capítulo 6

Dante

Não consegui mais fechar os olhos e dormir depois da noite em que reencontrei Giulia. Saber que eu tinha uma filha era a coisa que mais me tirava o sono; não por ser um absurdo, mas por tudo que vinha com isso.

Como se já não bastasse eu não fazer ideia de como um cara idiota como eu podia ser pai, vinha de brinde a ameaça de Marcos, que estava com seu orgulho ferido por conta disso.

Estar perto delas me deixava estranhamente vulnerável, todavia eu precisaria demonstrar superioridade ao encarar aquele filho da mãe naquela noite.

Vesti o meu melhor terno, pensando em toda a situação em que eu me encontrava desde a noite anterior. Giulia me odiava, com razão, e a criança em seus braços era o ser mais puro que eu já tinha visto na vida.

Muitas vezes, eu já havia ficado com meus sobrinhos no colo, mas nunca imaginei que, em algum momento, seria a minha criança no meu colo. A responsabilidade de ser pai era uma das coisas que mais me botava medo, pois eu não sabia como fazer isso. Ser um assassino era mais fácil, assim como lidar com os negócios e ir atrás dos meus alvos.

Eu me via em frente à mulher que eu amava, mas que me odiava, com uma filha de cinco meses, dizendo que preferia ir embora a ficar e me deixar provar que eu seria diferente se ela me permitisse.

Eu não poderia obrigá-la a ficar. Pedir isso à Giulia seria de uma má-fé absurda. Eu não a merecia, essa era a verdade, só que não sabia se lidaria bem com o pensamento de que minha filha e a pessoa que eu amava estariam a milhas de distância de onde eu estivesse, vivendo suas vidas longe de mim.

— Olha quem está em casa — Lorenzo chegou pelas minhas costas, já me provocando.

Desde a última ligação não nos falávamos. Eu sabia que o imbecil iria me provocar, ainda mais naquele instante.

— Desculpa me meter em seja lá o que for, mas você deu uma sumida e ainda está de mistério, irmão. Tive que lidar com aquele filho da puta sozinho. Longe de mim dizer que preciso de você como minha babá, porém poderia ter me avisado que não compareceria à nossa pequena reunião exclusiva.

— Perdoe-me. — Depois que arrumei pela vigésima vez a gravata, saí da frente do espelho e o encarei, tentando ser minimamente tolerável. — Eu não quis faltar o meu compromisso, mas tive um imprevisto — limitei minha resposta.

— E a casa que você armou até os dentes tem a ver com isso? — Cruzou os braços, encostando-se na parede do quarto no qual eu odiava que as pessoas entrassem. — Olha, eu sei que você tem esse lance com o mistério, que já é adulto e tudo mais, mas somos família. Você poderia me dar algumas explicações aqui?

— Não — fui direto. — Como já disse, sou adulto. Sei resolver os meus problemas sozinho.

— O que está acontecendo? — insistiu. — Você está sempre firme, e agora te vejo agir estranho.

— Porra, Lorenzo! Dá para me deixar em paz? — quase berrei, irritado. — Tenho um compromisso.

— É a menina Santini, não é?

Como eu queria socar a cara desse idiota intrometido.

— É um assunto meu, fique longe.

— Certo. Mas saiba que você não tem que fazer isso sozinho, como sempre faz. — Compreensivo esse babaca. — Seja lá quem você vai matar, vê se não deixa pontas soltas, como na última vez. — Recostou-se da parede e saiu do meu quarto.

***

Eu estava chegando ao meu limite; tanto por estar estressado, quanto pela dor de cabeça com nome e sobrenome.

Marquei um encontro em um lugar já conhecido por todos os líderes das famílias com as quais trabalhávamos. Marcos era um dos mais bem-sucedidos, isso não era de se negar, mas era de carne e osso. Esse bastão poderia ser passado para outro, só dependeria do seu entendimento mais tarde.

