•°•° Peter °•°•
Meu corpo fica inerte, como se uma força maior estivesse assumindo o controle de minhas ações. Não consigo mais segurar o chicote, ele cai da minha mão e faz um som alto ao se chocar com o chão.
Ela está imóvel, chorando baixinho, quase que um sussurro. Passei dos limites, agora ela está toda machucada e sangrando, não era para ter feito isso, isso não era para ter acontecido. Infelizmente, olho para ela e as cenas da morte de minha mãe vem tudo à minha mente.
Era para ter prendido ela aqui e não batido. Burro, que idiota eu fui. Começo a bater na minha cabeça, enquanto penso. Ela tinha pedido desculpas e mesmo assim continuei.
Eu devia assustar ela, mas não fazer isso. Minha ideia era trocar sua vida pela de seu pai, como farei isso agora se a marquei? Ela está toda machucada e ele vai querer ela intacta, caso queira trocar de lugar.
Por que ela tinha de fugir? Por que tinha de instigar o pior de mim? Por que só de estar ao lado dela, sinto só ódio e vontade de me vingar? Mas, quando prometeu ficar, foi como se a fera em mim se acalmasse.
Me aproximo dela, que se encolhe toda, devido ao medo. Abro as duas correntes de suas mãos, e preciso segurar seu corpo para que não atinja o chão. Ela não reclama, não se debate como normalmente, apenas fica quieta e prende o choro. Só seus soluços são ouvidos.
Abro a boca para falar algo, mas não consigo. Não sei o que está acontecendo. Me sinto tão confuso. Coloco seu corpo no chão, bem devagar, solto a corrente de sua perna e me afasto.
Apesar da dor que parece sentir, ela puxa os joelhos e os abraça, escondendo a cabeça entre os braços dobrados. Seu sangue escorre pelo chão. Olho para minha mão, manchadas pelo seu sangue. Eu fui longe demais, com alguém que não tem culpa, assim como minha mãe não tinha. No final das contas, sou um monstro como ele.
••°• Mellany •°••
Continuo no mesmo lugar que ele me sentou antes de sair, não me mexi nem um pouco, para não sentir mais dor. Fico pensando em tudo que aconteceu e o motivo de merecer isso. Não cheguei a nenhuma conclusão que me fizesse entender o porquê estou sofrendo tanto.
Minha bunda está doendo de tanto ficar sentada, preciso me levantar. Mordo os lábios, apoio a mão no chão e tento me levantar, não consigo. Meus olhos derramam lágrimas, mesmo que eu não queira. Apoio as mãos na parede e consigo me levantar escorando nela.
Olho para frente ao terminar, tem uma banheira grande de madeira, preciso me limpar. Ando até meu objetivo com dificuldade, mas consigo chegar antes que ele volte. A água parece limpa.
Me apoio na borda da banheira e respiro fundo, sentindo cada parte das minhas costas queimar enquanto sento. Entro, levo a mão a boca e mordo com força, para reprimir um grito. A dor que sinto na mão quando mordo, não é suficiente para apagar a das minhas costas queimando.
Termino de me sentar, fecho os olhos e me controlo para não gritar. Nunca dependi de ninguém para fazer as coisas para mim, não é agora que iria depender. Nana nunca gostou disso, mas quando ela não estava, sempre dava meu jeito de dispensar ajuda. Quando ela estava, eu não podia respirar sem ajuda, só quando fugia, era sufocante, para falar a verdade.
Termino de me limpar a medida do possível, me seco com uma toalha que estava pendurada em uma estaca de madeira presa à parede e uso para cobrir meu corpo. Tive de retirar o restante da roupa que usava em intervalos, por conta da dor.
Ando devagar até um roupeiro de madeira, abro e vejo algumas roupas masculinas, pego uma camisa e também um pano que aparentemente serve para forrar na cama, é diferente dos do castelo. Tudo é diferente, é tão estranho.
Ando até a cama que tem no canto do quarto e me sento. Enrolo o pano em meu corpo, para evitar que mais sangue saia e logo coloco a camisa que achei, ela fica enorme em mim e larga. Deito de lado, seguro no braço doendo, fecho os olhos e choro baixo.
Eu estou com tanta raiva dele, tanto medo também. Nem sei como vai ser daqui para frente, mas prevejo que não será bom para mim.
