Clarice arrumou a mesa para o jantar. Klaus já deveria estar chegando do hospital, mas não chegou. Todos jantaram e foram para os seus quartos. Ela ficou ali na sala o esperando. Nada. Ligou para o hospital, mas ninguém sabia onde ele estava. A secretária já havia ido embora e ninguém estava na sala de seu pai ou no consultório. Ela agradeceu.Lá pelas onze ela ligou de novo. Nada.Ligou às duas. Nadinha.Apareceu no hospital às oito a fim de matá-lo. Entrou no Centro cirúrgico e viu cada sala, nada. Foi no consultório, cantina, sala dos médicos, escritório do seu sogro. Nada. Ligou para o celular dele e ninguém atendeu.- Filho da puta! O que esse filho da puta está aprontando? Klaus, Klaus... Não me faça dar um tiro nas suas bolas...Chegou em casa, tomou banho, vestiu uma roupa confortável e ficou olhando para o teto imaginando-se viúva. - Duvido que ele esteja morto. Celular sem bateria, carro batido... Delegacia por briga na rua? Vamos ver que horas eu vou saber notícias suas, Dr
Catarina chegou cedo para irem juntas ao médico. Klaus tentou ir junto, mas foi impedido. Clarice andava nervosa e se encolhia ao ouvir a sua voz. Na sala de espera elas pegaram uma revista e Clarice viu um lindo vestido de crochê e sorriu.- Eu quero fazer este vestido para a minha menina. O que acha?- Lindo! Mas não é muito cedo?- Se ela não nascer eu posso dar para alguém, mas tecer me deixa calma. Eu quero me manter calma.- Clarice, você ainda gosta dele? - Se eu não gostasse, Catarina, seria mais fácil. Eu iria embora e foda-se o Klaus. Mas eu o amo e isso me magoa muito. Eu quis ser forte, tratar tudo com frieza, mas eu não consigo. Talvez seja os hormônios da gravidez. Mas às vezes acho que seria melhor se o mandasse embora. Eu não sei. - Procure relaxar. Eu sei o que é pirar durante a gravidez. Eu deixei Felipe maluco. - Ele me contou. Por favor, pare de se esconder no corredor. Eu sinto o seu cheiro. Sente logo aqui ao meu lado e não abra a boca a chorar.Klaus entrou n
Clarice era a grávida mais bonita do Rio de Janeiro. Aquelas cabelos vermelhos, aqueles olhos de gata verdes, o jeito elegante de se vestir e andar, davam à ela uma atenção mais do que especial.Passado o estranhamento dos primeiros meses de gestação que a fez se sentir mais frágil, agora Clarice era uma guerreira e Klaus um marido devoto e apaixonado. Um cavaleiro leal para qualquer batalha. E ele se mostrava muito disposto a enfrentar qualquer exército por ela.Fora isso, os filhos estavam a deixando meio doida. Levy se arriscando em conquistas diversas agora que começava a crescer, começando a levar a natação mais a sério. Guilherme se mostrando fiel e leal a Cecília. Rebecca se mostrando arredia e agressiva com a chegada do irmão de Catarina para as férias. O fato é que, embora o irmão mais novo de Catarina ser fruto das escapadas de Pedro, pai de Catarina, a convivência com ele era muito boa e os irmãos se davam muito bem. Anna, a mãe de Catarina, era tratada por ele com todo am
Levy não era o tipo de filho que procurava as pessoas para que ele pudesse contar segredos ou confidenciar sentimentos. Ele costumava ser o confidente e gostava de escrever todas as suas impressões sobre as pessoas em um diário que costumava esconder dentro de um livro. Parecia um espião. Mas Clarice estava atenta há algum tempo e um dia o surpreendeu entrando em seu quarto quando todos pareciam dormir.- Quem é ela?- O quê? - A garota que tem feito você suspirar de repente.- Ah, isso... Não é uma garota.- Gosta de meninos?- Não! Não existe garota nenhuma, mãe. Nem garoto algum. Estou escrevendo um livro. Um romance. Ainda não está pronto e eu não vou lhe mostrar nada.- Livro? Isso é sério? - É. Acha muito estranho?- Não, querido. Acho fofo. Criativo. Acho que eu nunca saberia como começar a escrever.- É só começar, mãe. É só começar a escrever.- Vou tentar.- Quer deitar um pouco aqui do meu lado?- Q
