Kate Ferreira Acordei com os primeiros raios de sol entrando pela cortina fina do quarto. Assim que abri os olhos, a memória da noite anterior inundou minha mente. O beijo. O toque de Ricardo. Sua intensidade. Tudo aquilo ainda fazia meu corpo arrepiar, mesmo que eu tentasse afastar esses pensamentos.Eu não podia negar que ele mexia comigo. A forma como seus olhos pareciam enxergar direto através de mim, como suas mãos seguraram minha cintura com tanta firmeza, como seu cheiro ainda parecia estar impregnado em mim... Mas eu sabia que precisava colocar um freio nisso. Ricardo Santana era o tipo de homem que nunca foi comprometido com ninguém, e eu não estava disposta a ser apenas mais uma história passageira na vida dele.Suspirei e decidi não pensar mais nisso. Tínhamos um voo marcado para a madrugada e precisávamos organizar tudo antes de deixar Los Angeles. Levantei-me, tentando ignorar a pequena pontada de frustração que insistia em permanecer no fundo da minha mente.Clara e Ana
Ricardo SantanaO avião estava no ar, cortando as nuvens em uma viagem silenciosa de volta à realidade. Apesar do sucesso do desfile, minha mente não conseguia se desligar. Na verdade, estava mais agitada do que nunca.Kate.Desde aquela noite, ela havia erguido uma barreira invisível entre nós. Seus olhares fugiam dos meus, suas respostas eram curtas, e havia uma distância que eu não conseguia suportar. Era irritante e, ao mesmo tempo, me deixava inquieto.Ela não saía da minha cabeça. Sua risada no coquetel, o jeito como ela olhava para mim, aquele momento em que meus lábios tocaram sua pele... eu queria entender o que tinha dado errado.Olhei para o outro lado do corredor, onde ela estava sentada ao lado de Clara, envolvida em uma conversa trivial. O som baixo de suas risadas era como um lembrete cruel da distância que ela havia imposto.Não dava mais. Eu precisava falar com ela.Respirei fundo e me levantei. Caminhei até o lugar delas e parei ao lado de Clara.— Clara, será que po
Kate FerreiraVoltar ao Brasil trouxe um misto de alívio e exaustão. O frenesi de Los Angeles finalmente havia ficado para trás, mas isso não significava que eu estava completamente em paz. O convite de Ricardo para o jantar de comemoração pingou no grupo da empresa poucas horas após pousarmos. Ele tinha marcado o evento para o outro dia e, como sempre, foi direto e objetivo na mensagem."Conto com a presença de todos."Deveria ser uma mensagem qualquer, mas, para mim, parecia ter um peso maior. Desde a conversa no avião e a frieza que ele vinha demonstrando, eu sentia como se houvesse uma linha invisível dividindo nossos mundos. Talvez fosse exatamente isso que ele queria: manter distância. E, sinceramente, talvez fosse o melhor para mim.Minha primeira reação foi simples: não ir. Uma noite tranquila em casa, longe de qualquer possibilidade de constrangimento, parecia mais atraente do que encarar a tensão no ar. Mas, claro, Clara não deixou barato.— Você vai sim, Kate! — disse ela n
Kate FerreiraA segunda-feira parecia prometer um daqueles dias intermináveis. Desde cedo, a sala estava cheia de papéis, planilhas e uma tonelada de tarefas esperando por mim. As viagens e eventos recentes deixaram um acúmulo de trabalho, e o e-mail não parava de apitar com mensagens urgentes. Eu estava focada, mergulhada nas ideias de marketing para os novos produtos do Sex Shop, até que o relógio indicou a hora da reunião semanal.Com os documentos em mãos e meu tablet pronto para anotações, segui para a sala de reuniões. Já sabia que o clima seria tenso, mas estava preparada para isso. Pelo menos era o que eu pensava.Assim que entrei, todos já estavam lá, inclusive Ricardo. Ele estava impecável como sempre, de terno escuro, a barba feita, e os olhos fixos em alguns papéis que tinha à sua frente. Não me deu nem um olhar quando entrei, e isso já foi um sinal do que estava por vir.A reunião começou normalmente, com o time apresentando ideias e discutindo propostas para novos lançam
