3 - Renegada

Meridian Water 

RENEGADA

A escuridão envolvia a sala de treinamento, onde eu estava sendo treinada para servir ao meu rei, Fondark Sweeney.

Meu olhar determinado mostrava o meu compromisso com o treinamento rigoroso que estava por vir. Ao meu redor, as sombras pareciam ganhar vida, dançando e ondulando como seres estranhos. Meu instrutor Tom me observava minuciosamente, cada passo que eu dava, cada golpe lançado, ele parecia estar sempre focado em mim e isso me deixava intrigada.

"Você deve aprender a caçar com precisão e eficiência", dizia com uma voz profunda e enigmática. "A sua missão é proteger o reino das ameaças que se escondem nas sombras. Este é o seu propósito como uma caçadora."

Eu apenas assenti, absorvendo suas palavras. Eu estava determinada a se provar digna desse papel e usar as minhas habilidades para proteger o reino, esse era o meu dever.

Afinal, eu era uma renegada. Não sabia de onde tinha vindo, não era um demônio e não me lembrava de nada do meu passado. Tudo que eu sabia era que o rei havia me pegado na sarjeta e me criado. Ele me deu um lar quando ninguém me quis por não saber a minha linhagem, eu lhe daria a minha lealdade.

Hoje seria o último dia do treinamento em que eu me provaria capaz de fazer parte da cavalaria a serviço do rei. Foi quando ele entrou que senti algo estremecer dentro de mim.

Todos o encararam, e um silêncio assustador se fez na sala de treinamento. O filho do líder dos magos estava ali. Sua pele era pálida e seus olhos eram negros, completamente negros, sem pupila. Era alto e seu corpo era imponente, coberto de uma autoridade assustadora.

Queria sair correndo daquela sala ao perceber que ele veio em minha direção, desde que começou o treinamento há dois anos, minha fama corria pelo reino de Umbra, não havia sequer um soldado que tivesse lutado comigo e vencido. Eu havia vencido até mesmo o instrutor e meu instinto rebelde às vezes era mal visto. Achavam que eu tinha que me curvar a eles porque eu era renegada, e eu não aceitava. Fui criada por eles, um deles eu era. Logo não me curvaria a ninguém.

Seu olhar me penetrou, sua expressão dura me observando quando seus passos quebraram a distância entre nós. Ergui a cabeça. Ele não me metia medo, embora sua presença fosse autoritária sobre mim, não recuei.

“Quero lutar com você.” Disse com suas mãos atrás do corpo e seu olhar direcionado ao meu.

“Seu pedido é uma ordem.” Me coloquei em posição de defesa.

Se fosse o que ele queria, ele teria.

O treino começou com passos calculados, um círculo perigoso onde nossas habilidades se mediam a cada movimento. Ele avançava com rapidez felina, os pés tocando o chão com uma leveza que parecia impossível para alguém de sua estatura. Eu desviava do primeiro golpe, inclinando o corpo para trás, sentindo o deslocamento de ar próximo ao meu rosto, mas não me dava ao luxo de hesitar. Contra-ataque. Um chute rápido para desestabilizá-lo, que ele defendeu com facilidade, girando o corpo como se fosse parte de uma coreografia ensaiada.

Seus movimentos eram silenciosos e mortais, revelando sua destreza e talento natural.

Mas não me colocaram em posição de inferioridade, porque parecíamos estar em uma dança sincronizada onde não havia perdedores.

Seus olhos, de um brilho intenso, estavam fixos nos meus, ardendo com uma concentração que fazia cada pequeno movimento meu parecer exposto. Ele estava me estudando. Não, dissecando. Meu próximo golpe, um soco rápido com a mão direita, foi bloqueado, mas, em vez de recuar, eu usei o impulso para girar o corpo, tentando acertar com o cotovelo. Ele esquivou-se por um triz, o olhar ainda cravado em mim. Meu coração batia em um ritmo frenético, mas não de medo — era algo mais. Algo que eu não tinha tempo de decifrar.

Em seguida, passamos para a luta com armas. Empunhei uma espada negra onde uma lua decorava seu cabo, era o símbolo do colar que eu nunca retirara do pescoço, a única coisa que viera comigo e que mesmo não sabendo de sua história permanecia. Balancei a lâmina com sagacidade, cortando o ar com velocidade e ferocidade, meus golpes eram certeiros, demonstrando minha habilidade e capacidade como caçadora. Ele parecia estar atento a cada movimento meu, e embora não parecesse estar pegando leve, eu sentia seu olhar sob mim. Me estudando.

Nossas lâminas se encontraram com um som cortante, faíscas saltando no impacto. Os lábios do príncipe se curvaram em algo que poderia ser um sorriso – ou uma provocação.

Os olhos dele não me deixavam. Mesmo enquanto desviava dos meus ataques ou contra- atacava com golpes rápidos e precisos, eles permaneciam fixos nos meus, intensos e penetrantes. Era quase sufocante, mas eu não podia desviar o olhar. Não enquanto ele me enfrentava com essa intensidade.

Meu treinamento foi mais intenso do que qualquer outro. Por ser dita como inferior, treinei dia e noite para mostrar o contrário, aprendi todos os treinamentos possíveis com corpo e com armas, aprendi também a rastrear e a perseguir minhas presas com astúcia.

Me camuflava nas sombras como se elas de fato fossem minha casa, me tornando silenciosa e invisível. Mostrei ser mais do que capaz de servir a cavalaria real caçando diversas criaturas, desde demônios rebeldes a seres diversos que ameaçavam nossa existência.

Eu sabia que podia vencer. A sala de treinamento estava repleta de tensão e energia concentrada. Os golpes trocados entre nós dois eram poderosos e implacáveis, cada um lutando com todas as suas habilidades.

A luta foi dada como encerrada quando nós dois utilizamos de um golpe em que nos colocou no chão, a ponta da minha lâmina em seu pescoço enquanto a ponta da sua em ponto mortal na minha barriga. Não ofegamos ou mostramos qualquer sentimento além de desafio, mas eu podia sentir meu corpo formigar com a proximidade.

Me levantei, me distanciando para que ele pudesse se levantar também. Então apenas assenti como era o correto a se fazer. Ele era da realeza. O príncipe do reino de Umbra havia lutado comigo. Eu podia ouvir os burburinhos com a minha audição aguçada, podia ouvir os deboches e um sorriso de canto brincou em meus lábios. Poderia ser qualquer um, mas era eu. Era eu ali, porque eu era a única mais capacitada para tal combate e ainda assim eles me reduziam a uma mera renegada. Eu provaria o contrário.

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