Jean-Luc
— Ele deve ter imaginado que eu sabia sobre as armas, porque pirou. Então, me bofeteou e me arrastou para o banheiro, gritando que eu não iria ferrar com ele. No corredor, vi algumas malas. Me lembro de ter estranho. Acho que perguntei para ele sobre elas. Então, Thierry me trancou no banheiro, dizendo que a discussão tinha acabado. E, minutos depois, eu escutei o cheiro de fumaça. O alarme de incêndio na cozinha... e logo vi as chamas por debaixo da porta. Eu... eu desmaiei depois de tanto berrar por ajuda e ninguém me ouvir.
— Eu ouvi. Eu apareci — disse, sem forças para dizer mais nada.
Ela assentiu, mas sua expressão foi de uma calma desconcertante.
— Eu estou aqui agora. Com você. Se quiser me beijar, eu vou permitir. Se quiser transar comigo, sou toda sua — ela disse, com uma frieza que me fez tremer. — Mas quero que saiba que não é tão diferente dos outros que me machucaram. Se vou ter que conviver com a merda na qual me colo
Jean-LucClaire olhava para frente outra vez. Ajeitou-se na poltrona, reclinando-a. depois de alguns minutos em silêncio ela tornou a falar, como se já tivesse acabado de digerir a última informação lançada.— Então Franz é como um deus no submundo.Ri baixo, assentindo.— Quase isso.Outro gole no uísque.Ela suspirou, pensativa.— Existem algumas obras de arte roubadas há décadas na casa dele. Alguma chance de devolvê-las?Ri novamente, balançando a cabeça em negativa. O tom leve da conversa agora parecia um presente raro nos últimos dias. Movido por um impulso incontrolável, inclinei-me e a beijei delicadamente. Claire não resistiu. Sua resposta foi imediata, intensa, quebrando a barreira entre nós.O beijo evoluiu, tornando-se mais profundo, mais urgente. E nesse momento me perguntei se apenas o sexo agora seria capaz de fazer essa barreira abaixar por uma hora ou duas. Isso me entristecia
ClaireJean-Luc deu de ombros, o desdém habitual que tinha por algumas coisas.— Ele achou que você gostou mais do quadro do que ele mesmo.O absurdo da situação me atingiu com força, como um soco invisível. Era como se o mundo tivesse virado de cabeça para baixo, e eu estivesse presa em uma realidade distorcida onde presentes eram obras de arte roubadas e compromissos surgiam sem consentimento. O contraste entre o luxo do Monet e a brutalidade na vida de Jean-Luc me fez sentir uma intrusa em um universo que não era meu. Lembrando-me mais uma vez no dia que eu estava amarrada a isso. O sentimento de impotência e o medo criaram um nó no meu peito, tornando difícil até respirar.— Eu não quero isso — murmurei, a voz mais fraca do que pretendia.Virei-me para sair quando Jean-Luc perguntou:— O que você quer que eu faça?— Devolva para Franz.— Isso seria ofensivo.Parei na porta, encarando-o, tentando decifra
Claire Quando saí do banho, o relógio marcava cinco e meia da manhã. O vapor ainda pairava no ar, mas o frio que senti vinha de dentro. Um vazio sufocante se espalhava no peito, uma sensação que nem a água quente conseguiu dissipar. O sono me abandonou, e o cansaço parecia um fardo inútil. O alarme tocou pouco depois, um som estridente que me fez estremecer, mesmo já acordada. Vesti-me apressada, cada movimento mecânico, e saí sem esperar para me despedir de Jean-Luc. O peso do seu olhar seria insuportável agora. O dia se arrastou em um torpor opressor. A sala na escola parecia menor, as paredes mais próximas, e o ar, mais denso. Tentei me esconder atrás da tela de esboço 40x50 no meio do espaço, mas meu rosto me traía. Tinha certeza de que se alguém me olhasse por mais de cinco segundos, saberiam que algo me atormentava.As mãos tremiam levemente, e a mente era um redemoinho de pensamentos que me irritavam e causavam um pouco de pânico. O relógio se recusava a avançar
ClaireClaireCharlotte me consolou. Dormimos juntas em sua cama depois de chorar por horas até a cabeça começar a doer. Na manhã seguinte, ela acordou antes de mim. ao sair do quarto, o cheiro de café e torradas entranhou meu nariz. Na pequena cozinha, a encontrei na beirada da pia. Quando se virou para mim, sorriu, pedindo-me para me sentar à pequena mesa com duas cadeiras junto a parede.— Ainda com dor de cabeça?Neguei com um aceno.Ela colocou uma caneca fumegante à minha frente e sentou-se.— Espero que cafeína não faça mal ao bebê.Encarei as bolhinhas na superfície da bebida, e suspirei fundo, cansada.— Eu não posso contar para ele, Charlie. Não posso.— Você não vai conseguir esconder por muito tempo.— Eu não sei o que fazer. Eu devo ter esse bebê? Devo fugir?Ela me encarou sem respostas.Na sala, meu celular começou a tocar. Caminhei até ele e logo que o apanhei o aparelho, em sua tela o nome de Jean-Luc brilhou. Eu havia apenas mandado uma mensagem para ele na noite ant
