2: Só pode ser brincadeira

Voltando para o interior da padaria, Marina confronta o pai.

— Como pôde deixar aquele idiota sair daqui com um olhar vitorioso? — questiona, claramente frustrada.

— Para evitar confusão — responde José, enquanto atende outro cliente. — Todos têm seus dias ruins, minha filha. Talvez esse tenha sido o dele.

— Aquele homem não estava num dia ruim, ele “é” ruim, isso sim — retruca, com firmeza.

Daniela, que está atendendo outro cliente, observa a indignação da filha e decide intervir.

— Não estrague o seu dia devido a um homem que você nunca viu antes, filha. Termine seu café, ou perderá o ônibus.

— Tudo bem, mãe — responde Marina, bufando de frustração.

Após terminar o café, Marina se despede dos pais e sai da padaria, caminhando em direção ao ponto de ônibus. Enquanto anda, não consegue deixar de pensar no idiota que apareceu mais cedo. Marina nunca gostou de pessoas que se acham superiores às outras, e aquele homem claramente era um exemplo perfeito disso.

— Mari! — uma voz masculina interrompe seus pensamentos. Ela se vira e vê Sávio, seu amigo de infância.

Ele está montado em sua bicicleta e veste o uniforme do supermercado onde trabalha como repositor.

— Oi, Sávio — ela cumprimenta. — Está indo para o trabalho?

— Sim, estou — responde ele, observando o modo como Marina está vestida. — E você? Para onde está indo tão bonita assim?

— Vou trabalhar — responde, sorridente. — Hoje é meu primeiro dia e por isso caprichei um pouco — confessa, sentindo as bochechas corarem ao notar o olhar apaixonado de Sávio.

— Quer uma carona? — Sávio oferece, sorridente. — Posso te levar até o ponto de ônibus.

Apesar de ter crescido em um bairro simples, Marina sempre sentiu que não pertencia totalmente àquele lugar. Seu objetivo era trabalhar duro para tirar os pais da vida comum que levavam. Aceitar uma carona na bicicleta de Sávio a deixava um pouco constrangida, mas ela gostava muito dele para recusar.

— Tudo bem, aceito. Assim, não arrisco perder o ônibus.

Ao perceber a satisfação de Sávio com sua resposta, Marina senta-se na garupa da bicicleta. Enquanto ele pedala, ela sente o perfume refrescante que exala dele. Sávio era bonito, simpático e sempre a tratava bem, mas seu único “defeito” era gostar da vida simples que levava. Por mais que sentisse algo por ele, Marina sabia que não poderia se envolver com alguém que não tinha grandes ambições.

Chegando ao ponto de ônibus, ela agradece e se despede.

— Bom trabalho, Marina — diz Sávio, antes de sair pedalando.

Marina suspira. “Se ao menos ele tivesse uma moto…”, pensa, enquanto observa o amigo se afastar.

O ônibus chega e ela embarca, voltando seu foco para o tão esperado primeiro dia no escritório de advocacia Ferraz. Ela lembra-se da entrevista desafiadora, especialmente diante dos associados da empresa, mas sua determinação a ajudou a responder todas as perguntas com confiança. Quando recebeu a ligação informando haver sido aprovada, soube que dali em diante faria de tudo para se destacar e crescer na empresa, até exercer a profissão pela qual estudou tanto.

Ao chegar ao enorme prédio de fachada de vidro, Marina procura o setor de RH.

— Pegue o elevador e vá para o oitavo andar — explica a recepcionista.

— Certo, muito obrigada — responde ela, sorridente.

Caminhando em direção ao elevador, Marina aperta o botão para o oitavo andar e observa a porta se fechar. Enquanto está ali, arruma alguns fios de cabelo que se soltaram.

— Você é capaz, Marina — diz a si mesma, encarando seu reflexo no espelho.

Ao sair no andar indicado, ela localiza a sala do RH e entrega todos os documentos necessários para sua admissão. Uma senhora de meia-idade, muito educada, chamada Lúcia, a recebe com um sorriso.

— Está tudo certo, Marina. Seja bem-vinda à empresa — diz, apertando a mão dela. — Tenho certeza de que vai gostar de trabalhar conosco. Marina sorri com o comentário. — Você será assistente do senhor Rodrigo Ferraz. Ele é uma pessoa maravilhosa, muito educado e respeitador.

— Que alívio ouvir isso — responde Marina, relaxando um pouco.

— Aqui nos tratamos como uma família — acrescenta Lúcia, acompanhando-a até o elevador. Quando Marina entra no elevador, Lúcia lança um sorriso meio amarelo. — E como toda família, sempre há uma ovelha negra.

Marina franze o cenho, sem entender o que a mulher quis dizer. Quando as portas do elevador se fecham, ela fica refletindo sobre aquela estranha observação.

— Uma ovelha negra? — murmura, intrigada.

Ao chegar ao andar onde trabalhará, Marina caminha até a mesa da secretária de Rodrigo Ferraz. A mulher está concentrada no computador e não percebe sua chegada.

— Bom dia, sou Marina Ferreira, a nova assistente jurídica — se apresenta.

A secretária a observa dos pés à cabeça, com um olhar avaliador.

— Bom dia — responde, com a voz melosa. — Sou Katrina, secretária do senhor Ferraz. Vou avisá-lo que você chegou. Katrina pega o telefone e avisa o chefe.

— A nova assistente chegou.

Após desligar, ela se levanta, ainda sorrindo, e vai até a porta do escritório de Rodrigo.

— Pode entrar, o senhor Ferraz está te esperando.

— Obrigada.

Marina entra na imponente sala e avista Rodrigo sentado à mesa, usando um terno de linho impecável. Ele se levanta ao vê-la se aproximar.

— Bom dia, senhorita Ferreira, seja bem-vinda — Rodrigo saúda, estendendo a mão.

— Muito obrigada, senhor Ferraz. Espero corresponder às suas expectativas.

Rodrigo faz um gesto para que ela se sente.

— Seu currículo é ótimo. Embora ainda não tenha experiência, suas notas na faculdade e sua determinação chamaram minha atenção. É exatamente disso que precisamos aqui.

— Prometo que farei o possível para estar à altura das expectativas da empresa — responde ela, confiante.

— É isso que gosto de ouvir. Você trabalhará ao lado da Katrina e revisará todos os processos para mim.

— Claro, senhor.

De repente, a porta se abre bruscamente, interrompendo a conversa.

— Preciso que assine isto agora! — uma voz estridente preenche a sala.

Marina sente um calafrio ao reconhecer aquela voz. Lentamente, vira-se para ver o homem impaciente, e seu coração parece saltar para a garganta. Ela está diante do mesmo homem que enfrentou mais cedo na padaria.

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