De manhã, eu fui informada que teria de acompanhar novamente a senhorita Génesis durante à refeição.
Eu estava sonolenta e com leves olheiras que me proporcionavam um ar de cansaço. As manchas avermelhadas na minha pele estavam camufladas com um cropped de gola alta e manga longa.
Mas, não era de todo um problema usar aquela peça. O dia amanhecera frio e o céu escuro ameaçava uma chuva fina.
Dirigi-me até a sala onde seria servido o desjejum, encontrando a movimentação das copeiras, e Génesis de pé a um canto, perto da janela, conversando com lady Armstrong. Quando a mais velha notou à minha presença murmurou-lhe algo, e de seguida fitou-me com uma expressão séria.
__ Bom-dia, miss Drumong. Está atrasada para o desjejum.
Eu olhei as senhoras terminando de ajeitar as xícaras de porcelana com o cenho franzido.
__ As copeiras ainda não terminaram de organizar a mesa.__ pontuei.
__ A senhorita também é uma funcionária, não deve achar que elas têm a obrigação de servi-la. Além do que, tem de auxiliar à sua educanda no que ela precisar.
Eu assenti apenas. As copeiras abandonaram a sala, deixando-nos a sós.
__ Eu as deixarei à vontade. Com licença.__ despediu-se com um suave menear de cabeça.
__ Bom-dia, senhorita Génesis.
Ela resmungou um "bom-dia" antes de ocupar o mesmo lugar que ocupou na noite retrasada.
Ajudei-a a servir-se e de seguida ocupei um lugar à mesa, que por acaso estava fartíssima com frutas e cereais. Quando é que eu iria imaginar que teria um café da manhã como esse à minha disposição?
Comiamos em silêncio. Eu encarava Génesis à espera de um pedido de desculpas ou alguma expressão que denotasse remorso, mas ela manteve-se em silêncio, por isso comecei:
__ Vejo que não está disposta a desculpar-se, então, desde já eu queria deixar bem claro que independentemente do que você faça ou diga eu vou continuar a trabalhar aqui até que o seu pai, a pessoa responsável pela minha contratação, decida romper com o contrato.
Ela largou os talheres e fitou-me com desinteresse.
__ Eu não sei do que a senhorita está falando.
Eu sorri sem humor.
__ Claro que sabe. Colocou pó de mico na minha cama.
Ela manteve-se em silêncio, fazendo questão de adotar uma expressão de enfado.
__ Eu sei que não gostou de mim, mas agradeceria se tivesse mais empatia e me respeitasse. Eu estou apenas aqui para fazer o meu trabalho.
Génesis arregalou os olhos e bufou irritada.
__ Eu posso tomar o meu pequeno almoço à vontade?
Eu deixei a xícara de café de lado.
__ Claro que sim, mas eu só quero deixar claro que não sou sua inimiga e não faço questão sê-lo, a única coisa que vai conseguir agindo desse modo é parecer uma garotinha insolente e malcriada.
A menina deu de ombros e cutucou a panqueca em seu prato.
__ Menina Génesis, seu pai ligara para avisar que dentro em breve estará de volta.
Lady Armstrong adentrou trazendo essa novidade. Indiferente, Génesis apenas assentiu.
__ Pretendo levar Génesis a um passeio após o pequeno almoço, lady Armstrong.
Declarei após saborear a deliciosa torta de hortelã com chocolate. A ideia tida de última hora pareceu chocar as duas.
__ Não creio que seja possível. Está serenando e amanhã à menina tem aulas, o mais lógico é que enteire-se acerca do conteúdo que tem visto.
Olho-a com o semblante fechado.
__ Creio que possamos fazer isso mais tarde. E quanto ao sereno podemos usar um guarda-chuva.
Lady Armstrong parece receber o meu comentário como uma afronta.
