Ingrid
20 de janeiro de 1999 - 22h30min
- Meu nome é Ingrid. Ingrid Santana. - Cruzo os braços sob meus seios, de modo a deixa-los em evidencia. Funciona. Lucas imediatamente desvia o olhar para meu decote, engolindo em seco.
- Certo, prazer em conhecer você, Ingrid. - Ele balança a cabeça e a expressão confiante volta a aparecer em seu rosto. - E então, o que há com a pedra? - Descruzo os braços, e volto a analisar o anel em meu dedo.
- É uma aliança de ouro branco, dezoito quilates. - Aproximo mais a mão de meu rosto, para poder analisar melhor o diamante. - Diamante... Realmente uma bela pedra... Tamanho... - Lucas abre a boca, mas eu o interrompo com um gesto dramático, pois meu show ainda não terminou. - Cento e cinquenta pontos. Não está sujo, machado e, pelo que eu percebi, não há arranhões em sua superfície. Eu diria que custa cerca de cento e cinquenta mil reais. Estou certa? - Lucas parece surpreso com meus conhecimentos, sua sobrancelha tão erguida que ameaça sumir por baixo de seus cabelos claros.
- Você está quase completamente certa. Na verdade, ele custou mais de duzentos mil. - Dou de ombros, tentando disfarçar minha surpresa com indiferença. Ridiculamente caro, com certeza.
Por um tempo, ficamos parados, nos encarando de cantos opostos do quarto. A empegada e o filho do chefe, tão distintos... Ok, chega de amargura Ingrid, você precisa tirar essa merda deste anel do dedo, devolver para Lucas Martinelli, terminar de limpar e voltar para casa, tudo exatamente nesta ordem.
Lucas ri de minhas tentativas infrutíferas e então caminha até mim. Antes que eu perceba, ele está me puxando pela mão, em direção ao banheiro. Lá, ele liga a água da pia no máximo, enche nossas mãos de sabonete líquido e começa a esfregar a minha entre as dele, fazendo bolhas surgirem na água e o cheiro de lavanda impregnar o ambiente.
- Espere, o que você está fazendo? - Tento puxar minha mão de volta, mas Lucas é mais consideravelmente mais forte do que eu e acabo me aproximando ainda mais dele, ficando com as minhas costas pressionadas contra seu peito musculoso e suado... Foco Ingrid, ele é o filho do chefe, herdeiro da máfia do norte e totalmente inalcançável.
- Estou tentando tirar isso do seu dedo. Não pretendo pedir ninguém em casamento tão cedo, mas é uma relíquia de família e preciso disso de volta. - Ah, claro, água com sabão com certeza vai facilitar as coisas aqui. Como não pensei nisso antes? Ingrid, foco, você não é assim.
Cerca de cinco minutos se passam, com Lucas massageando minha mão, fazendo o sabão se espalhar, e então o anel finalmente sai de meu dedo. Lucas então o segura em frente ao meu rosto, sorrindo vitorioso para mim, e depois joga a joia de duzentos mil reais na saboneteira, sem qualquer cerimônia, como se não valesse nada.
Dou de ombros novamente, secando minha mão com algumas toalhas de papel e voltando para o quarto, no intuito de terminar de limpar enquanto Lucas toma banho, mas, ao invés de fazer isso, ele me segue de volta para o quarto, atirando-se, todo suado, entre as almofadas que eu acabei de arrumar com tanta destreza.
Reviro os olhos, mordendo a língua para não proferir uma infinidade de palavrões que aprendi com minha mãe. Já estou acostumada, no entanto, aos filhinhos de papais, descendentes de mafiosos ricos, que acham que o mundo gira ao seu redor e que é fácil arrumar almofadas... Embora realmente seja, mas isso não vem a caso no momento e também não aplaca minha ira.
- O senhor quer que eu termine de limpar o quarto, ou prefere que eu volte amanhã? - Fico de pé, parada ao lado do balde, sem saber o que fazer a seguir.
- Pode terminar de limpar. - Ele responde, com indiferença, enquanto manda mensagens no celular e me ignora completamente. Um humor totalmente diferente de alguns minutos atrás, percebo, mas foda-se, ele que se exploda, vou terminar o que estou fazendo e ir para casa logo.
Coloco meus fones de ouvido novamente, concentrando-me na música enquanto limpo e o ignoro, assim como ele está se esforçando tanto para fazer comigo.
A próxima hora, que passo esfregando o chão até que fique sem um grão de poeira e brilhoso, é uma tarefa exaustiva, mas não reclamo nem fraquejo, mantenho minha cabeça baixa e trabalho em silêncio, a fim de não ser mais notada do que já fui.
