Sophie seguia Melinda escada a cima, ela carregava uma das bolsas da recém-chegada enquanto tagarelava sobre algo, Sophie notou, com certo alívio, que James não as seguia.
– Moramos no mesmo andar. Pode imaginar? Americanos perdidos em Paris e ainda assim nos encontramos – Melinda parecia eufórica novamente, Sophie sorria para ela, mas a única coisa que estava em sua mente é que logo estaria nos braços de Ray e admitiu com egoismo, que não se importaria que o resto de Paris sumisse, inclusive e ainda mais, os vizinhos de seu irmão – não se sentindo bem por tal pensamento, pôs a culpa de tamanha má vontade com a solicitude de Melinda no cansaço da viagem – mas a verdade era uma, desde que ela chegasse logo aos braços de Ray, o resto do mundo podia explodir.
Ray esperava em frente a porta aberta. Estava lindo, como Sophie se lembrava, grandes olhos azuis, sorrindo de boca fechada, seus belos e longos cabelos castanhos, ondulavam soltos até o meio das costas. Sophie achou que suas células parariam de funcionar se não o abraçasse logo, ela sabia que Ray sentia o mesmo. Correram um para o outro no mesmo instante, um longo e aconchegante abraço em que ambos poderiam morar para sempre. Era o tipo de coisa comum entre eles e que normalmente geraria comentários sobre o quão dramáticos os dois poderiam ser.
Era espantosa a semelhança dos dois, ainda assim a beleza parecia cair melhor em Ray do que em Sophie. Eram os olhos, Sophie tinha olhos amendoados, da cor do oceano sem sol, nada da exuberância dos grandes olhos azuis acinzentados de Ray. Eram praticamente da mesma altura, esguios e andróginos. Gêmeos, mesmo Ray sendo cinco anos mais velho, Sophie adorava o quanto se pareciam, pois sentia-se ligada ao irmão tanto quanto os gêmeos contavam em suas histórias fraternais.
Os vizinhos trocavam amenidades, Ray agradecia o favor enquanto Melinda sorria de forma radiante, James se juntou a eles, parado ao lado da esposa, parecia anotar mentalmente o que acontecia, analisava a imagem dos irmãos abraçados, como quem estuda uma pintura em um museu, atento e judicioso, ao menos essa foi a sensação que Sophie teve ao notar a expressão em seu rosto.
Melinda sempre sorridente fazia observações sobre como fora o percurso, James ainda calado, parecia absorver a cena, como se sua pele sugasse as cores que pretendia usar mais tarde, por instantes Sophie se distraiu olhando para ele, então ouviu o irmão limpar a garganta – Ah… Bem. Obrigada Linda, Jim – dizia Ray enquanto puxava a irmã pela mão para dentro do apartamento.
– Imagina, Ray. Foi um prazer buscar Sophie. Ah, não se esqueça de hoje a noite. - Melinda falou piscando um dos olhos – Mais tarde vamos mostrar a noite parisiense para essa garota – complementou enquanto abria a porta de seu próprio apartamento.
– Até mais cara. Tchau Sophie, foi um prazer te conhecer… – Sophie sorriu timidamente, não tinha certeza se por estar intimidada ao falar, ao que parecia agora mais normalmente, com o autor que admirava ou se, apenas o fato, de James resolver falar a surpreendera, reparou que apesar de o sorriso oblíquo de James ter desaparecido, seus olhos brilhavam estranhamente, Sophie analisou aquilo, mas em seguida lembrou-se – ele deve estar chapado.
Assim que Ray fechou a porta, Sophie jogou-se no sofá, sentia-se exausta. Ray tirou as botas que ela usava e se deitou ao seu lado. Sophie escorou suas costas no peito dele, enquanto Ray a abraçava. Ficaram assim em silêncio, abraçados, por quase uma hora. Ray sentira falta dela mais do que poderia expressar, e agora a tinha nos braços, para Sophie era como flutuar no espaço, longe da sujeira e do barulho do mundo.
Sophie se espreguiçou e sentou-se no sofá, Ray a observou enquanto continha um sorriso – você parece uma gatinha – Sophie riu com um suave bufo – Eu sempre fui uma gatinha. - Os dois sorriram um para o outro e Ray puxou-a para mais perto, quase em seu colo, pôs seus braços ao redor de Sophie
– Está com fome minha Sophie?
– Comi no avião
– Que tal um banho?
– Eis aí uma ideia atraente
– Te amo, achei que morreria longe de você
– Oh Ray, nos nunca estamos realmente longe… e você sabe, eu também te amo.
