Prelúdio II - Heróis
Poucos meses depois de ter completado dezoito anos de vida, meu mundo mudava drasticamente e eu mudava junto.
Era outubro do ano de 1997 do calendário cristão e logo me tornaria um contador. O ensino médio de curso técnico estava quase no fim. Teria um diploma.
Havia acabado de pedir demissão na academia de Taekwon-do na qual havia trabalhado por um ano. O proprietário era também o professor e o melhor no ramo. Havia poucos dedos numa mão, onde eu podia contar quantos mestres de verdade encontrei nessa vida. Ele era um deles. Ele tinha meu respeito. Além de trabalhar na academia dele, eu era seu aluno. Adorava aquele lugar. Era, porém, uma questão de pouco tempo até ele desistir da academia. Ante tal perspectiva, considerei outra proposta de trabalho; sem deixar de lamentar.
Como muita coisa na vida, aquela
A luz do sol vazava entre as frestas da madeira da taverna do Coelho Caolho, clareando o final daquela festa. A música alegre se esvaía. Momentos de celebração naquela taverna vinham tão rápido quanto iam. Os Bardos Barbados se sentaram e apenas dedilhavam notas descompromissadas em seus bandolins. Os outros bêbados voltaram aos assentos e deram boas tragadas em suas bebidas. Essas explosões comemorativas traziam mais sede e garantiam um bom consumo. Os Bardos agradeceram quando Gertrudes recarregou suas canecas. Tinham um acordo.Pierre já não era prisioneiro do mestre das apostas e estava feliz como nunca.– Ah, meu amigo! – exclamou o maltrapilho, ao se sentar àmesa de Ônix. Esfregava o lado direito do rosto, ainda quente e vermelho. Sim, Gertrudes era canhota. O mundo voltou ao foco para Ônix. A paralisia momentânea se foi e ele p&oci
– Você se tornou mesmo um pirata de verdade, nãoé? Este mundo não tem mais um herói... – Pierre lamentou. Sorriu sem graça e desviou os olhos para contemplar a imunda taverna do Coelho Caolho, onde quase foi morto.Os olhos de Ônix miraram o fundo de seu copo e, mesmo se esforçando para parecer indiferente, ele não esquecia o passado, e o rum nunca aquecia seu peito o suficiente. O vazio nele era maior e nem todo rum do mundo seria o bastante para preenchê-lo. Mas Ônix nunca desistiria de cumprir sua promessa. Por sua princesa, ele se obrigava a sobreviver a todo o custo. Ele sequer temia a morte, como descobriu na prisão do castelo do rei Ulysses de Valdrick, no dia da morte do príncipe Aleck.Uma certeza inabalável e inexplicável de sobreviver até cumprir seu papel no grande palco da vida, concedia a Ônix ousadia suficiente para se
Prelúdio III - A verdadeira cor da areiaMinha vida desmoronava e, em busca de um lugar seguro, encontrei uma armadilha.Era janeiro de 2000 do calendário cristão. Estava numa sala imensa, diante do meu gerente. Assim como meus companheiros de treinamento.Havia passado no teste da empresa para ocupar um cargo de coordenador. Os gerentes eram responsáveis por alguns coordenadores, assim como os coordenadores seriam responsáveis por muitos vendedores. A empresa vendia cartões e eles garantiam descontos nas mais variadas áreas aos seus associados.O primeiro mês de treinamento de nós, coordenadores, era aprender as dificuldades dos vendedores. Assim disseram. Por isso, precisávamos vender os cartões, nos mais variados planos, em nome da empresa.Eu era um fracasso como vendedor. A gravata apertada me sufocava. Havia algo errado co