•°•°Peter°•°•
Volto ao quarto, vejo a garota deitada na cama e me aproximo, ela parece estar dormindo ou desmaiou de dor. Percebo que uma camisa minha cobre seu corpo, parece um vestido em seu corpo magro. Ela está de lado, mas não vejo sangue. Deve ter arrumado um jeito de impedir que isso acontecesse.
Inclino a cabeça ao notar sua mão segurando o braço, minha testa se franze e vejo a marca enorme vermelha. Sua mão, em comparação a minha, é minúscula. Mesmo que segure o local magoado, ainda consigo ver a força que fiz. Não use tanta força assim. Droga. Esqueci que não consigo controlar muito bem minha força em certas situações.
Fico, levemente, admirado. Apesar da dor, ela deu um jeito de se cuidar sozinha, só para não precisar de mim. Mas, não é como se ela tivesse escolha, mesmo que eu tenha me descontrolado, minha vingança ainda está de pé e vou ir até o fim.
Encaro fixo seu rosto sereno, mesmo que me faça lembrar o que seu pai fez, em aparência não tem nada a ver com ele. Sua pele é branca, seu rosto é fino e delicado, seus cabelos enormes e vermelhos como o fogo. Ela é linda, e tem um cheiro próprio que me deixa em êxtase, quando estou perto, parece que não consigo pensar claramente.
Ela deve estar me odiando agora, com razão. Tirei ela de onde pertencia, a trouxe para cá e estou fazendo com que passe por situações que, provavelmente, jamais imaginou. Infelizmente, para ela, é preciso tratar suas feridas, então, ela vai ter que superar qualquer medo.
Me aproximo mais um pouco e acabo batendo no pé da cama, o que a faz dar um salto, me olhando assustada e se afastando um pouco. Consigo sentir a tristeza que seus olhos passam. Eu estou em parte conseguindo minha vingança, uma parte de mim está feliz e a outra parte está triste, por envolvê-la nessa história.
— Tira a camisa, preciso tratar desses machucados. — Falo me aproximando e ela recuando, péssima hora para ter uma cama grande.
— Não, não, você não vai tocar em mim. Nunca mais. Por favor, não toque em mim. Eu já falei que vou te obedecer. — Seus olhos se enchem de lágrimas novamente, eles estão, curiosamente, cinzas, diferente das outras vezes que vi.
— Lembro que disse que vai me obedecer, por que não está fazendo isso agora? É para o seu próprio bem. — Digo me sentando na ponta da cama.
— Agora, você pensa no meu bem? Não tem muito tempo que pensou só em seu bem, em sua vingança e esqueceu de pensar em mim. — Cospe em minha direção. Olho para o espaço à minha frente, onde o cuspe caiu e depois para seu rosto. — Posso cuidar de mim, não preciso de você. — Me controlo para não fazer nada, já fiz ela sofrer demais, deixa para outro dia. Sinto que se continuar se recusando e me desafiando, vai ser pior para ela. Minha paciência é muito curta.
— Tudo bem. — Fico de pé e vou até a jaula. Ela fica me avaliando enquanto pego a corrente e volto em sua direção. — Tente não fugir, se fizer isso, dessa vez não tem nada que me faça parar. — Prendo sua mão e acorrento a cama.
Me aproximo de seu rosto, ela virá para o lado e isso me faz sorrir. Meu nariz encosta na pele lisa de sua bochecha.
— Se não se comportar. — Digo roucamente e devagar, para que entenda cada palavra. — Eu vou me deliciar ao te devorar. — Ameaço e seu corpo fica rígido. — E vou amar ouvir seus gritos de pavor. — Me afasto, espero que isso deixe ela com mais medo ainda, para que não cometa outras loucuras.
Olho para a porta quando escuto um barulho alto. Faço careta, péssima hora para receber visita. Volto a olhar para a menina, que mantém os olhos fechados, o rosto virado e a boca comprimida.
— Fique quieta. Não queremos mais machucados, certo? — Sussurro em seu ouvido. — Responda! — Ordeno.
— Não, senhor. — Sua voz sai em um sussurro reconfortante.
— Boa garota. — Me afasto sorrindo. Se continuar me obedecendo assim, irei gostar.
