Enquanto Bernardo ficou bebendo e conversando com o pai e o irmão, dei logo um jeito de subir para o quarto para ver Ian. A verdade era que estava preocupada com meu filho, mas também queria uma desculpa para escapar da companhia daquelas pessoas. Bernardo sempre dizia que os pais iriam me adorar, que eu era exatamente o que ele sempre quis para si. Porém, a frieza e os olhares avaliadores que recebi desde que chegamos deixaram claro que a aceitação deles estava longe de ser alcançada. Sentia-me deslocada e ansiosa, buscando qualquer conforto familiar, e estar com Ian era a maneira mais segura de encontrar um pouco de paz naquele ambiente estranho.Ao entrar no quarto, encontrei Ian dormindo tranquilamente no berço, e logo dispensei Rita com um sorriso agradecido. Aproximei-me e comecei a acariciar seu rostinho, sentindo uma onda de paz e amor. Seus traços delicados e a expressão serena enquanto dormia me faziam esquecer, ainda que por breves momentos, da tensão que sentia ao redor. D
Quando acordei naquela manhã, um sentimento de irritação pairava sobre mim. Talvez fosse o fato de estar em um ambiente onde tudo parecia fora do meu controle, ou talvez fosse simplesmente o cansaço acumulado dos últimos dias. De qualquer forma, o mau humor era inegável. Mas, antes que pudesse me afundar completamente na minha própria negatividade, senti as mãos de Bernardo acariciando meu corpo suavemente, seus dedos traçando linhas gentis pelo meu braço, e seus lábios depositando beijos suaves em meu pescoço. Automaticamente, senti meu corpo relaxar, a tensão se dissipando ao toque dele.— Bom dia — ele murmurou, sua voz baixa e rouca, ainda carregada de sono. — Precisamos nos arrumar. Minha mãe preparou um passeio de veleiro e um brunch para nós.Forcei um sorriso, tentando não demonstrar o quanto a ideia me desagradava. Não era que eu não gostasse da ideia de velejar, mas a perspectiva de passar mais tempo com os pais dele, que até então tinham sido frios e distantes, não era nada
~BERNARDO~Enquanto a lancha avançava pelo mar, senti uma onda de culpa começar a se formar dentro de mim. O vento salgado batia no meu rosto, mas não conseguia afastar a sensação de que talvez Alice estivesse certa. Na ânsia de agradar meus pais, de me mostrar presente e adequado ao que eles esperavam de mim, talvez eu realmente estivesse ignorando a forma como eles estavam tratando Ian e Alice. Talvez não tivesse prestado atenção suficiente no fato de que eles estavam evitando qualquer interação com nosso filho ou que, especialmente se essa interação fosse pública. De alguma forma, não aceitavam a nossa história como uma família.Prometi a mim mesmo que pediria desculpas a Alice assim que retornasse. Eu queria que ela soubesse o quanto eu estava comprometido em compreender, em estar ao lado dela na batalha para preservar o que estávamos construindo juntos. Mas ali, no meio do mar, cercado pelo peso das expectativas familiares e pela tensão crescente, me sentia impotente, incapaz de
~BERNARDO~Enquanto a conversa com Clarice fluía percebi que, apesar de tudo, ela não era uma pessoa tão desagradável quanto ela tinha parecido ser até então. Havia uma camada de humanidade por baixo de suas ações calculistas, uma motivação que, embora errada, fazia sentido em um contexto de desespero. Nós até tínhamos algo em comum: o senso de dever para com a família. Ela havia feito o que achava necessário para ajudar a mãe doente, e de certa forma, eu podia entender isso. Não que isso justificasse o que ela fez, longe disso. Mas se eu fosse obrigado a conviver com ela em prol do nosso filho, talvez fosse melhor encontrar alguma forma de paz entre nós.Clarice começou a falar sobre o ultrassom, sua voz assumindo um tom mais suave e até animado. Ela descrevia com entusiasmo como era ver o bebê crescendo pouco a pouco, cada detalhe que ela notava nas consultas. Enquanto ela falava, eu não pude deixar de pensar em como não tive a chance de viver isso com Alice e Ian. Toda a fase da gr