ClaireQuando a festa acabou e quase todos foram embora, René se despediu anunciando que levaria Charlotte para casa. Jean-Luc, por outro lado, se trancou no escritório com dois de seus homens, discutindo algo que me foi vedado. Suas esposas e o filho de um deles, um bebê de seis meses, ficaram na sala de estar. Elas conversavam entre si. Às vezes me olhavam e sorriam sem graça, mas em momento algum tentaram me integrar à conversa. A mãe da criança percebeu que eu olhava demais para seu filho.— Quer pegá-lo?Isso pegou-me de surpresa. Olhei-a com espanto.— Não — disse baixinho, forçando um sorriso.O menino era lindo. Pele escura, olhos pretos como a noite e bochechas grandes. Apesar de sonolento, ele me olhava e sorria receptivo. Instintivamente minha mão foi à barriga, repousando-se ali. Despedindo-me com um breve boa-noite, deixei a sala. A casa estava silenciosa, apenas o crepitar das lareiras preenchia os cômodos. Caminhei até a biblioteca, onde o fogo projetava sombras longas
ClaireParis, 2018. A noite caía suavemente sobre a Cidade das Luzes, derramando sombras longas pelas ruas estreitas e antigas. Eu sentia o frio úmido penetrando minha pele, mas meu coração ardia com uma inquietude que nenhuma estação poderia acalmar. Caminhava apressada pelo Boulevard Saint-Germain, com meus pensamentos dispersos como as folhas de outono aos meus pés. A galeria onde eu costumava buscar inspiração estava a poucos metros de distância, e eu ansiava pelo refúgio silencioso que as pinturas ofereciam. Eu precisava escapar das memórias que me assombravam, das incertezas que pendiam sobre meu futuro como uma espada invisível. As ruas de Paris, embora familiares, pareciam mais solitárias naquela noite. Entrei na galeria, e o cheiro familiar de tinta e madeira velha me acolheu imediatamente. Passei pelas obras conhecidas, cada pincelada contando uma história, mas naquela noite, uma sensação de antecipação rastejava pela minha mente. Meus olhos começaram a percorrer ao redor.
ClaireOs dias que se seguiram foram marcados por uma inquietante sensação de expectativa. Cada pensamento meu era tomado por Jean-Luc Moreau, seu sorriso enigmático e os olhos que pareciam sondar minha alma enquanto falávamos de arte. Eu tentava afastá-lo de minha mente; era ridículo pensar tanto em alguém que conheci por menos de meia hora, mas ele insistia em ocupar meus pensamentos como uma obra inesquecível. Naquela tarde de céu nublado, eu estava em um pequeno café no Marais, tentando concentrar-me em um livro que mal conseguia ler. Minhas mãos tremiam de modo quase imperceptível ao passar as páginas. Meu coração estava acelerado como se o amontoado de palavras no papel estivesse prestes a me levar a embarcar em uma aventura desconhecida. Então, ele apareceu. O sino acima da porta anunciou a chegada de alguém junto a um leve arrepio nos meus braços. Imediatamente olhei para a entrada a tempo de ver Jean-Luc atravessar pela porta com uma elegância natural. Seus passos determina
ClaireSuas palavras foram o suficiente para selar nosso destino naquele fim de tarde até o cair da noite. O café se esvaziou ao nosso redor, mas nós permanecemos ali, presos em um jogo de olhares e palavras que pareciam desafiar as leis do tempo e do espaço enquanto falávamos sobre arte e um pouquinho de nada sobre mim e meus estudos. Por um segundo, senti que estava falando muito e rápido demais. Estava começando a parecer exagerada. Então, eu me calei, suspirei fundo e tomei um gole do meu café que já estava gelado. Prova de que eu havia falado demais! — Claire, posso lhe fazer uma pergunta? — perguntou Jean-Luc após um momento de silêncio carregado. — Claro — respondi, sentindo meu coração bater mais rápido. Ele estudou meu rosto por um instante, como se estivesse buscando algo nas linhas sutis de minha expressão. — Por que Paris? Por que deixar sua família e vir para cá estudar arte? A pergunta de Jean-Luc era direta e simples, mas carregava um peso que eu não esperava. Eu r