Saio do quarto, puxo a porta e sigo em direção ao local em que o intruso está. Já consigo ter uma leve noção de quem seja. Só ela entraria aqui sem minha permissão.
Desço a escada com certa rapidez, só para ter certeza do que imaginei. Minha tia está parada próxima a porta, analisando uma pintura na parede. Ela se vira para mim assim que me aproximo, sua expressão não está muito convidativa.— O que faz aqui? — Pergunto sem rodeios.— Isso são modos de tratar sua querida tia? — Diz vindo em minha direção e parando em minha frente. — Assim me magoa. — Faz seu drama corriqueiro. Preciso respirar fundo para me manter paciente.— Desculpa, não estou no meu melhor dia. — Sou sincero.Me aproximo e lhe dou um abraço, apertando com força e tentando achar conforto. Estou tão quebrado que não consigo, aquela sensação de quentura e carinho não vem, apesar de saber o quanto ela gosta de mim.— Quando está sem seu melhor dia? — Retribui o abraço. — São raros, na verdade, são dias inexistentes. — Se afasta e me olha, um sorriso aparece em seu rosto. — Vim te perguntar uma coisa. Não, vim apenas confirmar algo que tenho quase certeza. — Cruzo os braços, espera
•°•°Peter°•°•Assim que entro em casa, minha tia já está à minha espera, com os braços cruzados e batendo com o pé direito no chão. Já vi que aquela garota abriu a boca, odeio sermões, não tenho mais idade para isso.— Como você pôde fazer aquilo com ela? — Pergunta vindo em minha direção.— Ela tentou fugir, tinha de punir ela de algum jeito. — Respondo calmamente, mas a mulher para em minha frente, de forma ameaçadora. — Ela não é nenhum bicho para tratá-la daquele jeito! — A mulher está transtornada. — Isso não te interessa em nada, ela é minha, eu faço com ela o que eu quiser. — Digo em um tom raivoso e recebo um tapa em resposta.— Você não tinha o direito de fazer isso, ela é tão inocente, não merecia isso, o corpo é dela e não seu para decidir o que quer e quando quer. — Diz vermelha de raiva. – Não te criei para isso, te dei educação e ensinei a respeitar a todos, mas por causa desta vingança ridícula você está se tornando outra pessoa. Isso está manc
Acordo devido às luzes que entram pela janela, me irrita acordar assim. Levanto e decido tomar banho, deixo a água encher a grande bacia e tiro minha roupa, logo depois a faixa do curativo e entro na banheira, sem dor alguma nas costas ou no braço, que maravilha. Aquela mulher é realmente poderosa. A única dor que sinto é da fome por não comer nada até o momento.Quando termino, me levanto e levo um susto quando o homem entra no quarto, eu estava de costa para ele e por isso, saio rápido da banheira e me enrolo na toalha. Fico de frente para onde ele está, completamente assustada, não confio nele. Vive dizendo que vai me devorar, não sei como entender essas palavras. Não me parece que ele come pessoas no sentido de comer mesmo. Ele vem andando em minha direção, fico com medo do que pode vir a seguir, seu rosto é de surpresa e espanto. Conforme ele se aproxima, recuo até que minhas costas encostaram na parede. É o meu fim. Ele para em minha frente e fica me encarando, sua boca se abre
Percebo que já está escurecendo e me sento no galho que estou, sequer percebi o tempo passar. O sol está se pondo. Está tão lindo, uns tons abóboras, vermelhos e amarelos, é a primeira vez que vi assim de um ângulo certo e no oceano. Sempre via da varanda do meu quarto, mas não é a mesma coisa, admiro pelo máximo de tempo que posso, não sei se terei chance de sair novamente. E preciso descer do topo dessa árvore antes de escurecer, posso acabar caindo e não quero isso.Quando chego ao chão, vou em direção a escada e entro na casa, aquele homem desapareceu. Não imaginava que ele me deixaria sair e depois sumiria assim. Acho que poderia fugir caso quisesse, porém, por algum motivo, tenho certeza que ele conseguiria me achar. Fiquei o tempo todo naquela árvore, não percebi o tempo passar, fiquei sem comer o dia todo, preciso comer algo. Vou aproveitar que aquele homem sumiu e vou comer escondido. Será que a cozinha é naquela porta enorme mais a frente? Passo por ela só para me certifica
