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Cinquenta
SORRISONão era nem meio-dia, mas o sol já tava dando moca bonito pô. Nem teve como eu subir de moto com todas as malas, tive que deixar minha moto na boca e ajudar a subir a pé mesmo.- Coloco onde? - Perguntei das malas e o Neguinho colocou a garotinha no chão e deixou uma mochila em cima do sofá.- A Emanuelly vai escolher o quarto dela e da Sofia, e tu leva as malas mais pesadas pra lá - Falou e eu desviei meu olhar para a morena, que já subia as escadas acompanhada da mãe do Neguinho e da garotinha.- Tranquilo, Alípio - Falei e ouvi ele me xingar. Ri e segui elas até a escada logo subindo com duas malas, uma na mão e outra com a alça no ombro.A senhora foi pro último quarto no fim do corredor, e a morena ficou com o quarto do meio. O primeiro da ponta era do Neguinho.Ela abriu a porta e entrou primeiro com a garotinha, e eu entrei logo em seguida colocando as duas malas no chão.- Vou subir pra casa do Rael! Sofia quer ir comigo não? Lá tem criança pra tu brincar - O Neguinho
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Cinquenta e um
RAELA Clara fez o exame, e porra, nunca vi alguém mais medrosa que ela. Cheia de medo de agulha pô. Na hora só faltou tirar sangue do meu braço com aquelas unhas dela.- Se foder viu! Maior empata foda tu, Rl! - O Sorriso chegou bolado, parando a moto perto do meio-fio onde eu estava sentado.Levantei batendo a poeira da bermuda.- Porra, sou adivinho não! - Disse e ri. Ele negou cruzando os braços e me encarou.- Fala aí, quando que sai o resultado do exame? - Perguntou enquanto eu subia na garupa.- Daqui à cinco dias - Suspirei - Vou nem dormir nessa espera. Bagulho público é uma merda! - Reclamei.Segurei nos ferinhos e ele acelerou indo pra entrada do morro.- Foda! Mas falar pra tu, se não dormir como vai tirar o plantão? Tem que ficar esperto pô, ainda mais agora - Alertou e eu assenti, enquanto ele enrolou em direção a rua 20.Nessa madrugada nas horas que eu não dormi, aluguei o Sorriso. Contei pra ele o que eu tinha em mente e que ele iria comigo na casa da Lis, pra ver o m
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Cinquenta e dois
RAEL- Vou ir no banheiro - Eu disse passando por eles e a Lis já tava cheia de sorrisos pro lado cria.- Leva o tempo que for preciso - O Sorriso soltou dessa, mas para a Lis soou como um flerte.Passei pela porta da cozinha e andei pelo pequeno corredor alí indo até o banheiro. Fechei a porta e peguei meu celular no bolso, desbloqueando o mesmo e logo fui na agenda procurar o número da Ana. No terceiro toque ela atendeu.- Oi Rael, aconteceu alguma coisa? - Perguntou e eu pude ouvir a voz da Rita e de outra criança do outro lado da linha.Não questionei nada, não era o momento. Eu precisava manter o foco.- Nada não, cunhada! Cadê a Rita? Quero falar com ela - Eu disse e andei até a porta, me escorando nela.- Tá aqui brincando com a sobrinha do Neguinho, espera que vou chamar ela - Falou e a linha ficou muda por alguns segundos, até a minha filha falar.- Oi papai, onde você tá? - Perguntou com aquela voz meiguinha dela.- Tô trabalhando, gatinha - Menti - Quero que tu me diga uma
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Cinquenta e três
2 horas atrás.NEGUINHOSempre fui muito transparente com o Talibã sobre a minha família. Ele sabia que minha mãe e toda a minha família morava no morro rival, e sabia também que meu primo era de uma outra facção.A uns dois meses atrás, quando ele soube que o Ll tinha tirado o Santa Marta da lama, ficou interessado no moleque e me convenceu a fazer uma proposta.- Trouxe a resposta daquele papo lá, chefe - Falei entrando na endola. O Talibã supervisionava os crias enquanto eles faziam as misturas das drogas e preparavam os saquinhos para a venda.Ele deu uma última olhada nos bagulhos e descruzou os braços seguindo pelo corredor até a sala dele, e eu fui seguindo junto. Abriu a porta e entrou, entrei logo em seguida fechando a porta.- Solta o verbo! - Falou sentando em sua cadeira, colocando o rádio sobre a mesa abaixando o volume. Tirou um cigarro comum da carteira em seu bolso e ascendeu, soprando a fumaça.- O Ll mandou o papo. Disse que vai pular, mas pediu um favor também - Fa
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Cinquenta e quatro
CLARA- Ui, quero - A Martinha falou me roubando um brigadeiro. O Rael tinha comprado pra mim, pois eu estava desejando muito e ele não queria que nosso filho nascesse com rosto de brigadeiro - Como foi o exame lá? - Perguntou com a boca cheia, sentando ao meu lado no sofá.- Horrível! Mas tive que fazer, né - Peguei um brigadeiro dando uma mordida - Só tive pena do Rael, ficou todo arranhado o meu amor - Falei fazendo bico e a Martinha negou com a cabeça rindo, mostrando seus dentes sujos de brigadeiro.- E quando que saí o exame? - Perguntou passando a língua nos dentes para limpar, depois de eu ter indicado que estavam sujos.- Próxima semana - Suspirei pensando no quanto iria demorar, já que cada dia que passava era como se fosse uma semana só.- Ai cara, vai demorar em! Público é o gongo - Levantou uma almofada para pegar o controle remoto que estava em baixo, ligando a tv.- O que vai demorar? - Minha mãe perguntou descendo as escadas.Socorro. - Ai tia, os capítulos de coraçõe
