“O que ele faz aqui?” Os seus cílios tremiam enquanto continuava absorta em seus pensamentos. O olhar dela vagou ao redor. Haviam vários clientes que a observavam cheios de expectativa.— Sente logo no piano e cante! — Exasperado, senhor Donato instruiu entre dentes, mantendo um sorriso forçado para os clientes atentos.Com as faces coradas, ela se acomodou no banquinho diante do piano de cauda. Uma microfonia breve ecoou pelo ambiente quando ajustou o pedestal do microfone à altura de seus lábios. Seu coração batia acelerado, quase escapando do controle.— Já sabe o que vai cantar? — indagou o gerente em tom baixo.— Vou cantar Someone Like You, da cantora Adele. — Luísa respondeu num sussurro.O bar estava lotado de clientes que aguardavam algo para entreter-se enquanto conversavam e saboreavam seus pratos. As palmas das mãos de Luísa suavam, e o nervosismo parecia quase insuportável. Os seus ouvidos captaram cochichos e risos disfarçados entre olhares curiosos e julgadores. Por u
Antes que pudesse sair, ele foi interceptado pelos pais de Bianca. Don Morano cumprimentou um homem calvo e a esposa dele, desviando o olhar de Luísa. Embora precisasse focar no término do noivado, a mente dele insistia em retornar à pianista, cujo talento e presença o haviam cativado por completo. Por diversas vezes, ele dava olhares furtivos para o palco enquanto jantava com sua noiva e os sogros. Torcia para que Bianca tocasse no assunto e acabasse logo com aquele jantar. — Vi essa moça num vídeo… — o homem calvo comentou ao fitar Luísa no palco. — Milhões de pessoas viram, papai — disse Bianca. — Ela distrai as pessoas só com a voz e o piano. — Sim, senhor Antonio. — Paolo concordou sem tirar os olhos de Luísa. Nesse meio tempo, A pianista tocava a canção Fallin' de Alicia Keys e cantava acaloradamente. Alguns homens diziam o quanto ela era linda e isso irritou bastante o mafioso, que desviou o olhar do palco e encarou-os com o semblante enfezado. — Hei, garçom. — Antonio c
— Eu ainda não tenho o valor para te pagar, senhor Morano! — Ela tentou explicar. — Não é sobre isso que vim falar… — A voz cheia de aspereza se pronunciou. — Podemos conversar depois? Eu ainda tenho muito trabalho e o gerente está me vigiando — retrucou Luísa, evitando encarar diretamente aquele olhar que parecia devassar a sua alma. Paolo deu mais um passo para frente, encurtando ainda mais a distância entre os dois. — Tem que ser agora, — insistiu, num tom que beirava o imperativo. De longe, Caterina observava a cena. Seu rosto marcado pelo tempo trazia uma expressão indecifrável enquanto avaliava discretamente o noivo de sua filha em um aparente b**e-papo com a pianista e atendente do bar. Sem chamar atenção, ela caminhou até eles. Ao se aproximar, esboçou um sorriso que oscilava entre a simpatia e o sarcasmo. — Com licença! Estou perdida e não sei onde fica o toalete, — falou efusivamente, dirigindo-se a Luísa. Ao ouvir a voz da futura sogra, Paolo soltou rapidamente o punh
— Luísa, vá guardar essas flores! — Milena disse com um sorriso torto. — Deixa que atender esse cliente.— Mas eu…— O gerente quer que você volte ao palco e toque piano… Tem um cliente ilustre pedindo para colocar você no lugar da banda musical.Embora já desconfiasse que aquele pedido veio de Don Paolo, ela gostou da ideia de poder tocar piano outra vez.— Mais uma vez, eu agradeço pelas flores, com licença. — Falou com Carlo antes de se retirar.O olhar escrutinador de Don Morano ainda vigiava a garçonete sorridente que desaparecia com um buquê nos braços. “O que esse babaca quer com a minha mulher?” Espremeu os olhos na direção da mesa do advogado. “Não vou deixar você tirar ela de mim, imbecil”.— Acho que o Paolo também gostou bastante da pianista. — Caterina falou com intenção de alertar a filha.— Percebi! — Bianca já tinha notado a maneira como o noivo olhava para Luisa enquanto ela recebia flores de outro homem. — O babbo também está caindo de amores por ela. — Sorrindo, com