Os dois irmãos se levantaram do sofá, com um leve roçar de lábios brindaram delicadamente seu reencontro.
– Por que não foi me buscar?
– Melinda não te disse?
– Reunião…
– É isso – Ray abraçou novamente Sophie, escorando a cabeça na volta de seu pescoço, quase como se estivessem dançando. - Gostou deles?
– Seus vizinhos? - Sophie torceu a boca com desprazer – Melinda parece com aquelas garotas que sempre estiveram ao seu redor desde que me lembrou, todas querendo ter ou ser como Ray, irritantemente prestativas – Ray soltou um risinho abafado
– E quanto ao James?
– Não acho que ele se pareça com aquelas garotas – Ray se afastou da irma, rindo alto e respondeu. – E certamente e um alívio que ele não pareça. - Sophie sorriu para ele, não queria falar sobre os vizinhos de Ray, mas ela jamais diria a ele, estavam juntos novamente e ela falaria do que ele desejasse, e claro, ele continuou falando sobre Melinda e James.
– Ele é escritor…
– Melinda contou
– Ah é?
– Sim… Você já o leu? - Ray deu de ombros, como fazia quando o assunto não o interessava.
– Não, e não pretendo… O que foi? - Sophie ergueu as sobrancelhas e conteve o sorriso.
– Então, Melinda parecia realmente satisfeita em ter ido me buscar, mas James… Parece que seu amigo não gostou muito de mim.
– Ora, não diga. Ultimamente ele está em uma crise criativa, na verdade acho que fazem quase dois anos que está com essa crise, só que agora a Linda tem se dado conta disso também – Ray fez uma careta do tipo deixa pra lá.
– E quanto TJ, pensei que ele fosse seu assistente agora, ele podia ter ido me buscar e…
– TJ foi para Montecarlo com a família ou algo assim, longa história, você não verá seu amiguinho nesse verão – Ray disse em um tom amistoso porém debochado.
– Ah que gracinha Ray – Sophie fingia contrariedade, sorrindo, mudou de assunto – E o meu banho?
– Ah sim, você sabe onde ficam todas as coisas, produtos de higiene no armário do banheiro, toalhas na cômoda do corredor… E depois do banho tenho um presente, que desenhei especialmente pra você.
– Sério? Deixa eu ver agora, por favor – Ray adorava aquilo, Sophie era sua garotinha ganhando uma boneca nova.
– Não, só depois – sorriu para a irmã. Fazendo beicinho Sophie seguiu para o quarto, onde Ray deixara sua bagagem, enquanto ouvia Ray rir de seu comportamento.
Ray sempre desenhou roupas para a irma, mesmo que ela não usasse o estilo habitualmente, Sophie sempre seria sua musa. E aquele era especial, ficara praticamente seis meses sem ver o irmão pessoalmente, passara festas longe dele, sabia que Ray devia ter esperado ansioso para ver como o designer ficaria nela. Não era difícil na verdade, ter Sophie como musa, ela não tinha o corpo diferente da maioria das modelos com quem ele trabalhava. A grande mágica acontecia pelo fato de só Ray conseguir fazer com que ela usasse um vestido, e no fundo Sophie amava usar os vestidos que o irmão fazia para ela.
Tirou a roupa ainda no quarto, diante de um grande espelho que Ray tinha em frente a cama, ouviu quando seu irmão colocou Stones para tocar, Ruby Tuesday, era sua música – sorriu – de calcinha em frente ao espelho rolou o olhar por todos os lugares antes de se encarar, a moldura era antiga, provençal, o tipo de coisa que se encontraria na casa de Ray, junto a um jarro de flores frescas e cortinas esvoaçantes – sorriu novamente – sorriria muito enquanto estivesse ali, ela sempre sorria muito quando estava com Ray.
Olhou-se demoradamente no rosto, o rosto magro ainda parecia manter as bochechas da adolescência, os lábios cheios de mais para seu gosto, a vaziam parecer uma garotinha de doze anos. Lembrou-se de James – Garotinha – murmurou. Desceu os olhos até os seios, pequenos de mais para a altura que tinha – não é a toa que todo mundo acha que sou um garoto. - Sorrindo outra vez entrou no banho.
De fato, era consenso que Sophie fazia questão de parecer com um garoto, parecer com Ray na verdade, isso e o fato dela não ser a garota mais interessada na vida alheia, acabara eliminando qualquer tipo de amizade que Sophie poderia vir a ter, mas sempre tivera Ray, não precisaria de mais ninguém enquanto tivesse Ray.
