A Van da fundação Hermann chegou a mansão. Estela foi ao quarto de Renata e Humberto.- Boa tarde. Com licença e já entrando. Estamos indo ao cemitério de Lá Recoleta.Renata estava deitada, relaxada entre as almofadas e com Humberto aos seus pés, lhe fazendo massagem.- Almoçamos a pouco tempo, Estela. Nem fizemos a digestão.- O almoço foi a uma hora, Renatinha. A Van nos espera. Todos vão e ficará feio se a gente não for visitar o túmulo da falecida Consuelo. - Nosso vôo sairá a noite, vai dar tempo?Perguntou Humberto, sem a mínima disposição de sair.- Voltaremos antes das dezesseis horas, querido. Tomamos o café da tarde, a tempo de arrumar as malas para o aeroporto. Não se preocupe.- Tudo bem, nós vamos. Estamos nas suas mãos, Estela.- Vocês dois têm dez minutos.- Está bem, já vamos descer.Estela saiu e fechou a porta.- Reparou como ela se transforma, longe do Brasil? Parece outra pessoa, Rê.- Não tinha reparado mas depois da nossa conversa, começo a crer que essa santa
Após o lanche da tarde, nos jardins da mansão, Renata e Humberto subiram ao quarto.- Os pais da Bianca são gente boa mas aquele irmão dela, não desce.- Eu o achei legal, Humberto. Você encanou com o moço.- Encanei, foi? Está na cara que é um sanguessuga desocupado que vive as custas da irmã. Estou fazendo faculdade, ele fala com a boca cheia. Sei a faculdade que está fazendo, de pilantragem.- Humberto, você está ácido demais. Não morda a língua senão é capaz de morrer com seu próprio veneno.- E você agora deu pra roubar as minhas frases, foi? Renata abriu a mala de viagem.- Finalmente, vamos voltar ao Brasil.- Graças a Deus, Rê. Essa viagem foi o ó do borogodó. Eu não queria vir, se lembra? Você foi na onda da Estela e viemos para o velório da tia da nossa presidente. Deu no que deu.- É o que chamam de conspiração do universo, não? Tudo caminhou pra você ver o que viu.- Antes não tivesse visto. Agora tenho que fingir que nada vi, se quiser ficar vivo. Ai, já pensou, esse co
Estela e Júlio César deixaram o aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Renata e Humberto vinham logo atrás deles. - A gente se separa aqui. Vamos tomar um táxi pra casa.Disse Estela, voltando-se para Renata.- Está bem. Também estamos indo, Estela. A gente se vê na fundação.- Certo. Bom descanso.Estela e Renata se beijaram. Ela deu um beijo na face de Humberto.- Tchau, querida. Se cuida e descansa.- Você também, Humberto. Renata encarou Júlio César. Ela apenas lhe estendeu a mão.- Bom descanso, Júlio.- Pra você também, Renata.Júlio e Humberto se cumprimentaram friamente. Júlio apertou a mão do rapaz, que não apertou a outra mão, em sinal de descontentamento e aversão.- Bom descanso, Humberto.- Pra você também.Júlio César fez sinal a um motorista, sentado e conversando com outros taxistas. Júlio e Estela entraram no Corolla branco.- Ufa. Muito obrigado, Senhor. Que alívio ficar longe desses dois.- Concordo, amigo. Eles são iguais e se merecem. Não sei onde estava com a ca
A pequena embarcação ancorou na ilha do Francês, no litoral brasileiro. A ilhota era assim denominada por servir de habitação a um tenente francês que ali aportou, após a segunda guerra mundial. Edmond Ordonez construiu uma grande casa e o cais na pequena ilha. O oficial ia semanalmente ao continente, com seu barco, para comprar materiais de construção e alimentos. Era conhecido e querido por todos. Edmond era médico e construiu um posto médico na ilha, onde cuidava das pessoas gratuitamente. Ele faleceu em 2002, aos noventa e três anos, esbanjando vitalidade e sabedoria. Sem aparecer na cidade litorânea de Lages, foi encontrado após três dias, por amigos pescadores. A ilha e a casa foram abandonados.- Há cobras nessa ilha?- Sim, doutor mas estão no morro, na vegetação densa. - Terei que ficar nesse casarão antigo?- Nada que uma boa faxina não resolva. Meus homens cuidarão disso. Vamos consertar as telas das janelas e abastecer a despensa com muita comida e uísque. Você merece.