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Cinquenta e cinco
LISBurra, burra!Maldito sorriso! Como que eu fui cair no papinho daquele abusado? Argh, que ódio!Com certeza eles já desconfiam de algo. Não viriam aqui atoa, ainda mais com uma desculpinha esfarrapada.Depois que eles foram embora, rodei a casa toda para procurar alguma coisa revirada. Mas não havia nada bagunçado, estava tudo no mesmo lugar que eu costumava deixar.- Minhas malas! - Pensei comigo mesma, passando as mãos pelos meus cachos um pouco desesperada.Andei até o meu quarto e rodei cama, encontrando elas no mesmo lugar que eu havia deixado hoje cedo. As abri e as roupas estavam intactas, o Rael não tinha mexido em nada. Mas também não havia nada que fosse suspeito alí, apenas as minhas roupas.E talvez fosse paranóia minha, ou sei lá. Eu não seria tão suspeita assim para ser a primeira a desconfiarem de algo, disso sim eu tinha a completa certeza.Já era noite eu estava terminando de arrumar a minha última mala. Na semana que o Gledson saisse, eu iria para o morro com ele
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Cinquenta e seis
LUCAS- Da o papo, minha preta - Brinquei assim que atendi a ligação do Neguinho.Tava saindo pra ir na boca resolver as minhas pendências antes de meter o pé pro Cantagalo. Faltava duas semanas se pá, mas eu gostava mesmo de ter tudo adiantado já pra não ter problemas.- Adianta, a gente já tem a visão de tudo! A casa vai cair, então trata de se mandar logo daí! - Falou puto e eu pensei logo nas minhas meninas, e na minha tia também.- Qual foi, porra? A Sofia e a Emanuelly estão bem? - Perguntei atordoado com tanta informação.Fui entrando na boca esbarrando em geral e entrei rápido na minha salinha, e o 99 me encarou sem entender o meu desespero.- Fica suave, falô? As meninas tão com a minha mãe, em casa e com segurança - Falou e eu me vi mais aliviado alí - Só quero que tu arrume tuas coisas pra meter o pé daí, pra ontem até - Falou - Quando tu chegar, vai passar todo o esquema pra gente - Disse por fim, eu já liguei tudo.Eles com certeza esperaram a Lis dar um vacilo e nisso aí
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Cinquenta e sete
RAELEram 4hrs da madrugada, e eu nem tinha pregado o olho essa noite.Estávamos todos na boca principal só no aguardo do outro lá.- Eai - O tal Ll cumprimentou o Talibã com um toque de mão e o moleque que tava com ele só fez acenar com a cabeça.Passou pelos outros crias me cumprimentou e cumprimentou geral, parando no Neguinho dando um abraço no mesmo.Eles trocaram algumas palavras e o Talibã logo adiantou o papo.- Te mandei vir antes porque quero a visão do certo. E tu vai me mandar o papo certinho, se ligo? Desde do dia que a puta começou a ser amante do arrombado lá, até o agora - O Talibã falou puxando a cadeira pra sentar, enquanto deixava o rádio sobre a mesa.Ele contou como toda a merda começou e como a Lis se envolveu com o Gd. Contou também que não sabia que a Lis conhecia a Clarissa e que não foi intencional. Mas a Lis toda envolvidona contou mais do que devia, e o que era apenas pra ser um visita íntima, acabou virando um plano de vingança de ambos. Do Gdpor ter sido
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Cinquenta e oito
1 semana depois.CLARASabe quando você espera tanto por uma coisa e as horas demoram a passar, o dia se torna semana e a semana se torna mês? Foi exatamente o que aconteceu. Parecia que o dia do resultado nunca iria chegar, mas graças a Deus eu o receberia hoje.- Tá nervosa? - O Rael perguntou me olhando enquanto apoiava os braços no balcão da recepção a espera da enfermeira.Eu estava ao seu lado acabando com as minhas unhas e ele tinha seu fuzil atravessado nas costas. Ele tinha dado uma escapadinha do plantão só pra vir buscar o exame comigo.E antes que vocês perguntem da Rita... Com tudo isso que está acontecendo, ela não estava indo pra escola. Sempre ficava comigo, e as vezes com a Ana. Hoje ela está lá em casa com a minha mãe, é um grude só. Chama até de vovó rs.- Não! - Continuei a roer minhas unhas e ele riu negando com a cabeça.- Relaxa pô! - Me puxou para o seus braços e segurou as minhas mãos - E para de roer as unhas, cara! Bagulho feião - Fez careta olhando minhas u
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Cinquenta e nove
RAELSabe quando tu tá feliz pra caralho e do nada as coisas desandam? A vida manda um tsunami e derruba tua felicidade de uma maneira surreal, parcero.Os fogos estourando e eu só conseguia pensar na possibilidade de perder tudo de novo. A minha mulher. o meu filho. Coração ficou pequeno na hora, pô.- Entra! Agora! - Mandei deixando um beijo em sua testa e ela fechou o portão.Saí de lá com os caras, sem olhar para trás. Sabia que se olhasse, eu não conseguiria sair dalí e se eu quisesse proteger ela, teria que ir no olho do furacão. E não esperar que vinhessem até nós.Estávamos de aviso. Qualquer barulho, ou ameaça o papo era fechar tudo e só sairem até segunda ordem. E a essa altura, os comércios e os moradores já estavam de portas fechadas. Só tinha os crias de porte na rua.De longe já dava pra ouvir o barulho dos tiros.Vi o Rico passar voado no carro em direção a casa da Clara e pude me ver mais aliviado. Ele cuidaria dela e da minha filha por mim, e iria ser só gratidão quan
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