Adriano...
Eu estava tão maluco com a ideia de ter de me casar que quase não dormi e agora estava ainda mais aborrecido do que ontem. Isso era ótimo, para ser bem irônico.
Se Hank não fosse tão irritante com essas regras familiares eu poderia já ser o dono legal do castelo á essa hora. O tempo corria e eu precisava me organizar para não deixar Diogo passar na minha frente. Isso eu não iria admitir.
Diogo nem mesmo gostava desse tipo de coisa. Ele achava que propriedades assim antigas, deveriam ser reformuladas e modernizadas. Dizia que o passado deveria ficar para trás. Se ele ganhasse o castelo, eu poderia dizer adeus de vez á propriedade.
Não conseguia me concentrar no exercício e decidi parar. Achei melhor ir tomar um banho.
_ Só espero que o vizinho não venha me encher. Cara chato!
Liguei o som e deixei o Steve Tyler da banda Aerosmith gritando a plenos pulmões. Gosto de ouvir música alta quando estou ansioso como agora.
Meu vizinho de baixo é um velho chato que reclama de tudo. Quando comprei a cobertura achava que não teria problemas, mas me enganei. Mesmo estando no último andar, de vez em quando as pessoas reclamavam que eu fazia barulho.
Mas eu gostava de morar ali, comprei pela localização, só por isso não me mudara ainda. Talvez no futuro eu fosse para uma casa. Afastada, de preferência. Assim ninguém me encheria por causa de minhas músicas altas e nem das festas até tarde.
Pensei e repensei em tudo o que Alexandre havia dito sobre a herança e quando achava uma saída, logo depois via que não daria certo. Teria mesmo que existir uma mulher real usando meu sobrenome e vivendo comigo.
“Inferno, odeio precisar dos outros”.
A ideia dele de usar a boba da minha secretária era a única saída até o momento. O problema seria ela me ajudar. Eu não gosto dela, mas todos na empresa gostam e Alexandre sempre que aparece é todo gentil. Ele até a acha bonita.
“Como? Só eu que a vejo como é? Não é possível que eu seja o único errado nisso."
_ Ah, que frustração!
Minha cabeça está cheia. Os pensamentos em um turbilhão de ideias, se emaranhando todas e me confundindo mais.
Pensei em como ela seria se fosse mais arrumada. Deixei a água correr no meu corpo e me veio à ideia de xeretar a vida dela. Eu não sabia nada além de seu nome.
Saí do banho e me enxuguei rápido, indo atrás do notebook. Acessei o arquivo da empresa com minha senha pessoal e pesquisei o nome dela. Uma foto com detalhes apareceu.
_ Nossa, já são quase dois anos?
A foto não era das melhores, era pequena e parecia velha, mas dava para notar os grandes olhos castanhos, a boca carnuda, o nariz arrebitado e o cabelo loiro que estava solto. No trabalho ela sempre o deixava preso em um coque de velha.
Analisando bem, ela até que tinha potencial se usasse roupas melhores e se ajeitasse. Era magra demais, quase esquelética. Eu gosto de mulheres magras, mas não ossudas. Carne sempre é bom.
Só que isso não era importante agora. Ouvi o celular tocando no quarto, era Alexandre.
_ Liguei cedo para avisar que Álvaro vai te ligar para saber sobre sua noiva.
_ Noiva? – esfreguei a nuca _ Que papo é esse? Ficou doido, homem?
_ Ele me ligou. Diogo não gostou da mudança de data e reclamou sobre ser mentira que você tinha alguém sério e eu joguei essa de noiva. Se fosse deixar como estava, Diogo iria convencer Álvaro de que era mentira sua ter alguém em vista.
_ Filho da p**a! Eu sabia que ele estava de olho. Sacana - disse irritado.
_ Pois é... Quando ele ligar, crie algo, diga que era segredo... Sei lá! Só não me deixe como mentiroso. Eu joguei como não queria nada, no meio da conversa e me fiz de espantado por ele ainda não saber que você está quase morando com alguém.
_ Ok. Fazer o que? Estou metido em uma roubada, isso sim.
_ Já falou com a Bianca?
_ Ainda não – resmunguei.
_ Tem outra em vista?
_ Não.
