TIRINTINTIM
E assim se inicia mais um dia, às trombetas tocando e os aprendizes acordando. No meu primeiro dia foi um pouco difícil, afinal, nunca havia feito aquilo antes, e ser o novato não é fácil.
Meu primeiro dia foi bem... Hum... Engraçado, digamos assim; todos os aprendizes eram quatro dias mais velhos do que eu, e todos, sem exceção de nenhum, zombaram de mim, e o pior, era que eu nem sabia o que eles estavam fazendo, até o treinador Suriel os repreender e falar que não se pode zombar de um irmão e nem de ninguém, que isso não é atitude de um filho do senhor.
No meu primeiro dia de treino (segundo de vida) caí tantas vezes que os anjos curandeiros tiveram que enfaixar meus joelhos e as palmas de minhas mãos. Também descobri que o "senhor" a quem Suriel se referia era o mesmo corpo grande de destaque entre os outros corpos que eu tinha visto no dia do meu nascimento, e que também era dela a voz que ouvi quando comi pela primeira vez, era ele falando em sua forma de espírito santo.
Não tive mais nenhum contato com ele, mas ele soube ( naquele tempo não sabia como) o que estava acontecendo e como castigo por zombarem de mim, ele determinou que os outros aprendizes só iriam receber suas asas no mesmo dia que eu receber as minhas. Todos ficaram indignados. O certo era eles receberem suas asas quatro semanas após seu nascimento; agora, eles serão a primeira geração de anjos que receberam suas asas quatro semanas e quatro dias depois de vossos nascimento.
Bom, hoje eu completo quatro semanas de vida, estou nervoso; minhas mãos tremem e soam, sinto meu estômago revirando e um leve frio no pé de minha barriga se alastrando.
— Calma Anael, — diz Suriel se aproximando de mim — Desse jeito você irá desmaiar antes da hora.
Arregalo meus olhos, isso não pode acontecer, sempre estive tão ansioso por esse dia, não posso estragá-lo assim! E além do mais...
— Tem hora certa para desmaiar? — perguntei perplexo com essa suposta informação.
Durante essa semana, eu aprendi tudo o que é preciso, e já sei exatamente como funciona meu corpo, tenho controle total sobre cada pedacinho dele. Também descobrir que as asas dos anjos são diferentes. Não são todas brancas, elas têm cores diferentes e cada cor revela sua missão, são elas:
Um: Têm as asas brancas com as pontas douradas, essas são as dos anjos que cuidam da biblioteca, dos arquivos, ajudam ao Senhor na administração do céu.
Dois: Asas brancas com a ponta verde claro, são dos anjos que cuidam dos jardins celestiais. Os que cuidam e zelam pela beleza do paraíso.
Três: As asas brancas com as pontas prateadas pertencem aos anjos guerreiros, ao pelotão comandado diretamente pelo senhor, são eles que guerreiam defendendo o reino do senhor de outros deuses.
Quatro: As asas brancas com as pontas cinzas, pertencem aos responsáveis por alguma divisão do paraíso. Tem apenas 7 anjos com essas asas e eles são os mais antigos entre nós.
Cinco: As asas brancas com as pontas lilás, são as dos anjos curandeiros, eles são os responsáveis por cuidar de todos os outros anjos, então, todas as classes dependem dos anjos das asas de pontas lilás.
Seis: As asas que tem sua extensão completamente branca, são dos comandantes e treinadores. Eles são responsáveis pelos novatos, cuidam do seu aprendizado tanto nas lutas práticas quanto nas questões teóricas. E são os comandantes dos pelotões de anjos da guarda.
Sete: As asas brancas com as pontas azuis celeste, são para os anjos da guarda. Os protetores de humanos.
Os anjos da guarda são divididos em duas classes:
classe um: Os que seguem o dia inteiro apenas acompanhando o protegido e escrevendo em um livro tudo o que ele fez, e os livrando de alguns perigos causados por eles mesmo;
classe dois: São os guerreiros protetores, eles guerreiam com os anjos de asas pretas para protegerem os humanos.
Essa classe não tem um protegido específico, eles ficam em alerta e vão defender qualquer humano que for ameaçado pelos anjos caídos. Ainda não sei bem o que são humanos, ainda não pude observar nenhum, só sei que eles são a maior criação do senhor, e que eles são à sua imagem e semelhança. Devem ser tão lindos já que possuem a imagem do meu senhor.
Também já ouvi falar de algo como o livre arbítrio, não sei exatamente o que é, mas pelas conversas que escutei pelos corredores de outros anjos é o poder de escolha, não entendo o que isso quer dizer, mas deixei para lá, como Suriel me disse, aos pouco irei saber tudo.
Há! não falei dos anjos de asas pretas né?
Bom, essas asas nenhum anjo as recebe, elas são motivo de vergonha, pois as asas ficam pretas quando o anjo é expulso do paraíso. Isso é uma forma de mostrar que ele é indigno, que errou e traiu o senhor; que desobedeceu aos mandamentos, que fez algo contra a criação do senhor.