No entanto, quando termino de limpar a última lajota e começo a me levantar, uma dor aguda, como uma punhalada na espinha, me faz soltar um leve gemido, colocar a mão nas costas, como que para segurar a dor, e voltar a me ajoelhar no chão, olhando para baixo com lágrimas nos cantos dos olhos.
- Você está bem? - Ao que parece, Lucas não estava tão indiferente assim a minha presença quanto eu imaginava, pois, em um milésimo de segundo, ele está ajoelhado ao meu lado, com uma das mãos em minha coxa e a outra sobre a minha, em minhas costas.
- Eu estou bem, estou bem. - Lucas me ajuda a levantar e, para minha surpresa, junta todos os utensílios de limpeza e joga-os dentro do balde. - Eu não preciso que você faça isso, Lucas. - Mas ele já está de volta, guiando-me até sua cama, onde me ajuda a sentar, de forma confortável, contra as almofadas.
O que está acontecendo? Me questiono, quando Lucas Martinelli vai até a porta, tranca e volta a caminhar em direção a cama. Ama sempre nos avisou, a mim e a Agnes, sobre isso, membros da família, homens, que poderiam querer se aproveitar de nós... Ela sempre fala para corrermos, mas para onde? A porta está fechada. Desespero começa a subir pela minha garganta, deixando um gosto amargo em minha boca e fazendo eu me encolher contra as almofadas, esperando sumir entre elas.
- Está tudo bem, não vou fazer nada com você, só fechei a porta para ninguém vê-la assim, no meu quarto e na minha cama, por sinal. - Diz Lucas, ao perceber que estou com medo.
Ele então avança lentamente, com as mãos estendidas a frente do corpo, as palmas voltadas para mim, como que para mostrar que não há nem uma arma com ele e que ele não me fará mal algum.
- Desculpe, eu só... - Relaxo novamente contra as almofadas, fechando os olhos e tentando esquecer a dor que sinto nas costas, mas esta parece estar se espalhando por todo o meu corpo ao invés de diminuir.
- Você está bem? - Ouço sua voz e sinto o colchão afundar sobre o seu peso quando ele senta ao pé da cama.
- Sim, estou. - Suspiro e abro os olhos, encarando-o. - Apenas muitas horas de trabalho pesado. - Com esforço, levanto-me da cama.
- Não, espere. - Ele pega meu pulso, puxando-me de volta para a cama e me fazendo soltar outro suspiro, pois a dor aguda me atinge com força novamente. - Por favor, me desculpe. - Ele balança a cabeça, seus olhos cheios de arrependimento.
- Não quero ser um incômodo para você...
- Não, tudo bem, fique o tempo que precisar. - Lucas passa uma das mãos pelos cabelos, parecendo cansado e sem brilho pela primeira vez desde que o conheço. - Então, já que estamos aqui, por que não me fala como sabe tanto sobre diamantes? - Não. Não quero falar sobre isso, pois dói demais, mas, olhando em seus olhos verdes, percebo que talvez valha a pena.
- Meu pai era um joalheiro e ourives, ele tinha uma joalheira pequena no centro da cidade e ele tinha um amor por pedras preciosas. Ele me ensinou tudo o que sei. - Lucas inclina a cabeça para o lado, parecendo confuso.
- Se o seu pai tem uma joalheria... - Ele aponta para o balde de limpeza e depois para meu uniforme de empregada. - Por que você trabalha como faxineira em minha casa? - Suspiro, pois essa é exatamente a pergunta que eu temia.
- Eu disse tinha, meu pai tinha uma joalheria, mas não tem mais. - Ele faz um gesto com a mão, para que eu prossiga. - Meus pais sempre foram ambiciosos, sempre querendo mais e mais dinheiro, apesar de já termos mais do que o suficiente para vivermos confortavelmente. Eu falei para eles... - Sacudo a cabeça, não querendo entrar em detalhes sobre essa história, a história de minha vida, com um estranho. - Enfim, eles perderam tudo o que tínhamos, se viciaram e agora eu sou a única que trabalha em casa. - Ele franze o lábio, ainda com a cabeça inclinada para o lado.
- E são só vocês três? - Balanço a cabeça em negativa.
- Não, tenho mais cinco irmãos, todos mais novos do que eu. - Aos poucos, sinto a dor ir amenizando, mas estou gostando da conversa, pois sinto-me confortável na presença de Lucas, então continuo onde estou.
- Nossa... E só você trabalha? Ganha o suficiente para todos? - Suspiro, balançando a cabeça para os lados, insinuando que mais ou menos. - Eu poderia tentar conversar com minha mãe sobre a sua situação...
- Não, por favor, não fale com a senhora Martinelli sobre isso, não a incomode. - Quase grito, em desespero, temendo por meu emprego. O pagamento aqui realmente não é dos melhores e o serviço é pesado, mas é o que tenho e não posso, em hipótese alguma, perder ele.