Quanto a sua aparência, as opiniões divergiam bastante. Alguns, principalmente as amigas de seu irmão, faziam questão de tratá-la como um garoto, o que no fundo nunca a incomodou, garoto, garota, ela seria quem ela quisesse, o fato da incrível semelhança entre Sophie e Ray ajudava nos equívocos e sempre divertira os dois irmãos, mas enquanto Ray era belo em sua androgenia e grandes olhos frios, Sophie se parecia com uma garotinha desengonçada, ao menos era o que ela pensava, mesmo que Ray dissesse o contrário sempre, era alta e vestia-se de forma despretensiosa, ate mesmo com uma certa inocência – como se ainda não se preocupasse com os garotos.
Quando Ray ouviu sua irma sair do banheiro e ir ate o quarto foi encontrá-la
– Está descente?
– Não sou você. Eu estou sempre descente. – Sophie piscou para o irmão e sorriu enviesado.
– Cafe?
– Por favor – Sophie suspirou e fez uma reverência para o irmão.
Estava enrolada na toalha, sentada na posição de lótus. Após alcançar a caneca com café Ray sentou-se atrás dela com a escova de cabelo.
– O que você fez com seu cabelo? –perguntou, fingindo desgosto em sua voz.
Sophie riu do jeito do irmão – Sabe que a tempos eu queria passar a tesoura nos meus cabelos e além do mais, sua preciosa Audrey Hepburn já usou assim.
– Você é minha Audrey Hepburn, mas ao contrário dela você parece a porra de um moleque. – Sophie riu alto com a declaração.
– Eu sempre pareci. – escorou a cabeça, ainda de costas no peito do irmão.
– O que tem feito? – Ray falava muito baixo perto do ouvido dela.
– O que faço sempre? Estudar e estudar.
– E o bonitinho que estuda música? Qual era mesmo o nom…
– Era bonitinho de mais. – Sophie riu. – E você o que tem feito?
– Trabalhado.
– Só?
– Quer mais?
– Sim, afinal você é o Ray não a Sophie.
– Tenho esperado por você.
– Por que não foi me buscar no aeroporto?
– Eu já disse, estava em reunião.
– Por que James e Melinda foram me buscar?
– Porque são meus amigos, gosto deles e…
– E queria saber qual seria minha opinião sobre eles, minha primeira impressão?
– Qual foi?
– Que diferença faz? – Sophie escondia um sorriso.
– Nenhuma, de fato…
– Você já gosta deles. - Ray não disse nada, passava suavemente a mão pelo braço de Sophie, ela continuou a falar. - Melinda, lembra mesmo aquelas garotas, você sabe…
– Eu sei, she’s like a rainbow. –Ray suspirou
– Mas ela fala muito – Ray riu – Serio, eu acabei me distraindo…
– Distraindo? Não acredito que você continua com essa mania! - Sophie se afastou do irmão, ficando de frente para ele.
– Como assim? Fiz isso minha vida toda. Por que mudaria em um ano?
– Bem, verão passado você parecia mais… concentrada.
– Porque só fiquei com você. O que alias pretendo fazer esse verão também.
– E James? – Sophie sentiu o rosto esquentar outa vez – como era possível? – pensou.
– O… o que?
– Ainda não disse o que pensou dele? – Ray sorria, seu sorriso de boca fechada, percebera a reação dela na hora, na verdade percebera no corredor, assim que James se juntara a eles, era uma interessante situação.
– Eu não sei… Acho que James não gostou muito do fato de eu não conhecer o livro dele. - Ray sorriu para ela, Sophie continuou sua ponderação – Enfim… Não importa, me parece que ele não faz muita questão de ser social…
– Tipo você.
– Eu sou social, só não gosto das pessoas, é diferente. - Ray sorriu com a expressão chocada e depois um tanto cheia de birra de sua irma, se inclinando para frente deu um selinho em Sophie. Ela enrolou-se ao pescoço do irmão, Ray puxou-a para seu colo.
– Tá saindo com um deles? – afastou o rosto e o encarou.
– Sim, são meus amigos e…
– Você me entendeu. – Sim Ray entendera, por fim respondeu – Não, não estou – aquela não era a pergunta correta.
Antes que pudesse formular outra pergunta Ray se afastou e parou perto do closet.
– Agora, seu presente. – disse, pegando um cabide dentro do armário de forma teatral, Sophie sorriu e caminhou na sua direção.