Ricardo SantanaEstava sentado em minha sala, os cotovelos apoiados na mesa e as mãos entrelaçadas, sustentando a cabeça cheia de pensamentos. Os números da empresa estavam despencando, e as ideias apresentadas na reunião mais cedo eram, no mínimo, medíocres. Mas o que mais me incomodava era Kate.Eu fui um idiota.Durante a reunião, a tratei com frieza e sarcasmo, mais como um reflexo da minha frustração do que por qualquer erro dela. Kate era brilhante, sua mente criativa era o que movia parte do sucesso da empresa. Ainda assim, deixei meu ego e meus sentimentos mal resolvidos contaminarem o ambiente profissional.A verdade era que o afastamento entre nós estava me corroendo. Eu sentia falta dela. Sentia falta das conversas leves, do brilho nos olhos dela ao falar de um novo projeto, da forma como ela enchia a sala com sua presença, mesmo sem perceber. Mas, em vez de lidar com isso como um adulto, descontei nela.Respirei fundo, massageando as têmporas. Eu precisava me desculpar.Qu
Kate FerreiraApós ler a mensagem de Ricardo, resolvi ignorá-lo e apenas enviei outro email com a carta de demissão, assim que apertei o botão de "enviar", a sensação de vazio me atingiu com força. Sentei no sofá do meu apartamento, abraçando meus joelhos, enquanto lágrimas grossas escorriam pelo meu rosto. Eu não sabia se estava fazendo a coisa certa, mas sabia que continuar naquele lugar estava me destruindo.As palavras que ouvi naquela empresa ecoavam na minha mente como um pesadelo recorrente. "Não tem nada de atrativo fisicamente." "Eu até comeria ela, só pela experiência." Cada sílaba cravava uma nova ferida. Como alguém pode ser tão cruel?Minha garganta estava apertada, o coração parecia esmagado. Eu me sentia sozinha, pequena, e... cansada. Cansada de lutar contra julgamentos, cansada de provar meu valor, cansada de me sentir inadequada em um lugar onde eu deveria brilhar.No fundo, o que eu queria agora era o colo da minha família. O cheiro do café que minha mãe fazia à noi
Kate FerreiraAcordei com um leve toque no ombro e a voz animada de Júlia.— Kate, vamos pra praia? — ela perguntou, com um sorriso enorme no rosto.Esfreguei os olhos e olhei para o relógio no criado-mudo. Era cedo, mas a luz do sol entrando pela janela já anunciava que o dia seria bonito.— Agora? — murmurei, ainda sonolenta.— Sim, agora! Anda, você não veio pra cá só pra dormir!Apesar do cansaço, o entusiasmo dela era contagiante. Dei um suspiro e concordei, me espreguiçando.— Tá bom, tá bom. Me dá uns minutos, chata!Júlia saiu do quarto saltitando, e eu levantei preguiçosamente. Caminhei até o banheiro e tomei um banho rápido. A água morna ajudou a me despertar, e quando terminei, escolhi um biquíni que fazia tempo que não usava e vesti uma saída de praia por cima. Ao me olhar no espelho, senti uma pontada de insegurança, mas rapidamente afastei o pensamento.Ao sair do quarto, o cheiro do café da manhã me envolveu. Minha mãe já estava na cozinha, colocando pães na mesa, enqua
Kate Ferreira Depois de quatro dias ao lado da minha família, a volta para casa tinha um gosto agridoce. Por um lado, me sentia mais leve e revigorada, mas por outro, sabia que assim que cruzasse a porta do meu apartamento, a realidade bateria à porta novamente.Merlin miava dentro da caixinha de viagem desde o momento em que saímos de Santos, como se soubesse que estávamos nos distanciando do calor e da tranquilidade que encontramos lá. Assim que estacionei o carro e subi com ele para o apartamento, mal consegui colocar a bolsa no chão antes de soltá-lo.— Pronto, pequeno, você tá livre — murmurei, abrindo a portinha da caixa.Ele saiu imediatamente, sacudindo o pelo e me olhando com aqueles olhos julgadores. Logo depois, começou a miar de novo, caminhando até o canto onde costumava comer.— Já entendi, faminto. Calma.Fui até a cozinha, servi um pouco da ração e coloquei água fresca na tigela dele. Enquanto Merlin comia, peguei minha mala e a levei para o quarto. Precisava de um ba