- Ei, ei, está tudo bem. - Lucas ri, aproximando-se de mim e pegando meu rosto entre as mãos para que eu fique parada e olhe em seus olhos.
Ao sentir o toque delicado de Lucas em meu rosto e o cheiro de seu hálito quente, que faz cócegas em meus lábios, meu coração para, levanta, tropeça e volta a bater em um ritmo anormalmente rápido, quase saindo pela minha boca no processo. Ele está tão perto, seu toque é tão afetuoso e seu cheiro é tão bom...
Eu nunca beijei um menino, nunca tive esse interesse e sempre estive ocupada demais para isso, mas olhando nos olhos de Lucas, sinto uma vontade devastadora de me inclinar mais em sua direção e pressionar meus lábios contra os dele.
Olho para seus lábios, cheios e rosados, e sinto os meus se entreabrindo ao mesmo tempo que meus olhos se fecham, mas nada acontece por um longo tempo, talvez longo demais. Estou prestes a abrir os olhos novamente, pedir desculpas e sair daqui, quando sinto seus lábios, quentes e possessivos, pressionando os meus com força e... Desejo?
Lucas pousa a mão em minha bochecha, inclinando minha cabeça para trás e aprofundando o beijo. Borboletas parecem se agitar em meu estômago enquanto um gemido escapa por entre meus lábios. Se eu soubesse que beijar é tão bom, penso, enquanto Lucas passa a língua por meu lábio inferior, lentamente e de forma sedutora, eu já teria feito isso muito antes.
Nosso beijo dura uns dois minutos, no máximo, mas ele é terno e cheio de desejo, tão bom que deveria ser proibido se afastar e encerrá-lo, mas quando nos afastamos, ambos ofegantes, Lucas sorri e me dá um selinho, deixando claro que gostou tanto do beijo tanto quando eu.
Nos beijamos por mais um tempo, mas, quando o relógio badala, declarando que já são 23h, afasto-me, pego o balde de limpeza e deixo o quarto, sem lhe dizer mais nada, apenas olhando-o por cima do ombro, de forma provocativa, e mordendo meu lábio inferior.
Já no corredor, corro até o armário de limpeza e me enfio dentro do espaço apertado, junto com baldes e esfregões, e toco meus lábios, sorrindo. Céus, eu beijei Lucas Martinelli, o príncipe da máfia do norte, o sonho de todas as meninas da cidade... O pior de tudo é que eu gostei e, meu Deus, eu quero mais, quero muito mais com ele, desejo mais.
Não sabia que era possível sentir isso por alguém, um desejo tão desesperado e urgente, uma vontade tão grande de estar junto que, enquanto saio pela porta do armário, preciso me esforçar ao máximo para seguir pelo corredor e não voltar para o quarto de Lucas.
- Eu juro que jamais voltarei lá, jamais beijarei ele novamente. - Sussurro para mim mesma, determinada a manter esta promessa, pois dependo deste emprego e não o perderei por causa de um riquinho metido a besta como Lucas Martinelli.
Ingrid 08 de dezembro de 1999 - 05h30minAcordo e imediatamente me sento, com cuidado, tentando não acordar Anne, Lina e Louise que dormem comigo em uma cama de casal. Ao nosso lado, em uma cama de solteiro, estão espremidos meus outros irmãos, Camille e Angel, o caçula. Ainda zonza de sono, olho para o relógio na parede e suspiro, em frustração, pois já são 05h30min, o que significa que tenho que levantar se não quiser chegar atrasada no trabalho novamente. A vida de uma empregada doméstica não é nada fácil. Cheguei em casa quase duas da manhã e já estou tendo que sair novamente, antes das sete. Embora, para ser bem honesta, eu não estava limpando até tão tarde, e sim fazendo outras coisas... Ok, admito, eu estava no
Ingrid 08 de dezembro de 1999 - 06h20min Abro a porta da cozinha, entrando como um vendaval, indo até onde Agnes e Ama se apressam em terminar de preparar o café da manhã dos Martinelli. Quando as alcanço, as duas parecem perceber que algo não está bem, então apenas lhes mostro a sacola com os três testes de gravidez. - O que é isso? Um presente para nós? - Agnes brinca, mas para de rir imediatamente assim que vê minha expressão, percebendo que estou falando sério. Tiro os testes e mostro para elas. Só há duas pessoas além de mim e de Lucas que sabem sobre nosso caso, que vem se intensificando cada vez mais no decorrer dos meses, então elas entendem, sem que eu precise lhes explicar nada, o que está acontecendo. - Ah, minha criança, como pôde ser tão tola. - Ama larga o que está fazendo e vem até mim e então as lagrimas começam a esc