_ Então espero que consiga convencê-la ou está perdido. Fodido é a palavra certa.
Quando ele desligou ainda fiquei de cabeça baixa um tempo, pensando no que faria e minutos depois Álvaro ligou mesmo. Consegui fingir surpresa por ele saber sobre meu romance secreto. Não iria deixar o Alexandre como mentiroso. E precisava usar a mentira ao meu favor.
_ Então é verdade? - Álvaro perguntou.
_ Sim – disse animado _ Já estamos com data marcada para o casamento.
_ Mesmo? Que surpresa. Eu nem sabia que estava namorando.
_ Não queremos que outros saibam. Pode guardar segredo? - aumentei a mentira _ Ela é tímida.
_ Claro. Entendo que sua fama de playboy possa atrapalhar, caso suas ex resolvam aparecer.
Senti vontade de mandá-lo á merda, mas me segurei.
_ Na verdade, não quero dividí-la com ninguém – menti de novo. Estou virando especialista.
_ Ah, então ela deve ser muito especial.
_ Com toda certeza. Uma garota muito especial.
_ Bem, voltarei na sexta pela manhã ou no início da noite.
_ Ótimo. O casamento será no sábado.
“Eu estou doido”.
Falamos um pouco e depois desliguei antes que me enrolasse mais. Minha agenda marcava duas reuniões em outras filiais, então eu só estaria de volta na sede no final da tarde, talvez. Respirei fundo e decidi ligar para senhorita santa que atendeu com voz de sono.
_ Sr. Mendez? O que quer?
Não sei se a assustei ou se não gosta de acordar tão cedo. Talvez as duas coisas.
_ Talvez eu não possa retornar á sede ou chegue tarde e preciso que faça algo muito importante pra mim, como sem falta.
_ E o que seria? M****r flores pra outra amante?
Eu até achei engraçado o resmungo dela. Parece que pela manhã ela era mais corajosa.
_ E desde quando eu faço isso?
_ Desde que comecei a trabalhar com o senhor. Várias vezes, aliás.
Verdade. Eu a mandava até mesmo dispensar a mulher quando estava de saco cheio. Flores e presentes era o mínimo.
_ Não é isso, é algo importante de verdade.
_ E o que é?
_ Preste atenção para não fazer besteira – ouvi seu suspiro _ Ao meio-dia você vai me ligar. Em ponto, sem falta. Vai me dizer que chega hoje e...
_ Quem chega?
_ Cala a boca e me escuta – mandei _ Vai falar comigo como se fôssemos namorados e...
_ O que? – ela se espantou.
_ Não me interrompa – bufei _ Você vai estar em viva voz e tem que parecer íntima. Vamos falar sobre o casamento hoje á noite e quando eu chegar ao escritório te ligo – eu sabia que ela estava confusa _ Te explico depois o que isso quer dizer. Você entendeu? Tem que parecer íntima. Me chame pelo nome.
_ Na verdade não entendi. O senhor está bem? Era comigo mesmo que queria falar agora?
_ Estou ótimo. A tonta é você.
_ Realmente está bem – torceu a boca.
_ Lembre-se de parecer íntima, como uma namorada – desliguei na cara dela.
*******
Comecei meu plano aparecendo na casa dos meus tios, coisa que há tempos não fazia, mas sabia que encontraria Diogo lá. Ele mora no mesmo condomínio. Usei a desculpa de estar por perto e resolvi almoçar com eles.
Era ridículo ver Diogo de mão dada com a esposa. Não sei se meus tios não sabiam que era gay ou se aprovavam a mentira para evitar fofocas com o nome da família. Dá pra saber só de olhar. Ele nem mesmo tem um jeito másculo.
Acho isso uma bobagem. Ele deveria assumir e ir atrás da vida que queria ter ao invés de ficar mentindo para agradar e esconder. É até pior na minha opinião. Cada um tem direito de procurar a vida que se sentir melhor, se sentir feliz de verdade.
No horário certo o celular tocou. A tonta era mesmo uma boa secretária. Eu estava sentado á mesa ao lado de minha tia e dei um sorriso de propósito antes de atender. A farsa começava. Atendi sorrindo olhando para Diogo.
_ Bianca – atendi animado. Ela ficou em silêncio e repeti _ Oi, Bianca?