Eu já tinha bebido duas doses bem generosas do melhor whisky do bar que era muito frequentado por homens de negócios que buscavam por discrição. E aquela era uma dessas ocasiões. Além do mais, eram os meus seguranças que faziam a guarda do lugar. Isso serviria de aviso e qualquer descontrole seria resolvido em dois segundos.

Marcos se atrasou de propósito, aumentando a minha ira. Ele caminhou vagarosamente até a mesa em que eu o esperava, usando de apoio a sua bengala, a qual ele ganhou depois de sua última investida muito mal executada.

Era nítido o nosso desgosto um pelo outro. Ele sabia do meu desejo pela sua filha e não tinha medo de demonstrar seu ódio por mim, mesmo ciente de que eu era o segundo na cadeia de comando da organização.

O homem magro, de cabelos grisalhos e olhos claros, sentou-se na minha frente sem me fazer um cumprimento formal. Encarou-me e, com um gesto, chamou o garçom que já estava de prontidão.

— Me traga o de sempre — disse ao funcionário assustado que nos serviria. — Então... A que devo a honra desse encontro? — questionou-me depois que ficamos a sós.

Seus homens estavam a quase dois metros de nós. Mas se eu fosse comparar, eles eram dois contra mais de quinze, e Marcos não era tão burro.

— Honra. É algo que você preza mais do que pelo seu próprio sangue — ironizei sem mover um músculo.

Nós nos encarávamos. O ódio era mútuo, ainda mais depois que descobri o que ele fez com Giulia. Minha raiva era tanta, que eu estava a ponto de matá-lo.

— Mas acho que podemos resolver isso da melhor forma — comentei.

— Você acha? — O garçom trouxe sua bebida e ele se limitou a se curvar para pegar o copo e beber um gole dela. Depois voltou a me olhar. — Penso que você me deve.

— Não devo nada a você. — Dei uma risada irônica. — Você, pelo contrário, deveria me agradecer por não estar morto agora.

— Achou a vadia que me traiu, não foi? — Devo confessar que ele era corajoso. — A vira-lata nos braços dela pode custar caro aos irmãos Mitolli.

Recostei-me da cadeira, aproximando-me dele. Ele recuou um pouco e os dois idiotas logo atrás ameaçaram sacar suas armas e vir até nós, entretanto foram barrados.

— Vou ser claro e direto, Santini. Se voltar a ameaçar a Giulia e a minha filha, vou pessoalmente matar você. — Deu para ver as veias na sua testa aparecerem. Ele apertou o copo com a bebida com tanta força, que achei que o partiria. — Não queria causar mais um burburinho matando você tão rápido. Algo que, com certeza, tenho vontade de fazer. Mas pouco me importa se iriam ou não suspeitar de mim. Faria isso sem pestanejar se, por um acaso, pensasse em machucar as duas. Me entendeu?

— Você pode ser um dos grandes, mas não é imortal.

— Pode crer que não sou, assim como você. E se quer uma briga com os Mitolli, posso lhe dar isso.

— Você é vira-lata como a bastardinha que saiu da minha filha. Não encha o peito para dizer que é um deles.

Antes de, simplesmente, eu dar um soco na fuça do idiota, dei uma leve risada de ódio. Todos no lugar olharam em nossa direção e eu me senti satisfeito ao ver o rosto do velho sangrar.

— Pode ter bolas para me desafiar, Marcos — falei ao seu ouvido, segurando-o pelo colarinho —, mas o seu rosto ainda é de carne. Posso arrancar sua cabeça e a deixar na praça principal da cidade como um aviso. — Soltei-o, deixando-o para trás.

Sabia que esse imbecil seria um problema, por isso deixei a ordem para o vigiarem vinte e quatro horas. Eu podia ser o pior homem do mundo, o mais idiota e não saber como era ser um pai, mas proteger os que importavam para mim era um papel que me cabia bem.

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