Okay, eu fiquei meio surpreso com essas asas, nunca imaginei que pudesse existir anjos que fizessem tais afrontas para alguém tão bom. Espero nunca ter que ficar com minhas asas pretas e ser expulso daqui. Apesar dos outros aprendizes me ignorarem, eu amo o paraíso, aqui tenho tudo o que preciso, aqui minha vida é perfeita, não tenho com o que me preocupar, e os outros anjos mais velhos gostam de mim, e isso já basta para eu ser feliz aqui.
— Depende unicamente de você — fala colocando sua mão direita em meu ombro e dá duas batidinhas ali.
— Como assim? — pergunto de testa franzida.
— Se você for um anjo forte, não irá desmaiar — pisca seu olho direito pra mim e sai do dormitório.
Estranho né? Sou o único no dormitório. Os outros aprendizes ainda estão desgostosos de mim; eles me culpam pelo atraso do recebimento de suas asas e a humilhação de serem os únicos na história a já começarem com pé esquerdo em suas vidas como anjos. Todos eles estão se arrumando na cachoeira de Serafim, e eu fiquei aqui, sozinho; mas como meu melhor amigo e treinador sempre me diz:
'Melhor só, do que mal acompanhado ' — eu ainda não entendo o que mal acompanhado quer dizer, mas logo terei sabedoria sobre tudo isso, pois assim que ganhamos nossas asas a cortina em nossos olhos se abrem.
Ele também me diz que eu não devo sentir raiva, ódio ou guardar rancor em meu coração de meus irmãos, pois somos anjos! E anjos só devem ser portadores de sentimentos bons, como por exemplo: Amor; esperança; compaixão; gratidão e etc.
Ele me alertou que se eu sentir sentimentos ruins, me deixar levar pela ira, inveja, gula, preguiça, luxúria, avareza e pelo orgulho, caso eu seja dominando por qualquer um desses sentimentos as minhas asas também ficaram pretas, e depois que as asas ficam pretas, não existe perdão para o portador dessas asas, uma vez preta, sempre preta.
De acordo o que me explicaram elas não ficam pretas assim do nada, sem ter qualquer processo para este fato, antes esses anjos irão sentir suas asas doeram muito e o senhor em sua forma de espírito santo irá em pensamentos, como uma voz no fundo de sua mente, alerta-los. E dará três chances para que percebam onde estão errando, para que se arrependam e irem até o palácio ter com o senhor se confessar e pedir perdão.
Às vestes de hoje são diferentes, hoje todos os aprendizes usam calças de cor branca, contudo, depois que a gente receber nossas asas, as calças serão da mesma cor da ponta das asas de seu respectivo dono.
Eu já estou pronto, só a espera de Suriel que irá vim me chamar quando estiver na hora de ir até o palácio do senhor, onde ocorrerá a cerimônia das asas. Essa será a segunda vez em toda a minha vida ( vivida até agora ) que eu irei ter o prazer de contemplar o senhor, meu criador, com meus próprios olhos.
Ando de um lado para o outro, esfrego minhas mãos uma na outra, sinto meu coração pulsar forte em meu peito me fazendo ter uma respiração rápida e descompensada, ansiedade é algo que preciso trabalhar muito para parar de sentir.
“Ahhhh! Por que demora tanto!?” — penso alto em meus pensamentos.
— Vamos Anael, chegou a hora — Grita Suriel na porta do quarto.
Ao ouvir o chamado de Suriel, meu sangue gela, chegou a hora! Respiro fundo, passo minhas mãos em minha calça para tirar um pouco do suor acumulado nelas. Depois de respirar fundo mais duas vezes, o sigo Suriel para fora do dormitório, uma carruagem está a frente da mesma e nela já posso ver todos os outros nove aspirantes à aprendizes. Entro na mesma, e o cocheiro segue para o palácio.
