capítulo 4

Sempre fui focada em meu trabalho, principalmente na organização que ele envolvia. Desde que assumi essa responsabilidade de ser a secretaria de Fernando levei isso ainda mais a sério.  Também tive que estudar toda a sua maneira de trabalho, para aprimorar ainda mais o meu. Então nesse exato momento, depois de demorar dias para organizar tudo para a sua chegada mesmo a uma certa distancia.  Agora me via ansiosa pelo que ele falaria de tudo isso.

  Fernando estava concentrado olhando para tudo que estava a sua frente, enquanto eu ainda indicava tudo a ele. Como funcionaria sua rotina. Depois de longos minutos de silêncio, analisando por si só o conteúdo apresentado, finalmente ele ergueu o olhar até mim de uma maneira tão séria, que faria outra pessoa tremer, mas não eu. Já vivi ao lado de alguém pior que ele.

— Sente-se, por favor... — Fernando apontou para a poltrona a sua frente, e eu me acomodei no assento, sem o questionar.  — Andei refletindo... —Ele fez uma breve pausa e passou o olhar pelas pastas mais uma vez. Onde acabou soltando um breve suspiro. — Irei lhe dar dois meses para que você me mostre que dará conta desse cargo.

Me remexi um pouco na cadeira, estava me sentindo meio desconfortável, mas nada que pudesse ser percebido aos olhos de Fernando. Meu coração começou a bater rapidamente, não por medo de perder meu emprego, pois sabia muito bem da minha capacidade. Porém, era emoção que me atraía a um certo desafio, que a muito não era imposto para mim. Já estava quase saltando de excitação. Nunca gostei de trabalho fácil, e me deixar abater por esse ser a minha frente, era dar o ponto da vitória a ele. O que negaria até o fim.

— Acho que esse tempo para mim é mais que o suficiente para mostrar meu trabalho.

Encarei aqueles olhos verdes com tanta determinação, que só me lembrei de me sentir assim uma vez; quando descobri sobre os desafios da maternidade, o que tiro de letra por sinal, mesmo sendo extremamente trabalhoso e recompensador ao mesmo tempo.

  Aguardei ele continuar, quando seus olhos se demoraram nos meus.

— Na semana do dia doze de janeiro, temos um evento importantíssimo como sabe. — Assenti brevemente, pois tinha anotado em sua agenda. — Como bem sabe, eu não conheço nenhum dos executivos, então você irá me acompanhar nesse evento dizendo quem são, o que fazem e o que devo falar para cada um deles. Se você conseguir dar conta desse desafio sem errar, irei lhe dar o cargo definitivamente. Você terá meu respeito e um aumento de salário, afinal o valor que você ganha não condiz com o seu cargo.

Fernando mal tinha parado de falar, e já não olhava mais para mim. Estava agora focado em uma das pastas que abriu, analisando o conteúdo que trouxe até ele.

— Isso é tudo por enquanto.

Ele ainda não olhava para mim, quando saí de sua sala. Então não podia ver o grande sorriso que se formou em meu rosto. Se esse era o desafio... Acompanha-lo nesse evento de gala, então tiraria de letra. Possuía cartas na manga que só Daniel aqui da empresa sabia. Atraí vários investidores e clientes em potencial para a M.Y.B.I depois que entrei para essa equipe, todos que reverenciavam a empresa dos pais do Guilherme. Então eu tinha uma ligeira vantagem para deixar a cara de Fernando no chão: Eu possuía conhecimento, e ligações com as pessoas certas.

Havia mais um ponto. Nos quatro anos em que estava com o Guilherme, anualmente participei nessa festa, então meu rosto já esquecido por muitos, não era tão desconhecido assim. Foi a partir daí que comecei a traçar meu plano e anotar meus possíveis contatos em uma agenda.

Passei o resto da tarde, mandando relatórios para Fernando, sobre como se encontrava a administração da empresa. Coisas que ele pedia, mas não trocávamos nenhuma palavra a mais. Todos os documentos e analises que ele me pedia geralmente se encontravam já organizado em seu escritório. Um pressentimento já me dizia que talvez ele pedisse por isso.

Quando por fim achei que tinha acabado, mais uma vez passei em seu escritório, entretanto dessa vez não entrei.

— Já estou indo. Acabei o que tinha por hoje. — Já passava das seis da tarde, o que significava que eu tinha passado uma hora do meu horário habitual. — Até amanhã.

  — Até. — ele nem levantou os olhos em minha direção, o que não me surpreendeu em momento algum.

Quando já estava prestes a ir embora e sair do edifício, Camilla me ligou e eu retornei pelo mesmo caminho em que vim só que parando no penúltimo andar. Ela precisava da minha ajuda com a seleção de funcionários, e certa analise, já que Fernando tinha exigido isso.