Dois meses se passaram. A secretária interfonou para a presidente Bianca. Ela saiu de seu cochilo e tirou os pés da mesa.- Presidente Bianca, ligação de Nova York. Ronald Higgins. Transfiro?- Sim, Mercedes. Obrigada.Ela pensou.- O que esse cara quer comigo?Ela se endireitou na cadeira e colocou doçura na voz.- Bom dia. Finalmente, amigo.- Bom dia, senhorita. Primeiramente, os meus sentimentos pela sua tia. Uma pena.- Obrigada, Ronald. Já está fazendo tanta falta.- De fato. Segundo, como estão os andamentos de seu projeto? - A todo vapor, amigo. Será um sucesso, sem sombras de dúvidas.- Recebemos algumas queixas de seu pessoal, junto às agências, em especial a Unicef. Parece que não se deram bem trabalhando juntas. Sabia que teve um tufão violento nas Filipinas? Tive que tirar nossos médicos de lá.- Eu fiquei sabendo. Entrei em contato com nosso pessoal.Ela mentiu. - Lembre-se que há um prazo para os objetivos, querida. Não quero lhe intimidar, ao contrário. O segundo apo
Humberto bateu a porta do apartamento.- Que humilhação.Renata se despediu do encanador e pegou a garrafa de whisky no bar. Humberto sentou-se no banquinho.- Alguém aqui está pistola. Quer uma dose, com gelo ou sem gelo?- Com gelo, por favor.Renata o fitou. Humberto estava bufando, de tão nervoso.- A reunião virtual com a presidente o deixou assim?- Aquilo não foi reunião mas sim humilhação, Rê.Ela acendeu um cigarro.- Estou mais preocupada com o nosso chuveiro, que está esquentando pela metade. Já imaginou quando o inverno chegar?- Me poupe.Ela apagou o cigarro, pela metade, no cinzeiro.- O cara veio aqui pois eu o chamei, indicado pelo zelador. Você não conhece o zelador, Jeremias nem o síndico, o Benício. Pudera, você não vai às reuniões e assembléias. Levamos duas multas, de oitocentos reais cada, por excesso de barulho, gritarias e bebedeiras às duas horas da madrugada. Está aqui , dias treze e quinze. Os dias em que eu estava em Santa Catarina.- Sério? Eu as pago.-
O sorriso de Humberto desapareceu ao ouvir uma voz diferente, quando a porta ficou entreaberta.- Quem é? Guilherme, tem gente na porta!- O Gui está aí? É o Humberto.- Só um momento.Antes que a porta fosse fechada, Humberto percebeu que o rapaz estava nú. Mais que isso, havia outro homem atrás dele. Dez minutos depois, a porta abriu. Para sua surpresa, Guilherme saiu.- O que quer a essa hora, Humberto?- Amor, fui despedido da fundação, pela Renata. Ela também me expulsou do apartamento. Estou na rua.Guilherme olhou para as malas no chão. Humberto olhou bem para o outro, só de roupão e de cabelo molhado. Tinha o semblante de alguém que estava numa festinha particular, com muita bebida.- Será que eu poderia ficar com você, só até arrumar um lugar? Quebra o meu galho.Guilherme apertou os lábios.- Infelizmente, meu caro, não vai dar. Quem quebra galho é macaco gordo. Minha tia vem do Paraná, com meus dois sobrinhos. O meu tio Lauro faleceu e ela quer vir pra cá. Terei que acolher
A ambulância chegou a praça. Apollo estava impaciente, olhando os paramédicos colocarem Humberto na maca. O colete cervical foi colocado com cuidado. Humberto estava desacordado.- O senhor conhece a vítima?Perguntou um policial a Apollo.- Conheço, sim. O nome dele é Humberto e trabalhou comigo, numa fundação de ajuda a refugiados. Não estou mais lá, ele sim. Ocupa um cargo alto e importante, de coordenar a fundação no território nacional.Disse Apollo, sem saber que Renata o havia despedido.- Por favor, levem-no para o hospital Redenção. Tenho o convênio e sou colaborador deles, desde a fundação. Pagarei todas as despesas hospitalares do meu amigo. Tenho que levar esses remédios a minha noiva. Logo em seguida, irei para o hospital. Vou guardar as malas no meu carro, pra devolver a ele depois.Apollo entregou seu cartão médico ao enfermeiro. - Podemos confiar no senhor? Não está mentindo pra pegar as malas dele?- De jeito nenhum, policial. Esse rapaz esteve comigo, recentemente