Abri a porta devagar, sem fazer barulho. O quarto de Sofia estava mergulhado na penumbra, iluminado apenas pelo abajur fraco ao lado da cama. Pelos cantos, brinquedos espalhados. Sofia dormia encolhida envolvida no cobertor florido, os cabelos espalhados pelo travesseiro e o braço agarrado à sua boneca preferida enquanto Celina estava sentada na cadeira ao lado de sua cama. Eu dei aquela boneca a ela. Lembro-me do dia, seus olhos brilharam de encanto enquanto rasgava o papel de presente. Assim que a segurou, apertou-a contra o peito e me lançou um sorriso radiante, daqueles que fazem o mundo parar por um instante. Naquela noite, recusou-se a dormir sem a nova companheira, e desde então, nunca mais a largou. Agora, vendo-a assim, abraçada à boneca, senti o coração aquecido pela lembrança daquele momento simples, mas perfeito. Enquanto eu ficava ali, observando-a, relembrando aquele momento, Celina notou minha presença. Ela sorriu, como se soubesse que eu visitava um momento f
Gabriel saiu tarde do quarto de Sofia, e claro, eu estava espiando. Fiquei ali, encostada na porta, ouvindo o que estava acontecendo lá dentro. Quando ouvi Sofia dizer aquelas palavras, meu coração apertou. A voz dela, tão simples e sincera, tocou em algo que Gabriel parecia ter perdido. Hoje é bom. Depois de todo esse tempo com ele, percebi que Gabriel não era cruel, só... estava tentando se proteger, proteger Sofia. Ele achava que precisava ser firme, controlar tudo, para lidar com o que o futuro trouxesse. Mas ali, ouvindo as palavras de Sofia para Gabriel, senti uma esperança silenciosa de que ele tivesse aprendido uma lição que talvez nem soubesse que precisava. Com a pureza de uma criança, ela lhe mostrou que, às vezes, o mais importante é simplesmente viver o agora. Eu realmente queria acreditar que ele havia entendido o quanto aquela garotinha precisava dele—mais do que qualquer outra coisa. Não sei como ele processou tudo aquilo, mas, no dia seguinte, Gabriel esta
— Se for para questionar minha decisão de não deixá-la ir, Celina, não vejo necessidade. Se eu não me engano, em duas semanas ela tem uma avaliação dela na terça, que é muito mais importante. — O senhor sabe da avaliação? — Eu sei de tudo a respeito de Sofia. — Entendo que a prova é importante, mas o senhor já pensou que experiências como essa também podem ser educativas? — Uma festa de aniversário? Educativa? Como exatamente? — Senhor Gabriel, quando o senhor negocia um contrato, o que é mais importante: números ou conexões? Ele inclinou a cabeça, como se analisasse aonde eu queria chegar. — Ambos têm sua importância. — Exatamente. E Sofia precisa aprender isso. Ela já está excelente nos números, mas como ela aprenderá a criar conexões se não tem permissão para interagir com outras crianças? — Está me dizendo que uma festa de aniversário de uma criança de oito anos vai ajudar a minha filha a ser bem-sucedida? — Acredito que sim. U
— Chame Sofia. — Sim, senhor. Enquanto Celina saía da sala, notei que o celular dela tocou e ela me pareceu apressada para desligá-lo. Nem teve curiosidade de saber quem ligava. Outra ligação misteriosa? Será que havia alguém em sua vida? Um namorado? Por que de repente a ideia dela ter um namorado me incomodou? Era bom que isso não interferisse em seu trabalho. Fiquei pensando sobre as interações que tive com ela. Celina nunca levanta a voz, mas sempre encontra um jeito de me fazer ver as falhas nos meus argumentos. Não é uma batalha de gritos, é uma batalha de lógica. E ela sempre está ganhando. Eu sou o CEO da maior empresa de tecnologia do ramo, sou conhecido pela minha habilidade de argumentação e lógica e ainda sim, não pareço nada disso quando falo com ela. Ela realmente não me confronta diretamente, mas sempre consegue me fazer questionar minhas decisões. Como é que ela faz isso? Cada palavra dela parece cuidadosamente calculada, como se esti