__ Por acaso está indo contra à minha ordem?__ sua voz soara gélida como um iceberg.
__ De modo algum, mas é que quando eu fui contratada para ser a babá da senhorita Génesis, Mr Greenford resaltara que não havia funcionários idóneos para tomar conta dela. E, em momento algum disse que as actividades a serem feitas durante o dia teriam de ser aprovadas por si.
Revido num tom suave, acompanhado de um sorriso petulante.
__ Se o Senhor Greenford proferiu tais palavras, quem sou eu para ir contra elas?
Ela lançou-me um olhar ameaçador antes de abandonar a sala.
Após findarmos o desjejum eu pedi ao chofer que nos levasse a dar uma volta pela região de Cotswolds. Não ficava muito longe da mansão que se escondia entre as árvores.
__ Eu espero que goste do nosso passeio.
Disse à Génesis enquanto ajeitava o seu cinto de segurança. Ela apenas sorriu e olhou para janela, embora estivesse contida, eu sabia que estava entusiasmada por poder abandonar a mansão por algumas horas.
__ Senhor Pierrez, por favor não se esqueça de avisar ao senhor Greenford sobre o nosso passeio, não quero um possível mal entendido.
Ele assente e gira a chave na ignição. O sereno continuava a cair, batendo suavemente sobre a vidraça do carro.
O nosso passeio começou em Castle Combe. No momento em que pisamos os pés na vila senti-me transportada para outra época, aquilo era muito diferente de Londres. Nada de correrias, nada de transportes ou de pessoas barulhentas.
Na vila havia um monumento do antigo mercado medieval, e perto podia ver a St. Andrew’s Church.
__ Esse lugar é muito encantador.__ Génesis confessou com um sorriso.
O Senhor Pierrez preferira ficar no carro. Eu segurava o guarda-chuva enquanto percorriamos as ruas do centro, admirando as construções de pedra reconhecidas como monumentos antigos.
__ Eu fico feliz por gostar.
Após o longo passeio nós almoçamos num restaurante charmoso de aspecto rústico.
Estávamos prestes a voltar para o carro quando uma idosa vendendo maças caramelisadas prendeu à minha atenção.
__ Vem Génesis.
Eu segurei à sua mão e puxei-a até a senhora de cabelos brancos como a neve, que vendia às suas maçãs movimentando de leve o quadril e assobiando uma velha canção que tocava no rádio.
__ Boa tarde, senhora!
Ela virou-se para nós as duas com um sorriso. Ajeitou os óculos em formato de coração e abaixou-se um pouco para apertar as bochechas de Génesis.
__ Boa tarde, senhoritas! Que menina mais adorável.
Génesis olhou para mim com um sorriso desconfortável. Eu dei de ombros e olhei para o carrinho, ficando logo com água na boca.
__ Eu adoro maçãs caramelisadas. Você alguma vez já provou?
Eu pergunto para a menina enquanto conto as moedas, torcendo para que seja o suficiente.
__ Eu nunca provei. O meu pai e lady Armstrong não me deixam comer doces, frituras e alimentos industrializados que contenham gorduras trans.
Eu arregalo levemente os olhos e de seguida encaro-a com um sorriso sorrateiro.
__ Então esse será o nosso segredo. Você promete guardá-lo?
Génesis retribuiu o meu sorriso e assentiu. Com um sorriso nos lábios, a idosa entregou-nos as maçãs.
__ Bom Apetite!
Ela desejou antes de virar-se para endereitar o rádio que começou a chiar ruidosamente.
Nos sentamos num banco de madeira, não nos importando com o facto de estar úmido.
__ Quero aproveitar esse momento para pedir a você uma trégua, não quero que me olhe de jeito nenhum como sua inimiga ou como uma ameaça. Eu não sou má.
Génesis olhou para mim com um pequeno sorriso.
__ Tudo bem, eu vou deixar de lado as partidas. Mas, isso não quer dizer que somos amigas, eu continuo não gostando de você.
