu precisaria demonstrar superioridade ao encarar aquele filho da mãe naquela noite. Vesti o meu melhor terno, pensando em toda a situação em que eu me encontrava desde a noite anterior. Giulia me odiava, com razão, e a criança em seus braços era o ser mais puro que eu já tinha visto na vida. Muitas vezes, eu já havia ficado com meus sobrinhos no colo, mas nunca imaginei que, em algum momento, seria a minha criança no meu colo. A responsabilidade de ser pai era uma das coisas que mais me botava medo, pois eu não sabia como fazer isso.
GiuliaMinha consciência repetia essa pergunta veementemente: "O que está fazendo, Giulia?". E eu não sabia como responder tão fácil. A única vez que achei estar certa foi naquele dia em que me vesti como uma vadia e pedi a ajuda dele. Só que eu não parava de pensar se essa foi a coisa certa a se fazer. Passei o dia andando de um lugar para o outro, tentando imaginar o que faria, como sairia dessa e como ficaríamos longe da cidade.Dante era um homem misterioso. O que era um charme lá no início, mas, no momento, era uma tortura. Deixar tudo em suas mãos não era nada legal. Ele fazia o que bem entendia, o que era bom para si mesmo, enquanto eu ficava naquela casa que mais parecia uma prisão particular, com uma garotinha minúscula nos braços, sem saber o que aconteceria com nossas vidas.A mulher que ele trouxe até que era simpática, mas me limitei a uma conversa superficial com ela e a me isolar em algum lugar da casa. Eu sabia que ali, eu não precisaria ficar sempre alerta em relação
DanteAs pessoas sempre vinham a mim em busca de ajuda, fosse meus irmãos ou os demais membros da organização. Mas, no momento, eu me via tentando buscar por essa ajuda, sem saber por onde começar. Não queria ser dramático, como se essa situação fosse a mais difícil da minha vida, mesmo parecendo ser. Era o meu maior desafio.Eu tinha certeza sobre os meus sentimentos por Giulia. Mesmo depois de meses longe dela, eu a amava. E em algum lugar daquele ser cheio de ódio por mim, eu sabia que ainda existia aquela paixão que sentíamos um pelo outro.Nunca tinha precisado correr atrás de uma mulher. Jamais havia existido motivos para isso. Contudo, naquele instante, eu tinha. E com ela, vinha a minha filha, que eu havia acabado de descobrir. A menina era uma mini cópia da mãe, mas, diferentemente dela, possuía olhos castanhos.Pegá-la nos braços foi mais difícil do que pensei que seria, pois assim que ela veio para mim, uma coisa muito estranha e sem explicação aconteceu. Eu nunca havia me
Giulia"Tome as rédeas da sua vida, Giulia", meu cérebro dizia. Só que fazer era bem mais difícil do que pensar. No entanto, quem desiste na praia é considerado fraco. E eu não iria desistir tão cedo.Ainda poderia me levantar da cama e pensar em algo que fosse além de olhar para o teto, esperando que meu super-herói Dante Mitolli salvasse o dia.Claro, isso também era difícil, pois eu não sabia o que fazer, nem por onde começar. Não queria ser uma medrosa do caralho que ficaria debaixo das asas do ex, entretanto, olhando para Nina, todo o conceito de coragem sumia. Ela era o meu raio de luz, a única coisa que me fazia ficar de pé, e precisava de mim para não se tornar uma segunda eu.Nina estava precisando de um ar livre, então levantei cedo. Ela já estava toda elétrica, esperando-me. Eu a peguei no meu colo e saí da casa. Dessa vez, com mais calma e claridade, consegui ver como era ao lado de fora. Tinha um enorme portão de ferro na entrada, uma fonte de água na frente, sem muita ve
Giulia— Gi!Abri os olhos e encarei Dante ao meu lado, na cama. Seu sorriso, que eu tanto amava, era como um "bom dia". Não importava a hora, ele estava lindo como na primeira vez que nos vimos. Claro, sem camisa era outra história. Suas tatuagens e algumas cicatrizes até eram atraentes.— Espera. O que está fazendo aqui? — questionei, sentando-me na cama, sem entender nada. — Você não tem permissão para se deitar na mesma cama que eu.— Foi você quem me pediu. — Usou aquele sorriso de canto, achando estranha a minha reação. — Não lembra?Abri os olhos, assustada. Olhando para o outro lado da cama King Size, vi que ele estava vazio. Eu não sabia se me sentia aliviada ou triste. Desde a conversa estranha com aquela mulher, eu vinha me questionando assim. Como se já não fosse ruim o bastante já estar pensando nisso antes da sua visita.Eu não deveria me deixar vencer por aquele sentimento persistente dentro de mim. Dante era um mentiroso de carteirinha e manipulador. Não tinha como eu
DanteNão era do meu agrado levá-las para longe de mim, entretanto era o mais seguro. Giulia estava presa, e eu sabia que isso não iria funcionar. Ela já estava vivendo assim por todo aquele tempo. Ser alguém sempre a impedindo de fazer o que queria só a afastaria de mim. Além do mais, eu sabia bem o que a tinha feito passar. Só esse fato era o suficiente para a fazer me odiar.Pelo menos consegui realizar um de seus sonhos. E era o melhor para a minha filha. Óbvio que eu nunca iria deixar de protegê-las ou de saber como estaria Nina, todavia, se eu queria ser o mais diferente possível do meu pai, teria que fazer o que fosse melhor para ela.Giulia estava desconfiada e se calou o caminho todo. O que foi estranho. Não queria chateá-la, então a deixei em paz.Essa estava sendo a coisa mais difícil que eu já tinha feito, sendo que já havia passado por muita merda.Foi difícil achar um lugar que fosse seguro para as duas, já que nossa família era conhecida no mundo todo, fosse por parceir