CAPÍTULO 8

O tempo passa comigo aqui nesse lugar.

Sinceramente, não demorou muito para que eu gostasse e começasse a desejar que Nicolai demorasse ou que nunca voltasse. É um sentimento feio, sei, porém não posso evitar.

Aprendi tantas coisas, coisas absurdas, outras tão legais. Quero aprender mais, muito mais.

Não posso ir embora, por vários motivos. Um deles, e o maior, é que não sei como voltar para casa. Ai vem o fato de que Nicolai meio que me vendeu por um mês.

Quando eu o encontrar ele terá que me explicar muito bem essa história.

Por falar em histórias... Aqui tem muitos livros. Eu nunca tinha visto um livro que não fosse o de regras das mulheres do Oeste. O que não faz muita diferença já que não sei ler. Ou melhor, não sabia.

A senhora Carmen me ajuda muito, ela e Lilica estão me ensinando a ler e fazer os trabalhos do local onde terei que viver pelos próximos dias. Ela que seleciona os livros que posso ler, segundo ela, eu tenho que ir por partes. Já percebi que alguns livros com homens ou casais seminus nas capas ela não permite.

Mais tarde... Primeiro as preliminares... Sempre diz.

Fui atrás de um dicionário saber o que é essa palavra. Ela me deu um dicionário logo que comecei a aprender.

[preliminar]

ADJETIVO

que antecede (o principal); prévio, preambular, introdutório

que antecede o ato sexual.

Pelo significado é como se ela estivesse me introduzindo a algo. E tenho quase certeza que tem a ver com esse tal ato sexual. É o que mais se fala nesse lugar, e sempre se calam e dão risadinhas quando pergunto. Dizem que alguém casada com Nicolai não entenderia. E dizem com puro deboche.

Eu continuo em busca de aprender, entender... Cada pequeno instante que consigo, trato de agarrar um livro e me esforçar para transformar letras em palavras, palavras em frases e frases em histórias.

*

— Lilica? Está ai? A Carmen me pediu para trazer o seu vestido novo.

— Pode entrar.

É a primeira vez que entro no quarto da Lilica.

Meus olhos arregalam quando vejo o enorme tanque. O quarto dela é maior que todos os outros, acho que por causa do tanque.

Lilica está apoiada na beira, completamente nua. Seus seios redondos visíveis através do vidro, assim como uma calda incrivelmente dourada que sobe até a cintura.

— Tão linda! — as palavras saem sem que eu perceba.

Ela sorri.

— Obrigada!

Eu já sabia que ela era uma sereia, mas nunca a tinha visto assim. Seu quarto é cheio de coisas da natureza, lindo.

— Deixa o meu vestido ai sobre a cama.

Faço o que ela pede.

— Quer entrar? — aponta a água.

— Ah não... eu... não.

— Não seja boba, menina. Você precisa se libertar. Somos duas mulheres. Você nadou nua na Cidades das Mulheres?

Sim. Eu já tinha feito isso. Sozinha.

— Tá bem. Só um pouco.

Sempre teve algo que Luma não gostava em mim, e isso era a minha curiosidade. Perguntar tudo, querer ver tudo, experimentar tudo. Eu sempre fui assim.

Acredito que tiraram isso de mim de propósito. Só não sei porque.

Agora entendo porque queriam que não fosse curiosa. Afinal se era para esconder a realidade tinham que moldar o meu desejo de conhecimento. Isso é tão cruel.

Pensando nisso me desfaço rápido de vestido e da calcinha, estou sem sutiã.

— Uau! Que gostosa! — Lilica b**e palmas.

Gostosa quer dizer bonita, atraente. Eu aprendi.

Toco a água e penso em desistir.

— Está gelada.

— Você acostuma. Entra logo.

Subo no banquinho e pulo no tanque. É tão grande que dá para nadar um pouco.

— Você sente saudades do mar? — pergunto me aproximando da minha amiga.

Confesso que estou um pouco envergonhada pela nossa nudez, mas engulo a vergonha.

— Nunca conheci o mar. O máximo que consegui em minha vida foi uma banheira velha. A Carmen fez isso para mim. Esse é o meu paraíso particular. A minha casa.

— Também nunca vi o mar — suspiro imaginando como seria. — Mas para mim é diferente.

— Um dia eu irei. Nem é tão longe assim. Dizem que o oceano é lindo no Sul.

Ela ficou pensativa e eu também. Ficamos as duas curtindo o tanque.

Lilica era muito expressiva. Vê-la pensando assim me fez ter vontade de ter o poder de dar a ela o mar.

Realmente espero que a minha amiga tenha a chance de viver isso.

*

— Seu marido é um eunuco. Tenho curiosidade. Como é o sexo de vocês? — Carmen questiona durante um dos momentos em que me ensina a ler.

Não disse. Tudo gira em torno dessa palavra. Sexo.

Deixo o livro de lado. Estou lendo Crepúsculo. A senhora Carmen disse que temos feiticeiros que enxergam o outro mundo de onde fomos gerados e que eles transcrevem muitas coisas, entre elas ficções sobre os seres mágicos.

Eu não questionei ainda, mas não pareço ser mágica. Será que sou apenas uma humana que veio parar aqui por acidente?

Paro de pensar em quem eu sou e encaro Carmen.

Ela continua:

— Às vezes tenho quase certeza que você nem sabe o que é isso, mas não é possível... — Ela me encara com dúvida. — Não pode ser possível.

— Não entendi a pergunta.

— Creio que ele bata uma siririca para você. Mas é só? Soube que vendem acessórios para isso. Vocês tem? — ela tem sorrisinho debochado no rosto.

— Eu não estou entendendo nada.

— Ela está falando de foder. — Lilica, a mesma moça que conversei na minha primeira manhã aqui, e que agora é minha grande amiga, entra falando. — Já que seu marido não tem pau.

Me sinto como a primeira vez que encarei um livro e não entendi uma palavra sequer.

— Entendo menos.

— Acho que vamos ter que dar uma aula de sexualidade a nossa pequena humana. — Lilica debocha. — Te falei que ela era virgem e ignorante.

Ei, eu sei o que significa ignorante. Agora sei.

— Querida, você e seu marido dormem juntos?

— Não. Cada um tem seu quarto.

— Você já o viu sem roupa?

— Claro que não. Isso é proibido.

— Quem te disse isso?

— As mulheres do Oeste.

Ela coça a cabeça, confusa.

Eu estou mais ainda. Conversa complicada.

— Juro que eu é que não estou entendendo — Carmen diz.

— Então você não sabe o que é sexo? — Lilica pergunta.

— Claro que sei. — Elas mostraram alivio com a minha resposta, mas só até eu completar. — É aquilo que define se você é homem ou mulher.

— Misericórdia! — Lilica b**e a mão na cabeça.

— Meu marido não pode saber disso. — Carmen murmura, mais para si que qualquer outra coisa.

— Se o senhor Mendonça souber, vamos ter leilão de uma raridade. Ele nem vai pensar no prazo que deu. É muito dinheiro. A última vez que tivemos uma virgem aqui foi há anos e lembro que todos ficaram loucos durante o leilão.  Não entendo todo esse tesão em virgens.

Minha expressão não passa de uma interrogação.

Carmen segura minha mão.

— É melhor Nicolai vir te buscar logo.

Também acho. Não que eu vá com ele, quero mesmo é explicações.

— Enquanto isso, vou te explicar direitinho o que precisa saber sobre os desejos dos homens e mulheres — completa. — Mas não hoje. Muita informação. Meu Deus! É pior que ensinar uma criança. Vou te procurar depois e vamos ter “aquela conversa”...

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