A luz dourada da tarde invadia meu escritório pelas amplas janelas, lançando longas sombras sobre os papéis espalhados pela mesa. Analisava a planta arquitetônica de um novo hotel na costa italiana, um projeto ambicioso que exigia precisão cirúrgica. Meus dedos deslizavam sobre o papel, mas minha mente vagava por caminhos tortuosos, revisitando os acontecimentos dos últimos dias. A chegada de meus pais, os lapsos de memória de minha mãe, a estranha conexão que ela parecia ter com Jhulietta… um emaranhado de mistérios que me deixava inquieto.Perdido em meus pensamentos, fui abruptamente trazido de volta à realidade quando a porta do escritório se abriu sem aviso prévio. Levantei o olhar, uma mistura de surpresa e irritação me tomando.— Quem…? — comecei, mas a pergunta morreu em meus lábios ao ver quem entrava.Olívia.Ela adentrou o escritório com a desenvoltura de quem é dona do lugar, seu andar carregado de uma sensualidade calculada. O brilho de ousadia em seus olhos era um conhec
Jhulietta DuarteO som das crianças correndo e rindo pelo pátio da escola criava uma melodia quase reconfortante. Parada perto da grade, observava o recreio, atenta para que tudo corresse bem. Ethan estava sentado em um banco mais afastado, absorto em um livro, alheio à agitação ao seu redor. Um suspiro escapou de meus lábios enquanto ajeitava a prancheta em minhas mãos. Trabalhar com crianças era uma paixão, mas naquele momento, meus pensamentos estavam focados em outra pessoa. Nicolas. Desde a nossa conversa na cozinha, sua imagem persistia em minha mente. Havia algo nele que me intrigava profundamente, uma mistura de mistério, dor e uma barreira invisível que ele erguia contra o mundo. Ele hesitava em se abrir com qualquer pessoa, mas havia um apelo silencioso em seus olhos, um pedido de ajuda que ele jamais expressaria em palavras. Balancei a cabeça, tentando afastar aqueles pensamentos persistentes. — No que você está pensando, Jhulietta? — murmurei para mim mesma, com um
Nicolas Santorini Estava sentado à mesa da sala de jantar, aproveitando a serenidade matinal enquanto lia as notícias no meu iPad. O aroma convidativo do café fresco pairava no ar, e Dona Nilza havia acabado de colocar uma fatia generosa de torta de nozes ao meu lado. Era meu momento de paz, um breve respiro antes que a rotina agitada do dia se instalasse. De repente, Ethan entrou na sala com passos rápidos, o rosto carregado de uma expressão que me chamou a atenção assim que ele se sentou à minha frente. Ele apoiou os braços na mesa, fixando em mim aqueles olhos grandes e expressivos, sempre repletos de expectativa. — Pai, você tem um tempinho para mim? — perguntou, com uma seriedade incomum para uma criança de apenas oito anos. Desliguei o iPad e o coloquei de lado. O tom de voz de Ethan e a forma como ele se portava me indicavam que o assunto era importante. — Claro, Ethan. O que aconteceu? Ele respirou fundo antes de começar, como se reunisse coragem para o que ia dizer. —
Jhulietta DuarteEthan estava visivelmente chateado, e quando mencionei que não estaria com ele no final de semana, ele começou a demonstrar sua insatisfação de todas as formas possíveis.— Eu odeio o meu pai! — gritou, cruzando os braços com força. Seus olhos brilhavam de raiva e tristeza.Parei o que estava fazendo e me ajoelhei ao seu lado, segurando gentilmente seus ombros.— Ethan, você não pode dizer isso. Seu pai ama você.— Ama? Ele só briga comigo! Só sabe gritar! — rebateu ele, com a voz embargada, enquanto lágrimas começavam a escorrer pelo seu rostinho.Respirei fundo, tentando encontrar as palavras certas.— Sei que às vezes o papai é duro, mas ele só quer proteger você. Às vezes, o jeito dele de demonstrar amor pode não parecer o melhor, mas isso não significa que ele não se importe.Ethan hesitou por um momento, digerindo minhas palavras. Então, sem aviso, ele me envolveu em um abraço apertado, enterrando o rosto em meu ombro.— Eu só queria que ele fosse mais como você