_ Oi... Adriano – falou baixo.
_ Oi minha bonita, quando chega? – tive vontade de gargalhar. Ela deve ter ficado travada.
_ Já cheguei...
_ Que bom. Te ligo quando chegar ao escritório. Vamos acertar o casamento. Agora não posso falar, estou almoçando com meus tios.
Todos olharam para mim com cara de surpresa.
_ Ok – ela murmurou _ Te espero.
_ Se cuide bonita. Até mais – desliguei.
_ Casamento? Você? –Diogo perguntou _ Quem é a azarada? – riu de modo cínico.
Me inclinei para frente com um sorriso falso.
_ Minha secretária.
_ Nossa, que mudança – fez um gesto com a cabeça _ Pra quem vivia cheio de modelos, vai casar com a secretária.
_ E o que tem demais isso, filho? O importante é o amor. Tenho certeza de que ela é especial – minha tia sorriu para mim, seu sobrinho preferido.
Não sabia o que falar sobre Bianca, eu não me ligava em sua vida. E agora só inventando.
_ Ela é... Diferente – isso era verdade _ Avoada e desastrada – meu tio franziu o cenho _ Não gosto quando ela se machuca. Ela sempre se assusta com tudo.
_ Ah, sim – sorriu _ Quero conhecê-la.
_ Eu também, primo. Parece que está apressado. Por quê?
Entendi a indireta dele, mas fiquei na minha.
_ Quero me assegurar de que ela será só minha. Não é sempre que a gente conhece alguém assim como ela.
_ Ih, meu sobrinho se apaixonou. Demorou, mas ainda bem que aconteceu.
Ri do comentário de minha tia. Isso não seria possível, até porque eu não sabia absolutamente nada sobre ela. Teria que corrigir isso. Falei sobre o óbvio.
_ Todos gostam dela na empresa. Ela é educada e gentil, um pouco tímida, fala baixo, faz café e sanduíche para os funcionários, ouve o que eles têm a dizer. É ótima como secretária.
_ E ela é bonita? – Diogo perguntou.
_ Tem grandes olhos castanhos, cabelo loiro, nariz arrebitado, boca carnuda e me atura.
Tentei lembrar de mais detalhes, mas não consegui. Apenas sorri parecendo feliz.
_ Isso já a faz uma santa – Diogo completou.
Quase isso, já que eu a chamava assim.
_ Na verdade ela é boa demais pra mim – assumi.
Não dava para esticar mais a conversa ou ficaria estranho caso a senhorita santa não fosse me ajudar. Eu ia me meter em uma confusão. Mudei de assunto, aproveitei o almoço e me despedi da família, sabendo que deixara Diogo com uma pulga atrás da orelha.
Porém, ainda no caminho para minha segunda reunião minha tia ligou nos convidando para um jantar.
_ Não pode manter a garota só para você. Não seja egoísta. Somos sua família e quero conhecer a garota que conseguiu fazer você mudar de status.
_ Claro que não, tia. Falarei com ela e ligo para marcar – disfarcei.
_ Estarei esperando. Ansiosa.
Desliguei imaginando como faria para que a santinha me ajudasse nessa ou estaria mesmo fodido dessa vez.
Se eu soubesse como jogar as cartas poderia mostrar a ela que só teria vantagens me ajudando com esse plano. A questão é que talvez ela não tivesse mesmo jeito para isso, assim como Alexandre pensava.
Não sei de onde ele tirou a ideia de que ela é especial. Em que?
A garota parece lerda, vive calada, com cara de fome e de preocupação. Como alguém assim, pode ser especial?
Bianca... Eu ainda não entendi o que o Sr. Mendez quis fazer com essa chamada e nem porque queria que parecêssemos íntimos. Foi estranho. Ele era estranho. Sempre fazia o que lhe pedia e ainda assim me tratava mal. O homem parece que me detesta e eu nem sei o motivo. Acho que só de chegar perto ele se irrita, por isso mesmo eu até evito e só falo com ele o necessário. O celular vibrou. Era a atendente da clínica. Precisava falar comigo. _ Eu não recebi nenhum aviso. _ Deve ter sido algum problem
Bianca... Acho que paralisei. Não consigo entender o que ele disse. Meus ouvidos estão com um zumbido estranho, parece aquela música de filme de terror. Talvez eu fosse mesmo um pouco lenta como ele sempre me dizia. Acho que abri e fechei a boca várias vezes sem emitir som porque ele me olhava impaciente. _ Entende o que digo? – arqueou a sobrancelha. _ Não – balancei a cabeça. Desci da cadeira o encarando _ Acho que o senhor está brincando comigo e não gostei da brincadeira. _ Não sou homem de brincadeiras. Não desse tipo.
