Capítulo 4

Eu não sei o que houve mais o carro já tinha saído a muito tempo da igreja e estacionava a mansão Johan.

Era um dia chuvoso. Os jardins já estavam cheios de lama mas mesmo assim eu abri a porta e saí do carro. Saí pisando mesmo com os pé descalços, pisava duro consequentemente espalhando lama sobre o trapo que ainda restava do vestido branco.

Em um certo ponto meus olhos se encheram de água e sem querer tropecei em meu pés caindo com tudo ao mar de lama. Sujei meu corpo por completo, mãos, pernas, cara. Eu estava no lixo.

Reuni forças e me levantei recolhendo a mínima dignidade que ainda me restava.

Eu me sentia o demônio de tanta raiva que me sugava, eu precisava de explicações, eu precisava ouvir de sua boca que era tudo engano, ele só tinha brincado comigo.

Era esse mantra que reinava em minha cabeça, Rickson jamais me faria mal, ele me amava. É claro que amava.

Abri a porta enorme da mansão como um estrondo. A primeira pessoa que vi foi Geane, estava com sua taça de champanhe, em frente a lareira com seu belo vestido de festa da cor negra. Bem harmônico com meu estado.

Ela fitou meu corpo por inteiro, passeou dos pés a cabeça e a gargalhada que soltou em seguida, me fez chorar a ainda mais.

Eu queria sumir, fugir para bem longe desse lugar, nunca mais olhar para a cara dessa infeliz.

Tanto que me me humilhou, que me desprezou. Eu sofro desde pequena nas mãos dela, quando ninguém estava vendo ela me batia e me maltratava das piores formas.

Conseguiu o que queria, me destruiu.

Subi correndo as escadas em direção ao quarto do meu ex futuro marido.

Queria me perder em seus braços, queria ouvir suas palavras doces em meu ouvido novamente. Que ele me abraçasse e dissesse que estava tudo bem, que tudo foi um engano e que simplesmente se atrasou.

Por dentro eu queria que fosse isso, mas a verdade é que eu só estava me enganando.

Cheguei a sua porta e abri com tudo botando um sorriso em meus lábios, mas a cena que vi a seguida dilacerou ainda mais meu coração.

Ele estava aos beijos, passeando a mão em toda parte, se acabando nos amassos com aquela prima de meses atrás que estava no dia em que me pediu em casamento.

-Rick. Sussurrei quase sem fala.

Ele levou um susto afastando a mulher de cabelos negros quase iguais aos meus.

-Iara.

Fitei sua boca borrada, a ânsia de vomito subiu na hora. Mas ainda bem que consegui me controlar, já tinha passado vergonha demais por hoje.

Agora eu só queria que me dissesse o porque me ludibriou se nos tratávamos como irmãos, se crescemos e descobrimos o amor juntos.

Bom, acho que descobri sozinha.

Falou algo no ouvido da morena e ela saiu andando, bufou me metralhando com os olhos. Esbarrou em meu ombro, jogou os cabelos para trás e se foi brilhantemente linda e superior.

-Eu posso explicar.

-Eu não preciso de explicações se você acabou de me mostrar o que eu cega, não via.

Tentei segurar o choro mas era quase impossível.

-Eu só quero que me diga o porque de esperar até o dia do casamento. Porque não me disse antes que não me queria, porque fez isso comigo?

-Amor, eu perdi a hora...

Ele vem para chegar perto de mim mas dou alguns passos para trás o evitando.

-Não me chama de amor! Grito soltando todo o ódio em mim. -Você foi um cretino! Eu ouvi seu canalha. Eu escutei na igreja algumas pessoas rindo e debochando da minha cara dizendo que foi tudo armação.

Começo a andar ao piso de madeira com as mãos enfiadas no cabelo.

-O pedido, a declaração, todo o seu amor, era mentira.

-Iara, minha sereia.

-Chega! Para de falsidade Rickson Johan.

Vou para cima dele, chego em seu corpo e começo a socar seu peito com toda a força.

-Você não vale nada, é um falso, um imoral!

-E você?

Segura minhas mãos travando minhas investidas. Seu rosto ganha um outro semblante, um que eu nunca tinha visto antes. Um olhar negro que me mira com raiva, muito ódio, mostrando o lado que eu não conhecia. O seu lado ruim.

-Você é uma safada que se insinuou o tempo todo para mim. Não tem escrúpulos. É uma sem vergonha.

-O que... Sussurro incrédula.

-Isso mesmo que você ouviu. Eu sempre te achei chata e pegajosa, uma mala sem alça que arrumei como irmã, mas aí você cresceu. Se tornou uma delicinha de mulher. Ganhou forma e corpo, eu já não te via como minha garotinha, mas sim como uma gostosa de um corpo saboroso que eu iria provar até quando me enjoasse.

Inclina a face me olhando torto.

-E olha só que engraçado! Eu enjoei.

Meus olhos lacrimejam com suas palavras duras e sem pensar muito cuspi com tudo em sua cara, e lhe presenteei com um belo tapa.

Fechou os olhos descrente no que tinha acabado de acontecer.

Meu corpo todo tremeu. A adrenalina escorria em minha veia esquentando minha alma. Mas em fração de segundos ele se virou bruscamente e devolveu o tapa mil vezes mais forte.

Meu corpo voou ao chão. Caí batendo a cabeça com tudo na quina da cama de Rickson.

Gemi, gemi sentindo o sangue quente descer na lateral de minha cabeça. Nunca pensei que seria capaz de algum dia fazer isso comigo. Cadê o Rickson bondoso que cresci junto? Cadê aquele que disse que me amava?