O domingo prometia ser um raro oásis de tranquilidade em minha rotina. A luz suave da tarde banhava meu apartamento enquanto eu me perdia entre as páginas de um livro envolvente. O silêncio era um bálsamo para minha mente geralmente agitada. No entanto, a paz foi abruptamente interrompida pelo toque estridente do telefone. Peguei o celular e vi o nome de Nicolas no visor. Suas ligações eram raras, o que instantaneamente acendeu um sinal de alerta em mim. — Oi, Nicolas. Aconteceu alguma coisa? — perguntei, tentando manter a voz calma. — Jhulietta, desculpe incomodar seu domingo, mas o Ethan está com febre muito alta. Ele não para de chamar por você — respondeu ele, com uma mistura de urgência e preocupação em sua voz. Meu coração acelerou. Ethan era uma criança adorável, e nossa conexão era inegável. Talvez fosse a semelhança física com alguém importante em sua vida, ou simplesmente o laço que havíamos construído, mas ele parecia encontrar conforto em minha presença. A ideia
Nicolas Santorini Eu terminava minha fatia de torta, o olhar perdido no vazio, enquanto o peso das responsabilidades parecia esmagar meu peito. Jhulietta se preparava para sair da cozinha quando a chamei, quase sem pensar. — Jhulietta, você tem um minuto? — perguntei, sem muita certeza de como iniciar a conversa. — Claro, Nicolas. — Ela respondeu prontamente, seu tom respeitoso, mas sem a formalidade excessiva de antes. Suspirei, sentindo a necessidade de ar fresco. — Vamos ao jardim? Acho que precisamos de um pouco de ar. Ela assentiu e me acompanhou. No jardim, as luzes baixas iluminavam delicadamente as flores. O aroma das rosas se misturava à brisa noturna, criando uma atmosfera serena. Paramos perto da fonte, onde a água fluía suavemente. Olhei para o céu, as estrelas pareciam tão distantes quanto as respostas que eu buscava. — Parece que tem algo te incomodando, Nicolas. Quer conversar sobre isso? — perguntou Jhulietta, com uma voz gentil, mas firme. Hesitei por alguns s
Subi as escadas com passos apressados, o coração pesado a cada degrau. As palavras da empregada ainda ecoavam: "Ethan acordou e está te chamando." Era a primeira vez em muito tempo que ele pedia por mim.Ao abrir a porta do quarto, encontrei Ethan sentado na cama, os joelhos dobrados contra o peito, os olhos arregalados e úmidos, ainda brilhando com o resquício de lágrimas. Apertava forte seu cobertor azul, aquele que sua mãe costurou para ele quando era bebê. A luz suave do abajur projetava sombras dançantes nas paredes, intensificando a atmosfera tensa.— Ethan? — chamei, a voz baixa e suave.Ele me olhou, e foi como se toda a sua angústia se derramasse naquele olhar. Sem hesitar, corri até ele e sentei na beira da cama.— Papai — ele sussurrou, a voz trêmula.— O que aconteceu, meu filho? Pode me contar — perguntei, tentando transmitir segurança com meu tom de voz e um toque suave em seu ombro.Ethan respirou fundo, apertando o cobertor contra o peito. — No sonho… eu estava sozinh
Após o café da manhã com Ethan e Jhulietta, a hora de enfrentar a situação na escola havia chegado. Um misto de apreensão e determinação me consumia. Precisava fazer isso por Ethan, por nós.Jhulietta e eu seguimos para a escola em silêncio, a atmosfera no carro carregada de uma tensão palpável. Podia sentir o olhar preocupado de Jhulietta sobre mim, mas preferi me concentrar na estrada, tentando organizar meus pensamentos. A imagem do rosto de Ethan, antes hesitante e depois aliviado com minha promessa, permanecia gravada em minha mente. Aquele era o combustível que me impulsionava.Ao chegarmos à escola, respirei fundo antes de sair do carro. Jhulietta colocou a mão no meu braço, um gesto de apoio silencioso.— Vai dar tudo certo, Nicolas — disse ela, com um sorriso encorajador.Assenti, tentando transmitir confiança, mesmo que por dentro estivesse me sentindo como um garoto prestes a ser chamado na diretoria.Fomos recebidos por uma secretária com uma expressão severa, que nos dire