Aquelas foram as primeiras férias da vida de Selene, e ela viveu coisas que jamais imaginaria.A balada era barulhenta, vibrante, cheia de luzes piscantes e pessoas dançando juntas sem a mínima preocupação com status ou hierarquia. Ela não amou a experiência, mas a liberdade ali era palpável. Havia híbridos de todas as espécies e até humanos, todos se divertindo como iguais. Era algo inimaginável na Cidade Alta, onde cada um sabia seu lugar – e os humanos estavam sempre no mais baixo degrau.Mas foram os restaurantes que realmente a encantaram. Sentar-se em um ambiente onde betas serviam humanos e vice-versa, onde as pessoas simplesmente coexistiam, era quase surreal para ela. Não havia aquela briga de egos interminável que moldava sua cidade. Pela primeira vez, Selene sentiu que a desigualdade da Cidade Alta não era inevitável.Os novos humanos não tinham culpa do que seus antepassados fizeram. Não mereciam ser marginalizados, forçados à pobreza como punição por algo que nunca comete
A semana seguiu seu curso na academia, mas para Selene, nada parecia ter o mesmo peso de antes. As lições, as etiquetas, os ensinamentos sobre como se portar—tudo lhe parecia vazio agora. Sabia que, no fim, não importava o quanto estudasse ou se dedicasse. As escolhidas para se tornarem Lunas eram sempre as mais bonitas, as que se encaixavam perfeitamente no ideal da Cidade Alta. E de alguma forma, ela sentia que já pertencia àquele grupo.Ainda assim, mantinha sua rotina de passar as tardes com Darius. Às vezes conversavam, outras vezes simplesmente ficavam em silêncio, compartilhando uma tranquilidade rara naquele ambiente opressor. Ele já não mais tocava no assunto dos clãs, e Selene também não perguntava, não tinha mais interesse.Foi em uma dessas tardes, enquanto ela observava o céu cinzento da varanda da academia, que decidiu mencionar algo que vinha remoendo há dias.— Aiden voltou a me enviar cartas e presentes. Disse que as outras cartas simplesmente não haviam sido entregue
A felicidade no salão de baile não era unânime. Enquanto as híbridas dançavam e brindavam em comemoração ao noivado de Camille, e a própria aniversariante rodopiava nos braços de seu alfa, Selene notou uma cena contrastante ao fundo do salão.Astrid estava sentada sozinha, um copo sempre cheio em mãos, a postura oscilante e os olhos vidrados em algum ponto indefinido. Ela não dançava, não sorria, apenas bebia. E bebia mais. O álcool escorria pelo canto de sua boca em um dos goles apressados, mas ela não parecia se importar.Selene suspirou. Aquilo estava prestes a se tornar um desastre. Precisava tirá-la dali antes que fizesse um escândalo.Buscando ajuda, seus olhos varreram o salão até encontrar Darius, que conversava tranquilamente com um grupo de professores. Ela se aproximou rapidamente, tocando levemente seu braço para chamar sua atenção.— Estão passando bastante tempo juntos, não é? — o professor de história comentou com um tom insinuante, um sorriso malicioso nos lábios.Dari
No instante em que os lábios de Selene e Darius se separaram, ambos pareciam despertar de um transe. Darius recuou um passo, sua expressão mudando rapidamente para algo próximo do arrependimento.— Me desculpa! — ele disse de maneira firme, desviando o olhar e girando nos calcanhares, pronto para sair dali.Mas Selene reagiu instintivamente, segurando seu braço antes que ele escapasse.— Precisa limpar sua boca, está suja de batom.Darius piscou, confuso, e passou a língua pelos lábios como se tentasse sentir a mancha. Selene, por sua vez, caminhou pelo quarto, abrindo gavetas até encontrar lenços umedecidos. Ao pegá-los, riu baixinho.— O que foi? — ele perguntou, pegando o lenço que ela lhe estendia.— Eles dizem renegar a tecnologia pelo peso que ela representa, mas só fazem isso com a tecnologia que pode acabar com a alienação — ela comentou, balançando a cabeça. — Ainda podemos gozar de todo o resto: energia elétrica, saneamento básico, comidas processadas… Menos da comunicação r
