5 - Um quarto para dois

Meridian Water 

UM QUARTO PARA DOIS

Hoje o príncipe Sweeney estaria no lado leste de Umbra, onde veria como está a região e se os guardiões estão cumprindo com o seu dever. O trajeto seria feito pela carruagem real, onde pararemos em pelo menos três regiões para descansar, pois seriam três dias de viagem.

Eu já estava servindo como sua protetora há um mês, e estar em constante movimento como sua sombra não estava sendo difícil, porque hoje seria a primeira vez em que ele de fato dormiria fora da casa real. Eu havia estudado todos os pontos onde pararíamos, avaliando cada ponto de fuga necessário para o caso de um ataque de desordeiros.

Demônios rebeldes que não respeitavam a realeza.

Realizei as minhas necessidades básicas e coloquei uma calça de couro juntamente com um cropped, adicionando minha adaga à cintura, e mais outras duas adagas pequenas dentro da bota também de couro que ia até o meu joelho. Prendi meu cabelo em um rabo de cavalo e segui para fora, sabendo que os serviçais se encarregaram de levar a minha mala para a carruagem.

Quando cheguei ao lado de fora, me coloquei ao lado dos soldados da cavalaria real como a primeira de uma fila lateral, à espera do príncipe. Foram dez minutos de espera até que ele estivesse na escadaria ao lado de seu pai, que parecia estar falando algo.

“Sabe o que precisa ser feito, não sabe?” Minha audição aguçada me permitiu ouvir.

Disfarcei.

“Sim, eu sei.” Ele respondeu sem sequer mexer a boca, apenas grunhiu.

“Não me decepcione, filho.” O rei disse.

Então pararam de conversar, meus instintos me disseram que havia mais. Eu queria saber do que estavam falando, simples frases me deixaram intrigada. Mas logo esqueci o que estava pensando quando reparei automaticamente no príncipe. Ele vestia um terno, sua blusa social de dentro com os botões iniciais abertos davam ao início de uma runa que eu quis saber o significado. Desviei o olhar afastando o pensamento depravado em minha mente, não foi só a runa que eu quis ver quando o imaginei sem camisa. Ele era o príncipe, eu era uma renegada, embora sua protetora isso nos colocasse em patamares distintos, logo não poderia acontecer. Ele só poderia se relacionar com um mago de sangue puro.

Ele passou adiante de nós, e com um rápido aceno para seu pai, entrou na carruagem.

Entrei após ele, sentado à sua frente. Como sua protetora, eu tinha que ser sua sombra e estar onde ele estivesse. Algo me dizia bem lá, no fundo, que isso poderia ser um problema. A carruagem seguiu sendo seguida por uma dianteira e outra traseira.

Enquanto percorremos o trajeto para o destino, eu observava cada rosto e movimento ao lado de fora, sempre em alerta.

O primeiro horário foi de repleto silêncio, não tínhamos o que conversar, não havia palavras a ser dita. O dia foi se esvaindo, o tempo passando. Escolhemos trajetos menos movimentados para evitar alvoroço. E ao passo em que a carruagem andava, eu sentia seu olhar sobre mim. Ele parecia continuar me observando, seus olhos negros pareciam hesitantes, mas eu sabia que ele estava ali. Me analisando. Sua expressão carregava palavras não ditas e isso me incomodava. Me intrigava. Ele era o príncipe. Poderia perguntar o que quisesse e eu seria obrigada a responder. Mas na minha vida não havia nada de interessante que alimentasse a curiosidade algumas vezes estampadas em seu olhar.

Após horas de viagem, já com a lua caindo sob o céu estrelado, nos aproximamos de uma das pousadas em que ficaríamos. Era uma cidade pequena, a carruagem parou em frente e eu desci primeiro para averiguar o território. Havia pouquíssima movimentação e com os soldados se posicionando em pontos estratégicos, os olhares curiosos reconheceram a presença da realeza e sussurros se espalharam pelo local. Mantive-me alerta, ignorando os burburinhos ofensivos a mim e avaliando rapidamente que o ambiente estava seguro para o príncipe. Assim que terminei, abri a porta da carruagem para que ele pudesse descer.

O príncipe desceu e seguimos comigo sempre ao seu encalço para dentro da pousada.

“Oh, que honra tê-lo em nossa pousada, majestade!” O tom de ironia e luxúria era evidente na voz da mulher que nos recepcionou. A encarei com um sorriso de canto.

“Queremos todos os quartos.” Fui eu quem me direcionei a ela, com uma voz firme e autoritária.

“Vossa majestade gostaria de ficar com a suíte?” Ela perguntou me ignorando e se referindo ao príncipe.

“Se me desrespeitar novamente, não vou poupar o príncipe de ver um espetáculo sanguinário feito exclusivamente por mim esta noite.” O tom em minha voz foi mais ameaçadora do que sombria.

Eu a vi estremecer e seu olhar voltou-se para mim com cautela.

“Todos os quartos?” Ela perguntou com certo deboche na voz.

“Você não é surda.” Respondi com um sorriso irônico nos lábios e apoiei o cotovelo no balcão da recepção.

“Receio que não possa atender ao seu pedido, alguns dos nossos quartos estão ocupados.” Ela disse desviando o olhar do meu e o baixando.

“Há mais pousadas na cidade.” Suspirei. “Este é o príncipe. Quero todos os quartos, mas vou te dar algumas horas para isso. Me dê a chave da suíte, quando eu descer novamente, quero ver todos da cavalaria devidamente alocada.”

Ela apenas assentiu, me dando a chave da suíte. Encarei o príncipe que nada disse, agindo apenas como mero telespectador. Seguimos para o último andar da pousada, onde ficava a suíte. Abri a porta e entrei primeiro, para verificar o quarto enquanto outro soldado ficava ao lado de fora juntamente com o príncipe. Acenei para que o príncipe pudesse entrar já que estava seguro.

Ele entrou e fechou a porta atrás de si, deixando o soldado ao lado de fora e apenas nós dois dentro do quarto. Aquele pensamento me socou o estômago, e me limitei a pensar que havia mais gente, mesmo que não ali dentro. Por isso não precisava temer. E o que eu estava temendo? Suspirei ignorando o devaneio.

Abri a segunda porta encarando o banheiro.

“Este é o banheiro, Majestade.” Falei o encarando. “O Senhor irá se aprontar agora para comer alguma coisa ou prefere descansar?” Perguntei.

“Gostaria de descansar.” Ele respondeu. Sua voz baixa e rouca me causou arrepios. Eu não estava acostumada a escutá-lo e seu tom não era tão imponente ali.

“Posso pedir alguma coisa para comer aqui?” Perguntei.

“Sim, pode.” Ele disse retirando o terno e desabotoando a camisa.

“Ok. Dormirei aqui esta noite. Tem consciência disso, certo?” Perguntei desviando o olhar de seu peito quase nu.

“Sim, tenho.” Ele respondeu de forma metódica, quase automática. Me fazendo arquear uma das sobrancelhas em resposta para ninguém em específico.

Fui até a porta e abri, pedindo ao soldado que fosse em busca de algo para comermos, ele prontamente obedeceu. Uma batida na porta dez minutos depois revelou nossas malas e um carrinho com a janta. Autorizei a entrada dos dois, enquanto o príncipe se encaminhava ao banho agora que suas coisas haviam chegado.

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