A primeira imagem que penetrou pelos olhos de Pedro quando eles se abriram foi a expressão angelical de Alyssa, dormindo nua ao seu lado. Os lençóis de seda cobriam-lhe metade do corpo, deixando os seios à mostra, erguendo-se e abaixando-se lentamente conforme sua respiração tranquila. Ele não ousou se mexer: corria o risco de acordar Alyssa e tirá-la daquela postura tão perfeita. Pelo menos por uma noite, ela havia sido sua e ele havia sido dela.
E havia sido indescritível. Ele ainda podia sentir os dedos dela a se cravarem em suas costas, suas pernas e braços entrelaçados nos seus, o gosto dela a enlouquecer o seu âmago. Levou sua mãos às madeixas de ouro da magi, contemplando sua beleza, e a americana não reagiu; prosseguia adormecida após uma noite agitada e prazerosa.
O Galardães finalmente se virou para o lado, tentando observar pe
Primeiro, Pedro sentiu um calor; depois, o breu. Apertou forte a mão de Alyssa; temia que estivessem sendo queimados. Quando conseguiu se concentrar novamente em onde queria ir, sentiu seu corpo ser lançado como um foguete abismo adentro. Não desgarrou nem por um segundo dos dedos da Blackhole. Deu-se por si em pé acima de um buraco negro, que cuspia a relva e diminuía de tamanho. O vau se fechou e o brasileiro sentiu a terra por baixo do sapato. Haviam chegado ao destino? Olhou para Alyssa, ao seu lado, também sem saber se o feitiço dera certo. — Estamos no Reino Unido? — perguntou ele. — Há uma Essência parecida aqui — falou ela, olhando o lugar onde estavam. — Dá para sentir, é muito forte. Chegamos sim ao território Smith. Os dois estavam em terreno gramado, circundado por algumas árvores desfolhadas. Estava frio, não tanto como nos último
Depois de pronto e devidamente vestido com um smoking completo, Pedro foi conduzido por dois magi de vermelho para o segundo andar do edifício. Lá, o brasileiro seguiu a guarda através do grande salão, passando por toda a corte do clã inglês; figuras que dançavam, riam e festejavam entre si. O banquete principal seria servido ali, e os bares eram ocupados enquanto os pratos não eram servidos nas grandes mesas postas próximo das paredes do salão. Os soldados de vermelho, no entanto, continuaram caminhando até alcançarem, do outro lado da entrada do salão, as portas da sala do trono. O aposento estava aberto, permitindo ao brasileiro ver que havia uma outra mesa, de poucos lugares, posta no centro do aposento onde antes ele e Alyssa encontraram os lordes Smiths. Pedro entendeu que deveria entrar e prosseguiu, enquanto a escolta mantinha-se na entrada. Ali estavam o homem de sobretudo vinho, que inicialmente comandara a escolta até o castelo, e um casal de quarenta ano
Ao redor da Mansão Blackhole, sucederam-se horas de enfrentamento direto, correrias e aflição, muita aflição. Cada Espírito identificava-se com um dos quatro elementos e usava-o contra os Blackholes. No terraço, os parlamentares enfrentavam sozinhos dois dos Espíritos, o do ar e o do fogo, enquanto o da terra tentava invadir a mansão, indo de encontro a um grupo de magi, e o da água era o que estava em pior situação, recuado na Praia de Saigon e enfrentando um grupo ainda maior de Blackholes. Em Saigon, o Espírito da Água tinha maior acesso ao seu elemento, tanto que ele tentava usar as ondas para tragar os magi e aprisioná-los no mar. Ele estava enfraquecido, pois seus esforços não surtiam efeitos e os Blackholes, com seu fogo poderoso, secavam as torrentes de água que tentavam engolí-los e repeliam os ventos gélidos da nevasca, lançando raios e provocando redemoinhos que deixavam o ser perturbado. Contudo, aquela vitória no mar não correspondia à
Na manhã seguinte ao banquete dos Smiths, o brasileiro despertou. Um novo dia se iniciava — e que dia turbulento fora o anterior. Os flashes passaram-lhe rapidamente pelos pensamentos, como uma compilação do que fora feito, da aliança que fora selada. Se tudo corresse como planejado, a Força Condal estaria auxiliando o Parlamento provavelmente naquele instante e logo o drenador cairia. Lembrou-se do jantar. Após a saída dos condes, os convidados da mesa se sentiram deslocados, perturbados. Talbatus Smith, que já tinha uma expressão compenetrada, continuara a comer ignorando os outros; Amelia Valerius mexia os olhos de um lado para o outro, como se não soubesse para onde olhar com segurança; Ronald, por fim, parecia não gostar de ter sido colocado pela condessa naquela mesa — quanto mais ouvia o barulho do salão principal, mais se arrependia de não estar comendo e bebendo por lá. Alyssa olhava com pesar para Pedro, mas o comportamento da europeia Valerius lhe chamara mais a a