Enormes portas revestidas a ouro fino, cravadas por diversas pedras preciosas como: os rubis, as safiras, os diamantes, as esmeraldas... São tantas que eu não sei nem listar o nome de todas — É porque eu ainda não sei o nome de todas mesmo, mas sei que não demorarei muito para eu ter conhecimento de tudo isso.Nesse momento todos os aspirantes a anjos aprendiz, estamos no corredor aguardando a hora de entrarmos dentro do grande salão de cerimônia, Suriel está de frente para as grandes portas e de costa para a gente; sinto minhas mãos e pernas darem , passo as costas de minha mão no intuito de removê-las, meu coração pulsa tão forte que sou capaz de escutá-lo como se estivesse dentro de meus ouvidos. Saio de
— Hoje o paraíso se encontra em festa — diz olhando para todos dentro do salão — Hoje estamos recebendo dez novos membros em nossa família celestial — dá uma pequena pausa, olha para todos os aprendizes e então continua — Fiquem ombro com ombro.Eu não saio do lugar, não é preciso, os aprendizes que estavam atrás de mim se locomovem e ficam todos um do lado do outro, e eu que era o primeiro agora sou o oitavo da fila.—
**Trezentos e sessenta e cinco mil dias depois, ou um ano no tempo dos dos anjos**408... 409... 410...- ANAEL? — paro de contar minhas abdominais ao ouvir a voz de Suriel me chamando.— Aqui treinador! — chamo sua atenção para indicar minha localização e então volto para minha atividade.— Por que ainda está aqui Anael? — pelo tom rude que ele usou comigo, já sei que Suriel está irritado comigo. De novo. Suspiro alto, cansaço se faz presente em meu semblante.Não era pra eu estar aqui no CAAG (Centro Acadêmico dos Anjos da Guarda), era para eu estar no portal do paraíso, junto com os outros anjos da guarda, indo cumprir uma tarefa primordial para a minha classe.— Não acho que observar os humanos seja mais importante que treinar para defendê-los — falo
— Ahhhhhhh! — olho com a testa franzida para a humana que está em cima de uma maca hospitalar, tudo indica que ela está a dar a luz — Ahhhhh! — a cada grito de dor que ela dá lágrimas escorrem de seus olhos se misturando com o suor que escorre de sua testa, seus cabelos loiros estão grudando em seu rosto por conta do suor.Ao seu lado um humano, com cabelos cacheados de cor marrom escura, e pele pálida está segurando a mão da humana, presumo ser o seu companheiro, e pai do bebê que está a vir fazer parte desse horrível mundo, sinto pena dessa criança, as pernas do humano tremem, seus olhos estão fechados bem forte, não entendo o por que de tanto medo.Simplesmente aparecemos aqui, nesse lugar pequeno preenchido pelos gritos de dor dessa humana. Passar pelo portal, não é tão simples, anjos sem autoriz
— Vamos, Anael!Ouço pela terceira vez a voz de Zaniel me chamando. Estou deitado em minha catre desde que voltei do mundo dos humanos com a informação de que serei um anjo da guarda protetor, estou ignorando a todos desde então, só queria fazer partes dos anjos da guarda lutadores, assim não teria que ficar vendo o terrível mundo dos homens, mas o senhor me fez virar guarda um ser humano, que é inocente agora, mas quando crescer vai ser tão detestável como qualquer outro.— Levanta! Deixa de agir! — escuto sua voz levemente alterada."Puff"Caio de lado no chão, Z
E lá vamos nós, mais uma vez para o tão amado mundo humano, sinto algo estranho em meu peito, meu coração bombeia forte, sinto a ponta de meus dedos darem leves tremidas… Como será que vai sair? Dessa vez eu não estou indo para observar, mas sim para lutar em proteção da humana.Olho para Zaniel ao meu lado, se ele está ansioso, apenas observando o seu semblante não dá para saber, ele está calmamente sério, em suas mãos se encontra um caderno de anotações para anotar tudo o que a humana faz de certo e errado, grudado nele tem uma pena especial de cor azul celeste, ela é especial porque não se faz necessário o uso de tinta para que ela escreva.— Está ansioso para a primeira missão? — tenho puxa conversa, esse silêncio está me enlouquecendo.— Poderia até estar se eu fosse desempenhar o que eu realmente fui criado para fazer — fala frio.Eu entendo, quer dizer… Eu acho que entendo, não deve ser fácil se prepara
— Quando o dia aqui chega ao fim, no pôr do sol, recitamos palavras corretas e as anotações vão diretamente para o escritório do senhor — Zaniel explica.Apenas gestos positivos com a cabeça, eu deveria ter participado das aulas, é horrível ser o atrasado e precisar das explicações dos colegas.Mesmo não sendo mais o meu dever, eu ando na mesma direção em que a mãe de Elisa foi. E ao chegar meus olhos se arregalaram, isso é uma mãe amorosa?Uma raiva tenta se instalar em meu ser, mas me controlo o máximo possível, não quero ser um anjo portador de vergonha de maneira nenhuma! Olho com nojo essa cena:Elisa sentada embaixo da mesa, com uma vasilha escrita seu nome, dentro da mesma contém restos de comida, que parecem ser de uns dois dias atrás, ela está comendo bem rápido, e sua mãe sentada na mesa comendo um belo pedaço de bife, com arroz colorido e salada, essa mulher está com as pernas cruzadas, e com a pern
Ando de um lado para o outro, e seus olhos me seguem pelo quarto, não consigo acreditar... Co...como... Paro de andar ao sentir a mão de Zaniel em meu ombro.— Ela é um bebê bem sensível, deve está se sentindo sozinha, de alguma forma ele dever ter percebido que você é o verdadeiro guardião dela - ele diz e eu franzo meu cenho - Perceba que ela não consegue me ver, mesmo no momento o papel de anjo protetor seja meu, ela não me reconheceu como tal.Sinto meu cérebro fervilhar, não era para ela fazer isso, e agora? Não quero ser o anjo protetor dela... Mas seus olhos me olham de uma forma tão meiga... Que belos olhos essa criança tem, me sinto calmo os olhando... Decido sair do quarto dela, não posso continuar se não... Eu acabe perdendo meu cargo de guerreiro protetor.Fico no lado de fora do corredor e as vozes dos pais de Elisa ressoando pela porta a frente, eu a atravesso e observo a cena: A mãe de Elisa em pé andando de um lado para o outro e seu marido sentado