Dante
Não consegui mais fechar os olhos e dormir depois da noite em que reencontrei Giulia. Saber que eu tinha uma filha era a coisa que mais me tirava o sono; não por ser um absurdo, mas por tudo que vinha com isso.Como se já não bastasse eu não fazer ideia de como um cara idiota como eu podia ser pai, vinha de brinde a ameaça de Marcos, que estava com seu orgulho ferido por conta disso.Estar perto delas me deixava estranhamente vulnerável, todavia eu precisaria demonstrar superioridade ao encarar aquele filho da mãe naquela noite.Vesti o meu melhor terno, pensando em toda a situação em que eu me encontrava desde a noite anterior. Giulia me odiava, com razão, e a criança em seus braços era o ser mais puro que eu já tinha visto na vida.Muitas vezes, eu já havia ficado com meus sobrinhos no colo, mas nunca imaginei que, em algum momento, seria a minha criança no meu colo. A responsabilidade de ser pai era uma das coisas que mais me botava medo, pois eu não sabia como fazer isso. Ser um assassino era mais fácil, assim como lidar com os negócios e ir atrás dos meus alvos.Eu me via em frente à mulher que eu amava, mas que me odiava, com uma filha de cinco meses, dizendo que preferia ir embora a ficar e me deixar provar que eu seria diferente se ela me permitisse.Eu não poderia obrigá-la a ficar. Pedir isso à Giulia seria de uma má-fé absurda. Eu não a merecia, essa era a verdade, só que não sabia se lidaria bem com o pensamento de que minha filha e a pessoa que eu amava estariam a milhas de distância de onde eu estivesse, vivendo suas vidas longe de mim.— Olha quem está em casa — Lorenzo chegou pelas minhas costas, já me provocando.Desde a última ligação não nos falávamos. Eu sabia que o imbecil iria me provocar, ainda mais naquele instante.— Desculpa me meter em seja lá o que for, mas você deu uma sumida e ainda está de mistério, irmão. Tive que lidar com aquele filho da puta sozinho. Longe de mim dizer que preciso de você como minha babá, porém poderia ter me avisado que não compareceria à nossa pequena reunião exclusiva.— Perdoe-me. — Depois que arrumei pela vigésima vez a gravata, saí da frente do espelho e o encarei, tentando ser minimamente tolerável. — Eu não quis faltar o meu compromisso, mas tive um imprevisto — limitei minha resposta.— E a casa que você armou até os dentes tem a ver com isso? — Cruzou os braços, encostando-se na parede do quarto no qual eu odiava que as pessoas entrassem. — Olha, eu sei que você tem esse lance com o mistério, que já é adulto e tudo mais, mas somos família. Você poderia me dar algumas explicações aqui?— Não — fui direto. — Como já disse, sou adulto. Sei resolver os meus problemas sozinho.— O que está acontecendo? — insistiu. — Você está sempre firme, e agora te vejo agir estranho.— Porra, Lorenzo! Dá para me deixar em paz? — quase berrei, irritado. — Tenho um compromisso.— É a menina Santini, não é?Como eu queria socar a cara desse idiota intrometido.— É um assunto meu, fique longe.— Certo. Mas saiba que você não tem que fazer isso sozinho, como sempre faz. — Compreensivo esse babaca. — Seja lá quem você vai matar, vê se não deixa pontas soltas, como na última vez. — Recostou-se da parede e saiu do meu quarto.***Eu estava chegando ao meu limite; tanto por estar estressado, quanto pela dor de cabeça com nome e sobrenome.Marquei um encontro em um lugar já conhecido por todos os líderes das famílias com as quais trabalhávamos. Marcos era um dos mais bem-sucedidos, isso não era de se negar, mas era de carne e osso. Esse bastão poderia ser passado para outro, só dependeria do seu entendimento mais tarde.Eu já tinha bebido duas doses bem generosas do melhor whisky do bar que era muito frequentado por homens de negócios que buscavam por discrição. E aquela era uma dessas ocasiões. Além