Clarice ainda estava sedada e não ouviu ou viu o marido chorando que nem um bebê em completo desespero. Como ele conseguiria sobreviver se algo acontecesse a sua mulher?Era uma dor profunda. Muito pior do que o infarto que sofreu quando estavam separados. Amava-a e a sua traição estava mais ligada a sua incapacidade de falar de seus sentimentos do que estar apaixonado por outra pessoa. O sexo era apenas um escape e acreditava que Clarice havia entendido isso depois de tanta conversa e terapia.- Fica calmo, Klaus! É comum essa instabilidade emocional acontecer.- Clarice nunca ficou tão sensível. Eu quero me afastar do hospital durante um tempo, Felipe. Eu posso deixar os meus pacientes em suas mãos? - Claro! Vai ficar tudo bem.- Eu preciso ficar com Clarice. Eu preciso que ela entenda que eu a amo e que ela ficará feliz ao meu lado e dos nossos cinco filhos. Meu Deus! Quase foram sete.- Fica calmo!- Clarice, amor da minha vida, eu não existo sem você. Não existe o médico, o mari
Com o final do ano chegando, começavam os preparativos para o Natal que geralmente eram comemorados no apartamento de Catarina porque era o maior e abrigava bem todos os convidados.Apesar de serem judeus, era comum ver a família de Clarice envolvida nos preparativos das guloseimas desde que ficou amiga de Catarina.Rebecca amava o Natal da família de sua melhor amiga. Vestia sempre um vestido vermelho quando pequena, mas há dois anos havia trocado o vermelho pelo verde que combinava com os seus olhos e dava aos seus cabelos um charme especial.Logo após o Natal Clarice seria posta em repouso por causa dos gêmeos. Catarina já havia contratado uma babá para cuidar do seu filho Rodrigo e duas enfermeiras para ajudá-la para qualquer evento surpresa que poderia acontecer quando Felipe e Klaus estivessem trabalhando.Ninguém queria surpresas. Apenas um nascimento tranquilo e programado no hospital.Logo depois do Natal viria o aniversário de Rebecca. Mas ela já havia avisado que não desejav
Rebecca acordou preguiçosamente às nove horas da manhã, percebendo a movimentação vindo da sala.Levantou.A sala estava repleta de flores. Girassóis, rosas amarelas e cor-de-rosa, flores do campo e violetas. Passou a mão sobre cada uma, caminhando descalça pela sala com os olhinhos brilhantes, de camisola e com os cabelos presos num coque alto e bagunçado por dois pauzinhos japoneses. Nem percebeu que era observada por alguém que se encontrava sentado na varanda.- Pensei que fosse hibernar.- No verão? - Bem, o quarto estava bem frio.- Foi no meu quarto?- Queria saber se estava dormindo ou de preguiça. Dorme que nem um bebê agarradinha ao ursinho... Ei! Eu lhe dei aquele ursinho. Achei que não gostasse de mim.- Mãe?- Eu fiquei curiosa. Os seus irmãos foram para a praia. Você não quer ir?- Não. Quero ficar de preguiça em casa.- Nem quer dar uma voltinha?- Não. Quero ficar de preguiça o dia todo. Nada de saidinha. Já avise
O almoço de aniversário de Rebecca teve poucos convidados. A avó paterna Norma, a mãe, os irmãos, Cecília, Catarina, Rodrigo e Anna, os avós maternos e Paulo. O pai e Felipe estavam no centro cirúrgico e só chegariam à noite.O clima foi de leveza. Muitas gargalhadas com histórias engraçadas na companhia de Rebecca. Rebecca acordando assustada no meio da aula por causa de um monstro de duas cabeças, gritando no cinema durante algum filme de terror, colocando sal no bolo e açúcar no peixe, correndo pela casa com lençol branco dizendo ser o Gasparzinho. No geral, era uma garota doce e que tinha uma uma voz maravilhosa. Paulo apertou sua mão quando se sentaram no sofá. Catarina havia feito seu famoso pudim de leite. Rebecca não puxou a mão de volta e, quando todos foram embora para se encontrarem mais tarde para o jantar, ela deixou que ele a beijasse no rosto antes de ir embora com a sua irmã, mãe e sobrinhos.O buffet chegou lá pelas cinco. Rebecca ainda dormia um p