Naquele sábado de folga, Darius não apareceu na academia. Ele sabia que Selene provavelmente o aguardava para as aulas — afinal, ela já havia pagado por elas —, mas não conseguiria encará-la naquele dia.Enquanto isso, na academia, Selene despertava de um sono pesado, sentindo o corpo dolorido por ter dormido no chão ao lado da cama de Astrid. O movimento ao seu lado fez Astrid despertar também. O susto percorreu seu corpo embriagado, e ela se sentou rapidamente na cama, mas logo se arrependeu, segurando a cabeça com uma careta de dor.— Hoje você precisa beber bastante água, ou vai ter muita dor de cabeça. Está desidratada por conta do álcool. — Selene disse, estendendo uma garrafa de água para ela.Astrid pegou a garrafa sem muito entusiasmo, estreitando os olhos ao encarar Selene.— O que está fazendo aqui? Veio rir da minha derrota?Selene suspirou.— Não estamos numa guerra, Astrid.Sem esperar mais nenhuma provocação, ela se levantou, sentindo o corpo reclamar pelo desconforto d
Após algum tempo dirigindo, Aiden a levou para um lugar ainda mais impressionante: um campo florido no alto de uma colina.A grama era de um verde intenso, contrastando com as flores silvestres que se espalhavam em um tapete colorido. Do topo da colina, era possível ver parte da Cidade Alta e, mais além, a imensidão do horizonte, onde o céu azul se fundia com as montanhas ao longe.O vento soprava suavemente, trazendo consigo o perfume das flores e o canto distante dos pássaros.— E então? — Aiden perguntou, sorrindo ao vê-la admirando a paisagem. — Melhor do que a vila da academia?Selene não conseguiu conter sua curiosidade. A Cidade Alta, ao menos fora da vila da academia, era um mistério para ela. Agora, sentada ao lado de Aiden, cruzando ruas e avenidas que nunca havia percorrido, sentiu que finalmente tinha a chance de entender melhor o lugar onde, teoricamente, pertencia.— Como são as áreas daqui? — perguntou, virando-se para ele.Aiden sorriu de lado, mantendo os olhos na est
Selene passou o domingo inteiro perdida em pensamentos. As palavras de Aiden, os olhares de Darius, tudo parecia embaralhar sua mente de uma forma que ela não conseguia entender. Quando a segunda-feira chegou, a rotina da academia voltou com força total. O ritmo frenético das aulas era ainda mais intenso do que antes, pois muitas das garotas fariam vinte e quatro anos em breve e, assim como Camille, seriam prometidas a um alfa. Não havia mais tantos meses no ano, e os instrutores estavam determinados a entregá-las como lunas exemplares.Selene, no entanto, sentia-se desconectada daquilo. Estava aérea durante a maioria das aulas, mal ouvindo as explicações das instrutoras ou as conversas das outras alunas. Porém, quando chegou a aula de autodefesa, algo dentro dela despertou. Aquela era uma das poucas atividades que realmente a empolgavam. Ou, pelo menos, era o que esperava, até notar a frieza de Darius.Ele se manteve distante durante toda a aula, evitando olhá-la diretamente. No mome
Os dias que se seguiram foram carregados de tensão. Selene tentava manter a rotina, mas sua mente e seu corpo pareciam traí-la. O pior era que Darius não ajudava—ou talvez fosse ela quem não ajudasse. Sempre encontravam uma maneira de se esbarrar. Às vezes, era nos corredores desertos do prédio de treinamento, quando ele a puxava para a sombra de uma coluna e a beijava com urgência. Outras vezes, na biblioteca, onde se escondiam entre as estantes enquanto os outros alunos estudavam, os lábios se encontrando no silêncio proibido do lugar. Cada encontro era mais intenso que o anterior, carregado da adrenalina do perigo, do desejo sufocado por meses, da impossibilidade de tudo aquilo. E, no entanto, continuavam.Selene mantinha os olhos atentos em Clemence, esperando o momento em que a garota pudesse abrir a boca e destruir tudo. Mas, para sua surpresa, Clemence mantinha o silêncio. Talvez fosse medo. Talvez fosse algo mais. Mas, enquanto ela não falava, Selene e Darius continuavam desl