do mais, eram os meus seguranças que faziam a guarda do lugar. Isso serviria de aviso e qualquer descontrole seria resolvido em dois segundos.Marcos se atrasou de propósito, aumentando a minha ira. Ele caminhou vagarosamente até a mesa em que eu o esperava, usando de apoio a sua bengala, a qual ele ganhou depois de sua última investida muito mal executada.Era nítido o nosso desgosto um pelo outro. Ele sabia do meu desejo pela sua filha e não tinha medo de demonstrar seu ódio por mim, mesmo ciente de que eu era o segundo na cadeia de comando da organização.O homem magro, de cabelos grisalhos e olhos claros, sentou-se na minha frente sem me fazer um cumprimento formal. Encarou-me e, com um gesto, chamou o garçom que já estava de prontidão.— Me traga o de sempre — disse ao funcionário assustado que nos serviria. — Então... A que devo a honra desse encontro? — questionou-me depois que ficamos a sós.Seus homens estavam a quase dois metros de nós. Mas se eu fosse comparar, eles eram dois contra mais de quinze, e Marcos não era tão burro.— Honra. É algo que você preza mais do que pelo seu próprio sangue — ironizei sem mover um músculo.Nós nos encarávamos. O ódio era mútuo, ainda mais depois que descobri o que ele fez com Giulia. Minha raiva era tanta, que eu estava a ponto de matá-lo.— Mas acho que podemos resolver isso da melhor forma — comentei.— Você acha? — O garçom trouxe sua bebida e ele se limitou a se curvar para pegar o copo e beber um gole dela. Depois voltou a me olhar. — Penso que você me deve.— Não devo nada a você. — Dei uma risada irônica. — Você, pelo contrário, deveria me agradecer por não estar morto agora.— Achou a vadia que me traiu, não foi? — Devo confessar que ele era corajoso. — A vira-lata nos braços dela pode custar caro aos irmãos Mitolli.Recostei-me da cadeira, aproximando-me dele. Ele recuou um pouco e os dois idiotas logo atrás ameaçaram sacar suas armas e vir até nós, entretanto foram barrados.— Vou ser claro e direto, Santini. Se voltar a ameaçar a Giulia e a minha filha, vou pessoalmente matar você. — Deu para ver as veias na sua testa aparecerem. Ele apertou o copo com a bebida com tanta força, que achei que o partiria. — Não queria causar mais um burburinho matando você tão rápido. Algo que, com certeza, tenho vontade de fazer. Mas pouco me importa se iriam ou não suspeitar de mim. Faria isso sem pestanejar se, por um acaso, pensasse em machucar as duas. Me entendeu?— Você pode ser um dos grandes, mas não é imortal.— Pode crer que não sou, assim como você. E se quer uma briga com os Mitolli, posso lhe dar isso.— Você é vira-lata como a bastardinha que saiu da minha filha. Não encha o peito para dizer que é um deles.Antes de, simplesmente, eu dar um soco na fuça do idiota, dei uma leve risada de ódio. Todos no lugar olharam em nossa direção e eu me senti satisfeito ao ver o rosto do velho sangrar.— Pode ter bolas para me desafiar, Marcos — falei ao seu ouvido, segurando-o pelo colarinho —, mas o seu rosto ainda é de carne. Posso arrancar sua cabeça e a deixar na praça principal da cidade como um aviso. — Soltei-o, deixando-o para trás.Sabia que esse imbecil seria um problema, por isso deixei a ordem para o vigiarem vinte e quatro horas. Eu podia ser o pior homem do mundo, o mais idiota e não saber como era ser um pai, mas proteger os que importavam para mim era um papel que me cabia bem.GiuliaMinha consciência repetia essa pergunta veementemente: "O que está fazendo, Giulia?". E eu não sabia como responder tão fácil. A única vez que achei estar certa foi naquele dia em que me vesti como uma vadia e pedi a ajuda dele. Só que eu não parava de pensar se essa foi a coisa certa a se fazer. Passei o dia andando de um lugar para o outro, tentando imaginar o que faria, como sairia dessa