O presente em questão era um vestido de corte reto, azul-marinho, estilo anos 50, feito em um tecido muito leve. Sophie o vestiu, era como o abraço de Ray, ela dançava pelo apartamento fazendo um desfile particular para o irmão, todos os gestos que ela fazia junto ao design de seu novo vestido, faziam-na parecer ainda mais jovem. Ray a observava e sorria.
– Oh Ray, ele e maravilhoso, amei a cor – Ray sorria para a irma
– É como a linda cor de seus olhos babe, você sabe, é difícil não te deixar bela – Ray deu uma piscadinha cúmplice para a irma.
– Que exagero – Sophie riu como uma criança – É um pouco curto… - Sophie franziu as sobrancelhas.
– Não é não, ficou perfeito pras suas pernas. Quem dera todas as minhas roupas caíssem tao bem em minhas modelos… Alias quem dera minha irma me desse a honra de desfilar para minha grife. - Ray dizia com voz afetada, aquele era um assunto antigo para eles, a única coisa ao qual Sophie não estava disposta a ceder para o irmão.
– Ray – ela colocou a mão na cintura – vai aparecer a minha bunda – fez uma careta cômica. Ray jogou a cabeça para trás em um riso alto.
– Ah Sophie só aparecera o que deve aparecer, e palavra… todos os caras de Paris vão querer ver mais, coloca essas pernas pra trabalhar.
– Primeiro: minhas pernas não foram feitas para deleito publico… Segundo: não dou a mínima para o que os caras de Paris querem ver – disse debochada
– Isso eu sei – disse Ray franzindo a boca e revirando os olhos – Outra coisa, talvez seja melhor não usar calcinha. – Ela o encarou meio chocada e meio risonha
– Nem pensar, isso você não vai conseguir. - Ray riu ainda mais alto, caminhou ate a irma e a tirou para dançar. Rodopiaram pela sala e riram ate que a campainha tocou.
Ele estava fervendo, precisou dar um tempo antes de entrar no prédio, sentia o desejo e a frustração dançarem em sua cabeça, tantos pensamentos irrealizáveis. Ascendeu um cigarro, respirou fundo, aspirou o perfume de Sophie, que a essa altura já sumira dentro do prédio junto a Melinda. Precisava retomar seu controle, algo acontecera, era êxtase e temor, algo acontecera ouviu seu coração rasgar.James ficou no carro tempo suficiente para tentar identificar o que sentia, não demorou muito para saber, fazia tanto tempo que não sentia algo assim – Foi em outra vida – sussurrou para o vazio – Foi um outro James. Não havia mistério ali, ele desejou, como a tempos não fazia, como julgara impossível acontecer novamente, desejou como desejara havia muito, perdera o controle e se encontrara sucessivas vezes em segundos… Sem mistério – Sim, seu estúpido, sem mistério, você apenas a quer – soprou a fumaça do cigarro que não havia absorvido – Sophie – O nome queimava por trás de seu
Sophie sussurrou para o irmão – Não atenda – Mas ele já estava diante da porta. Do outro lado, Melinda os esperava, vestida em um leve e esvoaçante vestido esmeralda que acentuava ainda mais o vermelho de seus cabelos, sorrindo de forma encantadora para os dois irmãos. A porta de seu apartamento estava aberta, mas não havia sinal de James, talvez o famoso escritor decidira os poupar de sua presença, Sophie não acreditou. Suspirou alto, não tinha nada contra Melinda, ate mesmo, não tinha nada contra James, mas desejava Ray apenas para ela, como fora o último verão, ocasionalmente TJ se juntava a eles, mas TJ trabalhava com Ray, era impossível ignorá-lo totalmente, além da total afinidade que surgira entre os dois, Sophie ate admitia gostar de TJ, ainda assim, havia sido diferente. Sophie sentia que algo estava fora do lugar, não Ray, não ela, provavelmente nem os vizinhos, era apenas o exterior, como se la fora houvesse mais pessoas querendo entrar, desfrutar do paraíso pessoal que e
Acordou suando, assustado, sonhos e sonhos que pela manha não faziam sentido, névoas e promessas, uma garota com olhos de corsa, Modigliani e o fantasma de Lady Douglas, pernas e lábios, deleite e agonia. Abrir os olhos era um tormento, mesmo que as grossas cortinas do local estivessem cerradas impedindo a entrada do sol de verão, outra vez dormira no escritório, gemeu e lamentou por suas costas ao levantar. Quando ouviu Melinda falando com Ray na sala, se apressou, por instantes acreditou que a primeira visão do dia, seria de Sophie em sua sala de estar, com um vestido tao bonito quanto o da noite passada, sorrindo para ele. Qual não foi sua decepção ao notar que estavam apenas Melinda e Ray, juntos a porta, já se preparando para sair.– Hei – disse um James com voz sonolenta e um tanto decepcionada.– Oh… Ola James – respondeu um sorridente Ray, seguido por Melinda – Jay, vamos encontrar o Marc, não sei que horas acabará a reunião.James ainda proc