Adriano... Quando ela saiu me deu uma vontade enorme de beber. Sentia meu corpo inteiro formigar. Eu nunca fiz uma coisa assim, pedir ajuda para conseguir algo para mim. Enchi um copo de uísque e liguei para Alexandre. Tinha que contar sobre a ideia dele começando a nascer. _ Parabéns! Eu não achava que isso daria certo – ele disse rindo. _ Como não? A ideia foi sua – me sentei na cadeira da varanda. _ Eu sei, mas pensei que seria tão cabeça dura que não baixaria a bola para se casar com uma secretária. Ela é mesmo uma santa. Se f
Adriano... Cheguei ao escritório bem cedo e a chamei. Agimos como se estivesse tudo normal para não chamar a atenção dos outros funcionários. Para todos os efeitos já estávamos namorando escondido, assim se não desse certo terminávamos e tudo seguia como sempre. Essa seria a versão que iríamos contar a todos que perguntassem. _ Daqui a pouco você tem compromisso com a Bete. _ Quem é Bete? – ela ficou confusa. _ É a dona do salão que vai dar uma geral em você. Ela é de confiança e muito séria, não vai te fazer perguntas pessoais. Ouça as d
Adriano... *Durante o trajeto até a casa dela, Adriano ficou calado, pensando no que estava para fazer, mas assim que viu onde ela morava desandou a falar, reclamando de tudo. _ Esse lugar é péssimo. Como pode viver aqui? _ É o que posso pagar – ela tremeu_ E você não tem que reclamar, não mora aqui, mora? _ E onde diabos gasta o seu dinheiro? Com roupas é que não é – olhou de cara fechada o lugar feio e pequeno _ Não tem nada aqui. É tudo pequeno e apertado. Sem cor, sem graça.
Bianca... Não consigo mais dormir e a culpa é de Adriano. Como sempre ele conseguia me tirar a paciência e tranquilidade. Antes esse assunto de sexo não estava nos planos e agora me assombra. Claro, mais uma mudança repentina dele. “Como faço agora”? Eu nunca pensei que teria um amante, menos ainda que fosse meu ex-chefe e que ele fosse meu marido. Bom, eu nem pensava em ter um marido um dia. “Que coisa bizarra”! Minha mente está tão cheia que até me sinto cansada. Tanta cois
Bianca... Eu nunca soube como agir com empregados particulares, também nunca tive um. O máximo que cheguei a ter foi uma diarista que trabalhou na casa de Emília durante um tempo antes de ela adoecer. Quando tive que escolher entre comprar os remédios e pagar alguém para limpar a casa, decidi eu mesma fazer a limpeza, até porque nunca tive drama com relação a isso. Era feliz só de ter um teto sobre minha cabeça, um prato de comida quente e uma cama para descansar. E eu mesma fazendo a faxina economizava muito mais. Até aprendi alguns truques de limpeza que me ajudaram a economizar material, assim não precisava ficar comprando direto. A educada senhora que trabalha para ele, na verdade se ch
Bianca... Estou um pouco tensa com esse jantar. Não sei se a família de Adriano é como ele, boca grande. Se for vai ser uma noite demorada. Lidar com um já é difícil, imagine com a família inteira? Vou ter que contar com a sorte para terminar a noite. Adriano diz coisas que me machucam, mesmo que ele não tenha intenção disso. Se a família for igual terei uma noite dos infernos. E ainda tenho que fingir que estou apaixonada. Mas para ser honesta, quando eu trabalhava no escritório ele era bem pior. Não sei se é impressão minha ou se ele está mesmo fazendo esforço para ter um relação mais fácil comigo, talvez por necessitar de minha ajuda. Ele só tem esse motivo para ser agradável.
Último capítulo