A algazarra cotidiana da Taverna do Coelho Caolho havia voltado. Ônix conseguiu ouvir. Recuperava o foco.O breve torpor no corpo do pirata havia passado e o capitão Hawk estava diante dele.O dia recém-começado já havia sido bastante agitado, para os bêbados ao redor, com a humilhação do mestre das apostas. Não podiam imaginar que a trama espetacular apenas começava; sobre a qual muito teriam a contar depois.O pirata calculou ter passado poucos segundos imersos no torpor a privá-lo temporariamente daquele mundo; a julgar pela cara do capitão Hawk. Numa luta, teria sido tempo suficiente para ser morto. Fora de uma, porém, era curto demais para ter sido notado por mais alguém.– Obrigado, capitão! – Ônix falou, em resposta ao brinde.– Não vai me desejar um feliz aniversário tam
Prelúdio IV - EclipseTudo estava previsto. Ir trabalhar. Voltar pra casa. Dormir. Acordar. Ir trabalhar. Voltar pra a casa. O Sol surgindo no horizonte, para depois ceder lugar a lua, ela ao Sol, no fim da madrugada. E o Sol a ela, no fim do dia. A rotina. Nada inusitado, como, por exemplo, a ilusão do encontro dos dois. Embora até isso pudesse ser previsto. Seria mais certo chamar um eclipse de raridade, e não de exemplo do inusitado, se pensarmos bem. Ainda assim, era uma prova de algo não ser sempre a mesma coisa.Era inverno de 2002, do calendário cristão, e o próximo eclipse só aconteceria no dia quatro de dezembro. Estávamos em agosto. Não era o momento, sequer, de fantasiar um encontro raro.Mal havia chegado ao escritório de contabilidade e um desespero tomou conta de mim. Outros funcionários trabalhavam lá h&aacut
Mégane de L’arc foi treinada para ser uma líder e foi obrigada durante a vida toda a ser forte. Noutras palavras, aprendeu a nunca se entregar aos seus sentimentos. Mas ela ouviu e viu por uma fresta tudo que foi dito e feito, depois de sua saída da taverna. A morte do pirata a emocionou.Ela justificaria o ato de espionar, como uma tentativa de entender o pirata intrigante que foi Ônix Pedra-Negra. Na verdade, ela queria entender a si mesma, dentre outras coisas. Entender a razão de desejar se entregar aos braços do pirata; indo contra a obrigação com seu povo e seu aprendizado. E ali, olhando o corpo dele, ela entendeu tudo. Sem mais hesitar, mirou a pedra em direção ao pirata e disse, após limpar as lágrimas:– Etis vivectus.A pedra brilhou por um segundo, gerando um calor incrível, antes de apagar no frio de antes.O gato lambia a m&ati
Prelúdio V – RomanceEra setembro de 2006 do calendário Cristão.Eu a vi e me encantei. Contei a um amigo e ele tentou me encorajar. Era apenas um desabafo meu, no entanto. Meu coração estava ancorado. Havia decidido não me envolver novamente com alguém. Meus poucos relacionamentos amorosos sempre haviam sido fiascos.Com seis anos tive uma namoradinha de sete. Jogávamos damas e quem ganhasse conquistava um beijo do outro. Bom acordo. Namorávamos debaixo da mesa de minha casa, ouvindo Meu ursinho Pimpão, de um grupo musical chamado Balão Mágico. Romance puro. A voz da cantora mirim falava a minha língua:“Vamos sonhar aventuras, voar nas alturas, da imaginação. Como nas histórias em quadrinhos, eu sou a Sininho, você Peter Pan...”Ora, quem queria c
Prelúdio VI – CegosEm pleno século XXI, entre prédios e carros, eu caminhava vestido como um pirata. Completamente. Colete, panos amarrados à cintura, botas até a altura dos joelhos e muitos outros detalhes. Ao meu lado estava minha namorada. Ela vestia roupas tão incomuns como as minhas, embora não fossem roupas pirata.Era novembro de 2008 do calendário cristão e havíamos acabado de realizar uma apresentação teatral como parte de um treinamento empresarial. Utilizávamos o Teatro de Aventuras Improvisadas no desenvolvimento pessoal há quase dois anos. Minha namorada era psicóloga e estávamos deslumbrados com o potencial daquela ferramenta. Era nossa primeira parceria com uma empresa de consultoria. Um trabalho inovador.Parecíamos fora do tempo, andando pela rua. Era divertido quebrar