Angel Camille01 de junho de 2015, 06h45minAcordo ouvindo os gritos de minha mãe vindos da sala e, imediatamente, ponho-me de pé e saio do quarto, desesperada, indo em direção ao som de seus gritos para saber o que está acontecendo e tentar ajuda-la, mas, quando entro no cômodo, a cena que se desenrola a minha frente me faz parar, boquiaberta, tentando assimilar o que estou vendo. Minha mãe está deitada no chão, protegendo sua barriga com as mãos, enquanto meu pai grita com ela. Estou tão assustada que fico momentaneamente congelada, sem entender uma palavra do que eles falam, apesar do volume elevado da discussão. - Mãe. - Saindo de meu transe, tento chegar até ela, mas um dos empregados de meu pai me agarra pelo braço, impedindo qu
Angel Camille15 de março de 2016 - 22h40minFaz cerca de três horas que tia Agnes foi embora, levando Anne Louise com ela e me fazendo prometer quer, assim que eu chegar em casa, vou ligar para ela para lhe contar como foi meu primeiro dia de trabalho. Nesse momento, já de banho tomado e cabelo escovado, estou de pé em meu quarto, analisando o uniforme de bartender que Leopoldo me entregou a tarde e disse para eu vestir para a noite. A roupa é ridícula, não há outra forma de descreve-la. Para “trabalhar”, terei que vestir uma saia de couro preta de, no máximo, 35 centímetros de cumprimento, um top de lantejoulas prateadas e com alças finais, uma meia calça arrastão e uma bota preta de cano alto com um salto agulha de dez centímetros. &nbs
Angel Camille16 de março de 2016 - 07h30min- Camille? Cami, acorde. - Tia Agnes balança meu ombro suavemente para me acordar. Abro os olhos, confusa, tentando desviar da claridade ofuscante do sol que ameaça me cegar a qualquer momento. Olhando ao redor, percebo que estamos estacionadas em uma rua residencial, mas não é qualquer rua. Nunca andei muito pela cidade onde eu morava antes, era apenas de casa para a escola e da escola para casa, visto que a boate de meu pai ficava logo abaixo, mas, ainda assim, tenho certeza que lá não haviam prédios como estes. É como se, ao construí-los, os arquitetos e engenheiros quisessem desafiar as leis da física e da lógica. Os prédios que ficam do lado esquerdo da rua, todos com mais de cinquenta metros de altur
Angel Camille16 de março de 2016 - 08h30minQuando tia Agnes para o carro, engasgo e começo a tossir, tentando disfarçar minha surpresa, ou melhor, meu susto, enquanto olho para a pequena, velha e encardida casa a nossa frente. Quando morei em Deoiridh, a nossa casa não era das melhores, mas ao menos era nova e bem cuidada. Essa é o contrário, mas, olhando mais atenciosamente, ao menos parece aconchegante. O telhado é feito de telhas de barro marrom escuro desbotado e as paredes, outrora pintadas de branco, estão com manchas de umidade e bolor por toda a sua extensão. As janelas e a porta da frente... Não há o que falar, estão em péssimo estado. - Não está tão ruim assim, para ser bem honesta. - Digo, enquanto minha tia me olha,
Andres27 de abril de 2017 - 11h30min- Comprou tudo, mãe? - Pergunto, entrando na cozinha de mármore preto, decorada com madeira de diferentes tons de marrom escuro e creme, e indo até a pia lavar as mãos. Nosso apartamento é uma cobertura e é ridiculamente grande... Já notei isso, é óbvio, visto que moro aqui desde que nasci, mas não consigo deixar de pensar nisso toda vez que entro aqui. O apartamento tem quatro suítes, todas ocupadas, e dois quartos de hóspedes, dois lavabos, dois escritórios, um para cada um de meus pais, uma biblioteca, sala, cozinha, sala de jantar e uma área com uma vista linda do topo das árvores da minifloresta que fica na frente do prédio e das casas mais simples do outro lado das árvores... Ou seja, ridiculamente grande.<
Andres28 de abril de 2017 - 00h30minLuana, no final das contas, acaba sendo uma companhia mais útil do que eu havia imaginado quando aceitei seu convite, pois ela fala sobre a vida dela, sem perguntar sobre a minha, e me faz quase esquecer de meu pai... Mas apenas quase. - Então, o que você quer fazer agora? - Luana pergunta, assim que saímos da roda gigante, que é pequena, apertada e muito lenta, agarrando-se ao meu braço como a um colete salva vidas em meio a uma tempestade no mar. - Vai continuar me fazendo companhia ou já chegou sua hora de partir? - Ela joga os cabelos curtos para trás dos ombros, dando um sorriso doce e encantador. - Não, minha hora ainda não chegou. - Olho para ela e sorrio de volta. - Que tal se a gente... - Estou prestes a convidá-la para dar uma volta, beber ou co