Eu observei Bernardo em pé diante de mim, a tensão evidente em seu rosto. Ele estava tentando escolher as palavras certas, como se temesse que qualquer coisa dita pudesse desencadear uma tempestade. Eu sabia o que ele estava pensando: que eu iria explodir em ciúmes, acusá-lo de algo, exigir explicações. Mas, para a surpresa dele, eu não tinha a intenção de fazer isso.Antes que ele pudesse articular qualquer desculpa ou justificativa, eu me levantei da cama, com o coração batendo rápido no peito. Caminhei até ele, a pouca distância entre nós sendo vencida por um impulso que eu nem tentei conter. Segurei seu rosto com as duas mãos e o beijei.Quando nos separamos, vi a confusão em seus olhos, mas também um alívio que ele tentava disfarçar.— Desculpa, Bernardo — sussurrei, olhando diretamente para ele. — Você tem razão. Eu não estou tentando o suficiente. Mas eu vou mudar isso.Ele piscou algumas vezes, como se processasse minhas palavras, claramente pego de surpresa.— Quando voltarmo
Eu me olhei no espelho uma última vez, ajustando o vestido simples que havia comprado em uma loja de departamentos. Era bonito, sem dúvida, mas nada comparado aos trajes luxuosos que eu sabia que as mulheres da família Orsini e as outras convidadas usariam naquela noite. Uma parte de mim se sentia inadequada, sempre tentando me encaixar em um mundo ao qual não pertencia. Mas quando Bernardo se aproximou por trás de mim, seus olhos se encontraram com os meus no reflexo do espelho, e o sorriso que ele me deu dissipou qualquer insegurança.Ele me olhava como se eu fosse a mulher mais linda do mundo, e aquele olhar não apenas iluminou meu coração, mas também dissipou todas as dúvidas e inseguranças que eu carregava. Era como se, naquele instante, o mundo ao nosso redor tivesse desaparecido, deixando apenas nós dois, conectados por algo que ia além das aparências e expectativas. O modo como os olhos de Bernardo me contemplavam, cheios de admiração e desejo, trouxe uma nova força dentro de
À medida que me aproximava da confusão, os gritos desesperados logo entregavam que, de fato, era uma emergência médica. Minhas pernas pareciam se mover sozinhas, impulsionadas por um instinto que desenvolvi no hospital. As pessoas estavam aglomeradas em torno de alguém, e foi então que vi Marisa, tentando amparar Sílvio, que parecia estar em sérios apuros. Ela estava visivelmente desesperada, mas a multidão ao redor dificultava minha visão do que realmente estava acontecendo.— Afastem-se! Deixem-no respirar! — gritei. Apesar da frase clichê, minha voz firme cortou o pânico geral.Mas, antes que alguém pudesse reagir, uma fala irônica ressoou por entre os convidados.— Esse é o problema — disse Valentina, sua voz carregada de desprezo, chamando minha atenção para a verdadeira gravidade da situação.Finalmente consegui distinguir o que estava acontecendo. Sílvio estava sofrendo um engasgo severo, o rosto vermelho e os olhos arregalados em pânico. Ele mal conseguia respirar, enquanto Ma
Quando voltei para o quarto, meus passos eram leves, quase hesitantes. A conversa com o senhor Orsini ainda ecoava em minha mente, e eu precisava de um momento para reorganizar meus pensamentos. Assim que entrei, a suave melodia de uma canção de ninar chegou aos meus ouvidos. Parei na porta, e meu coração se aqueceu ao ver Bernardo inclinado sobre o berço de Ian, cantando para ele com uma voz que era ao mesmo tempo terna e profunda.Ele estava completamente absorto, seu olhar fixo no pequeno rosto do nosso filho, que já parecia estar à beira do sono. A luz suave do abajur ao lado do berço banhava a cena em um tom dourado, conferindo a tudo uma aura quase mágica. As sombras dançavam suavemente pelas paredes, acompanhando o ritmo tranquilo da canção. Bernardo, que muitas vezes era um homem de palavras contidas e gestos calculados, agora parecia tão vulnerável e genuíno, como se toda a sua dureza tivesse se derretido na presença de seu filho.Eu fiquei parada ali, observando-o, incapaz d