No vestiário, Luísa pegou os pertences e, em seguida, trocou de roupa. Por vezes, ela parava e enxugava as lágrimas.Em algum momento, segurou o buquê de flores que Carlo havia lhe dado e então engoliu em seco. Lembrou-se de que o advogado ainda estava no restaurante, tentou ir para lá após sair do vestiário, mas foi impedida pelos seguranças que bloquearam sua passagem.— Precisa sair pela porta dos fundos, signora! — Um dos grandalhões enfatizou a ordem dada pelo gerente.— Posso falar com a Milena?— Lamento! — O outro segurança negou com a cabeça.Escoltada pelos dois brutamontes, Luísa se retirou. Havia um nó insuportável em sua garganta enquanto continha a vontade de chorar.Por volta de uma da manhã, ela saiu num beco nos fundos do restaurante.— Hei, Luísa! — Uma voz masculina chamou, mas ela não olhou para trás. — Fique onde está ou vou te furar agora! Ela parou no instante em que sentia algo pontudo nas costas. O buquê de girassóis caiu no chão conforme o estranho a puxava
Com os ombros encolhidos, Luísa entrou na casa e acompanhou o homem alto que andava na frente enquanto falava com os seguranças. Don Morano parou e deixou os outros irem à frente e então fitou a mulher de estatura mediana. — Entra! — Ele ergueu o queixo para dentro da sala depois que abriu a porta. O escritório possuía móveis rústicos e um leve cheiro de tabaco impregnado no ambiente. Sem hesitar, Luísa deu alguns passos para dentro do escritório. Seus ombros continuavam levemente caídos, e as mãos apertavam o tecido da bolsa como se isso pudesse conter a ansiedade. Ele a observou de perto enquanto fechava a porta, analisando-a como se tentasse desvendar seus pensamentos. — Sente-se! — Preciso voltar para a Japigia. — A voz de Luísa tremia. — Senta aí, porra! — Ele deu um soco na mesa que fez o seu corpo estremecer. Após sentar, o semblante de Luísa estava estático como se estivesse congelado. O tom pálido de sua pele destaca os traços do cansaço. — Você acha que vai ficar seg
Naquele ano, o homem com traços marcantes completava 22 anos. Paolo Morano possuía uma postura intimidadora quando se empertigou em seus 1,90 de altura. O italiano passou os dedos pelas veias que saltavam em suas têmporas e, em seguida, enterrou nos cabelos, jogando os fios lisos para trás enquanto o tio dirigia e reclamava em seu ouvido. — Temos que expandir os negócios da nossa família. Você precisa encontrar uma ragazza e… — Já disse que não vou casar! — Interrompeu o tio quando recusou com veemência. Vencido pela teimosia do sobrinho, ele desistiu de aconselhar. — O seu pai não está na cidade, então, temos que ir até Bari. Stefano cuidava dos homens e gerenciava os locais em que dominava. Já Francesco, pai de Paolo, sempre administrou a parte burocrática da organização. Estava sempre em reuniões importantes ou participando de jantares para manter a aliança com pessoas poderosas. Embora o clã fosse mais poderoso e sanguinário da região de Bari, os dois sempre divergiam, não ha
Luísa caminhava cabisbaixa, observando o piso de madeira que refletia as luzes amareladas do lustre. O quarto era decorado com uma sofisticação que exalava um ar de exclusividade. No centro, havia um balde de gelo com champanhe sobre uma mesa de canto que chamava sua atenção. Ela se deteve por um instante, mas o som da porta fechada com firmeza a fez estremecer. — Quer beber para relaxar? — A voz rouca de Paolo ressoou pelo ambiente. De costas para ele, Luísa meneou a cabeça negativamente. Ela uniu as mãos na frente do vestido azul de comprimento modesto, coberto por um casaco branco desgastado que parecia destoar do brilho e da elegância ao seu redor. Os passos de Paolo eram abafados pelo tapete espesso no instante em que ele se aproximava de suas costas. Os dedos longos afastaram suas mechas pretas e sedosas e, então, os lábios dele tocaram em seu pescoço. Luisa permaneceu imóvel, mas ele a puxou para mais perto, suspirando contra a sua nuca até ouvir um choramingo escapar de seus