6: Que homem chato

Ver Victor tão à vontade, sentado bem à sua frente, faz o sangue de Marina ferver. Ela revira os olhos mais uma vez ao ouvir o apelido que ele teima em usar.

— O que está fazendo aqui? — questiona, sem se dar ao trabalho de uma saudação.

Ele esboça um sorriso ao perceber o quanto ela está incomodada com sua presença.

— Isto aqui é uma padaria, não é? — ironiza, com o sorriso ainda no rosto. — Vim tomar meu café.

— Moro aqui há 22 anos e nunca o vi entrar nesta padaria — retruca, com desdém.

— Então, você tem 22 anos? — pergunta ele, fingindo interesse.

— Você não disse que isto era uma espelunca? Por que voltou? — ignora a pergunta, mantendo o tom afiado.

— Vim pedir desculpas aos seus pais — admite, agora mais sério.

— E a mim? Vai pedir desculpas também? — desafia Marina, erguendo o queixo em sua direção.

— Para você, não — responde prontamente, como se já tivesse pensado na resposta. — Como disse ontem, seus pais foram muito cordiais. A única pessoa grosseira que encontrei aqui foi você. Aliás, parece que quem me deve um pedido de desculpas é você.

Marina não se contém e cai na risada, surpresa com a audácia.

— Você é mesmo engraçado — comenta, entre risos.

Victor inclina-se ligeiramente para frente, apoiando os cotovelos na mesa. Seus dedos se entrelaçam de maneira firme, e ele apoia o queixo sobre as mãos, seus olhos agora estão fixos nos dela.

— Por que está sendo informal comigo? — pergunta, com uma sobrancelha arqueada.

— Você foi o primeiro a me tratar informalmente, sem sequer usar o meu nome — protesta, fazendo um leve bico com os lábios.

Por um breve instante, Victor sente um nó na garganta. Ele desvia rapidamente o olhar, tentando recuperar sua compostura.

— Tudo bem, não me importo que me trate assim. Afinal, não estamos na empresa — diz ele, disfarçando, justo no momento em que Daniela se aproxima com o pedido.

— Obrigado, senhora. A torta de ontem estava excelente — comenta Victor, com um sorriso que faz Daniela rir.

— Fico feliz que tenha gostado — responde Daniela, sorridente. — Algum problema, Mari? — pergunta, notando o semblante tenso da filha.

— Nada, mãe. Só perdi o apetite — responde Marina, com os olhos fixos em Victor.

— Sua filha tem um gênio forte, não é? — comenta Victor, chamando a atenção de Daniela.

— Sempre foi assim — responde Daniela, com um sorriso orgulhoso. — Ele veio até aqui para pedir desculpas pelo ocorrido ontem, Mari.

— E a senhora aceitou tão facilmente? — retruca Marina, incrédula.

— Filha! — protesta Daniela, surpresa com a reação da filha.

— A senhorita já contou à sua mãe que iremos trabalhar juntos? — pergunta Victor, interrompendo.

Daniela franze a testa, surpresa.

— Como assim? — pergunta ela, confusa.

— Mãe, este é Victor Ferraz, um dos donos da empresa onde estou trabalhando — explica Marina, com uma leve frustração na voz.

— Minha nossa! Como o mundo é pequeno! — exclama Daniela, sem conseguir conter o espanto.

— Não pensei o mesmo? — diz Victor, sorridente.

Dessa vez, o sorriso de Victor não contém ironia, sarcasmo ou segundas intenções, e isso não passa despercebido por Marina, que por um instante fica encarando os lábios dele, admirada com a perfeição de seu sorriso e os dentes brancos. Percebendo o que estava fazendo, Marina sacode a cabeça, tentando se recompor.

— Já estou de saída — anuncia Marina, levantando-se abruptamente.

— Mas ainda é cedo, filha — comenta Daniela, intrigada com a atitude repentina. — Ao menos acompanhe seu chefe até ele terminar o café.

— Ele não é meu chefe, mãe. Trabalho para o irmão dele — explica Marina, dando um abraço rápido na mãe. — Até mais tarde. — E, lançando um olhar firme para Victor, completa: — Até mais, senhor Ferraz.

Com passos firmes, ela sai da padaria, indignada com o cinismo de Victor.

— Que babaca… — murmura, atravessando a rua, como se discutisse mentalmente com uma versão imaginária dele. — Ele acha que um sorriso e flores podem apagar a impressão que deixou?

— Está tudo bem? — A voz de Sávio a faz saltar de leve.

— Ah, é você? — responde, ainda surpresa.

— Esperava outra pessoa? — brinca Sávio, arqueando uma sobrancelha.

— Não, claro que não — diz Marina, desviando o olhar para o carro de Victor, que continua estacionado no mesmo lugar.

— Que carrão, hein? — comenta Sávio, notando para onde ela está olhando.

— Pois é... O carro é lindo, mas o dono… — Marina interrompe a frase, por saber que, se dissesse que Victor é feio, estaria mentindo para si mesma.

Victor Ferraz, afinal, é um homem de presença imponente. Alto, sempre vestindo ternos impecáveis que realçam seu porte atlético, ele exala elegância. Os cabelos pretos, levemente ondulados, sempre arrumados com precisão, e a barba rala e cuidadosamente aparada dão ao rosto um toque sofisticado. Seus olhos negros, frios e penetrantes, parecem sempre estar analisando e planejando, com um ar de superioridade que intimida.

— O que tem o dono do carro? — Sávio insiste, curioso.

— Nada de mais — responde ela, evitando maiores explicações. — Ele é só um homem muito rico, só isso. Agora preciso me apressar ou vou me atrasar.

— Vem comigo, eu te levo até o ponto de ônibus — sugere Sávio, animado.

Marina hesita por um instante, mas acaba aceitando a oferta. Enquanto está na garupa da bicicleta de Sávio, ela o ouve falar:

— Estava pensando sobre nossa conversa de ontem. Entendi o que você quis dizer — diz ele, pedalando com calma. — Não há nada de errado em querer uma vida melhor, e eu não discordo disso.

— Fico feliz que tenha entendido — responde ela, aliviada.

— Só quero que me entenda também, Mari. Busque um futuro melhor, mas lembre-se de aproveitar o presente. Não se perca no caminho — aconselha, com uma sabedoria que a faz refletir.

Marina está prestes a responder quando avista um carro luxuoso passando lentamente ao seu lado. O vidro abaixado revela o rosto de Victor, que a observa com a sobrancelha arqueada e um sorriso enviesado nos lábios. Nos seus olhos há diversão e desdém. Ao perceber que ela o observa, Victor balança a cabeça em sinal de negação e depois acelera o carro.

— Ele estava rindo de mim? — murmura Marina, inquieta e indignada ao pensar que ele estava se divertindo a suas custas.

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