e como ficaríamos longe da cidade.Dante era um homem misterioso. O que era um charme lá no início, mas, no momento, era uma tortura. Deixar tudo em suas mãos não era nada legal. Ele fazia o que bem entendia, o que era bom para si mesmo, enquanto eu ficava naquela casa que mais parecia uma prisão particular, com uma garotinha minúscula nos braços, sem saber o que aconteceria com nossas vidas.A mulher que ele trouxe até que era simpática, mas me limitei a uma conversa superficial com ela e a me isolar em algum lugar da casa. Eu sabia que ali, eu não precisaria ficar sempre alerta em relação
DanteAs pessoas sempre vinham a mim em busca de ajuda, fosse meus irmãos ou os demais membros da organização. Mas, no momento, eu me via tentando buscar por essa ajuda, sem saber por onde começar. Não queria ser dramático, como se essa situação fosse a mais difícil da minha vida, mesmo parecendo ser. Era o meu maior desafio.Eu tinha certeza sobre os meus sentimentos por Giulia. Mesmo depois de meses longe dela, eu a amava. E em algum lugar daquele ser cheio de ódio por mim, eu sabia que ainda existia aquela paixão que sentíamos um pelo outro.Nunca tinha precisado correr atrás de uma mulher. Jamais havia existido motivos para isso. Contudo, naquele instante, eu tinha. E com ela, vinha a minha filha, que eu havia acabado de descobrir. A menina era uma mini cópia da mãe, mas, diferentemente dela, possuía olhos castanhos.Pegá-la nos braços foi mais difícil do que pensei que seria, pois assim que ela veio para mim, uma coisa muito estranha e sem explicação aconteceu. Eu nunca havia me
Giulia"Tome as rédeas da sua vida, Giulia", meu cérebro dizia. Só que fazer era bem mais difícil do que pensar. No entanto, quem desiste na praia é considerado fraco. E eu não iria desistir tão cedo.Ainda poderia me levantar da cama e pensar em algo que fosse além de olhar para o teto, esperando que meu super-herói Dante Mitolli salvasse o dia.Claro, isso também era difícil, pois eu não sabia o que fazer, nem por onde começar. Não queria ser uma medrosa do caralho que ficaria debaixo das asas do ex, entretanto, olhando para Nina, todo o conceito de coragem sumia. Ela era o meu raio de luz, a única coisa que me fazia ficar de pé, e precisava de mim para não se tornar uma segunda eu.Nina estava precisando de um ar livre, então levantei cedo. Ela já estava toda elétrica, esperando-me. Eu a peguei no meu colo e saí da casa. Dessa vez, com mais calma e claridade, consegui ver como era ao lado de fora. Tinha um enorme portão de ferro na entrada, uma fonte de água na frente, sem muita ve
Giulia— Gi!Abri os olhos e encarei Dante ao meu lado, na cama. Seu sorriso, que eu tanto amava, era como um "bom dia". Não importava a hora, ele estava lindo como na primeira vez que nos vimos. Claro, sem camisa era outra história. Suas tatuagens e algumas cicatrizes até eram atraentes.— Espera. O que está fazendo aqui? — questionei, sentando-me na cama, sem entender nada. — Você não tem permissão para se deitar na mesma cama que eu.— Foi você quem me pediu. — Usou aquele sorriso de canto, achando estranha a minha reação. — Não lembra?Abri os olhos, assustada. Olhando para o outro lado da cama King Size, vi que ele estava vazio. Eu não sabia se me sentia aliviada ou triste. Desde a conversa estranha com aquela mulher, eu vinha me questionando assim. Como se já não fosse ruim o bastante já estar pensando nisso antes da sua visita.Eu não deveria me deixar vencer por aquele sentimento persistente dentro de mim. Dante era um mentiroso de carteirinha e manipulador. Não tinha como eu