  Mandei uma mensagem para Mariana informando da minha demora, o que para ela foi de pouca importância. Ela odorava ficar com Beatriz, e eu já estava com tanta saudade, que já estava esmagando meu peito. Quase levantei as mãos para o céu, saí praticamente correndo do escritório de RH quando terminamos. Apertei rapidamente o botão que chamava o elevador, e quase entrei os tropeços, só não deixei minha postura de lado, porque meu patrão estava ali dentro, me olhando com o rosto pálido.

— Está tudo bem? — Perguntei.

— Estou. — Respondeu secamente. Isso não me convenceu.

— Mesmo? — Perguntei novamente e ganhei um revirar de olhos.

—Não. Estou um pouco tonto, acho que minha pressão caiu. Não tive tempo de almoçar hoje. Apenas isso.

Mesmo que estivesse me informando que não passava bem como suspeitei assim que o vi. Seu jeito de falar foi de maneira totalmente estupida. Me encolhi um pouco, não sabendo se oferecia uma barra de cereal que tinha na minha bolsa a ele, ou simplesmente ficava calada e torcia para chegar logo em casa. Só que o universo já não parecia mais torcer ao meu favor, pois senti um leve solavanco no elevador, e observei a energia cair.

— O que foi isso? — Fernando falou assustado. Seus olhos olharam ao redor, e ele parecia estar suando frio.

— Acho que acabou a energia. E estamos presos. — informei o óbvio.

  — Isso não pode estar acontecendo!

Eu pisquei e Fernando estava desesperado puxando a sua gravada e murmurando coisas indistinguíveis aos meus ouvidos. Aproximei-me um pouco e o observei apertando todos os botões do elevador.

Havia certa fragilidade em seu semblante e o suor escorria pela sua face. Não pensei duas vezes quando dei mais um passo e segurei a sua mão, chamando assim sua atenção. 

— Hey! Calma. — Seus olhos verdes encontraram os meus — Está tudo bem. Vou ligar para a equipe técnica para saber o que está acontecendo. Ok?

Não esperei para ver outro ataque de pânico, e liguei para o pessoal da manutenção que me informaram que estavam fazendo reparos técnicos no elevador e não sabiam que nós estávamos ali, pois já havia dado o horário de todos irem embora.  Agradeci assim que terminaram de se explicar, e desliguei olhando diretamente para o homem que estava cada vez mais pálido em minha frente. Fernando respirava com dificuldade, devido ao ataque de pânico.

— Mais alguns minutos e eles já vão ligar a energia novamente tudo bem? — ele assentiu, e eu o puxei para que sentasse no chão junto comigo. Que situação eu fui me meter. Sussurrei em minha cabeça.

— Eu não consigo respirar. — sua mão tremia quando se encostava no colarinho da camisa.

Como ele estava passando mal quando entrei no elevador, cheguei à conclusão o tremor era devido à falta de não se alimentar e ao pânico que estava sentindo pela claustrofobia. Sei que depois eu talvez me arrependesse por fazer isso, mas não podia deixar Fernando nessa situação, então levei minhas mãos até a gola da sua camisa, e fui desabotoando os dois primeiros botões para dar a ele a simples sensação do ar entrando pelos seus pulmões. Retirei a sua gravata, e a pus ao seu lado. 

  Mais uma vez me acomodei na sua lateral e retirei minha barrinha de cereal da bolsa e entreguei a ele, quando ele pareceu estar um pouco melhor.  Ele olhou para ela sem a mínima vontade, e eu chamei a sua atenção:

— Acho melhor você comer, porque se desmaiar aqui vai ficar caído no chão. — brinquei, e com isso consegui arrancar um pequeno sorriso dos seus lábios.

  — Sou seu chefe, acho você iria me carregar de qualquer jeito. — falou ele ironicamente já dando a primeira mordida. — Afinal tenho certeza que quer mostrar serviço para não perder seu emprego. 

 

Revirei os olhos no mesmo instante. Já sabendo que ele estava bem melhor.  Eu poderia ter ficado brava com a sua resposta, mas talvez nesse momento bancar uma de explosiva não daria certo. E esse também não era o meu estilo. Então optei por um sorriso em meus lábios quando eu o retruquei.

— Sou paga para ser sua assessora no quesito empresarial, não sua enfermeira. Pelo menos é isso que está registrado na minha carteira.

Escutei um leve barulho no elevador, o que indicava que ele estava funcionando novamente. Dei um salto e fiquei em pé na mesma hora. Fernando deu um sorriso aliviado e também ficou em pé.  Até esqueceu-se de me dar uma resposta fria como sempre fazia.

Nossos olhares se cruzaram mais uma vez, e eu pude observar o suor em seu rosto diminuir. Procurei não ficar o olhando por muito tempo, mesmo nesse estado ele era muito atraente, o que causaria diversos problemas se eu não evitasse situações como essa. Não que eu conseguisse evitar ficar presa em um elevador, com o meu chefe nada delicado.