Após desjejuar rapidamente no salão principal, Pedro desceu as escadas em direção ao pátio do castelo. Olhou para o céu nublado daquela manhã fria — cuja temperatura magicamente não estava tão baixa como no restante do país. Cruzou os braços, afagou-os com suas mãos para se aquecer. Não havia sinal de Alyssa; a comitiva já deveria ter saído com ela de vassoura. O jovem guarda que o conduzira até a Sala Imperial se aproximou. — Eu me chamo Yan, a propósito — disse ele. — Minha função é ser tipo o seu monitor aqui, até você se acostumar com as coisas. A Imperatriz me designou ontem para isso. — Ah, prazer — respondeu Pedro, virando-se e estendendo a mão. — Você teria um celular para eu poder usar? Esqueci o meu nos Estados Unidos. — Providenciaremos um novo para você. Enquanto isso, pode usar o telefone que está dentro da gaveta da sua mesa de cabeceira. Ela está lacrada, mas eu posso abrir. — Ah, obrigado, vou lá então. O Galardães volt
Eram meados de novembro. Sob o sol que já não aquecia mais como fizera no verão britânico, Pedro cavalgava cortando os campos de Armor em um dos corcéis dos Smiths. Aquela havia se tornado uma das atividades prediletas do brasileiro — lembrava-lhe instintivamente do seu sítio. Cavalgar não dava apenas a sensação de liberdade; o brasileiro também lembrava das vezes em que era pequeno demais para montar sozinho e seu avô, ainda vigoroso, ajudava-a a cavalgar. Recordava também das corridas que travara com seu pai Vladimir pela estrada do sítio, com o rio acompanhando ao lado, até chegarem na Rua da Padaria e no centro de Rio Azul. Modéstia à parte, Pedro ainda cavalgava muito bem. Logo na primeira vez que pediu para pegar um dos cavalos do estábulo do castelo, que ficava do lado de fora das muralhas, o brasileiro partiu em velocidade montado no animal robusto. Era como andar de bicicleta; nunca se esquecia. Dos cavalos de Armor, a maioria era bem amigável,
Logo anoiteceria. Ao fundo, escutava o som de ondas indo ao encontro das pedras. A brisa afagava suas bochechas, prenunciando o vento que se fortaleceria agora que a tarde caía. O sol, reduzido a um círculo laranja quase a tocar o horizonte, produzia uma miríade de tons rosa-alaranjados nas nuvens calmas sobre o céu azul. Março já havia começado, mas suas tão famosas águas que fechavam o verão ainda não haviam chegado. Pedro adorava observar o ocaso de seu apartamento, fosse da varanda do andar de baixo ou do terraço do andar de cima. Brincava com seu filho no chão frio da sacada, olhando por vezes pelo vidro da proteção a movimentação do mar, batendo com suas águas na ilha na direção de seu prédio. Seu filho era esperto, muito esperto para um bebê de quatro meses: encaixava velozmente os objetos de plásticos nos espaços correspondentes da casinha de brinquedo, demandando mais desafios com o olhar silencioso e o sorriso levado. Quando o pai ou a mãe uma vez deram-lhe
A origem da palavra magi remonta à época da Pérsia Antiga, quando Zoroastro foi o primeiro homem a se aprofundar nos estudos dos mistérios da Essência. A partir do Clã Valerius de Roma, o termo adaptou-se à língua latina: magus designava um único portador de Essência, enquanto magi era seu plural. Com o desenvolvimento do estudo da Essência, retomou-se o conceito primordial e as palavras foram unificadas em uma só, adquirindo o sentido mais filosófico inicialmente proposto que pode ser resumido da maneira seguinte: Magi, como pode se perceber ao longo da obra, pode ser usado tanto para homens quanto para mulheres, tanto para um indivíduo quanto para um grupo, tanto como substantivo quanto como adjetivo. Essa noção de magi está presente no cerne da filosofia da Essência, quando um é compreendido como todos e quando todos são compreendidos como um só. Os magi, regidos pelas regras da Essência, estão ligados e formam