— Eu ganhei, eu ganhei, eu ganhei o vestido da princesa Sofia! Eu queria muito! Olhe mamãe, é roxo, a minha cor preferida. — Sofia girava fazendo o vestido rodopiar. — Ficou maravilhoso em você, querida! — Livia falou com um sorriso. — Papai, você tem que ter uma fantasia do Crackle, o dragão da princesa Sofia. — Por que eu tenho que ser o dragão? Por que eu não posso ser o Rei Roland II e sua mãe, a Miranda? — Eu reclamei, fazendo uma careta, fingindo indignação. Sofia, com os olhos brilhando de empolgação, não hesitou e respondeu imediatamente, quase sem pensar. — Eu preciso de alguém para me levar para voar, papai. Mamãe é a Miranda, mas você tem que ser o dragão — Sofia pulou em mim. — Vamos papai, precisa comprar uma fantasia! — Não creio que haja uma fantasia do meu tamanho, mas eu serei o seu Dragão. Suba nas minhas costas princesinha Sofia, que eu a levarei para voar sobre Encantia! Enquanto eu corria com Sofia nas costas, pulando de u
Atualmente Eu havia conseguido. Sofia estava nas nuvens, apesar de tudo, Gabriel era diferente do que eu imaginava. Ele era rígido, mas não era cabeça dura. Ele se mantinha aberto a conversar e cedia diante de um bom argumento. Ele elogiou minha habilidade de argumentação. — Oh, Celina! Estou feliz demais! Viu como papai me ouviu? — Vi querida, ele ficou muito orgulhoso. — Obrigada, Celina. — Sofia me abraçou e eu me emocionei. Antes que as lágrimas pudessem cair dos meus olhos, ordenei com gentileza: — Vamos dormir. — Me dá mais um chocolate, por favor? — Você já comeu a quantidade permitida de chocolates hoje, querida. Até a quantidade de chocolate era controlada. Gabriel dizia que o chocolate dava uma falsa sensação de alegria com todo aquele açúcar, por isso ele controlava rigorosamente a quantidade que ela podia consumir. Acreditava que o chocolate podia se tornar um refúgio, uma forma de escapar das emoções difíceis, mas que, a longo prazo, não e
Eu achei que estava tudo bem. Achei que o pedido para a fada do dente estava funcionando. O papai tinha me ouvido, tinha me deixado ir à festa da Maria. Até me elogiou. Ele parecia… diferente, mas de um jeito bom. Um jeito que me fazia lembrar de antes. Mas agora… agora ele estava bravo de novo. Eu só queria mais um chocolatinho, só um. Não era tão errado assim, era? Celina ia me dar, e eu fiquei feliz. Mas, quando me virei, ele estava ali. Eu nem tinha ouvido ele chegar. Meu coração bateu forte, muito forte, e eu quis desaparecer. Ele olhou para Celina daquele jeito frio, fez aquela voz que me deixa com vontade de encolher. Disse que eu não devia pedir o que sei que é errado. Eu baixei os olhos, e me senti muito triste. Eu queria me esconder. Eu não queria que ele ficasse bravo. Eu só queria… eu só queria que ele fosse como antes. Depois que papai falou, a Celina pegou minha mão e saiu pisando duro. Eu fui junto, mas não consegui f
Fiquei um longo tempo no quarto com Sofia. Depois que ela adormeceu, desci as escadas e encontrei a porta do escritório de Gabriel aberta. Ele ainda estava lá dentro, sentado no sofá do escritório, com a camisa aberta, cabelo bagunçado e um copo de uísque nas mãos. Seus olhos estavam vermelhos e olhava fixamente para o nada. A raiva em mim dissipou. Ele parecia ter chorado. Fiquei parada por um instante, observando-o. A imagem de Gabriel, sempre tão rígido e no controle, agora despido de sua armadura, me pegou de surpresa. Ele não era apenas um homem severo e exigente—era alguém quebrado, perdido dentro da própria dor. A raiva que eu sentia antes desapareceu, dando lugar a algo que eu não sabia bem como nomear. Com cautela, dei um passo para dentro do escritório. — Senhor Gabriel… — minha voz saiu baixa, quase um sussurro. Ele piscou algumas vezes, como se estivesse voltando à realidade, mas não respondeu. Apenas girou o copo de uísque nas mãos, encaran