Acordar atrasada já era motivo suficiente para começar o dia em desespero. Me arrumei apressada, pronta para ir ao trabalho, e desci às pressas para comer alguma coisa. — O que está fazendo arrumada, Atena? — Martina perguntou, mal contendo o riso. — Ué, estou indo trabalhar. Já se esqueceu que tenho uma empresa para cuidar com meu amigo? — Att, hoje é domingo, criatura. Confirmei no celular e percebi que ela estava certa. Me arrumar toda para trabalhar e perceber que era domingo foi o ápice do meu momento patético. Martina soltou uma gargalhada, e eu acabei me juntando a ela. Entre risos, decidi aproveitar o dia com Ellah. — Martty, quer vir com a gente? — perguntei, animada. — Acho melhor não. Tenho coisas a fazer aqui. — Claro que não tem! Você vai com a gente e ponto final. Martina me lançou um olhar de derrota, mas seu sorriso denunciava que, no fundo, estava feliz. — Titia, você vai pra onde? — Ellah apareceu na cozinha, seus olhos brilhando de curiosidade. —
Lukke Rock Acordei com o som estridente do meu celular vibrando na mesa de cabeceira. Esfreguei os olhos e olhei para a tela. Era a minha mãe. O alívio imediato por saber que ela estava bem após o susto do dia anterior foi substituído pelo nervosismo que sempre sentia antes de nossas conversas. Não era medo, mas ela sabia exatamente como me desarmar com palavras. — Bom dia, mãe — atendi com a voz rouca de sono. — Bom dia, meu filho. Como está? — Estou bem. E você? Atena me disse que passou mal ontem. — Já estou ótima, não se preocupe. Aliás, conheci a sua filha ontem. Soltei o ar que nem percebi estar prendendo. — Conheceu, é? O que achou dela? — Ela é um encanto, Lucas. Uma menina tão doce, tão esperta. E a tia dela… Atena, certo? Meu coração disparou só de ouvir aquele nome. — Sim, Atena. — Que mulher incrível! Educada, firme… E linda. Ri nervoso. Minha mãe nunca foi de medir palavras. — É, mãe. As duas são lindas. — E você está se apaixonando por ela, Luc
O palco estava montado, e a energia do público já podia ser sentida mesmo antes das cortinas abrirem. São Paulo nunca decepcionava. Sempre tinha algo de especial tocar naquela cidade, mas naquela noite parecia ainda mais intenso. Talvez fosse a adrenalina ou o peso das lembranças que a cidade trazia, mas tudo estava à flor da pele. Minutos antes do início do show, me sentei no camarim com a banda. Damian, Reed e Lennox estavam eufóricos, brincando e zombando uns dos outros. Mesmo assim, percebi que, por trás das piadas, cada um carregava a mesma expectativa que eu. — Pronto, galã? — perguntou Damian, com aquele sorriso de sempre. — Sempre. — Dei um tapa no ombro dele e me levantei. A voz do público ficou mais alta, quase ensurdecedora, quando as luzes começaram a piscar e os primeiros acordes ecoaram pelo estádio. Assim que pisei no palco, tudo desapareceu — os problemas, as preocupações, até mesmo o cansaço. Era só eu, minha música e o público. Cantamos os sucessos antigos,
Atena Godoy Minha manhã estava caótica, como sempre. A pilha de documentos sobre a mesa parecia multiplicar-se a cada segundo, e a quantidade de e-mails na minha caixa de entrada deixaria qualquer um à beira de um colapso. Mas não eu. Não havia espaço para falhas. Cada linha de cada relatório exigia minha atenção, e era exatamente nisso que eu estava concentrada quando Murilo apareceu à porta. Ele bateu levemente antes de entrar, o rosto carregado de cautela. — Senhora Atena, temos um visitante na recepção. Sem levantar os olhos do relatório que estava analisando, respondi automaticamente: — Ele tem horário marcado? — Não. Revirei os olhos, impaciente. — Então dispense. Não tenho tempo para surpresas hoje. Murilo hesitou, e quando ergui a cabeça para encará-lo, percebi que havia algo mais. Antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, uma voz irritantemente familiar ecoou pela sala. — Nossa, sendo dispensado assim? Que frieza, ruivinha. Levantei o olhar e lá estava