DanteNão era do meu agrado levá-las para longe de mim, entretanto era o mais seguro. Giulia estava presa, e eu sabia que isso não iria funcionar. Ela já estava vivendo assim por todo aquele tempo. Ser alguém sempre a impedindo de fazer o que queria só a afastaria de mim. Além do mais, eu sabia bem o que a tinha feito passar. Só esse fato era o suficiente para a fazer me odiar.Pelo menos consegui realizar um de seus sonhos. E era o melhor para a minha filha. Óbvio que eu nunca iria deixar de protegê-las ou de saber como estaria Nina, todavia, se eu queria ser o mais diferente possível do meu pai, teria que fazer o que fosse melhor para ela.Giulia estava desconfiada e se calou o caminho todo. O que foi estranho. Não queria chateá-la, então a deixei em paz.Essa estava sendo a coisa mais difícil que eu já tinha feito, sendo que já havia passado por muita merda.Foi difícil achar um lugar que fosse seguro para as duas, já que nossa família era conhecida no mundo todo, fosse por parceir
GiuliaTudo estava começando a ficar complicado e confuso para mim. Eu sabia que seria difícil me manter serena quando finalmente nos reencontrássemos, mas nunca imaginei que seria tão difícil vê-lo sendo calmo e compreensivo. Pior, vê-lo sendo um pai para a Nina.Dante sempre deixou claro o que era: um homem frio que estava constantemente correndo para resolver as merdas que aconteciam na sua família. Eu deveria estar ciente disso, porém não conseguiria deixar o meu lado magoado tão cedo.Ele era problema com "P" maiúsculo e, ainda assim, eu me via olhando-o pela janela, esperando-o entrar com Nina, que estava começando a se acostumar com sua presença.Tudo estava pronto para a sua partida, enquanto nós ficaríamos ali, encarando o teto.Era o que você queria, Giulia. Foi o que pediu a ele.Lembrei-me do que aquela mulher disse. Dark não era uma pessoa nada confiável, no entanto suas palavras estavam me perturbando desde a sua visita. Pouco se sabia sobre ela. O que tínhamos de conhec
GiuliaEu não queria aceitar que estava sentindo tanta saudade daquele idiota, mas estava sim. Dante era um filho da puta traidor, egocêntrico e frio, porém tinha algo nele e no que vivemos que me fazia falta quando ele não estava por perto ou quando eu tinha uma certeza de que, em algum período do dia, ele estaria presente.Naqueles últimos dias em que estivemos juntos, ele foi um homem diferente, um cara que eu não conhecia. Pensei que Dante iria ignorar o fato de termos uma filha. Ele sempre dizia que nunca seria pai, e naquela época não me importei. Foi só quando descobri que ele tinha me deixado grávida, que pensei nessa frase milhares de vezes. Achei que ele me ajudaria simplesmente pelo passado ou pela responsabilidade das consequências do nosso curto período juntos.Todos poderiam dizer milhares de injúrias contra ele, e eu era uma dessas pessoas, só que ninguém poderia negar que ele não era um homem que não respeitava ou cumpria com a sua palavra.Todavia, depois do que ele m
DanteSempre me orgulhei de ser um homem que não se abalava por nada e que tinha um foco no trabalho que me ajudava a ser o melhor no que eu fazia, mas aquelas últimas três semanas só serviram para me mostrar que eu não era nada disso. Ser comparado a outros me irritava até certo ponto. Eu era humano e, constantemente, cometia erros. Contudo, nunca imaginei que estaria rendido por uma mulher e que meus pensamentos fossem roubados para onde Giulia e minha filha estivessem.Dizer em voz alta que eu tinha uma filha ainda era estranho. Nunca imaginei que isso poderia acontecer e não sabia como alguém tão minúscula e frágil poderia me fazer tanta falta.Não era como se eu fosse o homem mais normal e o melhor do mundo. Na verdade, muitos me consideravam um monstro; outros, como Giulia, um traidor. No passado, eu sempre disse que nunca passaria o meu DNA adiante, portanto não poderia imaginar que algo assim fosse acontecer. Não pensei que amaria uma mulher como eu amava a mãe da Nina. E ima