°•°Peter°•°• Preciso terminar de preparar as correntes e a jaula, hoje é dia de lua cheia, posso me transformar sempre que quero, mas quase não faço isso. Não é algo que eu necessite, é apenas algo que faz parte de mim e nas noites de lua cheia, sou obrigado a me transformar. Quase não me transformo, pois não consigo controlar o monstro, preciso deixar tudo certo, não posso sair da jaula, não com ela aqui, posso pôr meu plano a perder se eu fugir. — Tenho de ver se está tudo firme para me segurar, da última vez não deu muito certo e escapei, dessa vez isso não pode acontecer. — Começo a conferir rapidamente, pois a lua já está prestes a chegar em seu auge. Olho para a janela, tenho pouco tempo até que a transformação aconteça, pego alguns galhos finos da planta que pode ajudar ela a se proteger de mim e ando a passos largos em direção ao quarto em que está. Abro a porta, ela está acuada no canto do quarto e a imagem me deixa tão satisfeito, parece uma ovelha assustada e meu lado lo
•°• Mellany •°•• Pensei que ele não me diria o nome, mas fiquei surpresa quando me respondeu. Só não entendi o motivo da planta. Quando ele colocou em minha mão, senti minha mão queimar e não consegui segurar por mais tempo. — Ele estava estranho que o normal. – Comento dando de ombros e jogo a planta na cama, elas me queimam e parecem sugar minha energia. Vou até a janela, a noite está tão linda, hoje é lua cheia, eu amo essas noites. Todas as noites que tinha lua cheia, costumava esperar todo mundo dormir e ia para o jardim de casa, o ar parecia ser especial nessas noites e assim como as estrelas, continham uma certa magia. Sou tirada de meus pensamentos ao escutar um grito, ele está gritando, o que será que está acontecendo? Foi um grito de dor, isso me deixa com medo, se ele está com dor e ele é mau, o que fez isso deve ser pior ainda. Não é bom para mim. Ando em direção a porta, péssima ideia, pois quando estou próxima de segurar na maçaneta para ver se está aberta, ela se ab
°•°Peter°•°•No momento que a ataquei, minha única intenção era matá-la, meu instinto falava mais alto, o monstro queria isso, não conseguia me controlar. Tentei resistir, mas estava disposto a devorá-la e isso acabaria com meu plano. Quando meus dentes cravaram em sua pele, tão macia, tão frágil, eu ia matá-la sem dúvidas, até que seu grito ecoou em meus ouvidos, não sei o motivo, mas aquele grito fez o monstro se acalmar, foi como se ele a reconhece de alguma maneira, ela era a calmaria em sua tempestade. Foi tão estranho. Naquele instante, não queria matá-la, queria protegê-la e não sabia como fazer, meu lobo ficou agitado, temeroso e culpado. Quando me vi sentindo o cheiro que seu corpo emanava, foi como se um turbilhão de sentimentos fossem jogados contra mim e uma calmaria que nunca senti relaxou meu corpo transformado, irradiou pela minha mente e consegui retomar o controle, consegui me controlar.Isso me assustou, pois quando era mais novo, tinha quinze anos na época, estava
•°• Mellany •°•• Resmungo descontente quando volto a mim, olho para todos os lados ao sentir que estou sobre algo macio. Lembro de cair no chão gelado e duro, alguém me encontrou. Olho para baixo e levanto os braços, estou vestindo outra roupa. Me sento rapidamente quando percebo isso e também quando reconheço o ambiente. Ele me trocou? Ele me viu nua. Me auto abraço, isso faz com que uma dor grande incomode meu ombro e olho, está enfaixado. Estava com medo e fugi, ele me encontrou e vai me punir novamente. Estou com medo da reação dele, se dá ultima vez me bateu sem piedade, agora vai completar a outra ameaça que me fez, vai me fazer a mulher dele. — Será que ele vai me punir novamente? — Minha pergunta sai em um sussurro. — Não, dessa vez vou deixar passar, mas se fizer isso de novo já sabe o que vai te acontecer. — Tomo um susto quando ele entra no quarto e puxo a coberta para me cobrir até o pescoço. — Come. — Diz colocando uma bandeja com comida ao meu lado. — Anda. — Me obr