Cheguei em casa completamente exausta. A pilha de relatórios que enfrentei hoje parecia um teste de resistência, e ainda havia a interrupção inesperada de Lukke no escritório, que, honestamente, foi mais desgastante do que qualquer reunião da semana. Eu só queria um banho quente, um pouco de silêncio, e, se tivesse sorte, algumas horas de sono decente. Mas, claro, paz era algo raro na minha vida ultimamente. Assim que abri a porta da sala, um riso baixo chamou minha atenção. Franzi o cenho, deixando minha bolsa em cima da mesa lateral e seguindo o som até a sala de estar. Meus passos ficaram mais apressados quando percebi que vinham do meu quarto. Ao empurrar a porta, meu coração quase parou. — O que é isso? — minha voz saiu mais alta do que eu pretendia. Ellah estava sentada no chão com meu dossiê aberto no colo, e Lukke estava ao lado dela, folheando as páginas como se fossem trechos de uma revista qualquer. — Ah, você chegou, titia! — Ellah disse, com um sorriso inocent
Após o jantar, Ellah bocejou pela terceira vez, e eu sabia que era hora de colocá-la na cama. Apesar de todo o caos que ela causou mais cedo, ainda era uma criança adorável que precisava de descanso. — Vamos, mocinha. Hora de dormir — disse, levantando-me da cadeira e estendendo a mão para ela. — Mas eu não tô com sono! — protestou, esfregando os olhos enquanto segurava minha mão. — Claro que não está — retruquei com um sorriso divertido, guiando-a para o quarto. Depois de ajudá-la a vestir o pijama, sentei-me na beira da cama, ajustando as cobertas ao redor dela. — Você sabe que mexer nas coisas dos outros não é legal, né? Ela assentiu, parecendo um pouco arrependida. — Desculpa, titia. Eu só queria ver o que tinha no caderno. — Ellah olhou para mim com aquela carinha de culpada. — Tudo bem. Mas da próxima vez, peça primeiro, certo? — Certo. Inclinei-me para beijar sua testa. — Boa noite, meu amor. Durma bem. — Boa noite, titia — respondeu com um sorriso sonol
— Como assim, namorar? Você e eu? — Exatamente. Somos perfeitos um para o outro. — Lucas, não sei se isso daria certo. Nós somos… sei lá, tão diferentes. Ele riu, inclinando-se para me beijar suavemente. — A gente só vai saber se tentar, ruivinha. E, antes que eu pudesse responder, ele já estava me prendendo contra a parede do box, retomando as provocações que faziam meu corpo se incendiar. Quando finalmente estávamos arrumados e descemos para tomar café, senti que havia algo diferente no ar. Não sei se era por conta de Lukke, que parecia mais relaxado do que nunca, ou por mim, que não conseguia parar de lembrar dos acontecimentos da manhã. Dona Martina estava na cozinha, colocando xícaras na mesa, quando nos viu entrar. Seus olhos afiados nos analisaram de cima a baixo, e um sorriso curioso surgiu em seus lábios. — Vocês estão com um brilho diferente hoje — comentou, cruzando os braços. — Impressão sua — respondi rapidamente, sentando-me à mesa e tentando parecer na
Rafaela Mattos O barulho insistente da chuva batendo contra a janela acompanhava o ritmo acelerado dos meus pensamentos. O apartamento que outrora fora o símbolo do meu sucesso estava agora vazia e decadente, como a minha própria vida. Sentei-me no sofá rasgado da sala de estar, segurando uma taça de vinho barato e encarando o teto manchado de infiltrações. "Como eu vim parar aqui?" perguntei a mim mesma, embora soubesse exatamente a resposta. Minha ganância, minhas escolhas egoístas, meu desprezo pelas consequências... Tudo isso havia me levado a perder tudo o que tinha, inclusive as pessoas que mais importavam. Suspirei, largando a taça na mesa de centro cheia de papéis antigos e contas atrasadas. Minha última aposta tinha falhado miseravelmente. O que restava era um amontoado de dívidas e um orgulho ferido. Foi então que uma ideia perigosa começou a se formar em minha mente. "Eu preciso de dinheiro. E rápido." Era a única coisa que importava agora. Foi por isso que decidi vo