-Sua cadela. Rosnou se abaixando.

Pegou meus cabelos negros na mão e com a outra segurou meu rosto com extrema força.

-Quem você pensa que é para me desafiar sua ninfeta?

Quando iria gritar pela dor imposta ao meu corpo ele põe a mão em minha boca me impedindo.

-Nem um pio ou sua mãe morre, está ouvindo?

Assustada assenti com a cabeça.

-Para que, eu iria me casar com alguem que nunca vai me levar a lugar nenhum?

Meus olhos encheram d'gua.

-O que foi? Pensou que eu iria me casar com alguém tão inferior a mim?

Ri com desdém.

-Ah que peninha Iara, você foi muito boa na cama, é bem apertadinha, a melhor que eu já tomei como minha. Mas para casar...

Maneia a cabeça pensativo.

-Não. Você nunca irá servir como esposa, e sabe porque?

Fecho os olhos por alguns instantes sentindo suas palavras rasgarem meu peito. Tanto que eu sonhei com a gente, que fiz planos pro nosso futuro. Eu pensei que seria diferente, que construiríamos nossa família, mas não, ele não é quem eu pensei que fosse.

-Não precisa me olhar assim assustada, eu respondo.

Beija a ponta de meu nariz.

-Porque é filha de empregada. Beija minha testa. -Porque é uma falida. Beija minha bochecha. -Porque não passa de uma interesseira imoral.

Pausa me fitando frio.

-Uma pobre órfã.

Mordo sua pele o fazendo grunhir de dor. Tira a mão rapidamente olhando a marca que fiz.

-Nunca mais fale do meu pai!

Rosno aos olhos em chamas.

Ninguém pode falar dele, nunca. Meu falecido pai, ficou muito pouco tempo comigo. Mal tenho lembranças dele. Infelizmente se foi quando eu tinha acabado de completar meus três anos.

Minha mãe disse que morreu em um assalto, não valia muita coisa, era bandido, mas me amava e honrava minha mãe, éramos únicas e especiais para ele, e eu acredito no amor que ela disse que sentia por nós. O amarei para sempre.

-Sua...

Quando se preparava para meter um soco potente em meu rosto, sua mãe aparece dentro de seu robe de seda caro o olhando com desaprovação.

-Menino, eu disse para se livrar dessa garota, mas não te ensinei a levantar a mão para uma mulher. Fala firme.

-Saia de casa e dê uma volta para espairecer a cabeça.

-Sim senhora. Ele me j**a um último olhar e sai emburrado por não ter terminado o que começou.

-E você garota? O que ainda faz aqui, não foi o suficiente toda a humilhação na igreja, ter feito papel de idiota?!

Desce o olhar ao meu rosto banhado de tantas lágrimas e sofrimentos que seu filho me fez passar.

-Não se enxerga? Você não tem mais nada o que fazer aqui. Chispa da minha casa. Você não é, e nunca será uma Johan.

Diz como se eu fosse um de seus cães pulguentos, ou um trapo qualquer.

Fico a olhando sem fala.

-Não está ouvindo? Agora!!!

Grita e imediatamente meu corpo se encolhe.

Nunca fui tão desprezada e humilhada, o meu amor de infância, o cara que eu sempre fui apaixonada, me enganou. Nunca sentiu o mesmo por mim.

Todas as palavras, todos os gestos de afeto eram mentiras. As promessas que fizemos um ao outro, o nosso futuro... Como fui burra, como não enxerguei que um homem rico, um rapaz que poderia ter todas que quisesse, se interessaria por uma pobre menina de família falida, sonhadora e extremamente carente.

Desci correndo as escadas e fui direto para o quartinho de empregada que eu dividia com minha mãe. Abri uma malinha pequena e comecei a jogar tudo dentro. Meus vestidos que minha mãe costurou para mim, os livros todos da faculdade que eu iniciaria no próximo mês arcada pelo senhor Johan, e um dinheirinho pouco que havia sobrado.

Me abaixei pegando a mala em mãos.

Saí do quarto dilacerada, olhei todos os cantos da casa tentando não esquecer de me lembrar de esquecer todos os cantos desse lugar.

Andei desnorteada pelos jardins da mansão Johan, sentirei saudades daqui, dos empregados, das conversas, das festas chiques, e principalmente do senhor Johan. Ele era como um segundo pai para mim, sempre me amou muito e a única coisa que sinto no momento é pena por ele estar com essas duas cobras em casa.

Sempre darei um jeito de me encontrar com a mamãe porque não posso ficar longe dela, mas tenho que refazer minha vida. Crescer, deixar esses sonhos bobos e idiotas de lado, de ter uma família para amar, eu nunca terei isso, não sou digna.

Não deixarei mais homem nenhum pisar em meu coração, ninguém me terá por inteira, absolutamente ninguém conhecerá a verdadeira Iara, doce e carinhosa, mas sim a fria e amarga que desenvolvo nesse exato momento. Irei humilhar quem me humilhou, machucar quem me machucou.

Homem nenhum presta, e todos que passarem por mim irão se apaixonar e depois pisarei em seus sentimentos como fizeram comigo. Irei descarta-los como peças de roupas baratas, terão meu corpo mas nunca meu coração.

Serei a melhor em tudo que fizer. Hoje se inicia uma nova fase, morre agora tudo que há de bom em mim e renasce uma nova Iara Lauren.

Que estejam preparados. Eu vou jogar sujo.

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