Disse com os olhos semicerrados. Eu apenas assenti, para mim já era um grande passo dado.
Embora eu tivesse a plena noção de que Collin Greenford era o patriarca da mansão em que eu me encontrava, a mim ainda soara como uma grande novidade vê-lo adentrando pela porta principal. Ele mantinha o telefone em uma mão e na outra segurava a valise preta.O seu cabelo castanho escuro estava bagunçado, e no momento vestia um terno preto de três peças que o deixara bastante elegante, embora o nó da gravata estivesse desfeito e o colarinho desabotoado.__ Senhorita Tessa.Ele pronunciou o meu nome num tom surpreso. Guardou o telefone no bolso da sua calça e fitou-me com atenção.__ Boa-noite, senhor Greenford. É um prazer revê-lo.Afirmo com um sorriso polido.__ Senhorita Drumong?A voz de lady Armstrong soou bem atrás de mim. Eu virei-me para o lado, vendo-a caminhar até nós.__ Oh! Senhor Greenford, eu não sabia que já se encontrava em casa.Ela aproximou-se dele às pressas e recebeu à sua valise
Eu abandonei o quarto da senhorita Génesis com à sua frase martelando em minha cabeça, fiquei boquiaberta com o que dissera e não soube o que lhe responder no momento, restando-me apenas a opção de desejar-lhe um "boa-noite" pesaroso e retirar-me.__ Senhorita Drumong?Lady Armstrong chamou-me quando estava prestes a adentrar o quarto. Soltei um suspiro discretamente e virei-me para ela com um sorriso que não condizia com o meu estado de espírito.__ Deseja alguma coisa, senhora?Ela passou as mãos por cima do uniforme com cuidado, tentando não demonstrar a curiosidade avassaladora que parecia lhe entorpecer a alma.__ Nada de mais. Vi que acabara de sair do quarto de Génesis, ela já está dormindo?Eu fitei-a com o sobrecenho franzido.__ Não, ela está lendo um livro. Mas, creio que daqui a nada irá deitar-se. Porquê?Ela empinou o nariz de forma
Embora eu não fosse uma exímia apreciadora de matemática ou de qualquer outra área que envolvesse muito esforço mental, eu havia me dedicado para explicar sobre composição e decomposição de números naturais à menina Génesis, ainda tendo de carregar o fardo de ter as palavras de lady Armstrong ecoando pela minha cabeça.__ Então... Qual é mesmo a diferença entre a composição e a decomposição?Pergunto a ela como forma de revisarmos uma última vez e de afastar os sentimentos ruins que começava a nutrir por aquela mulher desagradável.__ A composição é a junção de dois ou mais elementos que quando unidos ou subtraídos formam um só e decomposição é quando decompomos em dois ou mais elementos um número natural.Fito-a com um sorriso.__ Muito bem, alguma dúvida relacionada a matéria?Ela repousa o queixo na palma da mão e nega com a cabeça.__ Se quiser pode tirar um
Um silêncio perturbador tomava conta da sala de jantar enquanto a copeira chegava com um prato de salada de folhas mistas, salpicadas de nozes, damascos e pedaços de salmão defumado.O Senhor Greenford ligara minutos atrás para avisar que não dormiria em casa, pois tivera uma viagem de última hora a Veneza. Pelos vistos as suas viagens de última hora são bem recorrentes já que não pareceu gerar surpresa aos empregados ou à sua filha.Eu entendo que ele é um homem muito ocupado e importante, algo que se reflete em suas vestimentas elegantes e moradia pomposa, mas seria bom se ele dedicasse também um pouco de tempo a filha. Mas quem sou eu, uma mera babá que acabara de chegar para opinar?__ O que acha de eu pegá-la amanhã, depois das suas aulas para irmos passear? Podemos ir ao shopping ou ao cinema.Génesis larga os talheres ruidosamente e fita-me com um grande sorriso, mas logo volta a conter-se e olha para o