Antes de as portas se abrirem, me virei para Fernando que olhava fixamente para a frente.

  — E, aliás, se você continuar ameaçando de me demitir, vou empurra-lo para o elevador de novo. — minha ameaça era um meio de quebrar qualquer clima que ficasse entre nós.

  Jurei que vi Fernando ficar ainda mais pálido, mas relaxou depois que viu que estava brincando. Quando as portas se abriram, ele saiu apressado, só que a postura do Ceo arrogante já estava presente novamente.  Nem parecia que estava tendo um ataque momentos antes. Uma parte de mim, que era maldosa desejava esse desespero perdurasse mais um pouco, só para ver as barreiras quebradas por mais um momento. Que ele era frágil como qualquer ser humano. Só para vê-lo sofrer.

Assustei-me com os lugares que meus pensamentos me levaram, então eu os guardei bem no fundo do meu peito.

— Vou levar a sua ameaça ao pé da letra. — Fernando falou ao meu encalço. Levei um susto, me esqueci da sua presença.

  — Acho bom, sou de levar as coisas bem a serio.

Mesmo com ele na posição arrogante novamente, não consegui evitar me sentir mais calma. Avistei meu carro, um Creta da Hyundai que estava estacionado sozinho próximo a uma BMW do ano, que cheguei a conclusão óbvia que era do meu chefe.

— Bom esse é meu carro. — apontei para o automóvel, parando ao seu lado. Encarei Fernando mais uma vez. — Está melhor?

  — Sim, só preciso chegar em casa e comer algo. Está tudo sob controle.

Concordei com a cabeça e abri a porta do meu carro, onde joguei minha bolsa. Antes de entrar, parei por um minuto e apontei para a maleta que Fernando segurava.

— Não sei se está lavando as pastas que mandei para o seu escritório. Mas em uma delas tem recomendações de excelentes restaurantes. E também tem o meu número, se precisar de qualquer coisa pode me ligar. — Então, entrei no carro. Mas antes de fechar a porta, soltei mais uma frase. — Acho que começamos com o pé esquerdo hoje de manhã.  Mas talvez você não seja tão ruim quanto imaginei, posso me adaptar a trabalhar da sua maneira. Tenha uma boa noite Fernando.

Sorri e fechei a porta. Dei partida no carro e saí o mais rápido que podia do pátio da construtora. Estava louca para chegar em casa e ver a minha princesa, que não saiu da minha cabeça o dia inteiro. Eu só queria ter o prazer de segurá-la em meus braços e amamenta-la tranquilamente. Sentir seu cheiro, e saber que meu porto seguro estava tranquila em meu colo.

  Praticamente saltei do carro quando estacionei em frente ao prédio de Mariana. Estava com meu coração acelerado quando sua porta abriu e eu pude ver a minha filha, que esticava todo o seu corpinho em minha direção.

— Como você demorou, eu dei banho nela, e dei uma sopinha ás sete como você sempre faz.

   — Obrigada Mari, de coração. Nunca pensei que iria passar por tantos imprevistos assim no primeiro dia, então de coração eu agradeço. — As mãozinhas de Bia tocavam o meu rosto quando ela me deu um sorriso banguela. Meu coração se derreteu com esse simples gesto.

  — Não foi nada Ju. Não precisa agradecer.

Trocamos mais algumas palavras e por fim me despedi da minha amiga. Estava morrendo de vontade de chegar em casa. Estava exausta e queria muito curtir minha bebê. Por isso quando adentramos em nosso lar, eu aproveitei para tirar esse tempinho para matar toda a saudade que estava acumulada em meu peito.

Porém quando eram oito e meia Beatriz já estava dormindo, provavelmente estava muito cansada, pois para sua idade ela era uma criança muito hiperativa.

  Aproveitei esse tempo para tomar um banho, e enquanto preparava algo para comer. Chequei minhas mensagens, e retornei uma ligação para minha mãe e outra para a Ana. Só que tinha algo que não saía da minha cabeça.

A maneira que Fernando se portou hoje me assustou. Gostei de conseguir arrancar um sorriso dos seus lábios, de sentir que um clima leve nos envolveu mesmo que por um curto tempo. Talvez desse certo essa nossa parceria no trabalho. 

Há alguns dias recebi a proposta para trabalhar de Coach em uma rede hoteleira em que fiz trabalhos algumas vezes durante a minha licença maternidade. Com eles recebi uma boa quantia em dinheiro e também uma oferta de emprego em que poderia passar mais tempo em casa. Hoje de manhã cogitei diversas vezes essa possibilidade, mas agora? Eu queria esse desafio que Fernando tinha me proposto, já sentia a adrenalina pulsar em meu sangue.

Eu agarraria esse meu lugar na M.Y.B.I a todo o custo.

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