– Insólita – a manha estava sendo insólita, pensou Sophie no banho. Acordara sem Ray, o que já a havia deixado bastante perdida, ele não costumava deixá-la só quando ela vinha visitá-lo, depois a visita surpresa de James– Será mesmo surpresa?- sussurrou para o nada, então TJ, provavelmente a melhor parte da manha ate agora. Decidiu que não pensaria em James, ainda não, depois absorveria a situação.Assim que James fechou a porta do apartamento de Ray, TJ a encarou curioso.– Sujeito peculiar – disse ele apontando com o polegar em direção a saída – O que tava rolando?– Sei la – disse Sophie com um sorriso inocente – trouxe o livro dele para mim… não pergunte mais, também não sei – Sorriu para o amigo.– Combinado, você não pergunta o que faco em Paris e eu não pergunto porque você estava seminua com o vizinho de 40 anos de Ray – TJ riu alto enquanto Sophie sacudia a cabeça fingindo reprimenda.– Sim, não perguntarei o
James não tinha ideia de quanto tempo passara em frente ao computador, algo era certo, produzira uma grande estória, três anos após a publicação da Dama Cinza, finalmente reencontrou sua inspiração – E que forma inusitada aconteceu – pensou, relembrando o fato.Foi em uma reunião na casa de Gus, uma das muitas que o vizinho costumava organizar, queijos, vinhos e conversas literárias para os americanos perdidos em Paris. O amigo havia deixado o note sobre o branco balcão da cozinha, aberto em uma rede social, na tela uma jovem radiante, longo pescoço, cabelos castanhos e curtos, olhos como os de Bette Davis, ela sorria abraçada a um jovem alto e também bastante sorridente, na legenda a frase de seu único livro de poemas já publicado “E assim seguíamos brincando, feito o anjo chutado do Paraíso. Não consentíamos nenhuma adoração ao silêncio, não admitíamos que nenhum verso fosse esquecido.” - James sorriu com a lembrança – O amigo havia dito que aquela era sua irma, viria
Assim que cruzou as portas do aeroporto de Orly, Sophie sabia – Ray não vira!Em Manhattan estava sempre atrasado, quando lembrava de aparecer. Seria diferente em Paris? - Acho que não – suspirou. Sophie o perdoaria? Obviamente, afinal perdoava sempre. Desde que se lembrava, amava perdidamente seu irmão, mesmo com essas pequenas falhas quanto aos horários e compromissos, Ray nunca a decepcionou realmente. Havia muito, decidira ignorar as demais pessoas que conhecia, exceto ele. Ray tinha a capacidade de elevá-la – Como um êxtase religioso – pensou certa vez. Não havia um único dia em sua vida que seu irmão não estivesse la para ela, era seu cúmplice e melhor amigo, mesmo sendo cinco anos mais velho. Da parte de Ray havia reciprocidade, ele sabia da mistica que exercia sobre as pessoas e sabia que só havia uma pessoa, sua Sophie, que poderia fazer com que sucumbisse
Olhou novamente ao redor, tudo se movimentava em um perfeito equilíbrio, exceto… exceto por uma garota parada a alguns metros dali, parecia estar suspensa no ar. Sentiu-se subitamente frustrado, o que vinha acontecendo com certa frequência havia algum tempo, mas dessa vez a força com que sentiu era tao forte que mesmo que usasse todas as palavras que conhecia não conseguiria expressar a sensação, aquilo o irritou. - Como poderia um escritor não ter as palavras certas? - Era como se a garota tivesse despertado nele aquele horrível sentimento de ver algo, no caso alguém, tao fora de seu alcance, que fica impossível negar a impossibilidade do êxito, quando qualquer tentativa para obter o que desejamos será em vão, frustração em seu estado mais bruto. Ainda assim, havia também a agradável sensação, como banhar-se em um mar agitado, libertadora e eufórica, uma sensação que parecia crescer em seu peito. Era a garota? Não podia ser a garota, uma estranha em frente ao aeroporto, a vida dele