Com os olhos semicerrados leio o título do livro que Génesis acabara de me entregar, no seu rosto havia uma expressão de divertimento.__ O que é isso?__ pergunto com a minha feição evidenciando a confusão que sentia.Génesis revira os olhos ainda mantendo o belo sorriso.__ É um livro, Tessa. Não é óbvio?Ela caminha até à sua cama e senta-se à beirada.__ Eu sei que é um livro, mas por quê está me oferecendo?Soltando um suspiro, ela bate com a palma da mão no espaço ao seu lado chamando-me para sentar ali.__ A Senhorita confidenciou-me que tem dificuldades para ler, por isso estou-lhe oferecendo esse livro, ele é bastante especial para mim. Foi minha avó materna quem mo ofereceu para me honrar pelo meu sétimo aniversário, nele havia uma bonita carta de despedida.__ assinalou ela com um brilho nos olhos.Eu franzi levemente os lábios, confusa.__ Carta de despedida?__ Quan
Eram quatro horas da tarde e um quarto quando Génesis chegou da escola, vestida com o uniforme de educação física e com o rosto denotando cansaço. Ela abriu um sorriso quando me viu à sua espera no foyer.__ Boa tarde, Tessa.O abraço que ganhei seguido do seu cumprimento deixou, não só a mim, como também lady Armstrong, que descia as escadas, boquiaberta, com a demonstração de afeto espontânea.__ Boa tarde, pequena pupila.__ sorri-lhe, retribuindo o abraço.__ Pelos vistos o dia na escola foi bom.Ela afastou-se com um sorriso no rosto.__ Tenho algo para lhe mostrar!__ exclamou entusiasmada.Com um leve pigarro, lady Armstrong fez-se notar, parada no último degrau da escadaria.__ Boa-tarde, menina Génesis.Sem um pingo de ânimo Génesis respondeu ao seu cumprimento:__ Boa-tarde, lady Armstrong.__e olhando-me de volta, inquiriu:_
Acordo num sobressalto, arfante, suado, com o coração aos pulos e um grito de terror entalado na garganta. Mais um pesadelo. Olho institivamente para o relógio de pêndulo sobre a cómoda, constatando que os ponteiros marcam três e meia da madrugada.Mais uma noite que possivelmente demorará muito para acabar.Parece que meu inconsciente fora condicionado com pesadelos desde a morte de Kendall. Desde que ela partira nunca mais consegui dormir plenamente, já que minhas tentativas são sempre frustradas pela chegada de um pesadelo em específico. Um terrível e doloroso pesadelo.Se eu fechar os olhos ainda consigo ouvir os seus gritos de agonia, o rosto pálido, os olhos azuis-safira mirando-me aterrorizados, eu conseguia ver o abismo neles.No sonho ela me chama de assassino.Não está de todo errada. Afinal, eu estava ciente das suas angústias, sabia que a depressão estava acabando com ela aos poucos, mas ainda assim não fiz nada para invert
Tessa estava parada perto da janela com o olhar distante e um sorriso discreto enfeitando-lhe o rosto, os seus dedos brincavam distraidamente com os fios da cortina de crochê.__ Tessa__ eu chamei com o cenho franzido, porém não obtive resposta.__ Tessa!Gritei, atraindo finalmente à sua atenção.__ Oi, desculpa, estava meio perdida.__ confessou o óbvio com um sorriso constragido.__ Eu percebi. No que tanto pensa? Se é que posso saber.Sento-me na cama e observo-a com atenção.__ Eu estou pensando na minha atuação de domingo, não sei o que hei de cantar.Ela senta-se do meu lado e repousa as mãos no colo.__ Eu ainda não consigo acreditar que meu pai consentiu para que eu fosse.Fito-a com um sorriso, mas arqueio levemente as sobrancelhas ao vê-la um pouco embaraçada e ruborizada. Dou de ombros e pergunto-lhe:__E